segunda-feira - 13/10/2025 - 19:20h
Despedida

Ao mestre José Oto, com carinho…

José Oto Santana tinha 91 anos de idade (Foto: reprodução de rede social)

José Oto Santana tinha 91 anos de idade (Foto: reprodução de rede social)

Por Marcos Araújo

Hoje, Mossoró se veste de luto e reverência. Despede-se não apenas de um advogado, mas de uma instituição viva da advocacia potiguar: o inesquecível Dr. José Oto Santana, decano, mestre e referência para todos nós.

Fui seu aluno no quinquênio de 1983 a 1988; depois de formado em Direito, seu eventual contendor profissional em muitos processos; e, ao longo da vida, fundamentalmente, seu amigo e admirador. Relembro com carinho não só as suas aulas e os seus exemplos inusuais, mas as conversas hilárias ao longo dos nossos encontros.

Titular da OAB de nº 16-B (o 16º advogado com inscrição suplementar no RN), teve escritório por mais de cinquenta anos na rua Almeida Castro nº 39, nos fundos do Cine Teatro Cid. Sua prática profissional combinava bom senso, coragem, técnica e humanidade. Havia nele algo que transcendia a toga e os códigos: um espírito leve, um humor fino e generoso, capaz de desarmar tensões e transformar embates em aprendizado. Mesmo nas situações mais complexas — em audiências, em sala de aula ou em conversas entre colegas — José Oto encontrava um modo espirituoso de iluminar o ambiente, arrancando sorrisos sem jamais perder a compostura.

De banqueiro rico a Auditor Fiscal do Estado do Ceará como salvaguarda financeira, para depois vir a advocacia, “Zé Oto” gostava de contar, sem mágoas ou tristeza, os seus desafios existenciais. Ria das vaidades humanas com aquela ironia doce dos sábios que sabem que a vida é breve demais para ser levada tão a sério.  Seu bom humor era a prova de que a inteligência e a alegria, quando caminham juntas, também são virtudes jurídicas.

Contava muitas histórias e estórias, sendo essas últimas apenas para divertir o ambiente… Gostava ele de contar – e isso é um fato! – de ter sido o primeiro advogado em solo mossoroense a ter a liberdade de atuação. Quando ele aqui chegou, nos anos 70, não se processava determinados sobrenomes famosos da cidade. Nessa época, em um tempo em que ser advogado era um terreno tátil entre o ofício e a vocação, foi ele precursor da cobrança profissional de honorários. Enquanto os advogados da época recebiam prendas como animais e legumes por paga dos seus trabalhos, teve ele a coragem e lucidez em estabelecer que honorários não são concessão, mas reconhecimento justo do trabalho intelectual e moral que a advocacia exige.

Era uma espécie de Robin Hood na cobrança de honorários: dos ricos, cobrava bem; aos pobres prestava favores. Nas salas de aula, unia a precisão prática de um jurista à paixão de um humanista. Ensinava o processo não com o ritualismo estéril das teorias complexas, mas apenas como “instrumento de realização da justiça”, lembrando sempre o ensinamento de Piero Calamandrei: “O processo é o caminho do direito em busca da verdade.”

Suas petições eram breves e objetivas. Sem juridiquês. Gostava de dizer sempre: “Direito é lógica e bom senso!” Aliava à objetividade de um prático à consistência de quem “conhecia o caminho das pedras”. Era um frasista irreparável. São muitas as suas “pérolas”, como: “quanto mais cabra, mais cabrito”; “tudo certo? a casa quieta e o povo dentro!”.

Homem de hábitos discretos e convicções firmes, José Oto fez da assertividade e da amizade sua marca. Apesar de ser um “construtor de pontes” e cultivar amizades em dois Estados (CE e RN), quis terminar seus dias na idílica Tibau, arrastando para o seu alpendre os vizinhos para horas contínuas de gargalhada.

“A vida só tem sentido quando deixa marcas no caminho dos outros”, dizia Miguel Reale.  José Oto deixou marcas profundas em todos com quem conviveu, seja na advocacia, no ensino, nas instituições, nos negócios….

Na moldura do tempo, ficará sua imagem de advogado risonho, de fala ponderada e olhar firme, sempre cercado de ideias e de um sorriso pronto.  Disse o escritor Victor Hugo que “Morrer não é nada; horrível é não viver”. E José Oto viveu — intensamente, plenamente. Viveu como quem sabe que a morte não é o fim, mas coroamento; que a biografia dos justos não se apaga, apenas muda de lugar — sai do tempo e entra na memória.

Hoje, Mossoró chora, mas agradece. Chora o amigo, o mestre, o colega.
E agradece o legado: a forma como ensinou, o respeito que conquistou, a leveza com que soube viver, e a coragem com que soube partir.

José Oto Santana parte, mas não se ausenta. Ele é, e continuará sendo, parte viva da história afetiva da advocacia mossoroense. Descanse em paz, Mestre José Oto Santana.

A advocacia potiguar e a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte reverenciam seu nome e sua memória. Pois, como dizia Rui Barbosa, “Maior que a dor de ter perdido um justo, é o orgulho de ter convivido com ele.” 

Marcos Araújo, um ex-aluno e eterno amigo.

*Velório de José Oto Santana, 91, acontece no Centro de Velório Sempre, Sala 02, em Mossoró, com cerimônia Religiosa às 20h, no mesmo local.

Nessa terça-feira (14), será iniciado cortejo até Fortaleza-CE às 7 horas. Às 14h, será cremado no Crematório Fortaleza.

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Categoria(s): Gerais

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