Por Zildenice Guedes
Em outros momentos da história já fomos acometidos por crises sanitárias e epidemiológicas. Por exemplo, até a Segunda Guerra Mundial, houve uma grande quantidade de vítimas mortas devido aos micróbios trazidos com a guerra, maiores do que mesmo os ferimentos das batalhas (Diamond, 2017).
Estamos no século XXI e fomos surpreendidos, por um vírus que de uma hora para outra mudou o ritmo das nossas vidas, nos trouxe uma grande insegurança, o medo passou a estar presente em nosso cotidiano, as relações familiares mudaram, no geral tivemos que ficar isolados com as pessoas que outrora só víamos em média, 1 ou 2 vezes ao dia.
E diante disso tudo eu tenho me perguntado, quem seremos nós pós pandemia? Que cicatrizes ela deixará em nós? Como será nosso retorno ao convívio social? Quais ideias nos alimentarão? E o futuro?A proposta desse artigo surge de uma perspectiva socioambiental. E o que significa isso exatamente? Tratar a relação humana com o meio ambiente em uma perspectiva sistêmica em que todos estamos interligados é uma forma de dizer que a pessoa humana interfere e depende da natureza.
Há muitos anos, um autor chamado Fritjof Capra nos apresentou esse conceito sistêmico para entendermos a necessidade de mudar a forma como nos relacionamos com o meio que nos cerca. Trata-se de entender que o todo está interligado, e nós seres humanos somos parte da natureza em uma relação de constante troca e interdependência.
Certamente é um risco afirmar de forma tão categórica que esse momento que estamos vivendo trata-se de uma crise de percepção. Mas, acreditem, a ideia não é simplificar algo por demais complexo. Estamos sim diante de uma crise sanitária, ambiental, ecológica, econômica e, portanto, sistêmica.
A sensação que temos ao olhar para o cenário diante de nós é colapso. Sim, isso mesmo, estamos colapsando em vários aspectos. Temos o sistema de saúde público que sendo fundamental para a sociedade, não tem sido gerido de forma sustentável.
Para que isso fique mais claro, basta apenas que conversemos com os profissionais da saúde e vemos que já havia uma deficiência de recursos em geral e várias debilidades do sistema, e que com a pandemia as demandas estão ficando suprimidas. O que nos leva a crer que em todo caso, teremos sim, um colapso na saúde pós pandemia.
Em relação ao crescimento econômico, temos uma variação média do crescimento do PIB entre 2010 e 2019 em 1,39%, sendo, portanto, a menor taxa das últimas 12 décadas (EXAME, 2020). No mundo do trabalho, já estava havendo em nível de sistema capitalista um reordenamento das relações, contratos e configurações. Sendo associado a isso, elevação do desemprego tecnológico, aumento das jornadas de trabalho e precarização das condições de trabalho.
Estamos assim, em diversas esferas da vida, nesse momento, com a sensação de que há um mundo tal qual conhecíamos ficando para trás, e vindo com isso muitas incertezas, inseguranças, desafios e oportunidades também. Afinal, não saber o que nos espera pode nos dar a possibilidade de fazermos diferente, com mais altruísmo e pensamento sistêmico.
Temos muito sobre o que discorrer, refletir e agir. Com essa crise sanitária, que como vimos, não é apenas sanitária, temos problemas urgentes que se tornaram ainda mais evidentes, tais como, aumento da jornada de trabalho para as mulheres, desigualdade social que é perceptível no acesso à educação, por exemplo, e que nesse momento demanda acesso a recursos tecnológicos da comunicação, produção alimentar sustentável, inovação e tecnologia, e muito mais.
Vamos prosseguir dialogando? No próximo artigo discorreremos sobre o impacto do isolamento para as mulheres diante do aumento da jornada de trabalho e atividades. Estamos rumo a um mundo que precisaremos construir a partir das ruínas que estão ficando logo atrás de nós.
Zildenice Guedes é professora-doutora em Ciências Sociais pela UFRN
Como é bom fazer uma leitura, com ótima informação e nos leva a refletir. Obrigada professora. Vamos sim, prosseguir o diálogo.
Belíssimo texto Professora Zildenice Guedes, esperemos pois, que a dita humanidade aprenda melhor que essa interação e essa interdependência, pra que aconteça com equilíbrio, razoabilidade e sem sobressaltos que atentem, inclusive a possibilidade de exterminação da especie humana. Depende e muito, do cumprimento diário do contrato social à que estamos vinculados, bem como das nossas análises, posicionamentos e escolhas, mormente quando do sufrágio universal, mais conhecido como voto.
Um baraço
FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
OAB/RN. 7318.
Um texto belíssimo ,palavras sábias e verdadeiras ♥️