• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
domingo - 13/03/2011 - 10:34h

Futebol com maconha


Tem cara que é tricolor, tem cara que é vascaíno; uns torcem pelo Flamengo, outros pelo Botafogo. Mas, Primo Altamirando tinha que ser diferente: o miserável me confessou noutro dia que é torcedor do “Puxa Firme F. C.”, Sociedade Recreativa do Morro do Queimado. Aliás, essa história foi ele que me contou.

Diz que dos 22 jogadores, mais técnico, massagista, enfermeiro do “Puxa Firme”, não tem um que não seja apreciador da erva maldita. O preparo físico do time se resume numa rápida concentração, para puxar maconha.

Em véspera de jogo a janela da sede, que fica no sobrado de um botequim, parece até incêndio: como sai fumaça! No sábado passado, o técnico do time – um tremendo crioulo que atende pelo vulgo de Macarrão, deu o grito:

“Olha cambada, amanhã nós tem que jogar comportado. Nós vai enfrentar o time do Padre Evaldo e é em benefício da Igreja.”

Como Macarrão é muito respeitado, ninguém chiou e no dia seguinte, no telheiro do campo, que a turma apelidou de vestiário, o time uniformizado contava com: Dentinho; Macaxeira, Bom Cabelo, Pau Preto e Lamparina; Melodia e Fubecada; Chaminé, Praga de Mãe, Porém e Parecido (tudo apelido, inclusive Parecido, porque fazia um sorriso igual ao do Sr. Juraci Magalhães sempre que acertava um). Macarrão deu as instruções e perguntou:

— “Argum poblema?” — Lamparina levantou o dedo e perguntou:

— “Que tipo de marcação que a gente vai usar?”

Macarrão pegou um papel de embrulho e deu uma de técnico formado. Traçou uns riscos e disse: “Marquemo por zona. É mais melhor”.

O time saiu pro campo e com cinco minutos a turma do padre já tava dando de goleada.

Macarrão berrava as instruções cheio de ódio: “Não intrapaia os beques, crioulo nojento”. “Oia a marcação, desinfeliz”. “Pára de fumar, Dentinho”. E o time do Padre fazendo gol.

Quando tava uns cinco a zero, Porém fingiu que mancava, chegou perto do telheiro e quis saber de Macarrão se podia apelar.

— “Apela pra tua mãe, semvergonho. Tá levando come aí pra todo lado. Arrespeita o time do Padre, que é tudo gente dereita”.

Diz Primo Altamirando que o “Puxa Firme F. C.” quando joga respeitando o adversário perde metade de sua estrutura técnica.

O jogo acabou 8×0 e o piedoso sacerdote estava todo satisfeito, tendo mesmo se dado ao trabalho de ir cumprimentar o crioulo Macarrão, pela lisura com que seus atletas se comportaram durante a refrega.

— “Parabéns, senhor Macarrão” — disse o Padre — “Certas derrotas têm o gosto da vitória. Seu time jogou com muita esportividade. Só não entendi por que jogaram com dez”.

— “Com dez???” — estranhou Macarrão — “Como é que eu não arreparei?”

Foi aí que Melodia, que era o capitão do time, esclareceu: “Pois é, o Lamparina não jogou. O senhor foi falar em marcação por zona. Sabe como é o Lampa. Não pode ouvir falar em zona que ele vai pra lá”.

Sérgio Porto, o "Stanislaw Ponte Preta", (1923-1968) – Jornalista, compositor e cronista.

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Categoria(s): Blog

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