domingo - 28/09/2025 - 03:34h

A minha nada mole vida de advogado

Por Marcello Benevolo

Arte ilustrativa com  recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

No imaginário das pessoas a advocacia é glamourosa: ternos de grife, escritórios alinhados, processos cheios de citações eruditas, cafés em reuniões estratégicas. Pois bem, na prática, o glamour dá lugar a situações pitorescas que só quem milita sabe.

Recentemente vivi mais uma dessas. Dois processos meus estavam parados há quase 60 dias em um Juizado Especial de uma cidade vizinha a Natal. Liguei para a secretaria da Comarca, expliquei a situação, e ouvi a seguinte resposta: “Doutor, os processos estão conclusos para despacho”. Ah, sério? Mas essa informação já aparece no sistema. Eu queria era movimentação, não constatação.

Pedi então para falar com a assessoria do gabinete ou com a própria juíza. Veio a surpresa: só atendiam presencialmente. Isso em plena era digital, quando o próprio Judiciário exige peticionamento eletrônico, audiências virtuais e assinaturas digitais. Viva a tecnologia, desde que não seja para falar com a assessoria ou com a juíza.

Como a cidade era vizinha a minha, então fui. Passei pela recepção, cheguei à secretaria, informei os números dos processos e fui convidado a… esperar no corredor. Sim, atendimento “corridor style”. Veio uma simpática assessora, ouviu meu relato em pé, e ali mesmo em meio a outros transeuntes do Fórum, tratamos do assunto. Nem um banco, nada. Parecia que o gabinete era território sagrado, inacessível.

Expliquei a urgência, ela respondeu que anotaria os números “de cabeça”. Tive que oferecer papel e caneta — coisas raras em um órgão público, ao que parece. Anotou, agradeceu e foi embora. Saí pensando: não espero tapete vermelho, mas ao menos uma cadeira não seria luxo.

Claro que não se deve generalizar. Há servidores exemplares, magistrados acessíveis e assessores solícitos. Mas o episódio mostra o quanto ainda precisamos avançar em respeito, estrutura e eficiência no sistema de Justiça. Porque, entre o glamour e a realidade, a advocacia é feita de perrengues — e de histórias que dariam ótimos capítulos de um diário de bordo.

Marcello Benevolo é advogado e jornalista

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. FRANSUELDO VIEIRA DE ARAUJO diz:

    Não se deve generalizar, mas, sim e sim, podemos afirmar que não raro ocorre situações tais e quais, dado que nosso sistema de justiça, infelizmente, continua a funcionar para meia dúzia de sempre, ou seja, a estrutura e as decisões e sentenças que decorre dessa estrutura, invariavelmente, tendem mais e mais concentrar renda, poder e mando.

    A questão da morosidade é tão flagrante e bizarra que já ouvi dos próprios servidores, que dificilmente se utilizariam do que chamam de prestação jurisdicional, dado que que, muito embora soubesse que estariam de posse do bom direito, o resultado e a resultante só seriam usufruídos por seus filhos e (ou) netos.

    Em resumo, além da morosidade conhecida e mórbida morosidade que decorre de vários fatores, inclusive de ordem processual, o que chama se chama de justiça e que muitos magistrados tem a pachorra de expressamente denominar como sendo uma sentença de natureza retributiva, especialmente quando do arbitramento de um dano moral no importe miraculoso de R$ 5.000,00 – 3.000,00 ou R$ 1.000,00 reais, no que convenhamos, de fato, não passa de uma piada ou verdadeiramente de um incentivo à aberta e reiterada delinquência de grandes empresas, planos de saúde, bancos e financeiras em face do consumidor Pátrio…!!!

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