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domingo - 07/05/2023 - 11:10h

Eu conheci um santo

Por Honório de Medeiros

Eu tinha dez ou onze anos quando conheci um santo. Chamava-se Helder Câmara, era Arcebispo da Igreja de Cristo em Recife e Olinda.Dom-Helder-Camara-NE2

A ele fui levado pela secretária particular do Governador Nilo Coelho, que eu suponho ter sido, muitas vezes, um canal de comunicação entre a Igreja, o Poder Civil e o Poder Militar em Pernambuco, dada sua condição singular de amiga pessoal dos líderes dessas instituições.

Fomos eu, ela, uma tia, funcionária da Sudene, minha mãe e minha irmã, no começo da noite, na sede do arcebispado.

Estávamos de férias em Recife.

D. Helder nos recebeu com aquele seu sorriso luminoso, tão característico, olhos pisados pela falta de sono, o corpo mirrado, frágil, em seu ascético gabinete.

Para mim, naquela época, era impossível sequer imaginar que ali estava um gigante moral. Um dique, que com a força de suas palavras, atitudes, e carisma, tantas vezes contivera o furioso redemoinho, em Pernambuco, das águas turbulentas da repressão pós 64.

Pregava defendendo uma Igreja simples, voltada para os pobres, e a não-violência. Orador que galvanizava multidões, também era um escritor cultuado. Dele li o belo “Um Olhar Sobre a Cidade”, depois perdido em alguma das mudanças que minhas muitas vidas me impuseram.

Entretanto, dele, guardei mesmo, em meu coração, em minha mente, sem nunca esquecer, não somente a benção que seus dedos magros desenharam sob a minha testa ainda infantil, como também uma frase sua, lida em algum lugar, que é a síntese, para mim, do seu apostolado, tão bela quanto densa: “me enriqueces quando discordas de mim”.

Eis uma epistemologia em forma de poesia direcionada ao espírito dos homens de boa-fé do povo de Deus. Minha benção, padre. Quando me lembro do senhor, acredito na humanidade.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

*Crônica extraída do livro De uma longa e áspera caminhada, pela Editora Viseu.

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. Marcos Pinto diz:

    Tive a honra emconhecer Dom Helder Câmara durante um Simpósio da UERN durante os anos 80 (1980) realizado no âmbito do Cine Teatro CID. Coincidentemente vislumbrei Dom Helder caminhando tranquilamente caminhando tranquilamente pela Praça Vigário Antônio Joaquim, em direção ao Cinema Cid, onde seria um dos celebrados Palestrantes. Me dirigí ao mesmo me identificando co.o Professor. Retribuiu gentilmente o meu cumprimento. De imediato indaguei-lhe sobre os mistérios da vida após a morte. De imediato Dom
    Helder levou sua mão até o meio da testa, e olhando bem nos meus olhos respondeu : “Meu filho, daqui pra cima só Deus que sabe responder”. Naquele instantes enviei naquele Discípulo de Deus o verdadeiro odor de santidade.

  2. Marcos Pinto diz:

    Em adendoao primeiro momento : …NAQUELE momento senti que aquele Discípulo de Deus representava o que a Igreja Católica denomina de 8dor de Santidade. Louvado seja Dom Helder Câmara.

  3. A de Andrade diz:

    Perseguido pela Ditadura militar e pela direita brasileira. Recebeu a punição do silêncio pelo papa polonês, atendendo pedido do ditador de plantão. Grande D.Hélder. Não acredito em santos, mas em homens extraordinários. Isso ele foi. E ainda vive.

  4. Pedro Rodrigues diz:

    “Quando alimentei os pobres, me chamaram de santo. Mas quando perguntei por que ha gente pobre, me chamaram de comunista”
    Dom Helder Camara

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