Somos convidados a lançar um olhar para tantos exemplos de dom da própria vida em favor de outros irmãos, marcados pelo sofrimento, pela doença, pela miséria ou atingidos por catástrofes naturais. Em todas essas circunstâncias continuam a multiplicar-se exemplos de sacrifício da própria vida, para salvar os outros, fatos que não podem ser isolados neles mesmos.
É preciso situá-los na grandeza da humanidade, fecundada pela morte e ressurreição do Filho de Deus. Este é o mistério que celebramos na Semana Santa, atualidade da Paixão de Cristo.
O Domingo de Ramos introduz-nos nessa realidade e nesse paradoxo de um Deus, que para trazer alegria e vida, para nos dar amor e ternura, enfrenta a violência, o ódio e a morte.
E se visitássemos agora os hospitais, onde se encontra concentrado o drama do sofrimento humano, as casas de idosos, onde a velhice e a doença são terra na qual dificilmente germina a alegria?
E se fôssemos às prisões, onde ao desgaste da culpa se acrescenta a humilhação da pena e a perda da liberdade, alterando profundamente o horizonte da vida?
E se ouvíssemos os desempregados, pais e mães de família, que perderam o direito à dignidade de construírem com o seu trabalho a felicidade de sua família?
E se escutássemos as vítimas inocentes de guerras, terrorismos e conflitos, para cujos mecanismos e causas nada contribuíram?
A sociedade, como um todo passa ao largo, indiferente a todo esse sofrimento, centrada, apenas, no aumento de riquezas e comodidades, fazendo da perda do poder aquisitivo seu principal problema. Deste modo, dificilmente os corações se abrirão à esperança libertadora de que a morte de Cristo é sinal.
A narração da Paixão do Senhor, que ouvimos na Liturgia da Palavra do Domingo de Ramos, mostra-nos que nela se concentraram todos os desvios da humanidade. Primeiramente, a traição de um discípulo, que O entrega a troco de dinheiro. Verificamos a dispersão assustada dos apóstolos, que, na prática, fogem e O abandonam.
Constatamos a mentira dos testemunhos, a ambigüidade dos objetivos, a perplexidade e fraqueza de quem julga. Deparamo-nos com a crueldade abusiva na execução da pena, não respeitando a dignidade do condenado.
Vejamos o mundo de hoje: não podemos ignorar as traições e os que estão dispostos a tudo por dinheiro, a indiferença dos amigos na hora da provação, as incertezas da justiça humana. Olhemos esse mesmo mundo de frente, porque também essas fraquezas fazem parte da sociedade que queremos transformar.
Observemos, não para condenar, mas para compreender à luz do drama humano, pois continua a ser importante que um homem, Jesus Cristo, tenha suportado, oferecido e vencido tudo por puro amor.
Não podemos esquecer que a generosidade da sua morte continua a ser um grande testemunho do amor de Deus por nós. E se conseguirmos compreender todos os irmãos que sofrem e Ele, nosso Irmão sofredor, abriremos o coração à luz da Páscoa, anunciando a morte do Senhor, proclamando a sua Ressurreição, até que Ele venha.
Padre João Medeiros Filho
Este texto do Pe. João Medeiros relata de forma clara a “Paixão e morte de Jesus” sendo inserido na situação atual da sociedade, que infelizmente preza mais pelo “ter” do que pelo “SER”. É momento de conversão e reflexão. Parabéns pela publicação!