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domingo - 08/12/2024 - 12:18h

A mensagem do alpinista

Por Carlos Santos

Ralston em imagem que ele mesmo filmou no local do acidente (Reprodução/Youtube)

Ralston em imagem que ele mesmo filmou no local do acidente (Reprodução/Youtube)

Eu tinha dúvida quanto ao ano. Confesso uma certa dificuldade para me situar no tempo, quando viajo cronologicamente, com uso apenas do recurso da minha memória. É um GPS inconfiável.

Bem, mas o ano não importava.

O que me parecia fundamental era o fato em si. Sua contextualização, pinçando-o para me situar, é o que me interessava mais.

Como alguém tem coragem de cortar o próprio pulso, com a lâmina de um canivete? Razões? Há-as para tudo, até mesmo para automutilação, raciocinava.

Tirou-me o fôlego a narrativa que ouvi à madrugada, em casa, com a TV sendo minha única fonte de luminosidade e companhia, incidindo sobre meu rosto opaco, num quarto lúgubre.

O sorriso de Aron Ralston, um jovem alpinista norte-americano, de braço erguido e parcialmente amputado, era um contraste com minha apatia. Uma sisudez tocada pela alegria de quem tinha acabado de perder parte do corpo e, assim mesmo, comemorava.

Sim, o ano… vamos a ele. Descobri que foi em 2003. Abril.

A TV era uma presença onipotente diante da cama, praticamente ligada 24 horas por dia. Hoje, não. Até de lá foi expulsa. Está entronizada na sala, sem qualquer pompa. Empoeirada.

Tempos difíceis, de transição, de muitas perplexidades e interrogações. Assim era meu 2003. Quase à beira de um ataque de nervos e em meio a constantes esbórnias. Meio “easy rider” (sem destino). Um Peter Fonda sem motocicleta.

Aron, ao contrário, tomado por um vigor maior, prometia voltar ao Grand Junction, um cânion no Colorado (EUA), que quase o sepultara. Não se intimidara com o infortúnio de ter sido preso a uma rocha, que o obrigou a se livrar de uma das mãos, após quase cinco dias imobilizado e sem ser localizado pelo resgate.

Admitiu que em vários momentos acreditou que não sairia vivo do lugar. Ficara entre a dúvida e a esperança. Mesmo após arrancar parte de seu corpo, ainda teve que rastejar, descer um precipício de 18 metros e andar 10 km, até ser socorrido.

A decisão veio de uma força espiritual, que não soube explicar. Conseguir sobreviver, para recomeçar e novamente encarar quem quase o engolira de vez, era uma segunda chance.

Seria uma sobrevida?

Na verdade, a lição que logo tomei para mim e não paro de rememorar, até hoje, é até simplista: para continuar inteiro às vezes é preciso arrancar uma parte de nós.

É uma medida drástica que por vezes somos obrigados a tomar, mas recuamos. Acovardamo-nos. Cortar a própria carne é morrer um pouco, sim. Contudo pode ser nossa única chance de ficar vivo. Renascer das cinzas, como a lendária Fênix.

Lembra um pouco a alegoria do “Mito da Caverna” de Platão. Continuamos na escuridão porque duvidamos da existência da luz. Limitamo-nos, somos limitados; conformamo-nos com as trevas.

Cometemos o pior dos erros humanos: o da omissão.

Somos levados a acreditar que não temos saída ou qualquer alternativa. Essa tal de felicidade fica por aí, no ar, pairando sobre nossas cabeças, como se fora um Zeppelin, aquele imponente dirigível. A qualquer momento, ela flutua e some, ou desaba em chamas.

Vivemos de ciclos. Para começar um novo é fundamental, em alguns momentos, extirparmos por completo o anterior. Toda escolha corresponde a alguma forma de renúncia.

Só chegaremos ao cume do Everest, o nirvana, abrindo mão de boa parte da “carga” amealhada desde o sopé da montanha. É uma espécie de tributo à vida. Impossível levarmos e termos tudo até o alto.

Talvez resida nesse aspecto, outro grande ensinamento à minha existência. Trato-o como “a parábola real da montanha”.

Aron Ralston voltou tempos depois ao cânion, amputado, mas não mutilado.

Entendi assim, a mensagem que me chegara àquela madrugada, pelas “mãos” do alpinista.

Carlos Santos é criador e editor do Blog Carlos Santos

*Crônica originalmente publicada no dia 20 de fevereiro de 2011, nesta página.

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Categoria(s): Crônica
domingo - 08/12/2024 - 08:14h

Vida alheia

Por Honório de Medeiros

Arte ilustrativa Web

Arte ilustrativa Web

Aboletada em um tamborete, na quina da tenda dos temperos, D. Tetê, queixo na mão, compensava a boca fechada com um olhar de águia, curiando os passantes.

Encostei na vizinhança dela, fiz um ar de enfado, e comentei: “detesto quem se incomoda com a vida alheia”.

“Eu também”, respondeu ela de bate pronto, ao mesmo tempo em que se ajeitava no tamborete, se preparando para assuntar.

Foi conversa longa, a nossa. Quase de pé de ouvido, ponteada por uma ou outra gaitada  quando, então, ela mostrava os dentes todos, brancos, limpos com raspa de juá, “desde menina”.

No final, concordamos que não devemos evitar uma ou outra cutucada na vida alheia, moderadamente, nem que fosse para se prevenir dos feitiços da maledicência descompensada dos outros. “Mal, com mal se paga”, ensinou-me ela.

“Temos que rezar, para pedir perdão por esse pecado, não é?”

“Conversa”, disse. “Deus sabe tudo. Ele sabe quem é para perdoar, e quem não é, não adianta pedir”.

Que mais eu poderia dizer? Fui derrubado feito garrote na pega, pela sabedoria de D. Tetê. Fazer o quê?

Tentei uma rasteira: “Se eu aparecer lá na Divisa, comerei uma galinha gorda e um arroz de graxa”? “Se você levar a galinha…”, respondeu, com um muxoxo.

“Tá certo, D. Tetê”. “Já vai? Que pressa é essa?”  “Sua sabença das coisas da vida, é de juntar menino, comadre. Eu levo a galinha gorda. E puxo o tema, para guardar seus ditos e ouvir sua gaitada…”

Juntei os sacos e me danei no mundo, olhando de vez em quando para trás, com medo da língua dela.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

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domingo - 08/12/2024 - 06:38h

Ainda estou aqui

Por Odemirton Filho

À esquerda da foto, os filhos Adiel, Albenice e Ana Maria. À direita, Alba (mãe do cronista), Adna e Adnélia. O mais alto da foto é o filho mais velho, Alcides. No colo da mãe Placinda, Alcivan; no colo do pai Vivaldo, Arnon (Álbum de família)

À esquerda da foto, os filhos Adiel, Albenice e Ana Maria. À direita, Alba (mãe do cronista), Adna e Adnélia. O mais alto da foto é o filho mais velho, Alcides. No colo da mãe Placinda, Alcivan; no colo do pai Vivaldo, Arnon (Álbum de família)

“Eunice Paiva é uma mulher de muitas vidas. Casada com o deputado Rubens Beyrodt Paiva, esteve ao seu lado quando foi cassado e exilado, em 1964. Mãe de cinco filhos, viu-se obrigada a criá-los sozinha quando, em janeiro de 1971, Rubens Paiva foi preso por agentes da ditadura, a seguir torturado e morto. Em meio à dor e às incertezas, ela se reinventou. Voltou a estudar, tornou-se advogada, defensora dos direitos indígenas. Nunca chorou na frente das câmeras”.

“Foi a minha mãe quem ditou o tom, ela quem nos ensinou”, escreve Marcelo Rubens Paiva neste relato emocionante sobre o passado, as perdas e a volta por cima. Ao falar de Eunice, e de sua última luta, desta vez contra o Alzheimer, ele fala também da memória, da infância e do filho. E mergulha num momento sombrio da história recente brasileira para contar – e tentar entender- o que de fato ocorreu com Rubens Paiva, seu pai, naquele janeiro de 1971”.

Eis a sinopse do livro, “Ainda estou aqui.” A história baseou o filme, protagonizado pelas atrizes Fernanda Montenegro e Fernanda Torres, e pelo ator Selton Mello.

Ao folhear as páginas do livro, lembranças vieram à tona. Lembrei da história que minha mãe conta, com os olhos marejados, sobre a prisão do meu avô materno, Vivaldo Dantas de Farias. Como ele lutava nas trincheiras em defesa da democracia, foi preso em sua residência, na rua 06 de Janeiro. Os treze filhos ficaram assustados com aqueles homens de coturnos. O suposto crime? Lutar por um estado democrático de Direito.

Daí em diante começava um calvário para a minha avó, Placinda Dutra. Ela teve que ter discernimento para acalmar os filhos, pois eles ficaram com medo de nunca mais terem o pai de volta; teve que tocar, sozinha, a sua fábrica de redes.

Entretanto, ela soube conduzir a situação com fé inabalável. Conta-nos minha mãe que a minha avó escondeu os livros de meu avô em uma carroça, mandando-os para serem enterrados em um terreno distante de sua residência. Livros com ideias comunistas, à época, eram um libelo-crime.

Da mesma forma que a família de Rubens Paiva, a minha também não sabia o local no qual o meu avô estava preso. Foram quarenta e cinco dias de tortura psicológica, uma agonia para familiares e amigos.

Por outro lado, o livro aborda a doença de Alzheimer, a qual acometeu Eunice Paiva no final de sua vida. A minha avó também padeceu da doença nos últimos anos de sua existência. Quem convive com pessoas assim, sabe como é delicado o dia a dia, é preciso muito amor, cuidado e paciência.

Leia tambémÀ memória de Vivaldo Dantas de Farias (2014)

Leia tambémVô Vivaldo (2022)

Triste é ver quem amamos já não reconhecer quem está ao seu ao lado, precisando de ajuda para fazer as simples atividades do cotidiano. As memórias recentes são apagadas, já as antigas são recontadas, recontadas …

Eunice e Placinda sofreram dos mesmos males: a ditadura militar e a doença de Alzheimer.

Entretanto, o meu avô, apesar de machucado no corpo e na alma, voltou para casa. Rubens Paiva, infelizmente, não.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
domingo - 08/12/2024 - 05:30h

Mãos dadas

Por Marcos Ferreira

Ilustração da Stock - Monkey Business Images

Ilustração da Stock – Monkey Business Images

Quando você está comigo, e sempre está de um jeito ou de outro, sinto assim que os abismos do mundo não podem mais me engolir como antigamente. Não. Até os meus arco-íris hoje têm cores mais vibrantes se estamos juntos. É dessa maneira desde que tive a felicidade de você entrar na minha vida. Devo reconhecer que sofri alguns tombos, uns tropeços, no entanto você me ajudou a levantar todas as vezes. Pois nem tudo são apenas flores; a vida segue com os seus espinhos e farpas.

O fato é que viver se tornou mais leve, ou menos pesado. Não importa que digam que sou um miserável altivo, um otimista fracassado. Gritem ou pensem o que quiserem. Tenho você (temos um ao outro) e isso me basta.

Aos poucos, entretanto, vamos construindo o nosso castelo de bem-aventuranças. Então, entre essas paredes de luxo metafórico, recebemos pessoas, amigos que torcem por nossa união e enriquecimento de felicidade.

Todas as luzes de minha alma estão acesas para iluminar a nossa jornada, o nosso caminho até os confins do tempo. Não tenho mais medo das carrancas de outrora. Não depois que você chegou. Essas coisas medonhas ficaram tão miúdas, quase invisíveis a olho nu.

Todos os meus medos fogem quando eu seguro a sua mão. Certas ameaças ainda me rondam, há um porão escuro que chama pelo meu nome, no entanto estou vacinado contra esse chamamento. Deixei o fundo do poço depois que a luz dos seus olhos penetrou a minha alma e o meu coração. Acredito mesmo que daqui por diante não mais sofrerei os velhos dissabores daquela época de pesadelos de olhos abertos. Repito que todos os meus medos fogem quando eu seguro a sua mão.

Quero descansar nos seus braços, que são minha guarida, meu porto seguro. Fiz um acordo com a Moça da Foice para que só me leve antes de você. Não há vida para mim neste mundo sem você. Mas ainda é cedo para falarmos em despedida. Tenho força e coragem para enfrentar todas as adversidades que se intrometerem entre nós. Todos os meus medos fogem quando eu seguro a sua mão.

Marcos Ferreira é escritor

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 01/12/2024 - 15:50h

Deus me proteja

Por Bruno Ernesto

Santuário da Divina Misericórdia em Cracóvia, na Polônia Foto: Bruno Ernesto)

Santuário da Divina Misericórdia em Cracóvia, na Polônia Foto: Bruno Ernesto)

Aviso ao eventual leitor desavisado que, antes que ele perceba, não me julgo tão religioso quanto você pensa. Todavia, tenho fé e não sou ateu, embora creia genuinamente em Deus.

Após minhas férias e, pois, retomar o rumo da vida terrena da minha insignificância que alguns tantos julgam ser – embora, íntima e nitidamente, tenham sentido minha ausência -, logo que coloquei os pés na minha amada cidade, rumei para o templo sagrado do elixir mais democrático que existe – mais até que as famosas “Landsgemeinde” dos Cantões suíços -, me pus a saborear um café espresso bem prensado, tão reconfortante, feito quem volta o berço em busca de afago materno.

Há três coisas que são excelentes, quando bem prensadas: café, livros e paçoca de carne seca.

Já registrei em outras oportunidades que as cafeterias são um mundo à parte e você, não raro, se depara com toda sorte de gente, assuntos e acontecimentos: ordinárias e extraordinários.

Lembro ao querido leitor que também já mencionei em outras crônicas, que há pessoas que não têm qualquer cerimônia ao conversar em viva-voz em ambientes públicos, de modo que, nos ternos das normas sociais e jurídicas, o que se fala passa a ser de domínio público. Ninguém pode obrigar o outro a desescutar. E digo, caro leitor: a maldade de gente boa é tão pior que a bondade de gente ruim.

Explico: tudo girava em torno de um portão quebrado. Não suportavam tanto descaso do condomínio com o portão de acesso dos veículos que ora quebrava, ora voltava a quebrar.

– É um absurdo! Total falta de absurdo! Diziam.

Pelo menos a reunião semanal no salão de festas do condomínio para mais um ciclo de orações estava mantida.

Vez ou outra, sussurravam contorcendo conto da boca, rogando a Deus que certos vizinhos não fossem orar dessa vez. Por fidelidade à informação, quase indaguei o motivo da insurgência. Por sorte, pontuaram que nem todos do ciclo, são tão fervorosos.

Foi aí, então, que avisaram no grupo de whatsapp do condomínio que o portão continuaria “enteditado” até o início da noite.

– Absurdo! Disseram.

– Faz dois anos que ele diz portão entedidato!

Quando falaram sobre a casinha do lixo, pelo fato de um dos sacos de lixo ter se rasgado acidentalmente no dia anterior e deixado cair seu conteúdo no chão da casinha, disseram que o lixo deveria ter caído bem no meio da sala do condômino, como castigo, ao invés de sujar a casinha do lixo do condomínio.

– Absurdo! Quem já se viu, sujar a casinha de lixo do condomínio! Que suje o seu apartamento como merecido! Multa! Deveriam olhar as câmeras!

A par da situação, ouvindo aquela destilação de ódio bem ali na minha frente, sem maior cerimônia, reverberava na minha mente o que o saudoso Rubem Alves dizia a respeito de religiosidade.

Dizia ele ninguém oferece à Deus algo de bom. As pessoas pensam que Deus é sádico. Sempre oferecem sofrimento em troca de uma bênção – subir quatrocentos degraus de joelhos se alcançar uma graça -, quando Deus – dizia Rubem Alves –, em verdade, quer apenas um jardim de delícias, e não sofrimento.

Ao que parece, ao invés de estar florido pelo ciclo de orações semanal, o jardim permanece verde, no que pertine à genuinidade religiosa de alguns de seus frequentadores mais fervorosos.

Vendo isso, apesar do medo escatológico, vejo que eu, que não participo de nenhum ciclo de orações, talvez escape do inferno.

Crer, orar e agradecer a Deus sozinho e sem alarde, dentro ou fora de um templo religioso, me parece mais genuíno.

Como Chico César canta: Deus me proteja de mim, e da maldade de gente boa. Da bondade da pessoa ruim. Deus me governe e guarde, ilumine e zele assim.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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Categoria(s): Crônica
domingo - 01/12/2024 - 14:38h

Metamorfose ambulante

Por Odemirton Filho 

Arte ilustrativa do Mudando de Rota

Arte ilustrativa do Mudando de Rota

Nesses tempos de extremismo e pós-verdade, pensar fora da caixinha tornou-se um ato de rebeldia. É pecado ter uma opinião diversa daquelas que presidem o nosso dia a dia. O maniqueísmo, ou seja, a divisão entre o bem e o mal, é a regra nas discussões nos dias atuais.

Entretanto, ao longo de nossas vidas inúmeras vezes mudamos de opinião acerca de alguém ou sobre algo. Se ontem pensávamos de uma forma, hoje, podemos pensar e entender o mundo de forma diferente, não constituindo, a meu ver, qualquer fraqueza, pois não devemos ter compromisso com o erro ou a mentira. Verdades postas como irrefutáveis podem, e devem ser analisadas. Porém, valores de vida são inegociáveis.

A dialética hegeliana, que se constitui na tese, antítese e síntese deve ser aplicada. Refletir e tirar as nossas conclusões nos torna diferentes, aguçando o nosso senso crítico. Não devemos concordar e aceitar tudo que nos é apresentado como verdade.

No decorrer do tempo, muitas vezes observamos a vida por ângulos diversos. Vemos um horizonte que, às vezes, pode estar nublado, outras, cristalino. Como disse linhas atrás, valores de nossas vidas não podem ser negociados. A ética, à guisa de exemplo, deve pautar as nossas relações, sejam pessoais ou profissionais.

A mudança é salutar, sempre. Mudar, amadurecer, crescer pessoal e profissionalmente deve ser continuamente perseguido. Atualmente, no tocante à política, vivemos no mundo do radicalismo. Somente o que vale é a nossa posição político-ideológica. Não paramos para ouvir a argumentação contrária. Contudo, mudar não é demérito. Aliás, pode ser uma virtude, mesmo porque não somos os donos da verdade (embora alguns acreditem que são).

Nessa toada, de um texto da escritora Martha Medeiros, extrai o seguinte fragmento:

“(…) Você vê um quadro hoje. Vê o quadro de novo daqui a dez anos, o revê daqui a vinte, trinta, quarenta … É o mesmo quadro com a mesma moldura, na mesma parede do mesmo museu, com a mesma luz, é você, mas cada vez será visto de outra forma. Cada vez ele nos conta uma história. O quadro não mudou. Já nós” …

Como diria o Maluco Beleza: “eu prefiro ser essa metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 01/12/2024 - 13:46h

Fofoqueiros, historiadores e reformadores

Por Marcelo Alves

Arte ilustrativa

Arte ilustrativa

Faz uns dias, eu escrevi aqui sobre o que denominei de “romances de adultério” (leia AQUI). Um certo tipo de ficção, cujo apelido dado já indica acerca do que os textos significativamente tratam, que exemplifiquei com duas obras-primas da literatura universal: “Madame Bovary” (1857), de Gustave Flaubert (1821-1880), e “Ana Karenina” (1878), de Leon Tolstói (1828-1910).

Entretanto, fui acusado, por um leitor indignado, mesmo tratando dos casos de Bovary e Karenina, de haver abandonado o direito e estar agora escrevendo fofocas.

Devo logo reiterar que, em termos de qualidade e legado para a cultura, os textos de Flaubert e Tolstói frequentam o pódio dos maiores de todos os tempos. “Todas as famílias felizes são parecidas. As infelizes são infelizes cada uma à sua maneira”, de “Ana Karenina”, talvez seja a mais célebre primeira linha da literatura. E, para muitos, “Madame Bovary” é simplesmente o melhor romance jamais escrito. Se têm “fofocas”, elas são de altíssima qualidade.

Na verdade – e aqui já chego onde quero chegar –, se, num primeiro momento, “Madame Bovary” e “Ana Karenina” têm como temas principais a hipocrisia, a sociedade, a família, o casamento, o divórcio, a fidelidade, a paixão, o sexo e por aí vai, elas são sobretudo retratos históricos dos contextos social, político e também jurídico da França e da grande Rússia de então.

Grandes romancistas, com suas tocantes estórias, algumas vezes são ótimos historiadores, inclusive do direito. Seus textos literários testemunham a visão sobre o mundo jurídico existente em certa sociedade em determinada época, embora essa visão seja marcada pela ótica particular do autor. E esses testemunhos, em linguagem elegante, são bem mais acessíveis aos leitores (com ou sem formação jurídica), para fins de reconstrução da imagem que determinada sociedade tem do direito e de seus atores, que os áridos estudos jurídico-histórico-sociológicos de caráter estritamente científico.

Para além disso, os grandes romances, ao mesmo tempo em que reproduzem o direito posto e o imaginário popular acerca das diversas temáticas jusfilosóficas, também influenciam, em graus variados, a construção desse direito e, sobretudo, desse imaginário. Nesse ponto, como se dá com outras interfaces da literatura (com a religião, com os costumes, com a moda etc.), ela (a literatura) é subversiva, tanto para o direito positivo como para a filosofia do direito.

De fato, muitas das ideias inovadoras no direito, assim como boa parte das críticas à mentalidade jurídica consolidada, encontraram sua mais vívida expressão nesse popular e imaginativo meio de expressão, denominado por nós de romance, mas que, poeticamente, o mesmo William P. MacNeil chamou certa vez de “lex populi” (na obra “Lex Populi: The Jurisprudence of Popular Culture”, Stanford University Press, 2007).

Dois grandes exemplos disso são precisamente os casos de Bovary e Karenina, como anota Antonio Padoa Schioppa em “História do direito na Europa: da Idade Média à Idade Contemporânea” (edição da WMF Martins Fontes, 2014): “Um primeiro setor de inovações legislativas diz respeito à família. Na França, a Restauração havia abolido o divórcio admitido no Código Napoleônico. A crescente consciência das consequências não raro dramáticas, sobretudo para a mulher, de uniões irremediavelmente viciadas – uma consciência exaltada com muita eficácia também pela literatura: pense-se em Madame Bovary de Flaubert ou em Anna Karenina de Tolstoi – levou em 1884, após longas batalhas parlamentares e de opinião, à reintrodução do divórcio na França, limitado contudo a poucas causas específicas (rapto, estupro, sevícias, condenação penal) e com a exclusão do consentimento mútuo como causa de dissolução do vínculo. Ainda na França, muito gradualmente se impôs também a proteção da mulher: à esposa é reconhecida uma pequena capacidade de agir, bem como o usufruto de uma parcela dos bens do cônjuge falecido, a mulher separada foi subtraída ao poder marital, concedeu-se à mulher trabalhadora a possibilidade de dispor livremente de seu salário”.

No mais, definitivamente não somos fofoqueiros. Nem eu nem muito menos Flaubert ou Tolstói.

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador Regional da República, doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL e membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras – ANRL

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Categoria(s): Crônica
domingo - 24/11/2024 - 04:26h

Deus na escuridão

Por Odemirton Filho

Capa do livro de Valter Hugo Mãe (Reprodução)

Capa do livro de Valter Hugo Mãe (Reprodução)

Estou lendo o livro Deus na escuridão, de Valter Hugo Mãe; um presente do meu amado filho, no dia do meu aniversário. Em resumo, o livro tem como um dos personagens, Felicíssimo, que é um protetor do seu irmão, Pouquinho, o qual nasceu frágil, e precisa da atenção especial. “Felicíssimo, porém, aceita desde o primeiro momento esse compromisso não como um dever, mas como um ato supremo de afeição”. De antemão, advirto que não se trata de uma resenha sobre o livro, mas de uma reflexão sobre o título da obra.

Pois bem. Quantas vezes estamos com um vazio na alma? Precisando de uma ajuda, de uma mão amiga, de um abraço apertado? Quantas vezes, no decorrer de nossa existência, atravessamos mares revoltos? Quantas vezes não estamos vivendo na escuridão?

É nesse momento, no qual estamos cegos pela escuridão, que precisamos encontrar uma fresta, um farol para iluminar as nossas vidas. E aí, quem professa alguma fé, procura nas palavras e nos ensinamentos de Deus um bálsamo para seus sofrimentos, um lenitivo para a alma.

Cada um tem, ou não, o seu Deus, algo superior no qual acredita, o metafísico. É uma questão de fé, do subjetivismo de cada um de nós. O fato é que quando estamos na escuridão é imprescindível procurar o caminho da luz, seja mergulhando em nossas orações, em íntima comunhão com o divino, seja buscando em alguém um gesto concreto de amor. Com efeito, atitudes valem mais do que mil palavras. Muito embora, vale dizer, uma palavra reconfortante pode, em um dado momento, ser determinante pra mudar o nosso rumo.

“Deus é luz; nele não há treva alguma”. Quão bom é o Senhor que, no obscuro de nossa alma, concede-nos a luz, a clarear os nossos pensamentos e caminhos. Por vezes estamos angustiados em razão de problemas de saúde, dificuldades financeiras, com problemas diversos. No mundo de hoje, quantas mães não choram por seus filhos estarem no mundo das drogas? Quantos jovens não estão a perder as suas vidas, vítimas de homicídio e acidentes?

Nas belas palavras de Valter Hugo Mãe:

– “Deus espera na escuridão. Deus assume suas dores, mas quer apenas entregar alegrias. Quando encontrado, Deus apenas promete alegria. Tudo o mais é falso. Desdém de quem não quis voltar a casa. De quem se perdeu e envergonhou.”

Sim, sempre haverá Deus na escuridão de nossas vidas.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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sexta-feira - 22/11/2024 - 07:22h
Cena Urbana

Um casamento que deu certo

Curso de noivos, casal, casamento, Sacramento do MatrimônioO jornalista do Tribuna do Norte, Vicente Serejo, foi visto ziguezaguando entre gôndolas de uma quitanda perto de casa, já finzinho da manhã dessa quinta-feira (21). Fazia as últimas compras à ceia de uma data muito sua, mas de simbologia a dois.

Cena urbana, creia.

Ele e Rejane Cardoso completaram 51 anos de casados nesse dia, numa comunhão à mesa, em família.

Diria o cronista Sanderson Negreiros (1939-2017) em ode bem-humorada à sua Ângela, que é o típico casamento que deu certo.

Espero que Paulo Macedo (in memoriam), colunista social por décadas no impávido Diário de Natal, goste de minha nota.

Serejo, não sei.

Parabéns ao casal querido.

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Categoria(s): Comunicação / Crônica
domingo - 17/11/2024 - 09:02h

Bebelplatz

Por Bruno Ernesto

Bebelplatz (Foto do autor do texto)

Bebelplatz (Foto do autor do texto)

Em mais uma tarde escura e num frio intenso e persistente – porém agradável -, caminhávamos em direção à Universidade de Humboldt para alguns registros e, enfim, conhecer pessoalmente a tão conceituada universidade que Leonardo Martins, meu professor de direito constitucional alemão na época do mestrado, em Direito na UFRN, tanto me incentivou a lá cursar o doutorado e que, por circunstâncias da vida, não foi possível.

Já havíamos passado por lá no dia anterior, entretanto, posterguei a parada diante do roteiro já traçado, hermeticamente confirmado, reconfirmado e ratificado por e-mail pelo controle de acesso ao Bundestag, que fica um pouco mais adiante, já próximo ao portão de Brandemburgo.

Embora já familiarizado com a cultura alemã, a fama de sistematicidade alemã ainda é muito amadora em relação à, digamos, hermenêutica empírica brasileira. Keith Rosenn certamente fica extasiado e envaidecido em relação à sua obra “O jeito na cultura jurídica brasileira”. Recomendo a leitura aos interessados no assunto.

Quem quiser visitar o parlamento e o prédio histórico do Reichstag alemão – aquele que foi criminosamente incendiado no dia 27 de fevereiro de 1933, quatro semanas após a ascensão de Adolf Hitler ao cargo de Chanceler do Reich alemão – , deve enviar por e-mail ou Fax – sim, ainda utilizam o fac-símile – um formulário um tanto extenso por eles disponibilizados, escolhendo um dos dias, horários e roteiros disponíveis para que eles analisem a sua requisição e, se for o caso, você conseguirá visitá-lo.

No dia pretendido não havia mais a possibilidade de visitar apenas o prédio do Reichstag e, assim, acessar o terraço panorâmico e a cúpula, uma vez que seria apenas por visita guiada, razão pela qual não me restou outra alternativa, senão, apenas assistir à sessão do Parlamento.

A propósito, tal cúpula é bem famosa e foi milimetricamente posta acima do plenário do Bundestag, de modo que você pode ver os parlamentares sentados naqueles simples assentos cor púrpura, os quais, frente aos do nosso homérico Parlamento, mais parecem de um anfiteatro de uma faculdade, enquanto faz sua caminhada pela espiral em direção ao terraço panorâmico.

Se bem que a cor púrpura no mundo místico significa espiritualidade, mistério e libertação do medo, algo que não deve ter nenhuma correlação séria diante dos sisudos parlamentares e da tépida receptividade dos alemães, apesar de no trajeto entre Berlim e Amsterdã o restaurante do trem só vender comida vegana. Vá entender.

Me perguntaram algumas vezes se eu portava alguma arma. Só tive coragem de brincar quando uma senhorinha muito elegante também me perguntou, porém com um sorriso sincero. Respondi: apenas armas nucleares. Por sorte ela sorriu fervorosamente e disse que isso não seria problema.

Após assistirmos à sessão, a primeira após ao que já se tem considerado como sendo um colapso político da coalizão que governa a Alemanha, uma vez o chanceler Olaf Scholz acabara de demitir o ministro das Finanças e agendou uma moção de confiança para o início do próximo ano, na saída do plenário, perguntei à mesma senhorinha – perguntei seu nome, porém acabei por esquecer – se poderíamos ir à cúpula; ela sorriu e disse que não haveria problema. Bem, objetivo alcançado.

Lá, tal qual o túnel que liga o edifício principal ao anexo II do Senado, que é conhecido como o “Túnel do Tempo”, há a cronologia política do Estado alemão moderno.

Lá pude ver a famosa constituição de Weimer, assinada em 11 de agosto de 1919 e que é um marco para os direitos sociais, os quais, nos últimos dias, são objeto de uma acirrada discussão acerca da redução da jornada de trabalho no Brasil e que vendo algumas postagens de alguns advogados autointitulados experts, despejam nas redes sociais uma verdadeira verborragia. Alguns eu até admiro pela coragem de passar tanta vergonha em público.

Sim, no conjunto do tempo, havia um destaque para Hitler. Eles não omitiram esse fato histórico e obscuro que ocorreu no país entre os anos trinta e quarenta do século XX.

O detalhe é que ninguém correlaciona o nazismo ao povo alemão. O próprio povo alemão se enoja por isso e levam muito a sério e repudiam veementemente quem ousa correlacioná-lo.

Você, caro leitor, deve me perguntar, pois, qual a correlação entre a minha visita ao Reichstag, a Universidade de Humboldt e a Bebelplatz.

É simples: na mesma quadra, Adolf Hitler foi nomeado Chanceler da Alemanha em 30 de janeiro de 1933; no dia 27 de fevereiro de 1933, incendiaram o prédio do Reichstag e no dia 10 de maio de 1933, queimaram milhares de livros na Bebelplatz, que fica em frente à Universidade de Humboldt.

O que se seguiu, também se resumiu a queimar e pude ver com meus próprios olhos.

Mas isso ainda serão outras histórias.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 17/11/2024 - 08:28h

Antes que o café esfrie

Por Odemirton Filho

Foto ilustrativa

Foto ilustrativa

O romance do escritor japonês Toshikazu Kawaguchi, que tem o título desta crônica, narra a história de um estabelecimento que serve um café especial. No local, os frequentadores têm a oportunidade de fazer uma viagem no tempo, reencontrando pessoas que também já estiveram no lugar. Porém, o encontro é breve, somente o tempo de o café esfriar.

Imagine o leitor se realmente tivéssemos essa oportunidade singular. Como seria abrasador para o coração reencontrar pessoas que se foram, deixando um vazio enorme no nosso peito. Sentar à mesa com aquela pessoal especial para reviver bons momentos ou, quem sabe, viver um pouquinho o que deixamos de aproveitar. Quantos momentos em nossas vidas não deixamos passar e, depois, nos arrependemos. Na correria do dia a dia, perdemos doces momentos.

Creio que cada um de nós gostaria de reencontrar alguém, um instante que fosse. Conversar, abraçar, sorrir, amar. Seria a oportunidade de dizer palavras não ditas, carregadas de sentimentos, compartilhando carinhos. O café, assim como o amor, deve ser servido quente, dizem por aí.

Decerto, há pessoas que passam por nossas vidas tão rapidamente que deixamos escapar instantes mágicos. Falta-nos priorizar pessoas que nos são queridas. Tudo deixamos para mais adiante. Mas, é de se perguntar: você tem certeza do porvir? Tá esperando o quê?

Quem não gostaria de rever a mãe, o pai, os avós? Certamente muitos de nós. Quem não gostaria de rever alguém que foi especial em nossas vidas? As saudades são muitas, não podemos mensurar.

Eu, particularmente, gostaria de sentar à mesa com o meu amado sobrinho, que tão cedo partiu, deixando-nos com o gosto amargo da saudade. Gostaria de rever meu vô materno, e conversar novamente com ele, aprendendo um pouco mais sobre a vida. Gostaria de prosear com um querido amigo da infância e juventude, não pra tomar um café, mas pra tomar aquela cerveja que ficou gelando, lá na casa dos meus pais, em Tibau.

Se tivesse essa oportunidade, antes mesmo que o café esfriasse, eu aproveitaria para dizer-lhes que fazem uma falta danada; são uma saudade constante.

Um dia, creio piamente, hei de reencontrá-los.

E você, se fosse possível viajar no tempo, quem gostaria de encontrar?

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 17/11/2024 - 06:30h

Canto de mau agouro

Por Marcos Ferreira 

Arte da Sketchepedia gerada com IA

Arte da Sketchepedia gerada com IA

Ontem pela manhã, na calçada do extinto Cine Pax, topei com o escritor e jornalista Nelson Rodrigues. Sim, um homônimo. Havia por volta de dois anos que eu não tinha notícias desse rapaz. Parece só lembrar da minha existência quando está precisando que eu faça a correção e copidesque de algum livro de sua autoria. Então ele cata meu número no telefone e liga cheio de amabilidades.

Esse esbarrão e um breve diálogo foram inevitáveis. Após alguns minutos, de olhos aboticados, tentou me arrastar para o assunto do homem-bomba que detonou explosivos na Praça dos Três Poderes, sobretudo na frente do STF. Conhecendo suas convicções de extrema-direita, logo me esquivei dessa discussão. Por diversas vezes ele publicou artigos virulentos na Gazeta de Negócios contra a esquerda e ministros do Supremo Tribuna Federal. É um sujeito mirrado, branco e de farta cabeleira. Não tem um metro e sessenta, porém se insinua destemido. Um homem pequeno com uma boca grande. Exibe no antebraço direito (tinha que ser no direito!) uma tatuagem de uma caveira colorida com uma faca atravessando o crânio na vertical.

Nelson Rodrigues, a exemplo de outros, vive suspirando por um óbito na academia. Já foi preterido em duas ocasiões e tal frustração segue sem remédio. Certos indivíduos e certas academias de letras são tão benéficos para o engrandecimento da literatura quanto uma gonorreia. Há muitas e honrosas exceções, obviamente, mas ponha a carapuça quem quiser. Não nego que tenho minhas queixas quanto a essas instituições que, por exemplo, deram assento a um José Sarney da vida e bateram a porta na cara de um artista do verso e da prosa como Mario Quintana.

Pois é. Essa falsa ideia de imortalidade intelectual e literária sempre mexeu com a cabeça e o coração de literatos de todos os naipes. Não interessa se o aspirante a imortal já esteja com um pé na beirada e o outro na cova.

Podem chorar as pitangas, dizer que sou feio e descer o malho. Essas igrejinhas da compadrice não me seduzem e acabou-se. Mas esqueçamos (antes que desabe sobre minha cabeça uma chuva de canivetes) essa história de medalhas, espadas e fardões. Não estou a fim de abespinhar o ego ou os brios de seu ninguém. Até porque, volto a frisar, muitas dessas entidades têm nos seus quadros valiosos manejadores da língua portuguesa que fazem jus a qualquer agremiação desse jaez. Meu receio, trocando em miúdos, é que a literatura possua mais adeptos do que amantes.

Bem. É tarde. Passa de uma hora. As rasga-mortalhas que vivem nos espaços da caixa d’água da senhora Raimunda fazem um concerto agourento com voos rasantes sobre nossos domicílios. Não me incomodam nem um pouco. De alguma maneira também sou um animal de hábitos noturnos. Às vezes a quetiapina não dá conta do recado e (assim como agora) entro pela madrugada escrevendo acerca de questões que podem muito mais descontentar do que agradar aos meus leitores.

Ainda sobre as corujas deste setor, que perturbam o sono da senhora Raimunda, torço que encontrem outro reduto ou ponto de recreação. Como se costuma dizer, o “canto de mau agouro” daqueles seres alados, além de atrapalhar o repouso de alguns, põe pressentimentos assustadores na senhora Raimunda. Não se pode negar que o barulho que as referidas aves produzem é de fato excessivo.

Até Maria dos Navegantes, nora da importunada Raimunda, diz sentir uma espécie de calafrio sempre que as rasga-mortalhas se pronunciam. E olhe que Navegantes, conforme já nos revelou, não é uma pessoa supersticiosa. Seja como for, por seu quarto ser no andar de cima, a senhora Raimunda é quem mais sofre com o grasnar de uma população de dez ou quinze voadoras daquele tipo.

Por um lado essas criaturas têm uma ligeira semelhança com o Nelson Rodrigues. Isso no tocante à questão do escriba mossoroense desenvolver e ocultar um exercício de mau agouro direcionado aos imortais da academia de letras. Pois sabe que só com a morte de um imortal ele talvez seja imortalizado.

Marcos Ferreira é escritor

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 10/11/2024 - 19:48h

Luzes no céu entre as estrelas

Por Honório de Medeiros

Lagoa do Corá, em Cerro Corá (Foto: Honório de Medeiros)

Lagoa de Cerro, em Cerro Corá (Foto: Honório de Medeiros)

Contemplo a água, os biguás e os cisnes da Lagoa de Cerro. Como veem, estou satisfeito esperando o por do sol.

Lucas e Zé de Maria me garantiram que os sinais de inverno são bons. Eu tinha procurado meu Lunário Perpétuo, para tirar dúvidas, mas não o encontrei. Fiquei mais tranquilo depois da conversa com os meninos da Pousada.

O fura-barreira está construindo seu ninho em lugar alto; o mandacaru florou; as aroeiras estão cheia de cachos e a quentura do fim de outubro, tudo promete, me disseram eles. Falta consultar Genilson e o pessoal do Receptivo.

Sábado vou lá, puxar o tema. Vamos ver.

Daqui a pouco vou subir a encosta até a casa que Deus me permitiu construir com a frente para o nascente, e as costas para o poente. Ivanaldo, o faz-tudo, vai me por a par dos últimos acontecimentos. Vida que segue.

Tomara que de noite faça frio e eu veja luzes se deslocando no céu, entre as estrelas …

Cerro Corá,  31 de outubro de 2024.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

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Categoria(s): Crônica
domingo - 10/11/2024 - 07:40h

Romances de adultério

Por Marcelo Alves

Arte ilustrativa

Arte ilustrativa

Por estes dias, vieram me contar – melhor seria dizer “fofocar” – de um caso recentíssimo de adultério na nossa terrinha. Sei que essas coisas de adultério se tornaram hoje banais. Mas o tal caso envolve gente conhecida, posso até dizer bem famosa na paróquia potiguar. E o indivíduo que me contou estava deveras entusiasmado – para não dizer “excitado” –  com o furdunço e, sobretudo, com a beleza bem-nascida da consorte adúltera.

Não pretendo agora entrar em detalhes sobre o ocorrido, nem muito menos dar nome aos “bois”. Pelo menos essa é a minha vontade no momento em que inicio esta crônica. Minha intenção é, aproveitando esse “gancho”, tratar de um tipo especialíssimo de literatura (dizer subgênero talvez seja um exagero), um tal “romance de adultério”, relembrando e indicando aqui dois clássicos das letras universais, “Madame Bovary” (1857), de Gustave Flaubert (1821-1880), e “Ana Karenina” (1878), de Leon Tolstói (1828-1910).

“Madame Bovary” é uma obra-prima. Figura certamente entre os melhores romances já escritos. Para alguns, tecnicamente, é mesmo o número 1. E agora mesmo eu relembro as sensações que tive quando o li, já pelo finalzinho da minha adolescência, começo da vida adulta. Foram de um realismo de fazer corar os mais castos. Parcialmente inspirado em um caso real, o enredo conta as aventuras e desventuras de Emma Bovary, nascida Roualt, uma jovem francesa que se casa com o médico provinciano, extremamente trabalhador, Charles Bovary. Apesar da paixão do marido por ela, Emma sente muito pouco por ele.

À própria falta de amor, ela compensa imaginando os amores que lê em livros/estórias românticas. Ela lê Walter Scott (1771-1832) e outros menos votados. Quando um dia Emma frequenta um baile promovido pela nobreza de então, ela ali se mistura, entre nobres e ricos, e imagina que nasceu para viver aqueles sonhos. Esses ideais românticos, transformados em adultério, acabam por destruir seu casamento e sua vida (e paro por aqui para não dar mais spoiler). De toda sorte, o causo da “Madame” desvelou sobremaneira uma aprisionante realidade matrimonial em França e alhures.

“Ana Karenina”, em termos de qualidade e legado para a cultura, anda de par com “Madame Bovary” na ribalta dos maiores “romances de adultério” da literatura mundial. “Todas as famílias felizes são parecidas. As infelizes são infelizes cada uma à sua maneira” – talvez seja a mais célebre primeira linha da literatura universal. Alegadamente inspirado em um caso real de adultério, o romance conta, em primeiro plano, a estória de Ana Karenina e de seu amante, o Conde Alexei Vronski.

Ana, em meio a essa paixão proibida (ela era casada com o enfadonho Conde Alexei Alexandrovich Karenin), entra num turbilhão de mentiras e de traição. Desesperada, premida por convenções sociais de antanho e leis absurdas (que só oprimiam as mulheres), vivendo num teatro de hipocrisias, numa das mais famosas cenas da literatura, ela acaba… Num primeiro momento, embora “Ana Karenina” tenha como temas principais a hipocrisia, a sociedade, a família, o casamento, o divórcio, a fidelidade, a paixão, o sexo e por aí vai, a obra não deixa de ser um veículo para que Tolstoi – com sua “filosofia” bem peculiar, quase mística – exponha suas ideias, de cunho mais social e político quero dizer, sobre a grande e congelante Rússia. Uma Rússia onde a vida no campo, idealizada pela e na personagem Konstantin “Kostya” Levin (para muitos o alter ego do autor), contrasta com os vícios e a hipocrisia da cidade. Paro por aqui.

Sei que a classificação “romances de adultério”, para certo tipo de ficção, não está consagrada nos manuais de literatura, pelo menos não como nos casos dos (sub)gêneros romances policiais/detetivescos, romances históricos, ficção científica, faroestes e por aí vai.

Mas estou seguro de que, quando bem escritos, e ainda mais se obras-primas como “Madame Bovary” e “Ana Karenina”, esses livros são maravilhosamente excitantes. Assim como excitante é o caso real que mencionei acima, cujos detalhes acabei não apresentando aqui. Quem sabe não o faço em forma de ficção? Boa ideia…

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador Regional da República, doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL e membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras – ANRL

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domingo - 10/11/2024 - 07:00h

O Fiat 147

Por Odemirton Filho

Miniatura (Mercado Livre)

Miniatura (Mercado Livre)

Aprendi a dirigir nos carros que faziam as entregas dos pães da padaria do meu pai. Eram duas ou três Kombis e uma Brasília amarela. Sim, amarela. Eu pedia aos motoristas, e eles me ensinavam a guiar, pois não havia autoescola. Isso, lá por meados dos anos oitenta.

A fiscalização de trânsito era quase inexistente, raramente havia uma blitz; além do que os arroubos da adolescência não conheciam o medo. Naquela época, não havia a variedade de modelos como temos hoje em dia. E eu, como qualquer adolescente, tinha o sonho de possuir carros possantes. O Gol GTI era o meu sonho de consumo.

Existiam outros modelos, a exemplo do Escort XR3, conversível, e o Uno esportivo. Meu pai teve, que lembre, uma Parati e, posteriormente, um Santana, bons carros, com motor 1.8. Entretanto, raras vezes ele me permitia dirigi-los. Então, contentava-me em dirigir a Brasília ou um Buggy, primeiro um Baby, depois, um Sabre, fabricado em Mossoró.

Quem tinha grana, ostentava com um Del Rey ou um Monza. Meus amigos andavam de Chevette e de Passat. Andávamos, também, no Fusquinha de um amigo mais velho, ele nos levava para conhecer alguns locais proibidos para menores de dezoito anos.

Tempos depois, meu pai comprou um Fiat 147, 1982, da cor verde. Foi o meu xodó. Eu o equipei com rodas grandes, um som roadstar e um equalizador. Apesar da caixa de marcha não ser essa coisa toda, eu tava feliz da vida. Acho que quem possui automóvel, lembra de algum carro de “estimação”.

Em menino, lembro que rua do Cine Pax havia apresentações, vez ou outra, de carros de concessionárias. Os pilotos davam um show, faziam manobras radicais, encantando quem ali estava. Eu ficava embasbacado.

Sobre o tema, aproveito para compartilhar uma curiosidade histórica: o primeiro carro que chegou à cidade de Mossoró foi um veículo de fabricação alemã, no dia 11 de maio de 1911, comprado pela firma Tertuliano Fernandes e Cia. Era equipado com capota desmontável, buzina externa, caixa de ferramentas no estribo esquerdo, bem como, manivela, rodas com aros de madeira, motor de 40 cavalos, com oito lugares.

O fato é que desde sempre fui apaixonado por carros, antigos, sobretudo. Opala e Maverick eram carrões, bebedores de gasolina. Acho bacana quem coleciona carros, como hobby. Dia desses, fui a Gramado, no Rio Grande do Sul, e vi uma exposição de exemplares antigos, inclusive, carros americanos, enormes. Fiquei maravilhado, parecia um menino numa loja de brinquedos.

Como não tenho dinheiro comprar carros antigos, coleciono miniaturas, principalmente os clássicos; tenho pra mais de cem carrinhos. E o mais interessante é que quando vou a uma loja de brinquedos parece que a criança sou eu, pois tenho que me segurar pra não sair com mais uma ruma de carrinhos.

Se pudesse voltar no tempo? Ah, certamente eu gostaria de dirigir o Fiat 147, no qual tanto passeei pelas ruas de Mossoró nos tempos da minha juventude.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 10/11/2024 - 05:42h

Apenas uma página

Por Marcos Ferreira

Ilustração da Freepik

Ilustração da Freepik

Ofereço esta página ao meu amigo Nilson Rebouças, pessoa avessa a textos longos. Nunca leu, por exemplo, nada parecido com Em Busca do Tempo Perdido, Guerra e Paz, A Montanha Mágica, Moby Dick, Os Miseráveis e, muito menos, o caótico Ulisses. Em virtude disso, como já foi dito, pretendo não passar de uma página. E, se possível, tornar estas linhas agradáveis aos olhos dos demais leitores. Sim. Os demais leitores precisam ser contemplados com uma escrita que, no mínimo, valha a pena o tempo empregado nesta breve leitura. Embora pareça fácil, digo que não. Pois essa tarefa de escrever com o mínimo possível de arte não é fichinha.

Eu mesmo (admito sem qualquer pudor) nunca li Em Busca do Tempo Perdido, Moby Dick nem Ulisses. Até iniciei a leitura desses calhamaços numa determinada época da minha vida, no entanto joguei a toalha, fui derrotado pela natureza gigantesca e enfadonha, principalmente, do macarrônico Ulisses.

Aqui com os meus botões, já de olho para não me estender muito nesta crônica direcionada e metrificada, fico pensando como esses livros tão musculosos encontraram editores e viabilidade editorial quando de suas primeiras edições. Isso num tempo em que os meios de confecção e comercialização de romances parrudos como os que citei eram extremamente dispendiosos e sem os recursos de marketing de hoje em dia. Quero supor que alguns autores tiveram que vender um rim para custear a impressão de romances-rios dessa quilometragem. Imagino quantos editores se recusaram a investir num desconhecido como Dostoiévski no começo de carreira deste que é, no meu ponto de vista, o maior romancista e pensador russo de todos os tempos.

Bom. Fiquemos por aqui. Antes que meu amigo Nilson se canse desta crônica de quatro parágrafos e abandone a leitura. Até porque, convenhamos, vivemos uma era em que muitos só se interessam por conteúdos (sobretudo por escrito) bem mastigadinhos. As redes sociais, que têm a sua importância, também concorrem para a preguiça mental do leitor habituado ao fast-food da informação.

Marcos Ferreira é escritor

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domingo - 03/11/2024 - 09:52h

A criação de Gore Vidal

Por Marcelo Alves

Reprodução

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Outro dia, em um excelente grupo de WhatsApp do qual faço parte, “Leitores vorazes”, administrado pelo amigo Bruno Cavalcanti, fui por este indagado sobre quais seriam os meus “top five” no que toca a livros em geral. Citei “O nome da rosa” de Umberto Eco, “A montanha mágica” de Thomas Mann, “Amor a Roma” do nosso Afonso Arinos, “A era da incerteza” de John Kenneth Galbraith e o conjunto “Júlio César/Antônio e Cleópatra” de Shakespeare, para logo depois, refletindo um pouco, transformar essa quina numa meia dúzia, incluindo “Criação” de Gore Vidal.

E é exatamente sobre Vidal e sua “Criação” (“Creation”, 1971) que quero falar um pouco.

Gore Vidal (1925-2012), escritor e ativista político norte-americano, foi um intelectual à moda antiga. Polemista, na esteira de um G. K. Chesterton ou de um George Bernard Shaw. Prolífico e diversificado, escreveu teatro e muitos – ponha muitos nisso – ensaios. Democrata e alegadamente bissexual, tratou, à sua maneira, de religião, filosofia e política. Mas, de minha parte, o que mais aprecio em Vidal são os seus “romances históricos”.

Sobre “Creation”, ainda me recordo até da sua aquisição – falo do exemplar em inglês que primeiramente li – na London Review of Books, a uma quadra do Museu Britânico, no bairro de Bloomsbury, uma das livrarias mais charmosas de Londres. Pequenina, composta de um pavimento térreo e de um subsolo, tem um café que então eu adorava. Logo devorei o livro e voltei à mesma prateleira para comprar “Julian” (1964) e outros mimos do mesmo autor.

Certa vez disse – e agora reitero – que “Criação” tem um lugar especial na minha alma literária. Cyrus Spitama, a personagem principal, grego e persa ao mesmo tempo, é neto do profeta Zoroastro. Representação perfeita do “homem viajado”, ao derredor do século V antes de Cristo, foi embaixador persa perante a Índia, a China e a Grécia de então. Através de Cyrus Spitama, somos apresentados a Cyro (o Grande), a Cambisses, a Dario (o Grande) e a Xerxes, os grandes (e haja grandes nisso) governantes persas da dinastia dos Aquemênidas.

Cyrus Spitama é um homem que, através de pequenos ajustes de datas confessados por Vidal (uma mentirinha branca, a favor do nosso deleite), em direção ao Ocidente, topa com os gregos Péricles, Pitágoras, Demócrito, Tucídides e Heródoto, entre outros luminares que aquela civilização produziu. Vai à China, de mestres do Taoísmo e de Confúcio, no Oriente mais distante. No meio do caminho, ele passeia pela Índia de Sidarta Gautama (o Buda), de Mahavira (fundador do Jainismo) e de seu discípulo/rival Gosala, com suas filosofias e teologias tão misteriosas para nós “ocidentais”.

Uma vida entre reis, pensadores, profetas e magos, de encontros e desencontros, um romance que é, antes de tudo, uma aula de história, geografia, filosofia, religião e política. Ainda devo acrescentar, quanto ao eruditíssimo romance de Vidal, um componente bem pessoal: li “Creation”, praticamente, dentro do Museu Britânico. Foram manhãs e tardes em que, maravilhado, contextualizava mais ainda aquela história/estória de gigantes, passeando (e aprendendo) pelo acervo daquele grande museu.

Paulo Francis, polemista como poucos, que também tem uma crônica intitulada “A criação de Gore Vidal”, republicada no seu livro “Diário da corte” (Editora Três Estrelas, 2012), “elogiosamente” afirma que “Creation sugere que o humanismo já disse tudo o que tinha a declarar em 500 a.C. Não é bem assim. Ou talvez seja. Se ficarmos apenas no humanismo e omitirmos a ciência. É difícil superar Buda ou Confúcio. Nossos mentores Moisés e Cristo são bobos perto desses sábios (é de estarrecer o que Confúcio faria em face de Cristo. Provavelmente lhe daria uma esmola e sairia correndo)”.

Bom, como cristão enfadado, não vou entrar nessa querela. Apenas sugiro a diversa leitura da “Criação”.

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador Regional da República, doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL e membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras – ANRL

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Categoria(s): Crônica
domingo - 03/11/2024 - 08:38h

Por Bruno Ernesto

Tela constante do acervo do Palácio D´Ouro, em Ouro Preto/MG (Imagem reproduzida por Bruno Ernesto)

Tela constante do acervo do Palácio D´Ouro, em Ouro Preto/MG (Imagem reproduzida por Bruno Ernesto)

Decerto você deve estar a pensar que desde o meu último texto, inicie alguma espécie de série, antologia, volume, talvez o primeiro tomo, sobre nomes de pessoas.

Lhe garanto que é pura coincidência.

Na crônica intitulada Jão (//blogcarlossantos.com.br/jao/), falei sobre a origem do meu nome e a correlação entre nome, geração e personalidade. O meu, como disse, vem de um solo.

Apesar de alguns nomes, tidos como tradicionais, ainda terem forte apelo regional e serem bastante utilizados ainda, um detalhe sempre chamou a atenção de muitas pessoas.

Alguns deles tem uma correlação – um tanto injusta -, com a idade biológica, embora atemporais.

Você, por acaso, já conheceu um Bruno de 80 anos de idade? Rebeca? Letícia? Larissa? Marina? Talvez, Melissa?

Eu, particularmente, nunca conheci.

Tomando como mote os Joões, a que me referi na minha crônica anterior, João embora tenha a injusta correlação com sendo de uma pessoa idosa, se composto, como João Paulo, já se transfigura como sendo de uma pessoa jovem.

Puxei rapidamente pela memória, e só me recordo de dois Joões Paulos idosos: o Papa João Paulo II e o filósofo e escritor francês, Jean-Paul Sartre.

É interessante destacar que há uma profusão de memes na internet correlacionando o nome à real idade de algumas pessoas, fazendo crer que é muito estranho, e engraçado, algumas crianças dessa geração serem nominadas com nomes que, aparentemente, só conhecemos como pessoas idosas, e cujos os nomes eram tradicionalmente utilizados por duas ou três gerações anteriores à nossa, como se o idoso brotasse no mundo já idoso.

Embora, de fato, alguns nomes tradicionais soem estranhos nessa geração, o novo de hoje – se tudo der certo -, vai ser idoso um dia. Claro que as cirurgias plásticas, cuidados médicos, nutrição e saúde mental – me desculpe o pleonasmo – serão um plus a mais.

Pois bem. Parece que, para mim, tem se aproximado bem mais rápido do que pensava – o que não acredito muito -, uma vez que, ao olhar os meus documentos pessoais, o meu ano de nascimento me enquadra como sendo da geração millennials.

Talvez, a estética seja o detalhe. Refletindo melhor, talvez não.

Quero acreditar – amiúde – que o costume ainda possa prevalecer, em certas situações, apenas como vocativo; como termo genérico para chamar alguém que não se conhece pelo nome, como por exemplo, chamar alguma mulher pelo vocativo genérico de Dona Maria. Será? Não sei.

O que de fato me ocorreu é que, durante a última edição do programa Justiça na Praça, ocorrida no dia 31 de outubro, promovido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte (TJRN), em parceria com a Prefeitura Municipal de Mossoró e outras entidades, colaborei com o atendimento da população que buscou os serviços oferecidos na Estação das Artes de Mossoró e, num deles, após esclarecer e tirar algumas dúvidas de uma jovem que acompanhava a sua mãe, após ouvir atentamente as explicações e orientações, me agradeceu fervorosamente:

– Obrigada, seu Zé!

Minha filha, Melissa, como diz o velho provérbio nordestino – desculpe o trocadilho -, gaitou.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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domingo - 03/11/2024 - 06:42h

A cara de Mossoró

Por Marcos Ferreira

Mãe com criança enferma. Pablo Picasso, 1903. Metropolitan Museum of Art, New York

Mãe com criança enferma. Pablo Picasso, 1903. Metropolitan Museum of Art, New Yorkcr

Quinta-feira passada, 31 de outubro, dia consagrado às míticas bruxas do planeta inteiro, topei com uma jovem senhora em companhia de uma menininha no semáforo do Cemitério São Sebastião. Sim, outra vez esse recorte da cidade é o palco de um lastimável quadro social. Tais retratos dessa ordem, todavia, são invisíveis aos olhos de um monte de pessoas convictas de que não têm nada a ver com a miséria desses coitados que enfeiam o belo e auspicioso País de Mossoró desde sempre.

Deparei-me com essa situação por volta das três da tarde. A mulher e a criança, apesar de malvestidas e maltratadas pelas circunstâncias que enfrentam, exibiam uma beleza física subjacente. A garotinha, talvez com quatro anos de idade, estava nos braços da mãe. Esta, quando o sinal ficava vermelho, aproximava-se das janelas dos carros com um recipiente de plástico oferecendo uma iguaria que todos nós conhecemos como paçoquinha. Raramente um motorista ou outro baixava o vidro do automóvel para adquirir a paçoca ou apenas dar algum trocadinho à vendedora.

Parei minha moto na frente do São Sebastião, pendurei o capacete no guidom, abri minha carteira e peguei uns cinco reais em moedas. Eu já estava acabando de atravessar a rua para entregar as moedinhas àquela desconhecida, decerto mãe solteira, quando ela se posicionou ao lado da janela de um sedã azul da marca BMW. Em seguida o condutor estirou o braço para fora do veículo e apalpou os seios da mulher por entre o decote do vestido, diante da criança. Fiquei desconcertado.

Não demorou e o sinal ficou verde, o sujeito entregou uma cédula não sei de quanto à vendedora de paçoquinha e seguiu viagem. Maldito dinheiro aquele! Maldito elemento que se aproveita da miséria de outrem para satisfazer uma pulsão sexual! Quantas vezes esse indivíduo já não terá feito isso com outras mulheres carentes e desvalidas por aí, nos semáforos de Mossoró? Não faço ideia.

Nesse instante as minhas pernas ficaram bambas, vi-me estarrecido, e um sentimento de impotente revolta se apoderou de mim. Respirei fundo, os carros rumavam para um lado e outro e me aproximei daqueles dois seres (mãe e filha) sobre o canteiro. A mulher, notando a minha presença, pareceu-me um tanto surpresa com o fato de que alguém a pé viesse em sua direção. Ainda assim, quem sabe receosa, encarou-me e ofereceu o que tinha no recipiente de plástico transparente.

Notei que ainda havia em seu semblante um aspecto de constrangimento. Não duvido de que ela tenha imaginado que testemunhei o que acontecera um minuto antes. “Boa tarde. O senhor quer paçoquinha? Custa só dois reais. Compre pelo menos uma para me ajudar. Eu sou viúva; o meu marido era viciado em crack, estava devendo na boca de fumo e foi morto por um traficante nos Teimosos”, disse-me assim como se tivesse aquela história dramática ensaiada na ponta da língua.

Sobre o final do canteiro da Avenida Augusto Severo, enquanto os carros paravam no sinal vermelho e logo após seguiam seus destinos, travei um breve diálogo com ela, depositei em sua mão pequena quantia e revelei que eu não tinha interesse nas paçocas, mas que aceitasse as moedas porque o meu intuito (embora com um valor bem pequeno) era tão somente o de ajudá-la. Estava perante mim uma morena clara de olhos tristes, cabelo longo, corpo franzino e bem-conformado. A filha não se parecia com a mãe, pois se tratava de uma menina de cabelos meio loiros e olhos esverdeados. Deduzi, então, que herdara as feições do pai, morto pelo traficante.

Na faixa dos trinta anos de idade, contou-me que hoje mora com a mãe idosa na Favela do Cachorro Assado, onde também existe uma boca de fumo perto do barraco que ela e a filha habitam com uma irmã mais velha e outras duas crianças. Compreendi que nossa conversa precisava ser curta, pois a vendedora de paçoquinhas estava deixando de oferecer suas iguarias enquanto falava comigo.

Ela me agradeceu, disse “Deus proteja o senhor” e eu fui embora contrariado com aquele motorista vil, sem compaixão. Torço mesmo que ele e nenhum outro volte a praticar esse tipo de patifaria, de absoluta falta de humanidade, contra aquela pobre mulher. Ainda mais aos olhos da uma criança inocente.

Esse tipo de coisa, que devemos repudiar com total veemência, é a cara de Mossoró. Pois nosso município, sempre coberto por maquiagem publicitária, vira as costas para um sem-número de cidadãos miseráveis.

Marcos Ferreira é escritor

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Categoria(s): Crônica
domingo - 27/10/2024 - 11:02h

Quem só direito sabe

Por Marcelo Alves

Arte ilustrativa de Hélio Teixeira Org

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Tenho me batido, aqui e na vida, contra aquilo que chamo de “mito da especialização”. Como já alertava Rubens Alves, em “Filosofia da ciência: introdução ao jogo e suas regras” (Editora Brasiliense, 1981), circunscrevendo o nosso pensamento e induzindo o nosso comportamento, “a especialização pode transformar-se numa perigosa fraqueza”.

No direito, isso tem até um toque especial e curioso.

Como muitos já devem ter notado, historicamente, os cursos jurídicos no Brasil sempre foram formadores de bacharéis cujas vocações, ao final dos estudos, acabavam sendo direcionadas para diversas outras profissões além daquelas consideradas estritamente jurídicas (magistratura, ministério público, advocacia etc.). Era – e ainda o é – uma característica do direito.

Na verdade, segundo Nelson Werneck Sodré, em “Síntese de história da cultura brasileira” (DIFEL, 1985), “a tantos aspectos negativos de que têm sido acusados os cursos jurídicos, em sua unilateralidade ou em sua preponderância – e que devem ser historicamente situados –, há que juntar um aspecto positivo quase sempre esquecido. É que tais cursos forneceram, como era de sua finalidade, conhecimentos que permitiam a atividade ligada ao Direito, mas forneceram, paralelamente – e, até o fim da fase de que nos ocupamos, unicamente –, aqueles conhecimentos, ainda que em nível rudimentar, que seriam fornecidos, adiante, por centros especializados de estudos, e, bem mais adiante, pelas Faculdades de Filosofia, isto é, o saber universal, humanístico, filosófico – com alguma licença nessas qualificações. De sorte que os bacharéis não se habilitavam apenas ao exercício profissional, mas às letras, ao jornalismo, à política, ao magistério, sem falar nas funções públicas. Não espanta que nos cursos jurídicos encontrassem eco especial as atividades mencionadas, de que ali se fizesse o noviciado, que tornavam estes cursos focos de ideias e de irradiação de campanhas, não esquecendo o papel, que tiveram, de unificadores da cultura, pela aproximação de elementos oriundos das mais distantes e diversas regiões do país, a que retornavam muitos com as marcas dessa formação”.

Talvez seja por isso que o folclore jurídico tenha consagrado o ditado “quem só direito sabe nem direito sabe”, cuja autoria muitos atribuem ao grande Pontes de Miranda (1892-1979), com o qual tendo deveras a concordar.

Mas se no passado essa “generalidade” do direito no Brasil era mais intuitiva pela própria necessidade de quadros profissionais, acho que hoje essa tendência do direito de ir além da sua especialização vem ganhando ares sistemáticos e espaço formal na academia. De fato, no direito, uma das atuais “coqueluches” é a interdisciplinaridade, aqui entendida, no seu sentido lato, como a interação, nos mais diversos níveis de complexidade (multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade em sentido estrito e transdisciplinaridade), das áreas do saber, visando à compreensão e ao aperfeiçoamento da realidade que nos cerca.

Nas últimas décadas o estudo interdisciplinar do direito tem ganhado institucionalmente espaço na academia e na literatura jurídica em geral, sobretudo nos EUA, com movimentos/disciplinas do tipo “law and society”, “law and economics”, “critical legal studies”, “law and literature”, “law and film”, dentre outros. E, mesmo que de forma não tão organizada como nos EUA, no Brasil, nos cursos de bacharelado e de pós-graduação, aos professores e estudantes é recomendado trabalhar toda e qualquer disciplina jurídica curricular em interação com os demais ramos de direito, assim como interagir com as demais ciências, tais como a filosofia, a política, a economia e a sociologia.

Seguindo essa boa tendência da interdisciplinaridade, eu faço a minha parte. Sempre misturo as enfadonhas tecnicalidades do direito com a filosofia, a literatura e o cinema, entre outras sabenças. E você, caro bacharel, tem se lembrado de fazer a sua?

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador Regional da República, doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL e membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras – ANRL

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Categoria(s): Crônica
  • Cachaça San Valle - Banner Rodapé - 01-12-2024
domingo - 27/10/2024 - 08:42h

Jão

Por Bruno Ernesto

Exposição no Centro Cultural Banco do Brasil Belo Horizonte Foto: Bruno Ernesto)

Exposição no Centro Cultural Banco do Brasil Belo Horizonte Foto: Bruno Ernesto)

Você escolheu o nome de alguém? Digo, nominou? Batizou?

Penso ser – após a notícia de uma gestação – uma tarefa um tanto complexa.

Há uns anos, alguns nomes – um tanto não usuais e que não convém listá-los -, foram adotados à exaustão pelos pais no Brasil e passaram a ser sinônimo da geração Z.

Para muitos, a escolha do nome do nascituro ultimamente tem se firmado num excesso de caminhos místicos e que pouco entendem o motivo pelo qual o nome foi escolhido.

Por sorte, recente alteração legislativa permite que o batizado, a depender do estrago, possa solicitar a alteração diretamente no cartório de registro civil, sem maiores delongas.

Claro que há nomes que são escolhidos em razão de uma significação especial, como uma homenagem; um desejo.

Por exemplo, o meu nome, apesar de ser um nome relativamente comum, foi escolhido pelo meu pai por um motivo inusitado.

Por ser engenheiro agrônomo, um profundo estudioso e pesquisar acerca da gênese dos solos e pedologia, tomou como referência um solo muito comum no sertão nordestino, com predominância em clima semiárido, e cuja coloração escura varia de marrom para o vermelho.

Classificado cientificamente como um solo Bruno Não Cálcico, virei apenas Bruno.

Decerto que há também quem diga que o nome, por si, pode dizer muita coisa sobre o seu titular, notadamente a personalidade. Não sei.

Por exemplo, uma das características dos solos Bruno Não Cálcicos é que são pedregosos. Será? O fato de ser implicante nato não quer dizer muita coisa.

Por tanto e por quanto, recentemente, ao visitar o Centro Cultural do Banco do Brasil, em Belo Horizonte, dentre as exposições ali abertas, me deparei com uma um tanto peculiar. Nem tanto pela forma. Porém, pelo conteúdo.

Era uma ação integrada à exposição denominada Arte Subdesenvolvida, inspirada na obra multimídia denominada “Sonhos de Refrigerador: Aleluia Século 2000”, de autoria de Randolpho Lamonier, e quem dentre inúmeros itens, no pátio central do Centro Cultural do Banco do Brasil, havia grandes cartazes que materializam os sonhos de pessoas ouvidas e que foram abordadas por ele nas ruas do país.

Eram inúmeros cartazes, intrigantes e curiosos, nos quais estavam transcritas as interações entre o artista e a própria obra de arte, que era a pessoa que ele abordava naquele momento; e eram totalmente anônimas.

Muitos dos cartazes eram hilários e irônicos. Outros demonstravam que a pessoa era um tanto amargurada. Maltratada pela vida.

Porém, dois cartazes me chamaram a atenção em um curtíssimo instante. Entre um e outro, distavam apenas alguns outros cartazes pendurados ali no pátio.

No primeiro estava escrito que o sonho de consumo daquela pessoa era comprar um trator para carregar mais amigos e amigas pela cidade. E gostaria de carrega-los na pá.

No segundo, o sonho da outra pessoa era estudar na Lambeth School os Arts, morar em Merylebone, na cidade de Londres, em um apartamento muito bonito, conseguir comprar as coisas, morar perto da mãe, e ter um coelho de estimação.

Os sonhos, apesar de diametralmente opostos, no que se relaciona às pretensões da vida, embora não totalmente intangíveis, a diferença entre aquelas duas pessoas era apenas a idade.

O primeiro, tinha trinta e um anos e era professor. O segundo, tinha doze anos, e deduzo ser estudante.

Ambos, eram Joões.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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Categoria(s): Crônica
domingo - 27/10/2024 - 07:28h

Uma breve caminhada

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa

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Aqui ou acolá, quando a preguiça permite, faço uma caminhada pelos arredores do bairro onde moro; sim, é preciso exercitar o corpo, faz bem à saúde, faz bem à alma.  Ao caminhar, aproveito para observar o cotidiano, olhar em derredor. Outras pessoas também estão caminhando; cada uma fazendo o seu exercício, seja por prazer ou por obrigação.

Os galos-de-campina estão bicando alguma coisa pelas praças; dois bem-te-vis estão lado a lado, num fio de alta tensão; dois ou três gatos estão à minha espera, na calçada, esperando a ração que diariamente coloco para eles. Aliás, ultimamente, tenho visto muitos cachorros pelas ruas, creio que há alguma cadela no cio. Algumas pessoas passeiam com seus pets, porém, nem todas levam um saquinho para apanhar as “necessidades” feitas pelos bichinhos.

Muitas casas estão abandonadas; os seus proprietários foram morar em condomínios, à procura de segurança, já que o Estado não cumpre o seu papel. Nas praças, de raro em raro, vejo crianças brincando, andando de bicicleta ou jogando bola.

Aí eu lembro da minha infância, na qual inexistiam celular e internet. Vivia-se somente no mundo real, “ralando” os joelhos. Mas, nada de saudosismo, os tempos são outros, o mundo mudou, é preciso virar a página e seguir escrevendo mais um capítulo da vida, antes do ponto final.

Como é à tardinha, final de expediente, observo trabalhadores saindo do serviço, cada um tomando o seu rumo, com as suas alegrias, preocupações e tristezas. Num banco da praça um jovem casal, conversa; acho que são namorados. Quem sabe, troque juras de amor, faça planos para o futuro.

Não pense você que está lendo esta crônica que eu vou caminhar para “curiar” a vida dos outros. Não. Eu acelero e diminuo o ritmo dos passos, como recomendam. E aproveito o ensejo para pensar com os meus botões. Penso na vida, no passado, nos erros e acertos cometidos; penso no futuro, no meu primeiro netinho que vem por aí, eternizando a minha existência. Os netos são o amor em dobro, dizem; no íntimo do meu coração, sinto que são.

Depois de uns trinta minutos, boquinha da noite, encerro a minha breve caminhada. Volto pra casa, e vou regar as plantas do meu quintal. Amanhã, talvez, irei novamente. Afinal, amanhã é outro dia; e teremos mais uma oportunidade para começar ou recomeçar.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
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