Por Bruno Ernesto
Não é de hoje que há determinados temas que devem ser abordados de forma cautelosa, tais como futebol, política e religião.
Como é natural, cada pessoa tem suas preferências, convicções e posicionamentos ideológicos. Algo que beira a cosmovisão, ou seja, a forma que determinado indivíduo enxerga o mundo.
Essa tríade tem um potencial enorme para desencadear sentimentos antagônicos, beirando o radicalismo e, em certas ocasiões, o extremismo.
Sou um profundo admirador de quem respeita a opinião do outro, embora discordando do ponto de vista de seu interlocutor, afinal, todos nós temos o direito de acreditar em algo e ninguém tem o direito de impor ideias, opiniões e crenças a ninguém. E quando impõe, a história tem inúmeros registros de verdadeiras revoluções mundo afora.
Decerto que as questões relacionadas à convicção e práticas religiosas sempre enfrentaram e continuam enfrentando, um grande desafio.
Atualmente, é corrente o debate e constatação de que as designações religiosas vêm, cada vez mais, perdendo espaço em meio a debandada de fieis e o surgimento de uma geração pouco afeita às práticas religiosas, embora não se julguem ateus.
Há quem procure abordar temas espinhosos, do ponto de vista artístico e literário, de modo a lançar uma análise ou mostrá-lo sob uma outra perspectiva, diferente daquela que é comum de observarmos.
Veja, por exemplo, que a sátira é o estilo literário mais utilizado para fazer esse tipo de abordagem, que nada mais é, ao final, que uma maneira de se fazer uma crítica aos costumes sociais em forma de ironia e sarcasmo, beirando por vezes a comédia, mas que, no fundo, aborda um tema espinhoso e delicado.
Esse estilo remonta à Grécia antiga, e com as redes sociais, explodiu na forma de memes e pequenos vídeos e que, certamente, você já deve ter repassado para alguém conhecido. Nem que tenha sido na forma de uma figurinha de WhatsApp.
No Brasil, um clássico desse estilo é o Auto da Compadecida, de autoria do paraibano Ariano Suassuna, que, apesar de ter sido um homem bastante religioso, não deixou de lançar mão desse estilo literário, quando condicionou o recebimento da herança da cadela ao seu enterro com exéquias em latim.
Na década de 1960, surgiu o grupo de comediantes inglês chamado Monty Python, que produziu uma série de vídeos e filmes, abordando temas sensíveis, como filosofia e religão, dentre os quais, o filme “A Vida de Brian” (1979), uma sátira bastante ácida sobre o cristianismo, na qual o jovem Brian, nascido no mesmo local e período de Jesus Cristo, foi confundido com o verdadeiro messias, e que na época de seu lançamento gerou grande repercussão e reações dos cristãos.
Para quem se interessar e quiser assistir ao filme, o mesmo está disponível na íntegra no YouTube na versão dublada do estúdio Maga, que pode ser acessado por este link: //www.youtube.com/watch?v=Cv3qr1yD0Ao&t=76s .
A intolerância religiosa que se espalha nas redes sociais hoje, e que antes parecia bem distante de nós e de pessoas do nosso convívio, em verdade, apenas deixou de ser velada, passando a ser tangível, de certa forma, o que tem causando bastante espanto, independentemente da religião que se professe, ou mesmo naqueles que sequer são adeptos a alguma prática religiosa ou mesmo num ateu.
Um episódio que gerou bastante repercussão em Mossoró, ocorreu no ano de 1886, três anos após o Ministro evangelista norte-americano, Dr. De Lacy Wandlaw, primeiro missionário protestante celebrar um culto na cidade, ter retornado à Mossoró.
Após a primeira celebração protestante em Mossoró, no ano de 1883, com o casamento de Ricardo Vieira do Couto com Maria Tereza Davina de Jesus, em 1885, efetivou-se instalação da congregação religiosa da igreja presbiteriana na cidade, sob o comando de João Mendes, que passou a ser hostilizado pelos locais, chegando, inclusive, a ponto de o telhado da casa do ministro evangelista, por diversas vezes, ter sido apedrejado por radicais, fanáticos, desocupados e até por ateus.
O ponto máximo da intolerância, se deu em 1886, como acima dito, quando o evangelista norte-americano, Dr. De Lacy Wandlaw, tendo retornado à cidade de Mossoró para assumir a igreja presbiteriana local, também passou a ser hostilizado, tal qual seu antecessor.
Diante da situação, formou-se um grupo que, em resposta às hostilidades, aguardaram mais um ataque ao telhado da casa de Dr. De Lacy, para revidá-lo.
Entretanto, ao invés de pedras, revidaram com disparos de armas de fogo, e mesmo que o embate daquele dia não tenha deixado ninguém de corpo ferido, a confusão pôs fim às hostilidades crescentes, reinando, até hoje, a concórdia em Mossoró, ficando esse infeliz episódio apenas nos registros históricos.
Bruno Ernesto é professor, advogado e escritor
Excelente, amigo!
Mais uma crônica para a gente “gostar de ler”, como na famosa coleção “Para gostar de ler”, projeto mais que bem-sucedido da Editora Ática. A coleção, que teve sua estreia com os cronistas Rubem Braga, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Carlos Drummond de Andrade, foi lançada nos anos 1970.
Parabéns!
Abraços.
Obrigado, meu amigo Marcos! Ler é sempre prazeroso e libertador. Inclusive, o Itaú Cultural tem um projeto com esse nome. Adquiri vários livros para meus filhos com ele. Um grande abraço!