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domingo - 26/12/2021 - 11:10h

A Caverna de Platão

Caverna, Mito da Caverna, Parábola da Caverna, Alegoria da Caverna - Platão em A República, diálogo entre Sócrates e GlaucoPor François Silvestre

Há quem denomine de Mito, Alegoria ou Parábola. A nomenclatura é secundária. Até porque essa imagem terrível, constante da obra reflexiva do filósofo clássico, Sócrates, possui contornos que abrange essas e outras denominações.

A caverna abriga prisioneiros que nunca conheceram a liberdade. Nascidos e vividos no obscuro da desinformação. Ou na informação sem escolha, sem distinção, sem questionamento. A informação imposta, que aliena.

Acorrentados, os habitantes da Caverna só veem “sombras” na parede da furna, que eles julgam serem sombras de vivos. São apenas reflexos de estátuas que se colocam entre a parede e uma fogueira. Isso se passa imutavelmente. E essa é a visão do único e imposto conhecimento.

Na premissa de que um dos acorrentados consiga sair da caverna, ele se deslumbra com o mundo real. E generosamente lembra-se dos companheiros aprisionados. Mas a solidariedade não terá reconhecimento, com seu gesto e sua volta.

Será considerado louco ou mentiroso, pois não entra na cabeça da ignorância cristalizada qualquer lampejo de negação do mundo apresentado. O mundo dos acorrentados é aquele e não há possibilidade de imaginar um mundo diferente.

Como imaginar a luz do Sol, o verde das plantas, a brisa dos ventos, para quem só “vive” na caverna? Único mundo conhecido.

É um mito na medida em que sobrevive, mesmo sem existir, em todos os tempos. É uma alegoria na medida em que mantém a imagem, mesmo na ausência de um mito heroico individual. E é uma parábola, pois oferta, sem imposição, uma moral.

Saramago, o grande escritor português, fez um desabafo reflexivo sobre o tempo de hoje: “Nunca em toda a história da humanidade, houve um tempo tão próximo da Caverna de Platão”.

É de se entender que o Ensaio sobre a Cegueira carrega muito dessa observação. A reflexão muito mais de alerta do que de pessimismo.

O curioso é que a alegoria da Caverna de Platão insere-se numa obra denominada “A República”, numa parte dos diálogos socráticos na casa de Polemarco, filho de Céfalo. Coincidência ou premonição?

A alienação midiática, que nos oferece imagens de bonecos aparentemente vivos. A globalização que apequena, acorrentando todos no interior de uma caverna global. As mentiras oficiais a chamarem de loucos os que ousam informar que há luz fora da caverna. Que há ventos, águas, bichos e plantas.

A generosidade virou sinônimo de desconfiança. A violência banalizou-se, iludindo com sombras na parede da caverna. A esperança esmorece ante a fogueira das imagens falsas. Ninguém, fugido do ambiente mórbido, ousará voltar para informar sobre a luminosidade externa ou o ar da liberdade.

E se na alegoria da exceção ainda houver lugar para a solidariedade, o solidário retornante quedar-se-á ante o escárnio dos que preferem a mentira cômoda da caverna.

E como em todos os mitos, nesse também há uma mentira clássica. A Caverna de Platão não é de Platão. É a reprodução escrita de um diálogo de Sócrates com Glauco, na casa de Polemarco.

François Silvestre é escritor

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. Inácio Augusto de Almeida diz:

    MOSSORÓ

    • François Silvestre diz:

      Um ano novo de paz, saúde e tranquilidade procê e pros seus!

    • A de Andrade diz:

      Comparar o mito da caverna com Mossoró não agride a cidade, não. É apenas confissão de ignorância filosófica ou incompreensão do texto comentado.

      • Inácio Augusto de Almeida diz:

        .
        Comparar com o quê um povo que aceita tudo caladinho, não reclama sequer de uma licitação que consumiu 143 mil reais na compra de COENTRO e trata com respeito corruptos condenados a vários anos de cadeia?
        Comparar com o quê uma gente que, quando alertada para a presença de corruptos, corruptos que a todos mantém na miséria e no atraso, responde de cabeça baixa que se trata de poderosos?
        Comparar com o quê quem se revolta contra quem diz que existe um mundo diferente, onde há liberdade, respeito e justiça?
        Comparar com o quê um povo que acredita em promessas e quando se convence de que tudo era mentira sequer reclama?
        Comparar com o quê um povo que diariamente sofre arrastões e vê as investigações serem arquivas e não reclama?
        É preciso mostrar a este povo que além do horizonte existe um lugar de paz, amor e respeito, um lugar onde a felicidade espera de braços abertos a todos os que ainda têm coragem de dizer basta a esta mesmice que incomoda, machuca e fere aos que não perderam o amor próprio e a capacidade de indignar-se.
        Não se desperta um povo com palavras doces.
        As mudanças não acontecem da maneira como os cabelos ficam brancos. As mudanças exigem sacrifícios e mártires.
        A história está cheia de exemplos.
        Que Deus abençoe Mossoró.

  2. Carlos diz:

    Caro companheiro francois ,551 foi seu número quando o escolhi na campanha para deputado federal! Sou muito admirador da história dos descendentes de Alexandre felicio suassuna,inclusive adquiri uma gleba da fazenda manue que foi de Antônio suassuna em Patu. Sou muito fã do ex presidente João suassuna e João Dantas,inclusive quero e vou conhecer em taperoa o museu ariano suassuna,as fazendas volta,marcelina, acahuan e malhada da onça , além de Teixeira , São José do Egito! Soube recentemente que seu pai foi assassinado quando tinha 10 anos, poderia por cima fazer um relato histórico?

    • François Silvestre diz:

      Deixe passar esse período de “festas” e me lembre que terei imenso prazer, às vezes mesmo de fatos doídos, de informar o que sei sobre esses lugares e essas pessoas. Frequentei, ainda criança, a maioria dessas fazendas. Pra você, Carlos, pros seus e pra todos os frequentadores deste Blog do Carlos Santos eu desejo um tempo melhor do que o atual. Abraço grande, com minha admiração.

  3. Carlos diz:

    Gostaria se possível depois até conversar com o mestre sobre algumas dúvidas! Um abraço !!!!

  4. Naide Maria Rosado de Souza diz:

    Excelente Crônica, François. Fez-me lembrar Vinícius Montardo Rosado. Um Rosado de Santa Maria, no RS. Vinícius conseguiu sair da caverna, na minha palavra, a Boite Kiss, em chamas. Sentiu falta de amigos e retornou à caverna, para salvá-los. Perdeu a vida na luta inglória. Menino bom, motivo de muito choro dos Rosados gaúchos. Menino de fibra. Deixou lembrança de coragem, determinação, amor ao próximo. Deixou uma dor imensa em sua família, por mais nobre que tenha sido a sua partida…

  5. Marcos Araujo diz:

    François Silvestre, como grande filósofo contemporâneo, contextualiza com o presente distópico a filosofia platônica e socrática, com maestria. Parabéns pela didática do texto!

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