Por François Silvestre
Sobre Rui disse José do Patrocínio: “Deus acendeu um vulcão na cabeça de Rui Barbosa”. E o tribuno ímpar da Bahia fez uma oração aos moços.
Começou discorrendo sobre os cinquenta anos de dedicação ao Direito. E debulhou encantos e desencantos, naquele momento, orientações e luzes no templo da vetusta Faculdade do Largo de São Francisco.
O Direito não era uma categoria profissional, para Rui Barbosa. Não. Era uma justificação de vida. Uma espécie de catarse dos pecados e das culpas. Rui tinha, em erupção, um vulcão na cabeça; como definiu José do Patrocínio.
Quem sou eu para mandar recado aos moços, diante da releitura de Rui Barbosa?
Depois, muito depois, cantou Lupicínio Rodrigues: “Esses moços, pobres moços, ah se soubessem o que eu sei”.
Quem sou eu para remendar a recomendação de Lupicínio, na solene declaração de tristeza diante da amargura da preterição? Não foi traído, foi preterido. Trair é mentir e enganar para obter vantagem.
No caso do amor, não há traição. Há preterição, sob a regência do desejo, que foge do controle.
Quem sou eu para recomendar lições aos moços, depois de Rui Barbosa e de Lupicínio Rodrigues?
Porém, uma coisa há de estarrecer a observação dos tempos pós-modernos. As fogueiras rasas, de labaredas escassas, que Deus tem acendido nas cabeças dos jovens de hoje que se enfronham na pretensão de “novas” ideologias.
Nem são novas nem se agasalham no escopo das ideias, apenas caliças de escombros que se desmoronaram após produzirem brutalidade e desumanização.
Foi bem ali, no aceiro do tempo. O nazismo, o fascismo e o stalinismo. Quantas gerações ainda não guardam desses monstros as marcas do sangue mal enxuto, a exalar “um estranho cheiro de súplica”.
Que atração miserável tem a força do ódio disfarçado! Como se o passar do tempo prescrevesse a monstruosa degradação da tortura, essa execração da própria descondição humana.
Sei não. Rui, apague o seu vulcão! Lupicínio, tente ensinar aos velhos! Té mais.
François Silvestre é escritor
Como é suave a caneta de quem pensa e escreve com maestria.
TEMPO DO QUASE NADA
David de Medeiros Leite
A François Silvestre
Somos rebentos (que desgastam
as mãos da parteira),
expelidos por um tempo de frivolidade.
De um tempo
onde o ideal
– redundantemente utópico –
sucumbe a forças indolentes,
causando náuseas
pelo apequenado
e confuso conhecimento.
De um tempo
ornado de pragmatismo,
protótipos-estereótipos
– pobres em efígies -,
desalterando
corações serenos em selvagens.
De um tempo
que nos faz confundir
visões ampliadas
com pororocas humanas.
De um tempo
onde a mansidão
transfigura-se em birutas de ares revoltos,
levando-nos como papelotes usados,
por parecermos pouco ou quase nada.