Por Odemirton Filho
Ao pé da estátua do Padre Cícero Romão Batista, em Juazeiro do Norte, Ceará, centenas de pessoas, sob um sol escaldante, sentindo o mormaço, olham para o alto, escrevem seus nomes no monumento, e pedem a benção do Padim Ciço. São crianças, jovens, adultos, idosos; gente de todos os recantos do país, principalmente do Nordeste.
Romeiros andam pra lá e pra cá. Vários ônibus lotados de fiéis sobem ao local onde se encontra o monumento, algumas pessoas fazem o percurso a pé. Lojinhas vendem os mais variados produtos, terços, rosários, chaveiros, imagens etc. Visita-se à casa azul, na qual os romeiros fazem os seus pedidos, pagam suas promessas, veem fotos e objetos que pertenceram ao Padre Cícero.
A cidade do Juazeiro vive e respira a memória do Padre Cícero. Em quase todos os estabelecimentos comerciais se vê uma estátua ou foto; creio que em boa parte das residências também seja assim, apesar do Padim não ter sido declarado Santo pela Igreja Católica.
No livro Padre Cícero, Santo dos Pobres, Santo da Igreja, de autoria da religiosa Annete Dumoulin, o Bispo emérito de Crato, Dom Fernando Panico, diz que em 2006 foi entregue à Congregação para a Doutrina da Fé um pedido de reabilitação histórica e canônica do Padre Cícero. O Pedido, segundo ele, foi sustentado em sólidos argumentos, fruto de profunda reflexão dos membros de uma comissão, composta por doutos em várias ciências.
Por outro lado, não vi nenhuma menção ao encontro entre o Padre Cícero e Lampião, no qual o sacerdote concedeu uma falsa patente de capitão ao cangaceiro, quando este visitou o município. Além disso, como sabemos, há outros fatos que maculam a biografia do Padre.
Entretanto, para a maioria das pessoas que visita o Juazeiro nada disso importa. O que vale é a fé e a devoção no Padim.
Consta que dois milhões de pessoas visitam anualmente a cidade. Há um forte turismo religioso, movimentando a economia da região metropolitana do Cariri, pois as acolhedoras cidades de Barbalha e de Crato são vizinhas do Juazeiro do Norte.
A região é quente, abafada; até mais que Mossoró. Lá estando, aproveitando a mítica do lugar, com a alma leve, também fiz as minhas orações. Agradeci a Deus pelo dom da vida; roguei aos céus saúde e paz para mim e os meus.
Lembrei-me da pretensão de se construir em Mossoró um monumento em homenagem à nossa padroeira Santa Luzia. Será que conseguiremos? Quem sabe. Sendo assim, socorro-me do Evangelho: “Homem de pouca fé, por que duvidastes”?
Aliás, a fé alimenta a alma de milhões de pessoas, sejam católicas ou não, por isso a tolerância religiosa deve ser cultivada em uma sociedade que pretende ser plural e inclusiva, pois de acordo com a Constituição Federal é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.
Devo confessar que achei agradável conhecer Juazeiro do Norte (calor para mim não é novidade), presenciando a fé e a devoção das pessoas. Será ignorância do povo? Ora, quem somos nós para julgá-lo?
Talvez, as palavras do Bispo Fernando Panico, um dos arautos do Padre Cícero Romão Batista, lancem luzes para explicar tamanha devoção:
“Pelo testemunho perene dos romeiros e romeiras na Terra Sagrada do Juazeiro do Norte, não era possível acreditar que Padre Cícero fosse o “heresiarca sinistro” que Euclides da Cunha descrevia no seu livro Os Sertões. Certamente Padim Ciço tem algo de muito especial para ser objeto da” devoção de milhões de pessoas que vêm a Juazeiro para “visitá-lo”.
Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça