Por Marcos Ferreira
Falo de vez em quando com as paredes. Os doutores Roncalli Cunha e Dirceu Lopes, ambos alienistas, talvez se perturbem com isso. Não precisa. No momento em que tal “conversação” acontece, embora eu tenha por resposta apenas o silêncio, estou de posse de minhas faculdades mentais. São ensejos em que não me encontro irritado, deprimido ou ansioso. Sinto-me em paz e sem uma excruciante enxaqueca, enfermidade esta que, às vezes, se arrasta ao longo de vários dias.
Embora não digam nada, estou certo de que as paredes me ouvem, sabem dos meus solilóquios, testemunham as minhas ruminações e queixumes, sobretudo nas noites embaixo deste teto que parece as escamas de um peixe de cerâmica. Apesar do silêncio absoluto que me devotam, repito, estou satisfeito. Pois não é todo mundo que consegue estabelecer e usufruir desse tipo de confidência.
Deitado em uma rede aqui na sala, enquanto os remédios não fazem efeito e o sono não vem, digo umas breves palavras como se fosse para sentir que continuo neste mundo. É mais ou menos como testar um microfone, reconhecer o timbre da nossa própria voz. Assim, entre outros pontos, podemos constatar que o coração bate, que o sangue corre nas veias. “Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe”, declarou o escritor irlandês Oscar Wilde.
Agora, todavia, esta minha mensagem ultrapassa os limites desta casa. Isto pelo simples fato de que ora compartilho com vocês esses instantes de introspecção, retraimento e quietude. Penso, enfim, nos amigos e até mesmo nas pessoas que sequer conheço e que possivelmente vão ler esta crônica dominical.
Ergo a vista, imagino ter escutado um ranger de dobradiças. Não é nada. Nenhum barulho ou vulto. Estou, como sempre, sozinho a esta hora da manhã. O cheiro do café que fiz há poucos minutos já impregnou a casa toda. As paredes seguem com o mutismo de costume. Sei, entretanto, que me dão ouvidos.
Marcos Ferreira é escritor
Conversar com as paredes eu faço de forma mental; imagino os diálogos e as possíveis respostas do ouvinte, daí, vou modificando, até ficar melhor de ser entendida. Nesse mundo onde as pessoas estão com pressa em tudo, é difícil encontrar quem tenha paciência em ouvir. Então eu crio meus textos mentais. Já me preparando pra uma conversa difícil. É uma especie de ensaio! Achei interessante essa coisa do “viver e não apenas existir”. Cada um tem interpretação própria! A questão da solidão é algo que se vive mesmo acompanhado(a). Podemos nos sentir sós na multidão; solidão tem mais a ver com o coração; não é cerebral! Como sempre, sua crônica nos impulsiona; nos tira do lugar-comum! É uma aula de estímulo à reflexão! Grata por compartilhar! Tenha uma semana especial! Abraço!
Obrigado, querida amiga Bernadete. Suas palavras têm sempre o condão do estímulo e da generosidade. Seus testemunhos neste espaço são preciosos. Que bom poder contar com sua leitura e opinião. Forte abraço e uma ótima semana.
As vezes é bom ouvir a voz do silêncio. Somente ela diz algo mais que desejamos ouvir.
Bom final de semana, poeta amigo.
Afine os ouvidos!
Prezado poeta Francisco Nolasco, bom dia. Esta sua frase é lapidar: “Às vezes é bom ouvir a voz do silêncio. Somente ela diz algo mais que desejamos ouvir”. Excelente! Obrigado e um forte abraço.
Olá, Marcos!
Bom dia!
Adorei a crônica.
Também mantenho longos diálogos comigo. Não acredito que isso seja de todo mal, acho até salutar! Aliás, desde criança já o fazia. Dava aula para as cadeiras vazias. Costumo questionar minhas próprias ações e o interessante é que respondo a todas elas.
Se isso é um problema padeço dele!
Abraços
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Amiga poetisa Vanda Maria Jacinto, bom dia. Grato pelo comentário tão sensível e enriquecedor. Sobretudo qukando você diz que: “Dava aulas para cadeiras vazias”. É, no mínimo, poético. Forte abraço e uma ótima semana, saúde e paz.
Abraçá – lo, poeticamente. Nobre e ilustre poeta. Saudades de ti.
Amigo poeta Costinha, saudades de você também. Espero sua visita para tomarmos um cafezinho e trocarmos umas ideias. Dê notícias quando estiver em Mossoró. Forte abraço.
Marcos !
As vezes sou chamado de louco por falar sozinho, mas agora tenho um companheiro inseparável que me escuta e me entende, é o gato Cazuza nunca estou sozinho ele sempre me acompanha e me escuta o dia todo.
Prezado Raniele Costa, bom dia. Fico feliz em saber que você também é tutor de um gatinho. Nunca estamos solitários quando contamos com a companhia de um ser adorável como um bichano desses. Desejo tudo de bom a você e ao seu gatinho. Obrigado pela leitura e comentário. Forte abraço.
Bela crônica, digna de Fanz Kafka.
Um abraçaço
Querido Amorim,
Obrigado pelo comentário e carinho de sempre.
Forte abraço.
Venho manifestar gratidão, poeta Dom Marcos, por você ter escrevido e por eu ter podido ler vidas inteiras em uma crônica. Vi João de Isabel, e sua voz clamando no deserto. Já minha avó Sarita advertia que quem dormisse na sala não ficasse com os pés para a porta da casa. Vivi a cultura dos agouros. Senti daqui o cheiro do café, na sala, de minha rede. Ao fim, a perspectiva da física. A fala é energia. Portanto, como diria Toinho de Lavô, se transforma.Valeu! Um abraço!
Prezado Lázaro Amaro, bom dia. Muitíssimo obrigado por seu comentário tão rico em essência, em outros universos e possibilidades existenciais. Um forte abraço e uma feliz semana para você.
Concordo com a dificuldade do diálogo com as paredes, mas me parece que pessoas com capacidade de ouvir, são muito raras, assim, nada de ignorar as paredes e que tenhamos ótimas prosas concretas. Grande abraço.
Meu caro Valdemar Siqueira, saudações. Obrigado pelo sensível e instigante comentário. Como sempre, você é uma fonte de inspiração para seguir com estas cronicas domingueiras. Abraço para você e Bete, saúde e paz.
Olá, amigo Marcos!
Boa noite!
Amei saber que além da minha pessoa, outros tantos são adeptos do diálogo solitário. Independente do lugar, se em casa ou na rua, sou famosa por falar sozinha (riso). É cada situação que passo, mas consigo tirar de letra. Adorei sua crônica, poeta! Me senti um pouco representada nela.
Abraços das bandas do Norte, menino escritor!
Minha cara poetisa Rizeuda da Silva, bom dia. Pois é, minha amiga, às vezes criamos nossos próprios interlocutores. A comunicação com o silêncio e o vazio, ao menos no meu caso, é algo saldável e antigo. Bom saber que você está nesse time. Um beijo para você aqui das bandas do Nordeste.
*saudável
“De médico, poeta e louco, todos nós temos um pouco”.(Machado de Assis). Dito.
Prezado xará Marcos Pinto, bom dia. Muito oportuna a citação do Bruxo do Cosme Velho. Obrigado pelo comentário. Desejo uma semana de saúde e paz para você. Abraços.
Nada como o nosso próprio refúgio.
Um forte abraço, Marcos!
Querido Bruno Ernesto,
Bom dia. Grato pelo comentário.
Forte abraço.
Conversar com as paredes é um exercício de confissão íntima…
Abraços caro poeta e escritor Marcos Ferreira!
Amigo poeta Airton Cilon, bom dia. Às vezes conversamos com a gente mesmo. Noutras vezes falamos às paredes. Em ambos os casos, como você disse, trata-se de um exercício de íntima confissão. Forte abraço e uma ótima semana.
Na época da lamparina colocada na meia parede do quarto do casal, os filhos (eu, no caso) ficavam olhando os vultos formados nas paredes adjacentes. E inventávamos estórias… Que bom que essa “loucura” é sadia e ajuda a desenvolver a criatividade. rssss