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quinta-feira - 28/09/2017 - 10:12h
Economia

O leão que não ruge na indústria salineira do RN

A indústria salineira do Rio Grande do Norte padece de um mal tão multissecular quanto à própria atividade, que existe economicamente no país desde o início do século XIX, mas que tem registro documental desde tempos coloniais, primórdios do século XVII. Apesar de forte, não sabe a força que possui.

Ontem (quarta-feira, 27), mais uma vez o segmento recorreu a políticos (veja AQUI). Bateram à porta do presidente Michel Temer (PMDB), em Brasília. Pleitearam demandas do seu interesse e que alcançam economicamente mais de 70 mil pessoal direta e indiretamente no estado, onde se produz cerca de 97 por cento do sal marinho do país.

Chegam a atingir seis milhões de toneladas/ano do produto, com um faturamento que beira 1 bilhão de reais.

Imagine você, se o monopólio dessa riqueza mineral fosse dos Estados Unidos da América ou mesmo do Rio de Janeiro ou São Paulo. Exagero até: bastava que sua produção coubesse nas ribeiras do Potengi, em Natal, para que outra mentalidade imperasse.

Salina nos anos 20 do século passado em área de produção do RN (Foto: Web)

Essa benção natural que colonizadores portugueses testemunharam e relataram abismados, até hoje é um negócio mal-resolvido.

Por favor, não joguemos essa carga de culpa nos políticos, como se tornou lugar-comum às nossas fraquezas e incompetências. Não terceirizemos o legado da falta de união do setor, principal causador dessa recorrente agonia que os levou aos pés presidenciais.

Desde menino que ouço: “Quando o sal está bem, Mossoró está bem”.

Pires à mão

Além de forte insumo à economia, fomentando o meio circulante e dilatando o erário com impostos, o sal revela-se como grande distribuidor de renda horizontalmente.

Contudo, mesmo assim, segue sua rotina de pires à mão à cata de socorro aqui e ali, quando tinha tudo para ter assento noutro nível de conversação no campo político e econômico do estado e país.

Em face de seu comportamento bipolar – vai da euforia à depressão de uma safra para outra -, não cuidou em séculos de produção de engendrar uma política de autovalorização, foi pouco atento na relação com o meio ambiente; investiu pouco em pesquisa (que poderia aproveitar o fantástico manancial das águas-mães), além de não cultivar melhor convivência com a sociedade e não apenas com a classe política.

As próprias entidades que escudam empresários de extração e moagem, não atentaram para a importância da aliança associativa e da imprescindível necessidade de expansão de sua influência além dos convescotes em restaurantes.

Um caso notório é do Sindicato da Indústria de Extração do Sal (SIESAL), que tem o mesmo presidente a 64 anos. É um feito de fazer inveja ao finado Fidel Castro. A mesma entidade não junta mais do que 15 associados, relegando ao esquecimento e desdenhando cerca de 50 pequenos produtores que não possuem nomes ou sobrenomes pomposos e faturamentos estelares.

A parábola do leão

Os salineiros lembram “A parábola do leão”, que conheci há muitos anos. Tem origem hindu. Narra que algumas ovelhas adotaram um leãozinho abandonado. Ele cresceu ao lado delas, incorporando seus hábitos e índole. Seus medos, em especial.

Certa vez, cercadas por um leão adulto que buscava uma presa para se alimentar, as ovelhas se amontoaram no alto de um ponto rochoso. O leão que elas criaram fez o mesmo, amedrontado.

O leão predador acabou desistindo da caça ao perceber que um exemplar de sua espécie estava entre elas. Mas o pressionou para saber o porquê de ele não se comportar como felino de grande porte. Até tentou fazê-lo rugir, sem êxito. Ensinou, ensinou… e nada.

Deu meia volta e foi embora, decepcionado.

O leão-ovelha só sabia balir (som emitido por caprinos), apesar de tentar urrar como lhe ensinara o leão.

Dias depois, o mesmo rebanho de ovelhas sofre outro cerco aterrorizante. Dessa vez, de uma alcateia faminta. Eram lobos que pareciam certos de uma comida farta e fácil. Mas aí o leão medroso aparece de repente e encarna sua verdadeira natureza; descobre-se como um felino de verdade.

Ele parte para cima dos lobos e ruge ferozmente, pondo-os em desabalada fuga. Dessa forma, salva-lhes dos perigosos inimigos. Paralelamente, descobre-se como um leão. Encontra sua força.

Quem sabe, um dia, os salineiros se tornem um leão de verdade, sem tantos medos.

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Categoria(s): Economia / Opinião da Coluna do Herzog

Comentários

  1. Andrea linhares diz:

    Excelente o artigo.
    Parabéns ao editor.

  2. João Claudio diz:

    Imagine se o brasil fosse administrado pelos japoneses.

    Nunca devemos esquecer que o Japão virou pó em 1945, ressurgiu das cinzas e hoje é destaque mundial.

    Enquanto isso, o povo brasileiro teima em ciscar para trás. Tem sido assim desde 1500.

    É o país ”galinha”.

    ”Cá” não cria e nem tão pouco inventa porra nenhum.

    ”Cá” só sabe copiar.

  3. João Claudio diz:

    Ops! Falha minha.

    A pedalada no futebol é invenção brasileira.

    Desculpe aí, viu?

  4. FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO diz:

    Concordo em gênero, número e grau com enunciado do artigo.

    Digo mais, os arranjos familiares, o tráfico de influência, compadrios, fisiologismos e subserviências de toda ordem na relação direta com os poderes constituídos (NO CASO, SOB O COMANDO DAS TRADICIONAIS OLIGARQUIAS POTIGUARES), ao longo do tempo transformaram os ditos empresários e sindicatos em simulacros de representatividade da classe.

    Nesse aspecto, o profissionalismo que deveria ser regra é exceção, no âmbito da gestão dos negócios da industria salineira com relação aos poderes da república, infelizmente, daí a reiteração de acontecimentos e chorumelas sazonais de grande parte dos empresários, sobretudo dos não detêm monopólios, daí o acerto da denominação de parte do articulista, quando os chama de processo bipolar.

    Ou seja os ditos empresários LEÕES/OVELHAS, continuarão tão somente tentando rugir e ao mesmo tempo, de fato, a depender estritamente do clima e das chuvas, e por conseguinte, sazonalmente publicizando suas chorumelas e subserviências de sempre, por via de consequência, a potência que deveria representar o Rio Grande do Norte no setor, mais uma vez continuará sendo, apenas ponto futuro.

    Um baraço

    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
    OAB/RN. 7318

  5. Vicente diz:

    Brilhante a sua análise, Carlos. É inacreditável constatar que Mossoró é sede dos produtores da quase totalidade do sal colhido no Brasil, e tenhamos uma situação tão inquietante. O meio salineiro, ao longo dos anos, ficou marcado como um setor econômico com enorme concentração de aventureiros, espertalhões, empresários e agentes megalomaníacos e sem qualquer responsabilidade social. Para as atividades comerciais foi um ramo tratado como residual, para onde migravam aqueles sem vocação para qualquer outra coisa. Se o sujeito não tem profissão definida, ou não se descobriu para qualquer área, vira representante comercial ou vendedor de sal. Exceções existem, evidentemente. A atividade teve gente do tamanho de Milton Marques e tantos outros empresários de atuação respeitável. Mas também tem gente do tamanho de Edvaldo Fagundes. Um ramo que tem este senhor como figura mais próspera, detentor de meios de produção gigantescos, obtidos pelas vias conhecidas por todos e pela Justiça Federal, não tem como chegar a bom lugar. Tivéssemos pessoas grandes liderando a atividade, Mossoró teria outra história. É de se lastimar que aqui não exista há muitas décadas um polo científico e acadêmico especificamente voltado à produção salineira, com engenheiros, técnicos ambientais, e tudo o mais.

  6. João Claudio diz:

    O texto de Carlos Santos sugere que, o país de Mossoró e o país tupiniquim são berços de ”gênios de bijuteria e intelectuais de miçanga.”

    Ambos não criam nada, não inventam nada, querem que tudo caia do Céu ou preferem comprar feito.

    Mais: a maioria deles torce para chegar a hora do almoço para logo após se estirar numa rede e ”tirar um ronco zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz.”

    Enquanto o brasileiro dorme, os povos de países desenvolvidos trabalham, criam, inventam e descobrem sem parar.

    Ah, Os gringos já pisaram na Lua, já tocaram o solo de Marte, vão chegar ao Sol e o brasil não sai da condição de 3ª.

    Repito: a diferença de idade entre brasil e EUA é de apenas 8 a-nin-hos.

  7. naide maria rosado de souza diz:

    Texto esclarecedor.

  8. Augusto Heleno diz:

    Excelente análise. A indústria salineira “vive” como se estivéssemos há 200 anos…

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