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domingo - 10/04/2016 - 07:34h

Nem pacífico nem ordeiro

Por François Silvestre

A maior fraude antropológica sobre a natureza humana do brasileiro foi a consagração dessa bobagem de que somos um povo ordeiro e pacífico.

Pra começo de conversa nem somos um povo. Somos um pré-povo, em permanente debandada, socialmente desnutrido e culturalmente embotado.

Quem pensou sobre a nossa identidade, não se arriscou ao apontamento do nosso destino. Sérgio Buarque, Gilberto Freire, Darcy Ribeiro, Rui Facó, Câmara Cascudo, Caio Prado, Josué de Castro, Manoel Correia de Andrade, Werneck Sodré e tantos outros só mostraram a nossa face. Às vezes deformada.

Somos violentos e desordeiros. Porém, a “valentia” da nossa índole é de natureza individual. Intrassocial. Em matéria política e de organização coletiva somos cordeiros. Arrebanhados. Valentes no varejo e covardes no atacado.

Todas as ditaduras aqui estabelecidas tiveram o amparo da nossa covardia. Pelo medo ou pela colaboração. E todas elas só caíram após a exaustão da sua própria superação. Nenhuma foi derrubada.

Nunca fizemos uma revolução. Só golpes. Nem reformas nós fazemos. Nossa organização partidária é uma quadrilha cartorial. Cada um em torno de uma legenda que nega o próprio nome e de um programa prostituído de adjetivos.

“A índole pacífica do nosso povo” é uma fraude antropológica. Verso de um poema de vaselina. A entrar no traseiro da incultura.

Fomos descobertos porque estávamos no caminho da ganância dos impérios e da aventura dos corsários. Num entreposto à disposição da ladroagem.

E nunca mais nos libertamos dessa sina. Roubados por portugueses, franceses, holandeses, ingleses e corsários de todos os mares. Depois, dependentes do império americano.

Mas não fica por aí. Os nossos representantes não se prestam à defesa da nossa terra. Pelo contrário, roubam-nos o que sobrou da roubalheira imperial.

Um pré-povo disponível ao saque. Assaltado pelos donos do poder econômico. Pacífico ante os mandões, mas violentos entre si. Ninguém está seguro na pátria da bandidagem. E no falso combate, os fascistas e seus holofotes assinalados.

A criminalidade crescente, sem controle, confirma a negação intrínseca da nossa falsa índole mansa. E quem deveria combater, colabora; na inutilidade festiva da mídia. As ruas são dos bandidos. Encurralados estamos entre a bandidagem e o controle de faz de conta.

Em política, no Brasil, não há correligionários. Há cúmplices. Conchavos eleitorais. Compra e venda. “Eleitos e eleitores” no mesmo forno de assar patifaria. Exuberância de geografia num país de pífia história.

Dizia Darcy Ribeiro que a naturalidade do índio, a tecnologia do europeu e a espiritualidade do africano formariam um grande povo. Resta esperar o futuro.

Constituinte Originária agora ou oportunidade perdida.

Té mais.

François Silvestre é escritor

* Texto originalmente publicado no Novo Jornal.

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Categoria(s): Artigo

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