Por François Silvestre
“A poesia é a única prova concreta da existência do homem”. Coloquei, na placa da Praça da Poesia, esta citação e o nome do seu autor: Luis Cardoza y Aragón.
Minha surpresa foi o quase completo desconhecimento da existência de Aragón, no universo intelectual da província. Um poeta famoso da terrinha olhou a placa, fez uma careta, e perguntou: “Quem é”?
A Praça da Poesia é um pequeno espaço, na área do Palácio Potengi, onde se aboleta a Pinacoteca do Estado. O prédio estava em estado de risco. Além de maltratado nas estruturas, havia uma linha na armação principal que ameaçava desabar sobre o sistema geral de climatização.
Era o risco iminente de desastre elétrico. Imagine um acidente na eletricidade de um prédio recheado de madeira, tecidos e tintas. Telas, molduras e materiais de exposição. Era como acender um fósforo num recipiente de gasolina. Decidi restaurar e recuperar o imóvel histórico. E o fiz.
Volto à pracinha da poesia. Atendi a um apelo de Alexandre Dunga Garcia, líder da bela e nobre pobreza do Beco da Lama. Nem sei se a Praça ainda existe. O que não foi abandonado foi destruído, sob o olhar complacente e omisso dos ditos órgãos de controle.
E pus na placa da Praça a citação corajosa de Aragón, de que o homem só se prova existente pela invenção da poesia. E não pela pompa das edificações monumentais.
Um intelectual renomado, numa praça de shopping, perguntou se a citação não era de Octávio Paz. Ele não conhecia, mas achava pouco provável ser de um desconhecido seu. Essa coisa que só a vaidade explica. Respondi marotamente que o grande pensado Mexicano jamais furtaria o crédito.
Luis Cardoza y Aragón foi poeta, diplomata e resistente democrata na Guatemala dos meados do Século Vinte. Viveu mais tempo no exílio do que em casa.
Num dos intervalos da exceção, ele foi designado embaixador na Colômbia. E estava lá, numa noite de terror do mês de Abril de 1948. O líder populista Jorge Eliécer Gaitán foi assassinado, o que provocou uma onda de terror pelas ruas de Bogotá.
Muitos dos perseguidos, naquela noite, buscaram refúgio na embaixada da Guatemala. Gabriel Garcia Marques, no seu livro de memórias, quase depoimento, conta o episódio e diz que a Colômbia entrou no Século Vinte naquele dia.
E foi o autor dos “Cem Anos de Solidão” quem fez um retrato falado do caráter de Luis Cardoza y Aragón. O caráter político e o talento poético.
Ele repetiu a frase que, surpreendentemente, eu descobri ser desconhecida de alguns dos nossos intelectuais cadastrados. É isso mesmo. Nós temos um cadastro de intelectuais. Jenicleide já pediu o cadastramento de Florentino Vereda. Vai ter licor de mangaba e conhaque de araticum-cagão.
No meio da concretude estúpida dos novos tempos, a suave abstração da poesia.
Té mais.
François Silvestre é escritor
* Texto originalmente publicado no Novo Jornal.
Té sempre. Existo e quem prova isso é a poesia. Há comprovação mais bonita do que essa. Sinto-me suave e verdadeira. Hola, Aragon!
Há comprovação mais bonita do que essa?