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domingo - 05/03/2023 - 11:34h

As joias apreendidas de Michelle Bolsonaro

Por Ney Lopes

Bolsonaro e o príncipe Mohammed bin Salman em Osaka, no Japão (Foto: Web)

Bolsonaro e o príncipe Mohammed bin Salman em Osaka, no Japão (Foto: Web)

O princípio ético do editor desse blog se resume na expressão: “informação com opinião”.

Procura-se a verdade dos fatos e o que diz a lei.

O exemplo é que, no atual momento de radicalização política no país, são comuns as reclamações (algumas violentas) de bolsonaristas e lulistas. inconformados com certas análises publicadas.

A tarefa do jornalismo independente gera essas incompreensões e mal-entendidos.

Porém, é um ônus necessário à cidadania.

O tema polêmico de hoje são as joias apreendidas de Michelle Bolsonaro.

A mídia estampa em manchetes terem sido apreendidas pela RF joias da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro, no valor de R$ 16.5 milhões e que o então presidente Bolsonaro tentou várias vezes reavê-las.

A impressão que dá à primeira vista é que foi uma tentativa recente de contrabando, evitada pela Receita Federal.

Independente de acusar ou defender o ex-presidente é preciso dizer, que não foi isto que aconteceu, “salvo elementos novos conhecidos, após essa análise”.

O fato ocorreu há mais de três anos

Ao saber que as joias haviam sido apreendidas, a presidência da República tornou o caso público.

Vejamos.

Em 26 de outubro de 2020, um funcionário da presidência da República, em missão oficial procedente da Arábia Saudita, teve a sua bagagem revistada pela alfandega, que constatou as joias citadas.

O servidor declarou que era um presente do governo da Arábia Saudita ao presidente brasileiro e esposa.

A RF não aceitou a explicação e reteve os bens.

Iniciou-se um processo administrativo fiscal (2020), tendo como objeto o material apreendido.

A presidência da República não se omitiu e informou à alfândega, alegando que se tratava de um presente do governo da Arábia Saudita para Michelle Bolsonaro.

Mesmo assim, a Receita não liberou.

Vê-se que não se trata de joias contrabandeadas e agora pilhadas pelo atual governo, mas – como explicado desde o início –, presentes do governo da Arábia Saudita.

A Presidência tentou reaver publicamente o material, em pelo menos quatro ou mais ocasiões.

Próximo ao término do mandato, em 28 de dezembro de 2021, o presidente Bolsonaro enviou novo ofício ao gabinete da Receita Federal para solicitar que as pedras preciosas fossem destinadas à Presidência da República, em atendimento ao ofício 736/2022, da “Ajudância de Ordens do Gabinete Pessoal do Presidente da República”.

Não houve resposta.

Não é a primeira vez, que dúvidas desse mesmo tipo são levantadas pela imprensa.

Aconteceu nos governos FHC, Lula e Dilma.

Cabe uma “análise jurídica” sucinta e isenta do tema relativo a propriedade de documentos e presentes, recebidos pelos ex-presidentes da República e acompanhantes.

A Resolução nº 3 da Comissão de Ética Pública (CEP) tem por objetivo dar efetividade ao artigo 9º do Código de Conduta da Alta Administração Federal que veda à autoridade pública por ele abrangida, como regra geral, a aceitação de presentes.

O Tribunal de Contas da União já apreciou a matéria e determinou que fossem incorporados ao patrimônio da União todos os documentos e presentes recebidos pelos ex-presidentes da República Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, a partir da publicação do Decreto 4.344/2002

Ficou claro que o recebimento de presente só é permitido em duas hipóteses:

a) quando o ofertante for autoridade estrangeira, nos casos protocolares, ou em razão do exercício de funções diplomáticas (item 2, inciso II);

b) por motivo de parentesco ou amizade (item 2, inciso I), desde que o respectivo custo seja coberto pelo próprio parente ou amigo, e não por pessoa física ou entidade que tenha interesse em decisão da autoridade.

Nota-se não ser demasia considerar, que o ofertante do presente a Michelle Bolsonaro foi uma autoridade estrangeira e ela estava numa viagem protocolar, aplicando-se o item 2, inciso II transcrito, que permite o recebimento de presentes.

Sabe-se que o acervo de Fernando Henrique está guardado na sede do Instituto FHC, em SP.

Em relação ao período presidencial, há cerca de 1.500 objetos, incluindo presentes dados ao tucano por cidadãos e autoridades nacionais e estrangeiras.

Em função da decisão do TCU, Lula e Dilma devolveram presentes recebidos, porém não sua na totalidade.

Entre os presentes oferecidos à Lula, quando presidente, incluem-se   artefatos de joalheria de alto valor, como uma adaga em ouro amarelo e branco – cravejada com pedras preciosas -presenteado pelo ex-presidente líbio Muammar Kadaffi.

Também há um punhal  de ouro cravejado com pedras preciosas recebido do rei Mohammed, de Marrocos.

Estátua de Camelos em ouro maciço e cristal dos Emirados Árabes, um Jade (réplica da coroa) em ouro do presidente da Coréia do Sul, um conjunto de taças de prata doado pela Rainha Elizabeth da Inglaterra.

A verdade é que o episódio envolvendo o casal Bolsonaro na RF deverá provocar uma regulamentação mais objetiva, do que pode e do que não pode, em relação a presentes ofertados a autoridades, em atos oficiais.

Em fidelidade a verdade e aos fatos, não houve neste caso de Michelle Bolsonaro tentativa de trazer ilegalmente para o país o conjunto de joias no valor de R$ 16.5 mi, que, até prova em contrário,  lhe foi presenteado pela Arábia Saudita.

Como já dito, salvo fato novo, ainda não conhecido, trata-se de um ato administrativo fiscal, que está sendo questionado em processo já instaurado, ou seja, se o “presente” saudita será ou não tributado.

Desde a apreensão das joias pela RF em 2020, existe um contraditório escrito e público, aguardando a decisão final.

Passaram-se mais de três anos, como já dito.

Portanto, não houve má fé, ou ocultação dolosa da apreensão feita pela alfandega.

O presidente Lula sofreu essa acusação no passado, até porque em seus dois mandatos como presidente, de 2003 a 2010, recebeu centenas de presentes.

A presidente Dilma também.

Uma comissão identificou, segundo o “Poder 360”, 176 itens na posse de Lula, dos quais 21 foram levados à Brasília para o acervo público.

O fato que envolve a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro, realmente deve ser esclarecido, ninguém se opõe.

Porém,  para caracterizá-lo como crime, são necessárias provas e indícios concretos, que contrariem a versão oficial do presente ofertado pelos árabes.

Até o momento, o que existe é um procedimento administrativo fiscal instaurado para decidir se os bens serão ou não taxados.

Sem a existência de uma base fática e legal consistentes, criminalizar por antecipação significa negativa ao devido processo legal, o único meio de fixar responsabilidades, se houver.

Assim recomendam o direito e a justiça.

Ney Lopes é jornalista, advogado e ex-deputado federal

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. Egidio Mascena diz:

    Muito bom os argumentos do Jurista e Ex-Dep. Federal Dr. Ney Lopes, porém, eu continuo crendo que: não existe alguém dar um presente de 16 milhões. Simplesmente, só pelo olhos azuis da Michele.. As jóias foram os meios usados para camufla os negociados.

  2. François Silvestre diz:

    Tudo bem, meu caro amigo Ney Lopes. Tudo muito bem explicado pra não se criminalizar sem o devido processo legal. Até porque “devido” aí não é adjetivo, é particípio do verbo “dever”. O Estado “deve” ao individuo um processo legal para investigá-lo, processá-lo, condená-lo ou absolvê-lo. Tudo bem. Minha pergunta é elementar, como diria o famoso detetive ao seu amigo médico, meu Caro Ney, pra que danado alguma autoridade de qualquer país faz doação de Brincos e Colares para uma República amiga? Foi doação para a República do Brasil? Pra que danado a República do Brasil precisa de Brincos e Colares? De Diamantes, ainda por cima. Isso é uma República ou uma Dama aos serviços do príncipe “doador”? Só isso, meu caro Ney, me deixou perplexo. No resto, como sempre, você foi craque.

    • Rocha Neto diz:

      Concordo plenamente com o comentário em tela feito pelo mestre François. Nada à acrescentar.
      Só que o assunto tá enojando os que querem um Brasil sério e com tantos outros problemas à serem resolvidos inerentes a sua economia, ação social, justiça, segurança e o escambau, e os donos da verdade que estão abrigados em ministérios e outros órgãos dão prioridade ao um caso policial.
      Gente, infelizmente Lula tá fazendo um governo totalmente diferente dos anteriores vividos por ele.
      Estamos com um governo que ainda não largou o espelho retrovisor, e aos poucos estar levando o nosso país ao caos, infelizmente o Lulinha paz e amor tomou doril.
      E nós vamos pagar a fatura.
      Aguardem!!!

  3. Gerson Sena diz:

    Nessa análise FALTA UM PEDAÇO: Se era pública, por que o Ministro colocou as peças na bolsa de um assessor? Por que não o Ministro a conduziu com termo declaratório público? Por que a Michelle Bolsonaro diz agora que desconhecia a existência das peças como presente para a Presidência e/ou para o Estado brasileiro? Falta contar mais Amigo… Conte outra. Ou conte de outra maneira. A sua análise tá faltando um pedaço. Bolsonaro tentou 8 vezes reaver as peças de maneira direta e camuflada, não declarada

  4. FRANSUELDO VIEIRA DE ARAUJO diz:

    Como sempre, o dito jurista neo-liberal Ney lopes de souza, tenta através de uma infinda à lá Rolando Lero, explicação técnico/jurídica, quando dissimuladamente tenta passar panos às pre claras tentativa de descaminhos, peculatos e corrupções da honesta familicia Bolsonaro.

    Caso não se trate de um débil mental, até uma criança de 05 (cinco) anos, depreende a real intenção da burla legal de parte da familicia. Especialmente quando por varias vezes seguidas (TUDO DOCUMENTADO), o staff do Presidente Genocida tenta liberar a fórceps e através de carteiradas e trafico de influencias, sobreditas joias, joias essas, as quais se realmente fossem direcionadas ao patrimônio publico da união e (ou) da Presidência da República.

    Para tanto, as próprias normas legais e regras insertas no âmbito do funcionamento da Receita Federal, impõe um prazo de seis meses para que a própria Receita federal delibere a esse espeito e, normalmente faça chegar à União r. presentes, quando estes são direcionados como presentes de Estados Amigos.

    Sabe-se que, r. joias chegaram ao Aeroporto de Viracopos (SP), em meados de Agosto do ano de 2021, portanto, com tempo suficiente , para que as regras ínsitas à Receitas Federal, fossem devidamente cumpridas , sem que a familicia Bolsonaro tentasse pratica escambos, propinas, peculados, descaminhos e moambas, tão afeitas á história criminosa história dos marginais Bolsonarianos.

    O mais, conforme se verifica, são tentativas medíocres tentativas de passar panos aos marginais do antigo governo, cujo chefe Genocida e Marginal atualmente se encontra fugitivo no paraíso da Extrema Direita, made USA, donde pretende, quem sabe se transformar num transfuga, à partir da sua inegibilidade, bem como das inúmeras condenações criminais que estão no horizonte do sistema punitivo, inclusive, do Tribunal Penal Internacional, deveras, não tão distante.

    Por último Senhores Bolsonarentos, por favor, acordem desse estado de esquizofrenia, alienação, transe, estupidez, cumplicidade com o Genocida e sua trupe e até de má fé…!!!

    Um baraço

    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO
    OAB/RN. 7318.

  5. Rui Nascimento diz:

    Esse texto é um verdadeiro ‘me engana que eu gosto’!

  6. Wendell Stewart da Costa Silva diz:

    Não é mais Milcheque, agora é Mil – joias.

  7. Alcimar Luiz Callegari diz:

    Esqueceu-se de dizer que as joias estavam ESCONDIDAS dentro de uma miniatura de cavalo. Assim falou falou falou sem nexo. Foi contrabando com uso de autoridades como mula.

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