A cassação – até agora – de oito prefeitos eleitos em 2008 no Rio Grande do Norte, sob denúncia de compra de votos, expõe uma realidade crescente e comum: cada vez mais a eleição pelo voto se transfere para as mãos do Judiciário.
Aos poucos passamos a ter a politização da Justiça e a judicialização da política, numa mistura de papéis ou troca de funções. Ou seja, mesmo que a lei não preveja, vários municípios com menos de 200 mil eleitores têm um simulacro de “segundo turno”.
É travado nos tribunais, longe da ação direta do povo nas urnas.
Esse protagonismo do Judiciário tem assustado a classe política e provocado algumas escaramuças entre os três poderes. Os entrechoques ocorrem com considerável regularidade, sobretudo porque algumas decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Supremo Tribunal Federal (STF) têm contrariado certos interesses.
Foi assim com a decisão do TSE de reduzir o número de vereadores em centenas de municípios e na norma da verticalização partidária. Também causou mal-estar a legislação sobre a fidelidade partidária.
Ano passado, o STF tomou posição sobre o óbvio, mesmo com tudo plasmado na Constituição, com os princípios da “moralidade” e da “impessoalidade”: empregar parente sem concurso público, na esfera estatal, é nepotismo.
Até então a esperteza via uma suposta lacuna constitucional para justificar essa excrescência.
Por que mais e mais eleições terminam sendo decididas nos tribunais?
Existem algumas explicações, assim entendo. Nada que na prática signifique uma intervenção do Judiciário eleitoral na liberdade democrática do voto.
Primeiro, a Justiça tem agido sempre por ser provocada. Por vezes é o Ministério Público – órgão com o dever de zelar a lei e os interesses do cidadão – que intervém. Noutros casos, uma das partes envolvidas no conflito eleitoral opta por pleitear a arbitragem do judicante, por se sentir “roubada”.
Portanto, tudo legítimo.
O que me parece ser o maior sinalizador dessa “onda” de “segundo turno”, é um conjunto de fatores que se interligam. Um deles é a crença subalterna de que é possível “tomar” a eleição de um adversário potencialmente mais forte, por essa via. Basta pegá-lo ou levá-lo a um deslize grave, forjando flagrantes.
Afoitos
Há ainda o recrudescimento de normas e fiscalização no combate ao toma-lá-dá-cá. Acrescente-se o surgimento e popularização de modernos instrumentos à arapongagem (gravadores de áudio, vídeos e fotos) que ajudam na produção de provas. Com a nanotecnologia em alta, todo mundo é um pouco “007” nas campanhas.
É preciso admitir noutro ângulo dessa abordagem, que o cidadão está mais esclarecido e pronto a “melar” resultados fraudulentos. Os mais afoitos e inconscientes, terminam fazendo papel inverso: toldam o que está limpo.
Nas mais recentes eleições, por todo o Brasil, aos poucos foi sendo eclipsada a figura do “marqueteiro”. Eles vendiam milagres, eram gurus e alquimistas na fabricação de vitórias. Exagero. Nada é mais sólido do que um bom candidato.
A nova panacéia ou falso rubi nas campanhas eleitorais atende pela identificação de “assessor jurídico”. Uns, éticos. Outros, nem tanto.
Do dia para a noite prosperam escritórios modelo “Bombril”, com mil e uma utilidades. O que menos se oferta é o direito. Alguns serpenteiam como corretores de sentença: os autos, jurisprudência, doutrina ou eventual capacidade argumentativa do operador do direito são secundários.
Mesmo com distorções aqui e acolá, não há motivos para descrença. Não se evidencia uma espécie de “República dos Juízes”. Avançamos, apesar de algumas chagas.
O tempo do mapismo, da brejeira, curral eleitoral, eleitor fantasma, compra de votos e outras mazelas não passou ainda. Teima em resistir ao banimento.
As cassações e novos pleitos indicam que existe uma fissura em formação. Seu aprofundamento é traumático, porém necessário, para separar o ontem pernicioso e doentio de um futuro mais límpido.
Democracia plena não existe. É uma utopia filosófico-política. Entretanto não é fantasioso se acreditar na seleção natural dos melhores, pelo princípio da livre escolha pelo voto. Outras civilizações chegaram a esse estágio, após longo tempo e muitas crises. Nós podemos também.























amigo: a série de cassações de mandatos é o reflexo da cultura política de nosso país. A compra de votos, aliada a uma inconsciência democrática do eleitor, tem sido a tônica de nossas eleições desde antanho. Hodiernamente, a Justiça Eleitoral tem tratado com rigor atos que malferem a incipiente democracia brasileira. Tenho dito em minhas aulas na UnP de Direito Eleitoral, que este ramo do Direito é bastante promissor, porquanto quase todos os mandatos são discutidos judicialmente. Bom papo aquele em Areia Branca hein? Abraço!