Por Paulo Mendes Campos
Pelo pés das goiabeiras,
pelo braços das mangueiras,
pelas ervas fratricidas,
pelas pimentas ardidas,
fui me aflorando.
Pelos girassóis que comem
giestas de sol e somem,
por marias-sem-vergonha,
dos entretons de quem sonha
fui te aspirando.
Por surpresas balsaminas,
entre as ferrugens de Minas,
por tantas voltas lunárias,
tantas manhãs cineárias,
fui te esperando.
Por miosótis lacustres,
por teus cântaros ilustres,
pelos súbitos espantos
de teus olhos agapantos,
fui te encontrando.
Pelas estampas arcanas
do amor das flores humanas,
pelas legendas candentes
que trazemos nas sementes,
fui te avivando.
Me evadindo das molduras,
de minhas albas escuras,
pelas tuas sensitivas,
açucenas, sempre-vivas,
fui te virando.
Pela rosa e o resedá,
pelo trevo que não há,
pela torta linha reta
da cravina do poeta,
fui te levando.
Pelas frestas das lianas
de tuas crespas pestanas,
pela trança rebelada
sobre o paredão do nada,
fui te enredando.
Pelas braçadas de malvas,
pelas assembléias alvas
de teus dentes comovidos
pelo caule dos gemidos
fui te enflorando.
Pelas fímbrias de teu húmus,
pelos reclames dos sumos,
sobre as umbelas pequenas
de tuas tensas verbenas,
fui me plantando.
Por tuas arestas góticas,
pelas orquídeas eróticas,
por tuas hastes ossudas,
pelas ânforas carnudas,
fui te escalando.
Por teus pistilos eretos,
por teus acúleos secretos,
pelas úsneas clandestinas
das virilhas de boninas,
fui me criando.
Pelos favores mordentes
das ogivas redolentes,
pelo sereno das zínias,
pelos lábios de glicínias,
fui te sugando.
Pelas tardes de perfil,
pelos pasmados de abril,
pelos parques do que somos,
com seus bruscos cinamomos,
fui me espaçando.
Pelas violas do fim,
nas esquinas do jasmim,
pela chama dos encantos
de fugazes amarantos,
fui me apagando.
Afetando ares e mares
pelas mimosas vulgares
pelos fungos do meu mal,
do teu reino vegetal
fui me afastando.
Pelas gloxínias vivazes,
com seus labelos vorazes,
pelo flor que desata,
pela lélia purpurata,
fui me arrastando.
Pelas papoulas da cama,
que vão fumando quem ama,
pelas dúvidas rasteiras
de volúveis trepadeiras
fui te deixando.
Pelas brenhas, pelas damas
de uma noite, pelos dramas
das raízes retorcidas,
pelas sultanas cuspidas,
fui te olvidando.
Pelas atonalidades
das perpétuas, das saudades,
pelos goivos do meu peito,
pela luz do amor perfeito,
vou te buscando.
Paulo Mendes Campos (1922-1991) Foi poeta, cronista, jornalista e tradutor
Depois de ler a inteligente crônica de Rubem Braga, bater de frente com esta poesia do Paulo Mendes Campos…
Palavras para mim desconhecidas até hoje e que estão nesta poesia:
Giestas, entretons, balsaminas, cineárias, miosótis, agapantos, resedá, lianas, ânforas, pistilos, acúleos, úsneas, boninas, zínias, glicínias, cinamomos, gloxínias, labelos, goivos.
Confesso que desconheço o significado de todas estas palavras.
E não me animei a ir ao dicionário em busca do que elas representam. Até porque jamais irei escrever um texto usando CINAMOMOS, BALSAMINAS GIETAS e outras menos votadas.
Se Rubem Braga tivesse lido esta poesia certamente sentiria o mesmo que eu estou sentindo agora.
O que causa estranheza é que as crônicas do Paulo Mendes Campos são agradáveis de ler.
Não quis o genial Paulo Mendes Campos, num jogo de palavras criticar os “poetas” que escrevem o que chamam de poesia de uma forma mais do que rebuscada?
E conseguiu.
O que nós encontramos de “poetas” assim…
Poeta?…
Ou Poeta foi o Vinícius de Moraes que escreveu:
Eu sem você não tenho porquê
Porque sem você não sei nem chorar
Sou chama sem luz
Jardim sem luar
Luar sem amor
Amor sem se dar.
Eu sem você sou só desamor
Um barco sem mar
Um campo sem flor
Tristeza que vai
Tristeza que vem
Sem você, meu amor, eu não sou ninguém.
Ai, que saudade
Que vontade de ver renascer nossa vida
Volta, querida
Os teus braços precisam dos meus
Meus abraços precisam dos teus.
Estou tão sozinho
Tenho os olhos cansados de olhar para o além
Vem ver a vida sem você meu amor,
eu não sou ninguém
////
Alguém teve dificuldade para entender uma só palavra desta POESIA?
Isto sim, isto é poesia.