domingo - 23/04/2017 - 08:06h

A realidade distorcida nas leis orçamentárias e seus números

Por Gutemberg Dias

A prefeitura de Mossoró enviou para a Câmara Municipal a LDO – Lei de Diretrizes Orçamentárias para que seja apreciada pelo legislativo e, se os vereadores assim quiserem, fazerem as propostas de alteração que acharem necessárias.

A LDO é parte de um processo maior para se organizar o orçamento municipal, vejamos o que diz o portal da Câmara dos Deputados: “compreende as metas e prioridades da administração pública, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento”.

Com base na definição podemos dizer, sem medo de errar, que a LDO vai estabelecer os objetivos e metas para gestão do ano de 2018 e, geralmente, segue as principais linhas estabelecidas no Plano Plurianual (PPA) e as propostas que fazem parte do plano de governo do gestor, claro que estabelecidas de forma técnica para não se ferir o ordenamento jurídico.

A outra parte do orçamento está assentada na LOA – Lei Orçamentária Anual que segundo Erick Resende é “o instrumento de planejamento utilizado pelos governantes para gerenciar as receitas e despesas públicas em cada exercício financeiro. Também conhecida como Lei de Meio, representa elemento fundamental na gestão dos recursos públicos, uma vez que sem ele o administrador não recebe autorização para executar o orçamento”.

Essas duas leis mais o Plano Plurianual Participativo (PPA) definem como os recursos do município podem ser aplicados. Agora será que essas peças jurídicas são bem elaboradas ou, mesmo, utilizadas de forma coerente na administração pública?

Primeiro, é bom lembrar que os orçamentos são de domínio público. Pergunto aos leitores, quanto de vocês tiveram acesso a essas peças? Quantas vezes a prefeitura de forma organizada e clara convidou a sociedade civil para ajudar na formulação dessa leis?

O orçamento participativo seria um caminho, mas não pode ser um arremedo como gestões passadas em Mossoró fizeram. Uma maquiagem para poder publicar nos jornais e blogs que ouviu a população e que a elaboração do orçamento teve a participação popular.

Digo sem pestanejar que as  peças orçamentárias são em sua maioria uma colcha de retalhos e, sobretudo, cópias dos anos anteriores. Pode pegar uma peça orçamentária de 10 anos e comparar com a atual, existem poucas mudanças.

Essa falta de cuidado com a peça orçamentária, em Mossoró, está embasada na falta de uma cultura de planejamento. Primeiro, para o fechamento da LOA as secretarias deveriam apresentar todo um planejamento dos investimentos. Sabe quantas enviam? Nenhuma. Geralmente a SEPLAN – Secretaria do Planejamento monta as planilhas com base no entendimento dela. Segundo, o fechamento deveria ser feito de forma integrada com as demais secretarias, já que os secretários titulares é que irão efetivamente desenvolver o orçamento.

Por essa falta de sinergia, quando o orçamento é aprovado e aberto no inicio do ano, podem observar que o Jornal Oficial do Município – JOM começa a ser carregado com uma enxurrada de remanejamentos. Isso é uma prova cabal que não houve planejamento orçamentário e, a partir desse momento, se inicia o chamado exercício acrobático para que o orçamento dê certo.

Outro ponto que gostaria de trazer nesse artigo é a falta de compreensão do gestor quanto à definição do valor final do orçamento. O que Mossoró vem fazendo ao longo dos anos é aplicando as correções inflacionárias e acrescentando, por vezes, a perspectiva de aumento de arrecadação.

Na realidade, isso está correto em parte. Veja que vendo a série histórica dos orçamentos municipais eles nunca foram menores que o ano anterior, mesmo nos momentos de crises econômicas, salvo o de 2017 que apresentou uma diferença para baixo de algo próximo a R$ 11 milhões.

Essa engenharia de não reduzir os orçamentos, repousa na perspectiva do gestor poder gastar (leia-se investir), ou seja, ele ou sua equipe sabe que não terá arrecadação suficiente no ano seguinte, mas resolve manter um orçamento alto, pois garante ao prefeito a manobra para contratar obras/serviços, mesmo não tendo dinheiro em caixa para os pagamentos. Isso é um dos problemas dos rombos que passam de gestão para gestão.

Vamos exemplificar isso com dados reais. No ano de 2016 o município de Mossoró arrecadou algo próximo a R$ 550 milhões de reais, o orçamento que estava aprovado pela CMM era de R$ 685 milhões, ou seja, houve um frustração na arrecadação de R$ 130 milhões, mas certamente o gestor utilizou todo o orçamento disponível, mesmo não tendo o dinheiro em caixa.

Já o orçamento de 2017 o valor aprovado foi de R$ 674 milhões. Pergunto: por que não houve uma redução, já que houve uma frustração da receita em 2016 e a projeção para 2017 não é muito diferente?

Quando das primeiras reuniões para definição do orçamento de 2016, participei na condição de Secretário de Planejamento. Minha recomendação foi analisar os últimos três períodos e fazer uma projeção para os dois períodos subsequentes, como diz a lei.

Acreditava que o orçamento não poderia ser muito superior a R$ 550 milhões. Não levaram em consideração e não fiquei no governo para lutar por essa certeza.  Esse ano teremos mais uma frustração orçamentária e, consequentemente, se a atual gestora não segurar o contingenciamento, já anunciado por ela, não será muito diferente do seu antecessor.

Infelizmente, nos moldes que o orçamento municipal em Mossoró é elaborado, posso afirmar que ele está mais para uma peça de ficção onde a realidade é distorcida pela vontade do gestor.

Uma coisa que contribui sobremaneira para que o orçamento não tenha a devida função é a falta de estrutura da Secretaria Municipal de Planejamento que, desde seu nascedouro, não tem um elenco de pessoal adequado para gestar um orçamento de qualidade e nem condições de coordenar, efetivamente, as gerências avançadas de planejamento e finanças nas demais secretarias. Destaco que  nenhum gestor que passou pelo Palácio da Resistência investiu nessa pasta, inclusive a atual gestora em seus últimos três mandatos e no início do atual.

Por isso, deixo o seguinte questionamento: como queremos ter uma cidade bem planejada se nossos gestores não investem maciçamente para estruturar a Secretaria Municipal de Planejamento?

A prefeita Rosalba Ciarlini (PP) terá três anos e nove meses pela frente. Acredito que nesse espaço de tempo, obviamente, se ela quiser, dará para fazer dessa secretaria seu braço direito. Esse é o caminho que apontei no período em que estive por poucos meses nessa pasta, mas infelizmente não tive acolhido o meu apelo.

Gutemberg Dias é formado em geografia, mestre em recursos naturais e ex-candidato a prefeito de Mossoró.

P.S. Informo ao webleitor que em breve vamos iniciar uma série de artigos discutindo um modelo de gestão pública que possa garantir um lastro para um crescimento ordenado e planejado de nossa querida Mossoró.

Vamos utilizar recursos multimídias para deixar a apresentação bem didática.

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Categoria(s): Administração Pública / Artigo

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