• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
domingo - 22/10/2023 - 09:32h

Cosmovisão

Por Bruno Ernesto

Cena de O Pianista (Reprodução do Papo de Cinema)

Cena de O Pianista (Reprodução do Papo de Cinema)

Durante o período escolar, quem de nós nunca brincou antes do início da aula?

Sabemos que certas vezes havia um exagero. Beirava mesmo à agressão física. Sim, isso mesmo.

Certamente você já ouviu falar no corredor polonês. Uma brincadeira que conheci no início dos anos 90.

Consistia a tal brincadeira, no enfileiramento dos alunos da turma no corredor de acesso à sala de aula, fazendo, literalmente, um corredor de alunos, para que o coleguinha de turma passasse até ingressar na sala de aula e, que, no trajeto, levava uns bons tapas. Era a recepção para um dia de aula.

Quem não era simpático às brincadeiras da turma, passava incólume pelo corredor polonês e ia guardar o material na sala antes de iniciar a aula.

Quem era dado às brincadeiras ou mesmo tido como fraco e indefeso, nesse trajeto, recebia uns bons tapas até conseguir entrar na sala de aula. E, claro, após guardar o material, reforçava o corredor polonês para recepcionar o próximo coleguinha de turma e, já bem acordado com os tapas que acabara de receber, elevava o tom da brincadeira. Quem chegava por último, certamente sofria mais.

No início, essa recepção era engraçada. Todos entraram no clima do corredor polonês. Quem apanhava, também batia.

Passados entusiasmo e a euforia do início da dita brincadeira, o corredor polonês passou a ser um terrível problema para a direção do colégio.

Lembro que a diretora Raimunda Almeida, a querida e eterna Tia Mundinha, ficou transtornada com a escalada do corredor polonês. Padre Sátiro ficou horrorizado. Foi iniciado um plano de contenção e de dispersão pela direção do colégio e o corredor polonês acabou.

Faço um parêntesis para quem achou o corredor polonês violento.

Lembra da brincadeira de derrubar um palito de picolé fincado num pequeno monte de areia no pátio do colégio? Infeliz daquele que derrubasse o palito e não conseguisse correr rápido para se salvar.

Hoje em dia esses tipos de “brincadeiras” renderiam muito problema para a escola e, em especial, para os pais dos alunos brincalhões.

O interessante dessa história, é que brincávamos de corredor polonês e, no fundo, sequer sabíamos a origem do termo corredor polonês. Isso, na verdade, pouco importava.

O termo corredor polonês tem origem quando da assinatura do Tratado de Versalhes em 28 de junho de 1919, no qual a Alemanha assinou os termos de rendição e, assim, pôs fim à Primeira Guerra Mundial e celebrou a paz mundial.

Como na história nem tudo é coincidência, foi lá, no dito corredor polonês, que em 1º de setembro de 1939, que o primeiro tiro de canhão da Segunda Guerra Mundial foi disparado contra a cidade de Danzig (Cidade-estado, semi-autonônoma), que a Alemanha dizia ser seu território.

Guerras sempre foram abordadas de inúmeras formas, pontos de vistas, narrativas e, não por onde, são temas literários recorrentes.

Umas das histórias de guerra que mais me chamou atenção foi a do polonês Władysław Szpilman.

Szpilman foi um pianista clássico, nascido em 5 de dezembro de 1911 e falecido em 6 de julho de 2000, e cuja dramática história de sobrevivência em Varsóvia, durante a ocupação alemã da Polônia na Segunda Guerra Mundial, foi eternizada no filme O Pianista, de Roman Polanski, lançado em 2003 e brilhantemente interpretado por Adrien Brody, e cuja música tema é Nocturne nº 20, de Chopin.

Frédéric Chopin não foi escolha de Polanski. Era uma predileção de Szpilman. Confira aqui o registro dele tocando no vídeo incluso nesta postagem):

Antes de assistir ao filme, li o livro por volta do ano 2000, cuja autoria é do próprio Władysław Szpilman – ou, apenas Wladek -, e que foi lançado originalmente em 1946.

Fiquei fascinado pela história, e a forma direta e crua como foi narrada no livro.

A adaptação do livro para o cinema, efetivamente, mostra toda a dramaticidade dos anos de agrura pelos quais ele passou no Gueto de Varsóvia. De fato, foi surreal.

A representação visual e sonora de um drama potencializa o sofrimento e desperta uma maior sensibilidade do espectador.

Porém o livro, quando lido detidamente, também passa a mesma impressão que o filme potencializa nos nossos sentidos.

A diferença é que a leitura atenta desperta em nós uma impressão apenas nossa. Sem estímulo externo. Nossa cosmovisão.

Assim, fica mais fácil compreender o motivo pelo qual tomamos certas atitudes, sem compreender o contexto e a nossa visão de mundo. O que pode ser uma brincadeira para uns, pode ser um sofrimento para outros.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica

Faça um Comentário

*


Current day month ye@r *

Home | Quem Somos | Regras | Opinião | Especial | Favoritos | Histórico | Fale Conosco
© Copyright 2011 - 2024. Todos os Direitos Reservados.