Os juízes de primeira instância e os tribunais não podem deixar de cumprir as resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que tem competência absoluta estabelecida pela Emenda Constitucional 45. A afirmação, que tem provocado discussão no Judiciário, é do conselheiro Marcelo Rossi Nobre.
O Blog do Carlos Santos reproduz síntese de entrevista (com link para depoimento completo) de Nobre ao saite Consultor Jurídico, abordando questões relacionadas ao CNJ. Ele destaca importância do Judiciário e como trabalho tem avançado.
Leia abaixo:
— Quais são os maiores problemas que o CNJ enfrenta?
Marcelo Nobre — Quando entrei, a visão era muito diferente da que se tem hoje. A maior parte dos processos era relacionada a concursos, tanto extrajudiciais como para a magistratura e servidores. Atos de dirigentes do Judiciário que eram questionados. Chegaram inúmeras reclamações como essas e trabalhávamos incansavelmente para não permitir desvios. A segunda composição da qual sou integrante teve uma atuação muito importante para assegurar a consolidação do CNJ e as conquistas que foram feitas na primeira. E vou citar apenas duas de tantas: o nepotismo e o teto. Na segunda composição percebemos que casos como esses continuavam de forma disfarçada, tanto o recebimento de vencimentos acima do teto quanto o empego de parentes. Atuamos firmemente contra esse descumprimento. Hoje, essas discussões já não ocupam tanto a pauta, porque o CNJ está muito mais atuante. Poucos são também os processos relacionados a cartórios de serviços extrajudiciais, porque o Conselho tomou decisões firmes, moralizando essa atividade, a postura e a conduta de todos. Hoje em dia, as entidades de classe vêm muito mais ao CNJ, porque sabem que vão encontrar amparo contra desvios do Judiciário, que são exceção apesar de existirem. A maioria do Judiciário é composta por gente decente, honesta, trabalhadora e que tem muito interesse público em si e vontade de acertar. São pessoas vocacionadas para a função.
— Há muitos casos contra juízes tramitando no CNJ?
Marcelo Nobre — São casos que representam um percentual pequeno. O país tem 91 tribunais e uma grande quantidade de magistrados. São 70 milhões de processos tramitando e só em São Paulo são 3 mil juízes estaduais. Portanto, o percentual é pequeno, mas na corregedoria, que é o órgão de apuração inicial no CNJ, há inúmeros processos disciplinares. A punição de magistrados é relativa a uma pequena parte da magistratura nacional. A maioria repudia esses poucos que denigrem a imagem da magistratura séria. O CNJ ajuda a melhorar a imagem da imensa maioria do Judiciário, que é composta por gente muito séria e trabalhadora.
— O CNJ afastou onze magistrados numa semana e isso era impensável há pouco tempo. É a abertura de uma nova fase no Judiciário?
Marcelo Nobre — Eu não vejo dessa forma. Ninguém gostaria de ter de fazer o que a gente fez, aposentando compulsoriamente dez magistrados do Mato Grosso e o ex-corregedor-geral do Amazonas. Ninguém aqui tem prazer e satisfação em ter de adotar esse tipo de conduta. Mas não podemos fraquejar quanto a isso, diante do que constatamos nos autos e nas provas. Quando a gente vê, pela provas, que alguém não tem a menor condição de prestar o serviço público, temos que agir. Não temos alternativa. Quanto ao caso de dez de uma só vez, é que ali se engendrou uma participação desses dez numa situação que não tínhamos como fazer diferente do que fizemos. Infelizmente.
— À semelhança do que se diz no Executivo, esses casos do Judiciário estão surgindo devido a uma maior fiscalização, que veio com a existência do CNJ?
Marcelo Nobre — O mundo ideal que todo brasileiro almeja é que isso não aconteça em nenhum poder. E isso não é diferente com todos que fazem parte do CNJ. Pode ser que com o Conselho, que é um órgão planejador de políticas públicas do Judiciário, mas também de controle, muitos casos que não eram investigados passaram a ser. O CNJ também veio para agir nesse vazio e está demonstrando que realmente era necessário. Vamos continuar levantando todos os aspectos dos tribunais, tanto negativos quanto positivos. Não há outra coisa a fazer com as condutas incompatíveis com o exercício da função senão aplicar a lei. No caso de Mato Grosso, se os magistrados não tivessem desviado recursos para a maçonaria, nada disso teria acontecido.
— Por que o CNJ tomou a decisão de tornar vagos mais de sete mil cartórios extrajudiciais?
Marcelo Nobre — Nos estados as corregedorias já deviam ter feito isso. Com um estudo e a percepção de que não faziam por inúmeras razões, o CNJ precisou botar o dedo nessa ferida. Depois de levantarmos dados de todos os estados, com a cautela necessária, determinamos que os cartórios ocupados por pessoas na interinidade, não concursadas, deveriam se tornar vagos. É inadmissível essa situação, que já deveria ter sido resolvida pelos tribunais estaduais. Os cartorários recorreram ao Supremo e conseguiram uma liminar porque induziram o ministro Cezar Peluso ao erro. Quando o ministro recebeu as informações prestadas pelo CNJ, revogou a liminar, porque nós estamos corretos. Quem não é concursado só pode ficar no seu cartório até o preenchimento por concurso público. Como os tribunais não colocavam determinados cartórios como vagos, eles não entravam nos concursos. Hoje, todos os cartórios que são dirigidos por pessoas não concursadas estão vagos e vão entrar nos próximos concursos para serem preenchidos por alguém que preste concurso e seja aprovado.
— Existem resistências à atuação do CNJ?
Marcelo Nobre — Ainda existe, mas diminuiu demais. Hoje, o Judiciário brasileiro percebeu que o CNJ não veio como caça às bruxas, não veio para perseguir ninguém. Ele veio para planejar o Judiciário do futuro de acordo com o que a sociedade brasileira espera de um órgão extraordinário como esse.
— O CNJ hoje não encontra mais dificuldades para atuar?
Marcelo Nobre — Essas dificuldades existiram, hoje não existem mais. Tínhamos resistências com os conservadores, que pensavam que lutavam contra o CNJ, mas na verdade lutavam contra a sociedade brasileira e contra uma nova mentalidade no país. Eles achavam que esse órgão representava algo que não era o anseio popular e essas pessoas perceberam que se equivocaram, tiveram que voltar atrás. Todo mundo sabe que o CNJ está consolidado cada dia mais, que veio para ficar e que não veio para punir nem divulgar mazelas do Poder Judiciário. Ele veio para planejar política pública do Judiciário nacional. É um órgão visionário, criado para olhar o futuro e enxergar o Judiciário lá na frente como um serviço público de primeira qualidade para o jurisdicionado e para a sociedade brasileira. Essas resistências que ainda tínhamos estão quase que todas já vencidas.
— O senhor acha que a atuação do CNJ é considerada rigorosa nos tribunais?
Marcelo Nobre — O CNJ está pacificando os conflitos administrativos do Judiciário com muito êxito. Antes não havia um órgão para padronizar nacionalmente os procedimentos. Hoje existe. Aqui é que se decide como deve ser o Judiciário nacional no futuro. O CNJ era um antes do ministro Gilmar Mendes e agora ao final do mandato do ministro Gilmar é outro, com todas as críticas que ele recebe. Isso é inegável. Mas temos muitas coisas pela frente. Tenho levantado uma questão que tem dado muita discussão, que é a competência absoluta do CNJ. Para mim, com a aprovação da EC 45, o CNJ passou a ter competência absoluta das questões administrativas do Judiciário nacional. E assim temos agido e decidido. Por isso, temos que começar a discutir se um juiz de primeira instância ou um tribunal pode decidir questões administrativas de forma diferente do CNJ. Pode um juiz de primeira instância ou um tribunal, através de um despacho jurisdicional, deixar de cumprir uma resolução do CNJ? Entendo que absolutamente não.
— Alguns críticos dizem que dessa forma o CNJ estaria retirando do Judiciário a apreciação de determinadas questões.
Marcelo Nobre — Isso não é verdade, porque o CNJ está sob o controle do STF como em muitos casos tem havido. Não há uma supressão de apreciação do Judiciário, pelo contrário. Agora, o constituinte deu competência absoluta ao CNJ, é ele que decide e dá as diretrizes administrativas para o Judiciário nacional e assim deve ser cumprido. O CNJ é uma corte criada pela constituição para decidir os conflitos administrativos do Judiciário nacional e planejar o futuro do Judiciário nacional. Acho que já é a hora de começar a discutir isso.
— Que falha o senhor apontaria em relação aos servidores?
Marcelo Nobre — Os Tribunais Regionais Eleitorais não têm quadro efetivo de servidores. São cedidos, ficam adequando, se há momentos de crise, muita coisa vem para o CNJ. Essa é uma questão que precisa ser pensada. A Justiça Eleitoral precisa ter um quadro compatível com suas necessidades. Talvez seja preciso pensar em abrir concurso para a Justiça Eleitoral com quadro efetivo dela. Nós temos recebido muitas questões eleitorais de servidores e acho que o CNJ deve se debruçar sobre essa questão.
Veja na íntegra AQUI.
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