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domingo - 10/04/2016 - 06:42h

Por uma nova Constituição para o Brasil

Por Marcos Araújo

(em homenagem ao brasilianista e querido amigo Stéphane Monclaire)

Desde a sua Independência, o Brasil conheceu diversos processos constituintes, isto é, vários conjuntos de sequências encadeadas que levaram à promulgação de uma nova Constituição. Seguramente, o último dos processos constituintes, aquele do qual resultou a promulgação da Constituição de 5 de outubro de 1988, foi o mais complexo e o mais rico do ponto de vista científico e da arqueologia constitucional. Para diferençar dos demais, basta destacar sua enorme duração.

Como lembrava Stéphane Monclair, um amigo brasilianista francófono, nunca, no Brasil, um processo constituinte fora tão longo, e este recorde é válido, sem dúvida, para todo o continente sul-americano. Os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) se estenderam por 613 dias, do dia 1° de fevereiro de 1987 até o dia 5 de outubro de 1988, totalizando 2.676 horas e 16 minutos de sessão plenária (duração de horas que não leva em conta o tempo – mais considerável ainda – passado em comissões, em reuniões preparatórias, em grupos informais de trabalho ou de negociação).

“Parido” o texto constitucional, com os vícios da falta de um referendo popular para o seu início de vigência, a elite política dominante passou logo a adjetiva-la como a “Constituição Cidadã”, jogando para “debaixo do tapete” da história a sujeira e os vícios de sua legitimação. A Constituição, genealogicamente, serviu para arremedar interesses dispersos e diversificados de grupos conservadores, instituições religiosas, entidades civis e militares, políticos desonestos etc.

Na época da Assembleia Nacional Constituinte (ANC), esse meu amigo Stéphane Monclaire, professor recém contratado da Universidade de Sorbonne, resolveu vir ao Brasil para centrar suas pesquisas nos trabalhos de elaboração da nova Constituição. Ele detinha provavelmente a mais ampla documentação, depois do Congresso, sobre a Assembleia Nacional Constituinte. Emprego os verbos no passado porque Monclaire faleceu semana passada, em terras brasileiras, vítima de um AVC.

A morte de Monclaire coincide com a morte da nossa Constituição. Se ela já não era a Constituição desejada, e nem muito menos lhe caberia a expressão enganadora de “Constituição cidadã”, agora o STF terminou por ditar para o coveiro o seu epitáfio: – O seu texto, de nada vale, diante de nossa interpretação!

É primário imaginar que temos a Constituição arquetipada pela Assembleia Nacional Constituinte. Quase nada sobrou do texto originário. Em 18 de fevereiro último, foi promulgada a 91ª (nonagésima primeira) emenda (que autoriza a desfiliação partidária sem prejuízo da perda do tempo).  Em suma, ela foi emendada 91 vezes e algumas destas emendas modificaram simultaneamente vários artigos. Foi o caso da emenda 45, de dezembro de 2004, que alterou de uma só vez 25 artigos! Há também emendas que modificam emendas anteriores.

Além disso, algumas interpretações jurisprudenciais de dispositivos constitucionais são muito distantes do significado que a maioria da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) lhe emprestava. Assim o texto em vigor hoje é bem diferente da Carta promulgada em 5 de outubro de 1988.

“Cidadã” a Constituição nunca foi. Não foi o cidadão o beneficiário direto do texto constitucional. Nem mesmo pode se dizer que a sua normatividade garante o exercício da cidadania. Veja-se, por exemplo, a quimera dos artigos 196 e 225: “a saúde é direito de todos e dever do Estado”; “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”. Estes artigos divulgam representações coletivas, de forte impacto simbólico, apenas.

O texto de 88 também trouxe de concreto benefícios diretos ou implícitos a certos grupos políticos e autoridades. O foro privilegiado foi um deles. É de se lembrar ainda, por exemplo, a figura do presidente da República de então, José Sarney, beneficiário direto de um artigo que institui e regulamenta as medidas provisórias, e de outro artigo que fixava a duração do mandato dele.

O Professor Monclaire, como excelente pesquisador, mapeou na Constituição que se redigia o lobby de grupos legítimos, mas também de elites setoriais e regras de jogo que marginalizaram os cidadãos.

Certos setores lobistas assumiram plenamente essa condição. Apenas para dar dois exemplos: a) com mérito, o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar – DIAP, credita a si a formulação inicial do que viria a ser o capítulo dos Direitos Sociais e outras vantagens dos trabalhadores na Constituição de 1988; b) a Igreja católica (CNBB) se uniu aos evangélicos (CONIC) na redação do artigo 226 da Constituição, relativo à formação da família.

Independentemente a quem seja creditada a genealogia dos diversos dispositivos constitucionais, é de se dizer que a Constituição morreu. Seja pela evolução social e política, seja pela desatualização jurídica, o seu texto não mais orienta ninguém, nem mesmo ao seu orgânico defensor maior, o Supremo Tribunal Federal.

É que, nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal tem se arvorado da condição de “dono da Constituição”, com o direito de reescrevê-la a seu bel prazer. Essa postura autoritária cria enorme insegurança jurídica, agride o bom senso, fere os bons sentimentos democráticos e republicanos e gera insustentável insegurança jurídica.

É bem verdade que tem prevalecido aqui no Brasil a teoria da mutação informal constitucional, do alemão Georg Jellinek. Segundo o alemão, o caráter dinâmico do corpo social exige dinamicidade do ordenamento jurídico e do sistema jurisdicional — sobretudo do órgão encarregado da guarda da Constituição, aproximando Direito e Justiça.

Talvez seja imbuído desse arrimo que o STF tem jogado na lata do lixo vários artigos da nossa Constituição. Certos preceitos da Separação de Poderes, como o da competência da Câmara e do Senado para a perda do mandato em caso de crimes praticados pelo Parlamentar foi reescrito pelo STF. Posso citar três outros casos que deixam bem evidentes a modificação do texto constitucional…

Uma delas, mais recente, ignorando os Tratados Internacionais recepcionados pelo ordenamento jurídico brasileiro, e a previsão expressa em nossa Constituição (art. 5º, LVII, CF), que garantem o princípio da presunção de inocência (ou de não culpabilidade), o STF passou a negar sua vigência, autorizando a execução antecipada de decisões condenatórias (art. 5º, LVII), mesmo pendentes recursos aos Tribunais Superiores.

Noutra, da mesma semana, por 9 votos a 2, o Supremo Tribunal Federal decidiu ser constitucional a Lei complementar 105/2001, que permite aos órgãos da administração tributária quebrar o sigilo fiscal de contribuintes sem autorização judicial, revogando a garantia constitucional do sigilo de dados, contida no inciso XII do art. 5º. Inclusive essa nova decisão foi uma modificação da jurisprudência da própria Corte, que em 2010 entendeu ser inconstitucional a quebra de sigilo pelo fisco sem autorização judicial.

Mais remotamente, no julgamento das ADPF 132/RJ e ADIn 4.277/DF, o Supremo havia reescrito outro artigo da Constituição. Naquela ocasião, o STF decidiu, com acerto, que a união homoafetiva perfaz uma entidade familiar, diferentemente do que dizia o §3º do art. 226 da Constituição, que só a reconhecia entre homem e mulher. Foi revogado, com o julgamento do Supremo, o texto que tinha o lobby conservador das igrejas.

O perigo se assoma maior ainda porque o STF tem reescrito a Constituição por casuísmo, fazendo uma adaptação constitucional ao momento social. As interpretações têm sido canhestras, ao sabor da pressão midiática e social. A balança de suas decisões pende em favor do grito da mídia, mais das vezes dotada de parcialidade e insensatez.

Relembrando a fala de Ulisses Guimarães ainda na criação da Constituinte de 1987, um povo só se autodetermina politicamente pela democracia. O caminho histórico e universal indicado pela honestidade política e trilhado pelos democratas sinceros e coerentes é a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, proposta urgente, institucional e salvadora para o país, que duela internamente entre o retrocesso institucional e a esperança de novos fundamentos principiológicos para o Estado.

Precisamos urgentemente reinstalar uma Constituinte e fazer uma campanha pela reconstitucionalização do país. É preciso proclamar a soberania da Constituição e reafirmar o povo como sua fonte legítima.

Uma pena que meu amigo Monclaire tenha falecido. Ele se debruçaria sobre os elementos que supedaneariam a elaboração de uma nova Constituição. Amava o Brasil mais do que muitos de nós brasileiros. Morreu vítima de um AVC, em Cuiabá, assoberbado de trabalho e de estudos em torno da nossa atual crise política.

Estafou de tantas pesquisas!

Fará uma falta danada aos seus amigos. Ele esteve em Mossoró por três anos consecutivos, a meu convite, brindando a comunidade jurídica com suas palestras. De certa feita, em visita a ele, em Paris, sentado no chão do seu apartamento entre alguns amigos, recebi dele a maior demonstração de amor pelo Brasil. Compenetrado, crente nas nossas instituições, defenestrou De Gaulle, e disse a mim, com seu sotaque característico:

Marcos, o Brasil é um país sério e de futuro, apenas alguns políticos não o merecem!

Ave, Monclaire! Descanse em paz!

Marcos Araújo é mestre em Direito Constitucional, advogado e professor da Uern.

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. F diz:

    A SOFREGUIDÃO DO CONSTITUCIONALISMO CASUÍSTICO

    Não obstante minha abissal ignorância política e, sobretudo jusfilosófica, ouso me contrapor ao crivo da análise e aos argumentos do Douto Professor e Mestre Marcos Araújo, quando este, deixa perfeitamente claro, tanto nas linhas quanto nas entrelinhas, só enxergar atrasos, óbices de toda ordem e obstáculos a uma nova ordem jurídica, política, constitucional, civilizatória e econômica por todos sonhada.

    De há muito, setores de perfil político imobilista e obscurantista, com um histórico viés conservador, pra não dizer reacionário, reclamam e disseminam argumentos desejosos de uma nova ordem constitucional aos quatro cantos do universo tupiniquim e plagas alhures. Assim o fazem, se servindo, se acumpliciando e quedando-se, inclusive aos “famosos, simpáticos e bem intencionados” brasilianistas, francófílos, germanófilos, americanófilos, anglofónos etc., todos eles, não raro de matiz política e jusfilosófica claramente conservadora e, muitas vezes a serviços de interesses alienígenas, entreguistas e inconfessáveis.

    O fato revestido de pretensa troca de idéias no campo da filosofia jurídica e do direito comparado, no mais das vezes, apenas e tão somente, delimita, demarca e caracteriza nossa irrefreável e doentia compulsão pela subserviência aos ditames de ordem cultural e jurídica às “verdades” das nações e povos que nos colonizaram, as quais infelizmente, ainda detém um descomunal e deletério poder de influência sobre a nossa condição econômica, política e cultural.

    Nesse norte, calhar assinalar e demarcar que não observamos tanto entusiasmos e tantos elogios dos muitos ditos professores das nossas universidades, com relação a inúmeros, especialistas, capazes, nacionalistas e independentes jusfilósofos e constitucionalistas brasileiros, os quais devotaram uma vida inteira de estudos e pesquisas, e que aqui, infelizmente pouco tempo, receptividade e espaço são destinados a debates, entrevistas, palestras e exposições em nossos meios oligopolizados e manipuladores meios de comunicação de massa, os quais, não podemos esquecer, derivam de viciadas, manjadas e patrimonialistas concessões do aparelho estatal.

    O saudoso Nelson Rodrigues a isso desdenhava e cognominava de Complexo de Vira-latas. Para o genial pernambucano e mestre da dramaturgia, o fato se revestia de tamanha profundidade e subserviência cultural, que o brasileiro ainda hoje tem pudor e muitas vezes indisfarçável vergonha de acreditar em si mesmo, seus valores nacionais e bens culturais. O que demonstra inquestionavelmente nossa claudicante e muitas vezes manifesta tendência em valorizar, apenas e tão somente o que vem de fora, esquecendo de forma autômata e tautológica da nossa rica cultura, costumes e riquezas de toda ordem.

    Quem leu, e, deveras interpretou seus estudos e sua visão sociológica e antropológica em O POVO BRASILEIRO e muitas outras obras, bem sabe o legado de consciência cívica e de brasilidade que nos legou a história política e a inestimável obra do saudoso mestre Darcy Ribeiro, assim com, bem sabem, efetivamente do que estou falando.

    Mais diretamente falando sobre aspectos argüidos pelo Douto professor ora articulista, entendo que, inobstante a nossa construção política, social, econômica e, por conseguinte jusfilosófica e constitucional ainda engatinhe, de forma nenhuma compartilho da idéia de que a Constituição de 1988, a chamada constituição cidadã, foi rasgada e jogada na lata de lixo da história do constitucionalismo e das constituições duradoras e sem retoques.

    A esse respeito se faz oportuna reflexão de que o esforço de reconstrução, melhor dito, de construção da democracia no Brasil ganhou ímpeto após o fim da ditadura militar, em 1985. Uma das marcas desse esforço é a voga que assumiu a palavra cidadania. Políticos, jornalistas, intelectuais, líderes sindicais, dirigentes de associações, simples cidadãos, todos a adotaram. A cidadania, literalmente, caiu na boca do povo. Mais ainda, ela substituiu o próprio povo na retórica política. Não se diz mais “o povo quer isto ou aquilo”, diz-se “a cidadania quer”. Cidadania virou gente. No auge do entusiasmo cívico, chamamos a Constituição de 1988 de Constituição Cidadã.

    Claro, que havia um pouco de ingenuidade e ufanismo no entusiasmo, dado que há pouco, havíamos atravessados duas décadas de negação total ao exercício da cidadania e seus pressupostos democráticos. Por conseguinte, havia a crença quase que absoluta, de que a democratização das instituições traria rapidamente a felicidade nacional. Pensava-se que o fato de termos reconquistado o direito de eleger nossos prefeitos, governadores e presidente da República seria garantia de liberdade, de participação, de segurança, de desenvolvimento, de emprego, de justiça social. De liberdade, ele foi. A manifestação do pensamento é livre, a ação política e sindical é livre. De participação também. O direito do voto nunca foi tão difundido. Mas as coisas não caminharam tão bem em outras áreas. Pelo contrário. Já 27 anos passados desde o fim da ditadura, problemas centrais de nossa sociedade, como a violência urbana, o desemprego, o analfabetismo, a má qualidade da educação, a oferta inadequada dos serviços de saúde e saneamento, e as grandes desigualdades sociais e econômicas ou continuam sem solução, ou tiveram solução pontuais e se agravam, ou, quando melhoram, é em ritmo muito lento. Em conseqüência, os próprios mecanismos e agentes do sistema democrático, como as eleições, os partidos, o Congresso, os políticos, se desgastam e perdem a confiança e legitimidade aos olhos dos cidadãos.

    Não obstante os aludidos aspectos acima reverberados, a não ser a partir de certos grupos ao mesmo tempo acumpliciados e manipulados pelo conhecido monopólio de comunicação social, aqui chamado de impressa. Efetivamente, desconhecemos portentosos movimentos, mais ainda poderosos indícios de que a descrença dos cidadãos tenha gerado saudosismo em relação ao governo militar, do qual a nova geração nem mesmo se recorda. Nem há indicação de perigo imediato para o sistema democrático.

    No entanto, calha asseverar, que, a falta de perspectiva de melhoras importantes a curto prazo, inclusive por motivos que têm a ver com a crescente dependência do país em relação à ordem econômica internacional, é fator inquietante, não apenas pelo sofrimento humano que representa de imediato como, a médio prazo, pela possível tentação que pode gerar de soluções que signifiquem retrocesso em conquistas já feitas. É importante, então, refletir sobre o problema da cidadania, sobre seu significado, sua evolução histórica e suas perspectivas. Será exercício adequado para o momento da passagem dos mais de 500 anos da conquista dessas terras pelos portugueses.

    Falando mais detidamente sobre aspectos alardeados pleo articulista e relacionados a incursão do Supremo Tribunal Federal quanto a regulamentação, derrogação e revogação sobre algumas matérias, importantes matérias originárias da constituição de 1988, de forma nenhuma entendo como enorme retrocesso e, menos ainda a preocupar e comprometer o conjunto e o arcabouço constitucional com seus indiscutíveis avanços sociais, políticos, econômicos culturais/institucionais e constitucionais.

    Claro óbvio e ululante que as reformas judicializadas reformas constitucionais, muitas vezes derivam da nossa conhecida omissão, conservadorismos e manifesto viés imobilista representado pelo nosso corpo político, eleito, no mais das vezes, a partir, e, fundamentalmente, como resultado da pecúnia e da promoção dos grandes grupos e corporações econômicas e políticas em seus conhecidos lobbys, através da tragédia anunciada, chamada financiamento privado de campanhas políticas, indiscutivelmente, principal vetor e força motriz de todo o processo de corrupção a corromper o processo político, institucional e constitucional, que, atualmente perpassa e permeia vigorosas e muitas vezes, apaixonadas, vazias e não fundamentadas discussões de ordem política e cultural em nosso país.

    Ante esse contexto, não exagerado afirmar que, na verdade, àqueles que se vêem deslegitimados e não representados na atual ordem constitucional, e, por conseguinte reivindicam e pugnam, de imediato por um constituinte exclusiva. À meu ver, de fato, não só representam parcela míniima da sociedade, como também representam os mesmos interesses patrimoniais e políticos de sempre, claramente incomodados com os reais avanços democráticos, sociais, políticos e econômicos, contidos na nossa CARTA CIDADÃ, os quais muito deles, ainda dependem de regulamentação através do Congresso Nacional e (ou) da intervenção do Supremo Tribunal Federal, por manifesta omissão dos nossos conhecidos legisladores privatistas e entreguistas de plantão, os quais, por exemplo,”esquecem” de maneira desabrida, escrachada e criminosa, que, os senhores deputados e senadores que de modo geral, não só, não movem uma palha em direção à regulamentação, com ignoram olimpicamente a práxis da desinformação, manipulação e omissão sistematicamente disseminada pelos meios de comunicação social aqui denominado impressa.

    Os efeitos da não regulamentação constitucional são tão evidentes e deletérios ao poder da informação real e da realidade factual, diariamente negado ao nosso sofrido e ignorante povo, que, entendo, oportuno transcrever respectivos artigos da Nossa Constituição Cidadã, vejamo-los:

    • O artigo 220, por exemplo, define que não pode haver monopólio ou oligopólio na comunicação social eletrônica. Hoje, no entanto, uma única emissora controla cerca de 70% do mercado de TV aberta.
    • O artigo 221 define que a produção regional e independente devem ser estimuladas. No entanto, 98% de toda produção de TV no país é feita no eixo Rio-São Paulo pelas próprias emissoras de radiodifusão, e não por produtoras independentes.
    • Já o artigo 223 define que o sistema de comunicação no país deve respeitar a complementaridade entre os setores de comunicação pública, privada e estatal. No entanto, a imensa maioria do espectro de radiodifusão é ocupada por canais privados com fins lucrativos. Ao mesmo tempo, as 5.000 rádios comunitárias autorizadas no país são proibidas de operar com potência superior a 25 watts, enquanto uma única rádio comercial privada chega a operar em potências superiores a 400.000 watts. Uma conta simples revela o evidente desequilíbrio entre os setores.
    • Por fim, o artigo 54 determina que deputados e senadores não podem ser donos de concessionárias de serviço público. No entanto, a família Sarney, os senadores Fernando Collor, Agripino Maia, Tasso Jereisaty, Famílias Alves e Maia e Edson Lobão Filho, entre tantos outros parlamentares do Senado e Câmara dos deputados, controlam inúmeros canais em seus estados. Sem uma lei que regulamente tal artigo, ele – como os demais da Constituição – torna-se letra morta e o poder político segue promiscuamente, tão somente vinculadas aos interesses de meia dúzia de famílias vinculados e ligadas diretamente ao poder midiático/empresarial e político conservador do nosso país.

    Por fim quero reafirmar ao articulista, que, infelizmente, sobretudo face aos motivos e entraves de ordem educacional e informacional acima aludido, ainda engatinhamos do ponto de vista político e institucional como nação e povo, posto que, além da origem e dependência histórica das nações que nos colonizaram, temos pouco mais que 500 (Quinhentos) anos de formação histórica política, econômica e social.

    Nesse talante, analisemos o contexto histórico de nações com DINAMARCA, HOLANDA, NORUEGA, SUÉCIA, ISLÂNDIA SUÍÇA e outras tantas, para que efetivamente, possamos aquilatar e cotejar comparativamente, que as grandes nações democráticas, assim consideradas, não pela sua riqueza material e poderio bélico, mas, tão somente pelo indiscutível aspecto civilizatório, normalidade democrática e institucional, sobretudo bem estar social e político dos seus povos e cidadãos, que, grande parte dessas nações, possuem em média de 3.000 (Três) a 5.000 (Cinco) mil de anos história.

    Nessa atual quadra de fecunda e ao mesmo tempo, perigosa ebulição política que vivenciamos, não podemos e não devemos esquecer o quão fundamental, é, a continuidade e a estabilidade das nossas instituições democráticas e do nosso Estado Democrático de Direito atualmente tão perigosamente combatido e assombrada pelos golpistas de sempre. Sob pena, de mais uma vez, quando de suposto combate a corrupção inflação, violência urbana e demais problemas de ordem histórica, cultural e estrutural, incorrermos em mais um erro histórico, somando-se à mais um dos que cometemos, quando sob o cínico, oportunista, hipócrita e mentiroso discurso de combate à corrupção, nos desvencilhamos dos poucos escrúpulos políticos, morais, nacionalistas e patrióticos que possuímos, literalmente jogando a nossa pátria em mais um perigoso retrocesso político de período de trevas.

    Um baraço

    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
    OAB/RN. 7318

  2. FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO diz:

    A SOFREGUIDÃO DO CONSTITUCIONALISMO CASUÍSTICO

    Não obstante minha abissal ignorância política e, sobretudo jusfilosófica, ouso me contrapor ao crivo da análise e aos argumentos do Douto Professor e Mestre Marcos Araújo, quando este, deixa perfeitamente claro, tanto nas linhas quanto nas entrelinhas, só enxergar atrasos, óbices de toda ordem e obstáculos a uma nova ordem jurídica, política, constitucional, civilizatória e econômica por todos sonhada.

    De há muito, setores de perfil político imobilista e obscurantista, com um histórico viés conservador, pra não dizer reacionário, reclamam e disseminam argumentos desejosos de uma nova ordem constitucional aos quatro cantos do universo tupiniquim e plagas alhures. Assim o fazem, se servindo, se acumpliciando e quedando-se, inclusive aos “famosos, simpáticos e bem intencionados” brasilianistas, francófílos, germanófilos, americanófilos, anglofónos etc., todos eles, não raro de matiz política e jusfilosófica claramente conservadora e, muitas vezes a serviços de interesses alienígenas, entreguistas e inconfessáveis.

    O fato revestido de pretensa troca de idéias no campo da filosofia jurídica e do direito comparado, no mais das vezes, apenas e tão somente, delimita, demarca e caracteriza nossa irrefreável e doentia compulsão pela subserviência aos ditames de ordem cultural e jurídica às “verdades” das nações e povos que nos colonizaram, as quais infelizmente, ainda detém um descomunal e deletério poder de influência sobre a nossa condição econômica, política e cultural.

    Nesse norte, calhar assinalar e demarcar que não observamos tanto entusiasmos e tantos elogios dos muitos ditos professores das nossas universidades, com relação a inúmeros, especialistas, capazes, nacionalistas e independentes jusfilósofos e constitucionalistas brasileiros, os quais devotaram uma vida inteira de estudos e pesquisas, e que aqui, infelizmente pouco tempo, receptividade e espaço são destinados a debates, entrevistas, palestras e exposições em nossos meios oligopolizados e manipuladores meios de comunicação de massa, os quais, não podemos esquecer, derivam de viciadas, manjadas e patrimonialistas concessões do aparelho estatal.

    O saudoso Nelson Rodrigues a isso desdenhava e cognominava de Complexo de Vira-latas. Para o genial pernambucano e mestre da dramaturgia, o fato se revestia de tamanha profundidade e subserviência cultural, que o brasileiro ainda hoje tem pudor e muitas vezes indisfarçável vergonha de acreditar em si mesmo, seus valores nacionais e bens culturais. O que demonstra inquestionavelmente nossa claudicante e muitas vezes manifesta tendência em valorizar, apenas e tão somente o que vem de fora, esquecendo de forma autômata e tautológica da nossa rica cultura, costumes e riquezas de toda ordem.

    Quem leu, e, deveras interpretou seus estudos e sua visão sociológica e antropológica em O POVO BRASILEIRO e muitas outras obras, bem sabe o legado de consciência cívica e de brasilidade que nos legou a história política e a inestimável obra do saudoso mestre Darcy Ribeiro, assim com, bem sabem, efetivamente do que estou falando.

    Mais diretamente falando sobre aspectos argüidos pelo Douto professor ora articulista, entendo que, inobstante a nossa construção política, social, econômica e, por conseguinte jusfilosófica e constitucional ainda engatinhe, de forma nenhuma compartilho da idéia de que a Constituição de 1988, a chamada constituição cidadã, foi rasgada e jogada na lata de lixo da história do constitucionalismo e das constituições duradoras e sem retoques.

    A esse respeito se faz oportuna reflexão de que o esforço de reconstrução, melhor dito, de construção da democracia no Brasil ganhou ímpeto após o fim da ditadura militar, em 1985. Uma das marcas desse esforço é a voga que assumiu a palavra cidadania. Políticos, jornalistas, intelectuais, líderes sindicais, dirigentes de associações, simples cidadãos, todos a adotaram. A cidadania, literalmente, caiu na boca do povo. Mais ainda, ela substituiu o próprio povo na retórica política. Não se diz mais “o povo quer isto ou aquilo”, diz-se “a cidadania quer”. Cidadania virou gente. No auge do entusiasmo cívico, chamamos a Constituição de 1988 de Constituição Cidadã.

    Claro, que havia um pouco de ingenuidade e ufanismo no entusiasmo, dado que há pouco, havíamos atravessados duas décadas de negação total ao exercício da cidadania e seus pressupostos democráticos. Por conseguinte, havia a crença quase que absoluta, de que a democratização das instituições traria rapidamente a felicidade nacional. Pensava-se que o fato de termos reconquistado o direito de eleger nossos prefeitos, governadores e presidente da República seria garantia de liberdade, de participação, de segurança, de desenvolvimento, de emprego, de justiça social. De liberdade, ele foi. A manifestação do pensamento é livre, a ação política e sindical é livre. De participação também. O direito do voto nunca foi tão difundido. Mas as coisas não caminharam tão bem em outras áreas. Pelo contrário. Já 27 anos passados desde o fim da ditadura, problemas centrais de nossa sociedade, como a violência urbana, o desemprego, o analfabetismo, a má qualidade da educação, a oferta inadequada dos serviços de saúde e saneamento, e as grandes desigualdades sociais e econômicas ou continuam sem solução, ou tiveram solução pontuais e se agravam, ou, quando melhoram, é em ritmo muito lento. Em conseqüência, os próprios mecanismos e agentes do sistema democrático, como as eleições, os partidos, o Congresso, os políticos, se desgastam e perdem a confiança e legitimidade aos olhos dos cidadãos.

    Não obstante os aludidos aspectos acima reverberados, a não ser a partir de certos grupos ao mesmo tempo acumpliciados e manipulados pelo conhecido monopólio de comunicação social, aqui chamado de impressa. Efetivamente, desconhecemos portentosos movimentos, mais ainda poderosos indícios de que a descrença dos cidadãos tenha gerado saudosismo em relação ao governo militar, do qual a nova geração nem mesmo se recorda. Nem há indicação de perigo imediato para o sistema democrático.

    No entanto, calha asseverar, que, a falta de perspectiva de melhoras importantes a curto prazo, inclusive por motivos que têm a ver com a crescente dependência do país em relação à ordem econômica internacional, é fator inquietante, não apenas pelo sofrimento humano que representa de imediato como, a médio prazo, pela possível tentação que pode gerar de soluções que signifiquem retrocesso em conquistas já feitas. É importante, então, refletir sobre o problema da cidadania, sobre seu significado, sua evolução histórica e suas perspectivas. Será exercício adequado para o momento da passagem dos mais de 500 anos da conquista dessas terras pelos portugueses.

    Falando mais detidamente sobre aspectos alardeados pleo articulista e relacionados a incursão do Supremo Tribunal Federal quanto a regulamentação, derrogação e revogação sobre algumas matérias, importantes matérias originárias da constituição de 1988, de forma nenhuma entendo como enorme retrocesso e, menos ainda a preocupar e comprometer o conjunto e o arcabouço constitucional com seus indiscutíveis avanços sociais, políticos, econômicos culturais/institucionais e constitucionais.

    Claro óbvio e ululante que as reformas judicializadas reformas constitucionais, muitas vezes derivam da nossa conhecida omissão, conservadorismos e manifesto viés imobilista representado pelo nosso corpo político, eleito, no mais das vezes, a partir, e, fundamentalmente, como resultado da pecúnia e da promoção dos grandes grupos e corporações econômicas e políticas em seus conhecidos lobbys, através da tragédia anunciada, chamada financiamento privado de campanhas políticas, indiscutivelmente, principal vetor e força motriz de todo o processo de corrupção a corromper o processo político, institucional e constitucional, que, atualmente perpassa e permeia vigorosas e muitas vezes, apaixonadas, vazias e não fundamentadas discussões de ordem política e cultural em nosso país.

    Ante esse contexto, não exagerado afirmar que, na verdade, àqueles que se vêem deslegitimados e não representados na atual ordem constitucional, e, por conseguinte reivindicam e pugnam, de imediato por um constituinte exclusiva. À meu ver, de fato, não só representam parcela míniima da sociedade, como também representam os mesmos interesses patrimoniais e políticos de sempre, claramente incomodados com os reais avanços democráticos, sociais, políticos e econômicos, contidos na nossa CARTA CIDADÃ, os quais muito deles, ainda dependem de regulamentação através do Congresso Nacional e (ou) da intervenção do Supremo Tribunal Federal, por manifesta omissão dos nossos conhecidos legisladores privatistas e entreguistas de plantão, os quais, por exemplo,”esquecem” de maneira desabrida, escrachada e criminosa, que, os senhores deputados e senadores que de modo geral, não só, não movem uma palha em direção à regulamentação, com ignoram olimpicamente a práxis da desinformação, manipulação e omissão sistematicamente disseminada pelos meios de comunicação social aqui denominado impressa.

    Os efeitos da não regulamentação constitucional são tão evidentes e deletérios ao poder da informação real e da realidade factual, diariamente negado ao nosso sofrido e ignorante povo, que, entendo, oportuno transcrever respectivos artigos da Nossa Constituição Cidadã, vejamo-los:

    • O artigo 220, por exemplo, define que não pode haver monopólio ou oligopólio na comunicação social eletrônica. Hoje, no entanto, uma única emissora controla cerca de 70% do mercado de TV aberta.
    • O artigo 221 define que a produção regional e independente devem ser estimuladas. No entanto, 98% de toda produção de TV no país é feita no eixo Rio-São Paulo pelas próprias emissoras de radiodifusão, e não por produtoras independentes.
    • Já o artigo 223 define que o sistema de comunicação no país deve respeitar a complementaridade entre os setores de comunicação pública, privada e estatal. No entanto, a imensa maioria do espectro de radiodifusão é ocupada por canais privados com fins lucrativos. Ao mesmo tempo, as 5.000 rádios comunitárias autorizadas no país são proibidas de operar com potência superior a 25 watts, enquanto uma única rádio comercial privada chega a operar em potências superiores a 400.000 watts. Uma conta simples revela o evidente desequilíbrio entre os setores.
    • Por fim, o artigo 54 determina que deputados e senadores não podem ser donos de concessionárias de serviço público. No entanto, a família Sarney, os senadores Fernando Collor, Agripino Maia, Tasso Jereisaty, Famílias Alves e Maia e Edson Lobão Filho, entre tantos outros parlamentares do Senado e Câmara dos deputados, controlam inúmeros canais em seus estados. Sem uma lei que regulamente tal artigo, ele – como os demais da Constituição – torna-se letra morta e o poder político segue promiscuamente, tão somente vinculadas aos interesses de meia dúzia de famílias vinculados e ligadas diretamente ao poder midiático/empresarial e político conservador do nosso país.

    Por fim quero reafirmar ao articulista, que, infelizmente, sobretudo face aos motivos e entraves de ordem educacional e informacional acima aludido, ainda engatinhamos do ponto de vista político e institucional como nação e povo, posto que, além da origem e dependência histórica das nações que nos colonizaram, temos pouco mais que 500 (Quinhentos) anos de formação histórica política, econômica e social.

    Nesse talante, analisemos o contexto histórico de nações com DINAMARCA, HOLANDA, NORUEGA, SUÉCIA, ISLÂNDIA SUÍÇA e outras tantas, para que efetivamente, possamos aquilatar e cotejar comparativamente, que as grandes nações democráticas, assim consideradas, não pela sua riqueza material e poderio bélico, mas, tão somente pelo indiscutível aspecto civilizatório, normalidade democrática e institucional, sobretudo bem estar social e político dos seus povos e cidadãos, que, grande parte dessas nações, possuem em média de 3.000 (Três) a 5.000 (Cinco) mil de anos história.

    Nessa atual quadra de fecunda e ao mesmo tempo, perigosa ebulição política que vivenciamos, não podemos e não devemos esquecer o quão fundamental, é, a continuidade e a estabilidade das nossas instituições democráticas e do nosso Estado Democrático de Direito atualmente tão perigosamente combatido e assombrada pelos golpistas de sempre. Sob pena, de mais uma vez, quando de suposto combate a corrupção inflação, violência urbana e demais problemas de ordem histórica, cultural e estrutural, incorrermos em mais um erro histórico, somando-se à mais um dos que cometemos, quando sob o cínico, oportunista, hipócrita e mentiroso discurso de combate à corrupção, nos desvencilhamos dos poucos escrúpulos políticos, morais, nacionalistas e patrióticos que possuímos, literalmente jogando a nossa pátria em mais um perigoso retrocesso político de período de trevas.

    Um baraço

    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
    OAB/RN. 7318

  3. Samir Albuquerque diz:

    Não sei se sou ou não a favor de uma nova Constituição para o Brasil. Talvez nos moldes da Americana ou da Inglesa, com uma inversão dos fatores quanto aos Poderes, quanto o poder de dar a ultima palavra em matéria do que quer ou não dizer a Lei Maior, ala o modelo Inglês, um judiciário que funcionasse nos moldes do judiciário americano, com a força de seus precedentes ou ainda, uma corte constitucional semelhante a alemã. Enfim, tenho varias criticas, varias ideias, mas me preocupa é quem levaria a cabo essa Tarefa Hercúlea. Com nossos políticos, melhor ficarmos com o que temos para que depois não venhamos a chorar o que perdemos. Independente disso, ótimo texto.

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