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domingo - 24/01/2016 - 09:04h

A tolice idólatra

Por François Silvestre

Os ídolos não têm culpa da tolice alheia. Os mitômanos apenas revelam a angústia da sua insuportável pequenez.

Quando esse fenômeno tão comum, que parece natural, atinge o campo das artes, o mal passa despercebido. Mesmo assim, não raramente, até nessa seara ocorrem tragédias por conta da idolatria.

Seja pela inveja que o ídolo atrai ou por outra morbidez de comportamento, sem razoável explicação. Caso dos assassinatos de cantores dessa babaquice de ostentação ou de casos universalmente rumorosos, exemplo da morte de John Lennon.

Essa doença não possui diagnóstico oficial. Nem consta da farmacopeia. É um típico processo psicossocial, de natureza coletiva, que vai da admiração ao fanatismo. E no meio dessas duas pontas abrigam-se inúmeras configurações.

Chega-se à infantilidade ao ponto de alguém instruído lamentar não ter conhecido bem o ídolo venerado após sua morte. Como se pedisse desculpas por não ter sido tão bobo quanto a bobagem geral. E aí enumera outros ídolos, numa indisfarçada compensação.

A idolatria é uma doença que não escolhe culturas nem distingue instrução. É uma espécie de catarse coletiva, onde o anonimato se compensa na visibilidade do idolatrado.

É a sublimação da bobagem. A marca da pré-humanidade, intervalo entre o ancestral microcefálico e o futuro ser humano de cérebro desenvolvido. Esse ser humano, pós pré-humanidade, ainda aparece de forma excepcional.

Sócrates, Cristo, Marx, Gandhi, Newton, Einstein são exemplos de humanos do pós Pré-humanidade. Há outros, principalmente nas artes; uns quanto outros nem tanto.

Porém, nenhum dos citados precisa da idolatria para registrar sua grandeza. Eles próprios não se admiram. Não são seguidores de si mesmos.

Cada geração tem seu código, ensinou Paulo Francis. E todas elas cultivam seus ídolos. Uns sensatos, outros malucos. Uns que nenhum mal produzem e outros que causam destruição. Os tipos são tão notórios que dispensam exemplificação.

As gerações de ontem tiveram ídolos na arte e na luta. Foi o “tempo de guerra, sem sol, da comida na batalha”…como disse Brecht. Que iam de Guevara a Cohn-Bendit. Dos Beatles aos Rolling Stones.

Os ídolos individuais; de James Dean a Elvis Presley. Os ídolos políticos; de Perón a Vargas. Pra não falar na idolatria sangrenta de Hitler e Mussolini. A idolatria é a senilidade da idade teórica.

O movimento Beatnik, de Jack Kerouac a Allen Ginsberg. “Eu vi as melhores mentes da minha geração destruídas pela loucura”, disse Ginsberg. E daí em diante a palavra loucura saiu do nosocômio para o mundo da criatividade artística.

“O Apanhador no Campo de Centeio”, que nada tem de colheita nem de agricultura, cuida do apanhar disperso da linguagem aparentemente sem nexo, com que Salinger cospe na face infantil dos idólatras.

Té mais.

François Silvestre é escritor

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. naide maria rosado de souza diz:

    Beleza de Artigo. Dói-me dizer que o ancestral microcefálico está voltando. Volta e encontra acolhida em governos despreparados e irresponsáveis, em povo desavisado ou não esclarecido. Volta a Microcefalia, atingindo fetos no útero materno. Seja qual o vetor, o agente dessa desgraça, dormem os governos em berços esplêndidos, ocupando o lugar de crianças que mereciam ter nascido saudáveis.

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