Por François Silvestre
Desde a partida do padre Salomão, Januária quase acostuma-se com a calmaria religiosa entre as igrejas. O novo padre, tolerante, a igreja Batista, luterana, com um pastor tradicional, os terreiros de Candomblé sem perseguição, o centro espírita kardecista, com sua politica de caridade, e os ateus, minoritários, a fazer pouco caso de todas elas. Estava assim.
Estava. Januária começou a experimentar o abate de silêncios da contemporaneidade. O padre Thiago foi chamado às pressas por ordem do arcebispo da Diocese. Mal teve tempo de repassar orientações ao sacristão Teófilo. Ao mesmo tempo, chega em Januária um grupo de geólogos munidos de vasta bagagem de equipamentos. Verdadeira parafernália de furadoras, máquinas de escavação, lentes grossas, instrumentos variados e desconhecidos do lugar, além de vasilhas contendo inúmeros insumos químicos.
O que há de relação? Tudo. Na Diocese, o vigário de Januária é alertado para problemas futuros na sua paróquia. Que certamente terminará com a paz religiosa ali reinante. Por conta da religião? Não. Envolvendo as igrejas? Sim. Por que sim e não? Porque o envolvimento é financeiro e político, tendo a religião e, por via de consequência, as igrejas no bolo misturado, cujos ingredientes são a fé dos ingênuos, a pregação do terror, a invenção de milagres, o jejum da verdade, fartura da mentira, tudo em forno brando, lento, consumindo crenças e disseminando medos.
Foi (não se sabe como nem quando, dos silêncios antigos), descoberta uma rica mina de areia monazítica nas proximidades de Januária. E ainda a suspeita de petróleo nos escondidos do seu solo. Daí a equipe de geólogos. O padre recebe orientações e informações sobre tudo.
Era guerra pela frente. Um “pastor” famoso de uma pseudo igreja, Vitória em Cristo, estava afivelando as malas para hospedar-se em Januária. Ambição que põe diariamente Cristo de volta na cruz. Esse “pastor” aspeado de título e desprovido de moral foi quem bancou e remeteu a Januária os profissionais da geologia. Mas haveria um preparo. Os geólogos não poderiam informar sobre as reais intenções da pesquisa. Primeiramente seria fundada a Igreja do Fariseu nacional. Ele iria preparar a população para justificar seus intentos.
Veja capítulos anteriores
Leia também: Esconderijo de silêncios I
Leia também: Esconderijo de silêncios II
Leia também: Esconderijo de silêncios III
Leia também: Esconderijo de silêncios IV
Leia também: Esconderijo de silêncios V
Ocorre que a igreja católica, pelo viés dos seus altares e informantes, descobriu a marmota. E resolveu prevenir-se. Mais um dos silêncios abatido em pleno voo.
François Silvestre é escritor
É ouvindo o silêncio dos longes que sinto o peso das minhas sandálias de chumbo. (Marcos Pinto in “Contando os dias de vida e somando os dias do tempo”.