Por David Leite
— Qual a expectativa que você cria quando sai de casa para ir a um restaurante? Essa expectativa muda quando você se dirige a uma instituição pública?
Do ponto de vista acadêmico, estudo e discuto características de atendimento ao público, estabelecendo um paralelo sobre o que, geralmente, acontece nas áreas pública e privada. E sempre começo com uma pergunta-provocação. Instigo o debate: o que se passa em nossas cabeças quando estamos trocando de roupa e colocando perfume para irmos a um desses destinos?
Via de regra, as respostas são bastante dispares: “Ah, professor, quando penso em ir a uma repartição pública já sei que serei mal atendido e perderei o dia pela demora”. Porém, sinto que mudanças, de forma lenta e gradual, estão em andamento.
Observamos algumas gestões públicas implantando ouvidorias ou outros serviços de atendimento ao público. Como, também, o velho e tão arraigado patrimonialismo, hoje de forma um tanto disfarçada devido ao avanço das tecnologias, vai dando lugar a um novo estilo governamental, em que alguns dos princípios constitucionais que regem a Administração Pública, como o da Impessoalidade e o da Publicidade, aqui e acolá, mostram sinais de efetividade.
Porém, voltemos ao título do texto. Creio que todos nós conhecemos alguns exemplos de atendimento que nos marcaram; de forma positiva ou negativa, diga-se de passagem. Particularmente, os tenho em profusão. Mas, comentarei dois exemplares.
Se falássemos no empresário de nome de batismo Francisco Fernandes de Souza, talvez poucos iriam identificá-lo. Porém, na realidade mossoroense das últimas quatro décadas, arrisco declarar que todos foram atendidos ou, pelo menos, souberam de como Souzinha do Parque Elétrico recebia a sua clientela.
Atentem bem: tento dizer que Souzinha atendia a todos de forma solícita, educada; fosse esse cliente rico ou pobre, bem vestido ou mal vestido.
Existe uma filósofa espanhola chamada Adela Cortina que desenvolveu sua tese acadêmica baseada em torno da “aporofobia” (que significa: “Repúdio, aversão ou desprezo pelos pobres ou desfavorecidos; hostilidade para com pessoas em situação de pobreza ou miséria. [Do grego á-poros, ‘pobre, desamparado, sem recursos’ + -fobia.]”).
E, tal qual o racismo ou a homofobia, a aporofobia se manifesta, também, nos atendimentos ao público.
Quem foi Souzinha? Menino nascido, em 1948, na cidade de Encanto (RN), que migrou para Mossoró e trabalhou num estabelecimento de um tio. Pouco depois, montou a loja Parque Elétrico; e lá trabalhou até um câncer levá-lo em 2011, aos 62 anos de idade e com um vigor de ciclista que era. No entanto o seu legado é inequívoco, como “case” de empreendedorismo e, repito, de padrão exemplar de atendimento.
Em Natal, nos dias atuais, até por questões de comodidade geográfica, tornei-me freguês de uma farmácia na qual, quase sempre, sou atendido por Almair Gonçalo de Paiva. Fiz-lhe perguntas acerca de como ele havia ingressado no segmento farmacêutico. Em linhas gerais, ele é natural da cidade de Martins (RN), migrou para Natal ainda criança, acompanhando os pais. Seu genitor estabeleceu-se no ramo, e ele e outro irmão deram seguimento, cada um com sua farmácia em bairros diferentes.
Sem mais delongas, posso sintetizar que Almair atende no “padrão” Souzinha.
Existem outros ângulos da questão? Claro que sim. Atentem para os balconistas e garçons, por exemplo, a cumprirem jornadas extremas e que são “vigiados” para manterem o sorriso de acolhimento da primeira à última hora. Além de outros tantos trabalhadores que lidam com o público e não podem cometer um pequeno deslize, pois vivem sob ameaça. Mas essa é outra vertente que merece análise própria e mais aprofundada.
Fiz questão de registar os exemplos de atendimento de dois proprietários. Ambos que, além de não ficarem restritos ao elegante birô de observação, assumiram a chamada “linha de frente” com seus colaboradores, sem muitas vezes o cliente distinguir entre o patrão e o empregado.
Como apregoa a velha máxima, os dois absorveram que o discurso mobiliza, mas é o exemplo que arrasta.
*David de Medeiros Leite – Professor da UERN e doutor pela Universidade de Salamanca (Espanha)
Bela homenagem. Atendimento é quase tudo para o sucesso de uma marca ou empresa.
David leite não está escrevendo normal. O homem está em todos os lugares da mídia. De fato, blog, notícias. O homem é bom! Valeu, David. Assim você chega nessa academia de letras do Estado fácil. E merece. Ocupar e manter. Lema em voga. É isso aí. Continue assim. Vai dar certo!
NOTA DO BLOG – Meu caro, bom dia. Você está usando vários nomes e e-mails diferentes. Escolha sua própria identidade para participar, mesmo que elogiando.
Agradecemos.
Valeu, Carlos! David merece essa vaga. Caba bom e está ocupando os espaços e é o certo. Quem não é visto não é lembrado. Vai dar certo e obrigado pelo espaço. Você é um cara inteligente e democrático.
David Leite é uma referência em nosso estado em se tratando de produção literária, bastando lembrar de seus inúmeros livros, artigos, contos etc. Reduzir, mesmo que involuntariamente, sua atuação e a intensidade desta à postulação de uma vaga na academia é não só injusto como, de certa forma, leviano. Certamente não foi esse o intuito do colega, pois se assim o fosse seria um caso de “amor” ou “ódio” patológico pelo nobre escritor, já que este é conhecido por não semear desavenças.
Quando encontra-se amor a profissão que é exercida , encontramos exemplos como esses citados. Que possamos refletir mais sobre a empatia dentro do profissionalismo. Parabéns ao autor que nos faz pensar sobre o assunto.