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sexta-feira - 28/12/2018 - 21:00h
Brasil

A democracia de cada um

Por François Silvestre

Já foi dito que cada ministro do supremo é uma constituição. E a Constituição real, de 1988, só serve para manuseio das interpretações.

Nariz de cera para contar um fato, usando a comparação, sobre a noção que cada um de nós tem da democracia.

Isso mesmo; democrata é quem concorda comigo, se discorda é autoritário.

Ah, prometi um fato.

Estava num barzinho da Rua da Glória, primeiro bairro carioca da zona Sul, de quem vem da Cinelândia para o Catete, que guarda fisionomia suburbana, segundo Norma, crítica de teatro que frequenta o local. Esquina da Rua Cândido Mendes, onde ainda mora a outrora aristocrática Casa da Suíça e o elegante e minimalista espaço de arte do Café Grégora.

Do barzinho, vê-se a Praça Paris e o Outeiro da Glória, onde foi batizada a Princesa Isabel. Ali se fala de tudo e passam de todos; boêmios, artistas, mendigos, loucos, profetas e poetas.

Numa dessas tardes, em plena campanha eleitoral, estava ao lado da minha mesa um grupo bebendo e distribuindo propaganda do candidato Haddad. Passa por eles um vendedor de óculos, oferecendo a mercadoria.

Uma jovem, do grupo, lhe oferece um decalque do candidato e diz “pela democracia”. O vendedor recebe e responde: “pela ordem”.

Aí a jovem se exalta e explica ao vendedor, que ouvia meio tímido, “a democracia precisa avançar, tudo pela democracia”.

O grupo era formado por militantes do PSol.

O vendedor de óculos foi embora, levando a propaganda. Aí, bestamente eu me meti. “Concordo com você”. Ela foi toda sorriso, de dentes à mostra. Inventei de continuar: “Também acho que a democracia é essencial, deve avançar”.

Enquanto eu falava, eles me ofereciam decalques. Continuei: “Chegamos a esse impasse por conta dos erros cometidos e a relutância em fazer autocrítica, promovendo inclusive a dissidência de vocês do PSol, por motivos éticos”…Não pude continuar.

Eles nem contestaram, apenas viraram as cadeiras e me deram as costas. Pois é.

Democracia só deles, do mesmo jeito da democracia de Bolsonaro. Só dele. Ou de Lula, só dele.

Recuso-me à filiação dessa democracia. Assim como dou-me o direito de duvidar da supremacia da nossa suprema corte.

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. Amorim diz:

    Supimpa!
    Gostei de tudo mas usei muito decalque.
    Lembranças aos seus,
    Desconhecido ignorante.

  2. Naide Maria Rosado de Souza diz:

    Amorim, não consegui entender o seu comentário. Talvez cansaço de final de ano.
    Quem é o desconhecido ignorante? O vendedor de óculos que bradou um ” pela ordem” ? O grupo que deu as costas ao se deparar com a verdade? O a democracia é só a minha? A dúvida da supremacia de nossa suprema corte?

  3. François Silvestre diz:

    Nenhuma das duas, Naide. O “desconhecido ignorante” é título de uma carta minha, antiga, sobre uma missiva com que fiz metáforas. Amorim repete essa fala, nada a ver com o texto atual. Abraço aos dois.

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