Por Bruno Ernesto
Um dos pontos esquecidos sobre o chamado “período do banditismo”, que eclodiu nos sertões profundos do Nordeste brasileiro no final do século XIX e que se intensificou até a década de 1940, foi a paradoxal relação entre o santo e o profano.
O protoreligiosismo sertanejo, com suas rezas incisivas, especialmente de proteção e fechamento do corpo, com alguma pouca incursão no sincretismo religioso, mas acentuada correlação entre a injustiça terrena e a salvação divina, foi a gênese do que se renova hoje no Brasil, sob outra tutela e cosmovisão, porém com mesmo proselitismo e interesses econômicos, sempre subjacentes.
Religiosidade nos grotões do sertão Nordestino sempre foi um fenômeno endêmico, peculiar, e de uma mistura mística difícil de compreender, e que deixou marcas indeléveis.
Nos tempos revoltosos do sertão, a mão que pedia a bênção e debulhava o terço, era a mesma que erguia o punhal, puxava o gatilho ou apertava a carne.
A religiosidade primitiva, se assim podemos dizer, guarda inúmeras facetas. O perdão nem sempre se conquista com a fé.
Lembro muito bem a colocação do escritor Honório de Medeiros, autor da importante obra “Histórias de Cangaceiros e Coronéis”, que destaca que o coronelismo foi o braço forte desse movimento, com nomes que até hoje reverberam entre nós, porém com pouca correlação de poder econômico e paralelo daquele tempo, como Veras, Maias, Saldanhas e tantos outros.
A religiosidade sempre foi esteio do povo, especialmente no meio da miséria econômica. Que o diga Cícero Romão.
O poder da palavra é exponencialmente maior do que o da força bruta, ainda que essa também lhe sirva.
No caldeirão nordestino daquele tempo, podia se dizer que, ao redor do buraco, tudo é beira.
Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor
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