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domingo - 09/05/2021 - 08:12h

Livro de linhagens

Por David Leite

Foi dito alhures que há distinção entre poetas que trabalham para a permanência e poetas que trabalham para o tempo. Paulo de Tarso Correia de Melo elegeu o “tempo” como uma das vertentes de sua poética, abrangendo, assim, significados lírico, metafórico e sentido cronológico.

Alencart e Tarso, Portugal e Brasil, afinidades e linhagem intelectual e poética (Foto: cedida)

Alencart e Tarso, Portugal e Brasil, afinidades numa linhagem intelectual e poética (Foto: cedida)

Livro de Linhagens (Ed. Sarau das Letras, 2011) revela um traço presente em todos os volumes publicados pelo poeta: intencional unidade temática. Observa-se, a partir daí, que cada trabalho desse literato potiguar delineia um corte temporal. Tempo que inclui, necessariamente, discussão do momento cultural escrutinado.

O próprio autor diz no texto que epigrafa o tomo: “Estas linhagens me ocuparam desde o meu primeiro livro de poemas”. Sânzio de Azevedo, escritor e crítico literário, em comentário na contracapa, declara: “Percorrer os poemas deste Livro de linhagens, de Paulo de Tarso Correia de Melo, é navegar, no espaço e no tempo, rumo às terras de Portugal e da Grécia”.

Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, com pós-graduação na Universidade de Michigan (EUA), Paulo de Tarso esboça tentativa de resumo da marca helênica no mundo neolatino, amalgamando recorte temporal e metáfora.

No segundo capítulo do livro, intitulado “Caderno de viagem grego”, ocorre um hipotético encontro entre Píndaro e Apolo:

“O vento quase estival

em face hoje enrugada

veio da Grécia, é igual

ao de uma idade passada.

 

Passou em pele onde restava

o ouro e o sol de outro verão

e uma ou outra marca que ficava

das aventuras da estação…”.

As duas estrofes acima transcritas iniciam o “Velho marinheiro do porto de Bríndisi”. Na sequência, no mesmo azimute, emergem os poemas “Palavras rituais: Cassandra” e “Passante em Glyfada”.       Paulo de Tarso explora temas do além-mar e, rumando para o epílogo do livro, encontraremos poemas do mesmo quilate, a exigirem leitura mais acurada: “Reflexão do aprendiz de Fídias”, “Diário de bordo dos argonautas”, “Alexandre” e “Poiesis”.

Em 2011, resultado de parcerias editoriais, a obra de P.T.C.M. extrapola limites da província, ocorrendo lançamentos em Portugal, que, segundo o conimbricense Eduardo Aroso, “persiste ancião e menino”, como também, na Espanha, pátria de Don Miguel de Unamuno.

Momentos que marcam Paulo de Tarso: “Não tenho muitas ilusões. Consola-me os ecos positivos dos Encontros Ibero-americanos de Poesia em Salamanca, aos quais tenho comparecido recentemente e que já me renderam figurar em uma dúzia de antologias internacionais, bem como as traduções de dois volumes por Alfredo Pérez Alencart”.

Nestes tempos de pandemia, um tanto reticente, Paulo de Tarso deixa escapar que segue produzindo: “Um diário poético a ser chamado Caderno de Quarentena e um volume que não sei se levarei a termo”.

Paulo de Tarso Correia de Melo, que frequentou o concorrido terraço do casarão de Câmara Cascudo (1898–1986), segue ancorado na “aldeia de Poti”, contemplando o azul do mesmíssimo Atlântico, sem procelas.

David Leite é escritor, professor, advogado e doutor pela Universidade Salamanca (Espanha)

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Categoria(s): Crônica

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