• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
segunda-feira - 02/02/2009 - 22:01h

A arte de ter razão no teatro do absurdo potiguar

“Restauremos a moralidade ou nos locupletemos todos.”

Coube ao cronista Sérgio Porto, sob o pseudônimo que o tornou famoso, Stanislaw Ponte Preta, produzir essa assertiva nos anos 60. Atualíssima, que se diga.

A jocosidade mordaz de Sérgio parece ter sido feita para o RN contemporâneo, de Natal e Mossoró.

A vida política transformou ética e moral em exceções, quando deveriam ser regra e dever. Mas não somos um país à parte.

Há teóricos da sociologia, antropologia e história que creditam essa zorra total à nossa própria origem ultramarina. Estaria no DNA ibérico, precisamente lusitano. A tese isoladamente é pobre e preconceituosa.

Mergulhando na pesquisa de Raymundo Faoro em seu definitivo “Os donos do poder”, flagramos o transplante de hábitos e a cultura político-legal de um lado para outro do Atlântico. Outro gigante da intelectualidade nacional, Oliveira Vianna, antecedeu-o nessa tarefa de procurar explicar nossa origem irrequieta, anárquica e delinqüente com “Instituições políticas brasileiras”, na primeira metade do século XX.

São leituras obrigatórias. Ajudam no entendimento de um Brasil (RN incluído), que teima em exaltar o “jeitinho” e a esperteza como regras gerais nas relações políticas e sociais.

Partidos seriam meros balcões de negócios, ou negociatas?

Para Antônio Lavareda, pernambucano que se transformou num ícone do marketing eleitoral no país, temos tradição partidária. Faltam-nos ambiente democrático perene e um sistema legal sadio. Ele sustenta sua visão no indispensável “Democracia nas urnas”.

UDN e PSD, por exemplo, foram legendas tradicionalíssimas, que a intervenção militar na vida nacional, a partir de 1964, converteu no bipartidarismo consentido nas versões MDB e Arena. Se fossem vivas, UDN e PSD teriam mais de 60 anos.

Claro que é pouco, em se comparando com o Partido Republicano e o Partido Democrata nos Estados Unidos, que possuem longevidade acima dos 160 anos. Bom sublinhar que nessa nação, há democracia longeva. A legislação eleitoral-partidária não muda há cada dois ou quatro anos.

CACHÊ E MICHÊ  

Já o historiador José Honório Rodrigues morreu longe de ver o Brasil pós-64. Porém em seu tempo, cunhou a idéia de que o pindorama brasileiro em toda sua oficialidade, só possuíra um único partido: o “partido do patriciado”. Fazia alusão à elite romana que dominava o poder na antiguidade.

Ninguém quer ou se sente bem na oposição. Os argumentos para o pula-pula são os mais cínicos e variados possíveis.

Tomemos à exemplificação o caso recente da adesão do PMDB ao governo da prefeita natalense Micarla de Sousa (PV). Antes de completar um mês de gestão, o adversário de campanha que defendia a deputada federal Fátima Bezerra (PT) como o melhor para Natal, ajoelha-se à vencedora.

Fátima tem motivos para imaginar que foi cristianizada em campanha, usada para queimação pura e simples.

A postura peemedebista faz-me lembrar o que Arthur Schopenhauer denominava de dialética erística, explicada em “A arte de ter razão”, obra pós-morte desse filósofo germânico. Segundo seu raciocínio, não era necessário ser dono da verdade. A ordem é vencer qualquer controvérsia.

Os políticos potiguares são catedráticos no tema. Produzem seguidos enredos que lembram a matéria-prima do “teatro do absurdo”. A gente não sabe se é para rir ou chorar.

Mossoró é um primor na consolidação do gênero. Assistimos um amontoado de gente de todos os matizes tentando ser governo a qualquer preço ou michê. Não tem um pingo de realismo a lenda de cidade libertária, que tentam adesivar ao topônimo da terra de Santa Luzia. Balela.

Estou concluindo leitura do livro-reportagem “Deu no New York Times” do jornalista Larry Rohter, aquele que o presidente Lula tentou expulsar do país há alguns anos. Rohter cita o porquê de corrupção ser uma moléstia mundial, humana e atemporal, mas ter efeitos distintos em cada sociedade.

Reproduz episódio de um deputado democrata Mike Espy. Político promissor e secretário Agricultura do presidente Bill Clinton, Espy foi flagrado recebendo ingressos para decisão do Super Bowl (campeonato de futebol americano), além de pegar carona num jato da maior produtora de aves do país. Fim da carreira.

Quanto à empresa, a punição foi pagar multa milionária, além de ressarcir o governo com o custo das investigações. Entre nós o primeiro seria incensado como “vítima”, além de ganhar outros mandatos, enquanto a corruptora manteria altos negócios com o ente público.

Por essa e por outras soa tão estranho hoje o reconhecimento da derrota ao governo do então deputado federal Djalma Marinho, em 1960. Depois de perceber que perdera o pleito ao governo estadual para Aluízio Alves, ele ditou nota a Rádio Nordeste em Natal, em que resumia elegantemente sua postura:

– Não pude ganhar, mas sei perder!

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Categoria(s): Blog

Comentários

  1. Tete Bezerra diz:

    Excelente texto Carlos.Vergonhoso e lamentável essa adesão descabida do PMDB.Vamos pra frente,o povo saberá julgar….

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