Nas últimas duas décadas, a sociedade evoluiu em temáticas relevantes, a exemplo de diversidade, igualdade de gênero, interracialidade, valorização da causa ambiental, proteção animal, etc. Para além desses, parcela populacional reclama dos outros avanços(?) no campo da linguagem: a implantação da neutralidade da linguagem e o politicamente correto em todas as obras culturais. Tenho minhas reservas a esses dois últimos, e justifico.
Acho que todo mundo sabe, mas, relembrando, a linguagem neutra tem como objetivo adaptar o português para o uso de expressões sem gênero (masculino ou feminino), a fim de que as pessoas não binárias ou intersexo se sintam representadas. É a substituição dos artigos feminino e masculino por um “x”, “e” ou até pela “@” em alguns casos. Assim, “amigo” ou “amiga” virariam “amigue” ou “amigx”.
As palavras “todos” ou “todas” seriam trocadas, da mesma forma, por “todes”, “todxs” ou “tod@s”. Os defensores do gênero neutro também exigem a adoção do pronome “elu” para se referir a qualquer pessoa, independente do gênero, de maneira que abranja pessoas não-binárias ou intersexo que não se identifiquem como homem ou como mulher.
Quanto ao politicamente correto, medidas jurídicas e outras movimentações sociais estão sendo feitas para impedir a venda, proibir circulação, ou até mesmo revisar termos e expressões de obras mundialmente famosas. Monteiro Lobato terminou no Supremo Tribunal Federal por causa de um professor que tentava impedir que o Ministério de Educação referenciasse as peripécias de Pedrinho, por entender que a fala era racista. O maior sucesso da inglesa Agatha Christie, “O caso dos dez negrinhos”, está tendo o título mudado no mundo inteiro.
Na França, o antigo “Dix petits nègres” (Dez Negrinhos, em tradução literal) virou “Ils étaient dix” (Eram dez). A mudança de linguagem não aconteceu apenas no título. Na nova versão do livro em francês, a palavra “nègre” aparecia 74 vezes e foi adaptada em todos os casos. Poderia até rebater este preciosismo linguístico com os dizeres do próprio Monteiro Lobato – “Um país se faz com homens e livros” -, mas recairia na pecha de uso de uma expressão machista, e sofrer das ativistas uma grave reprimenda.
Dizem que é racismo se lastimar da vida dizendo “a coisa está preta!”. É proibido reconhecer a “noite negra”, ou se referir à compra de muamba no “mercado negro”.
Se prosperar a linguagem neutra, como doravante versejaremos Florbela Espanca, na sua magistral construção: “Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida / Meus olhos andam cegos de te ver! Não és sequer razão de meu viver, Pois que tu és já toda a minha vida!”?
É na onda modista do politicamente correto que no Rio Grande do Sul há um boicote da execução do hino do Estado, por conter frases supostamente racistas nesta parte: “Mas não basta, para ser livre/ Ser forte, aguerrido e bravo/ Povo que não tem virtude/ Acaba por ser escravo”.
Linguagem é uma questão de escolha. Não me apraz a linguagem neutra. Nem corroboro com os puristas sociais do politicamente correto.
Está na órbita da liberdade de expressão, uma garantia constitucional, a forma de se comunicar. Como diz Leci Brandão na sua canção Questão de gosto: “Gosto mais do mês de março / Mas você prefere agosto. Questão de gosto. Questão de gosto (…)”
Marcos Araújo é mestre e doutor em Direito Constitucional, advogado e professor da Uern
Assino embaixo. E parabéns pelo artigo!
Querido Honório, você é um mestre na esgrima da palavra e bem superior com a linguagem.
Forte abraço!
Tá de lascar essa história de ” todos todx ” etc.
Não tenho conhecimento pra dá uma opinião, mas acho idiotice.
Dr. Marcos como semipre brilhante!
Um abraçaço
Estimado amigo Marcone, “data venia”, você quem é brilhante! Tão genial quanto o seu homônimo (Guglielmo Marconi), prêmio nobel de física e inventor do rádio.
Renovo, em nome dos meus pais, o meu particular apreço e amizade. Fui seu garçon no Daniel´s, tendo você o privilégio de adentrar a cozinha e tomar um aperitivo com minha mãe e degustar um tiragosto antes de ser servido o almoço.
A essa amizade, meu muito obrigado!
Depois de ler a peça em tela, caro amigo Marcos, só se faz bastante agradecer a Deus por sua inteligência magnânima. E que o nosso bom e eterno Pai Celestial te conserve sempre assim.
Rocha, sei que é bondade sua, meu dileto e fraterno irmão!
Sei da qualidade dos seus textos e sou leitor das suas “pílulas” diárias de bom senso. Sua generosidade não tem tamanho…
Que Deus replique em quintúplos a sua bondade.
Parabéns,
Gratíssimo, grande Gilliano!
Forte abraço.
Muito bom artigo.
Muito grato pelo privilégio da leitura.
Tô com o prof. Marcos e não abro um prego.
Sinto-me identificado também. Somos a favor da simplicidade da linguagem. Obrigado pelo apoio.
Mentes quadradas não deveriam lecionar, deveriam se aposentar. Está na hora, não?
Caro Anderson, talvez você tenha razão.
Prometo pensar a respeito.
Enquanto não acontecer, faço-me pensar como Voltaire: “posso não concordar com o que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo”.
Acho que quem faz mais zoada sobre esse assunto é quem sente-se “indignado” com um suposto ataque à própria liberdade de expressão de algo, com o perdão ds palavra, estrondoso como uma bufa.
Quem ressoa os gases em megafone são exatamente os que perdem tempo discutindo-os. De outra maneira, já morto e enterrado estaria o assunto.