Algumas vezes por vontade própria, outras por cautela financeira, esta nossa Mossoró me tem visto muito pouco. Então, sendo um indivíduo com baixa quilometragem, quase não frequento as rodas intelectuais, os cafés, os saraus literários. Sei que já falei mais ou menos sobre isso em data recente. Entre outros endereços, estou devendo visitas a familiares e amigos. Hei de revê-los em breve.
Este rodeio é para contar a pequena e distante história de um mau-olhado. Também conhecido por quebranto. Calculo que foi no início de 2018, antes da pandemia. Nesse tempo, ao contrário de hoje, eu batia pernas por aí com maior frequência. Ia ao cinema do shopping, entrava em alguma loja, dava um pulo na livraria, tomava um cafezinho ali por perto. Acontecia de comprar um sorvete ou uma barrinha de chocolate amargo. Não dava importância ao ruído, ao vaivém das pessoas. Gente habituada àquele passeio tão apreciado por famílias e namorados.
A classe média se achava. Continua se achando. Da mesma forma os pseudorricos. O espaço naquele empório parece elevar o espírito, a autoestima dos seus frequentadores. Em maior número, claro, está a população com menor poder aquisitivo. Esses dão pouco lucro aos comerciantes. Alguns deixam os seus veículos do lado de fora. Pois o preço que cobram por aquele estacionamento é uma facada.
Bom. Não quero enrolar. Vamos logo ao referido mau-olhado. Num domingo, portanto, começo da noite, de cabelo cortado e barba bem escanhoada, lá estava este pequeno cronista de bobeira. Eu acabara de sair da livraria quando topei com uma escritora desta cidade. Encontrava-se em companhia de certa mulher, cujo nome ignoro até hoje. Notei que a desconhecida empalideceu diante de mim. Achei que fosse desmaiar. Era uma jovem senhora bonita, de cabelos loiros e olhos verdes. Tive vontade de perguntar se ela estava se sentindo mal, contudo fiquei na minha.
A escritora cuidou de me apresentar e decerto informou o nome da amiga, detalhe este do qual não consigo lembrar. Daí a pouco a mulher readquiriu o sangue das faces. Suspirei. Eu temia que ela fosse ter um troço, uma síncope. Em seguida observei que ela, após balançar a cabeça lateralmente, como buscasse repelir o mal-estar, lançou-me um olhar feroz. Nesse minuto tremi de cima a baixo.
A explicação para aquele estranho comportamento não tardaria. A desconhecida resolveu abrir a boca e, ainda com ar de quem recebera uma ofensa, disse que eu era um sósia, que eu tinha a cara do seu ex-marido. Não revelou o nome do sujeito, que torci para que não fosse meu xará. Ressentida, a voz meio trêmula, acrescentou que o dito-cujo a havia trocado por outra dez anos mais nova: “Uma piranha de Grossos”, disparou. Fiquei desconfortável. Só não pedi desculpas. Mas falei que lamentava e que, salvo exceções, não se pode confiar nos homens, espécie inferior.
Foram embora. De imediato uma náusea me sobreveio. Tomei o rumo de casa já suando frio. Acordei de madrugada tremendo o queixo. Febre. Recorri à dipirona. O estômago não tolerou o comprimido. Vomitei. Repeti o medicamento. A febre me largou. Mal o dia amanheceu, porém, fui atacado por cólicas e diarreia. Escapei fedendo. Espero nunca mais me deparar com uma mulher traída.
Marcos Ferreira é escritor
O pior Caro Marcos, é que o tal ” mal olhado” existe.
Somos um corpo ou objeto que emana energia seja boa, neutra ou mal.
Um abraçaço
Você disse bem, amigo.
Bom domingo e ótima semana para você.
Abraços.
Com certeza essa mulher sofria de algum transtorno pós traumático. A energia dela tinha muito ressentimento acumulado; não é raro encontrar pessoas assim. Não tratam as mágoas e passam a distribuir ódio. E você, tendo a aparência do objeto de desagrado dela, tornou-se alvo! Pessoas assim são perigosas. Talvez isso explique a atitude de pessoas que saem atirando em multidões. Uma pessoa saudável supera uma traição e vai em frente. Essa mulher era doente e infectou você, emocionalmente. Tem até uma expressão popular para isso: olhos de seca pimenta. Só oração pra quebrar essas energias!
Querida Bernadete,
Grato por sua leitura e avaliação do suposto mau-olhado.
Você enriquece o assunto e opina muito bem.
Eu lhe desejo uma boa semana e um outubro ainda melhor.
Abraços.
Que coisa! Olhe, Marcos. Lembrei do livro Meleagro, de Cascudo. Um banho de Preto Velho vai bem! Coloque água na arruda! Todos nós precisamos.
Caro Bruno Ernesto,
Sua recordação do livro de Cascudo é muito oportuna.
Também concordo com você em relação aos preceitos.
Uma ótima semana para você.
Abraços.
Belíssima página, Ferreira. Relê-la é sempre um bálsamo para os olhos de quem valoriza a literatura.
Meu caro Cearense,
Grato por sua leitura e opinião, você que também é um enfeitiçado pela arte da escrita. Que tenhamos saúde e paz para seguirmoso com esse encantamento. Que os bons olhados nos protejam.
Abraços e um feliz outubro.
Extrair leite de pedra, poesia da febre e tosse… Bela crônica, Marcos. A poesia quebrou o desencanto. 🌹
Querido Poeta,
É sempre uma alegria contar com sua leitura e palavras de incentivo.
Obrigado, meu caro. Suas palavras têm carinho e poeticidade.
Um feliz outubro para você, saúde e paz.
Hilário!! Kkkkk
Caro João Bosco,
Concordo com você.
A hilaridade é forte.
Abraços, amigo
O escritor também é um escultor com as palavras. Ele recebe algo em estado bruto e lapida para ficar agradável de ler ou de ver.
Com relação ao mal-olhado, ele existe. Nas crianças faz estragos piores por serem mais frágeis.
Eu tive uma tia chamada Zulmira (conhecida por Zinha) que tinha o dom de curar o mal olhado (quebranto). Ela rezava e benzia as crianças usando uns ganhos de plantas e água.
Estimado amigo e leitores, mais uma vez Marcos nos presentear com sua escrita leve (mas nem por isso deixa de ser rebuscada), como algo próprio , acredito que vivenciado por todos, pessoas que crêem ou não no transcendental. Tenho amigos que são ateus, mas já me revelaram que há pessoas que a simples presença ou fala, já nos baixa a autoestima.
E já passei por poucas e boas com pessoas negativas e prefiro hoje, mantém distância.
O mau-olhado que vivenciaste Marcos, pode ser engraçado hoje para nós que somos seus leitores e ávidos por suas escritas. Contudo nobre amigo, imagino a situação aqui que aconteceu contigo, é rir para não chorar, causa arrepios mesmo!
Forte abraço deste professor e eterno aprendiz de poeta!
Mau olhado, chacras negativos e outras denominações que o subjetivismo de suposta ciência dizem aplacar corações e mentes, especialmente através da leitura dos signos.
Nesse campo de exoterismo e “religiões” fértil para com aqueles que querem ganhar ” dindin” levando e trazendo falsas esperanças aqueles que pra galgar dinheiro , fana e poder, se comprarem em tudo fazer e fazer tudo, ignorando olimpicamente quais quer regras e ( ou) escrúpulos de ordem ética e.moral.
No seu Caso Caro Marcos Ferreira, que dia hein…?!?
Onde uma simples coincidência e semelhança física, levou a traída
quase agredi-lo, mesmo que nada tivesses a ver com.a traição …
Imagina Caro cronista dos nossos Domingos, se por acaso,.o encontro da traída, tivesse ocorrido com uma mulher dita sósia da protagonista da traição…?!
Palavras, verbos e adjetivos.me faltam pra narrar o SUPOSTO ocorrido, que com certeza e Redundaria em agressões físicas e verbais.. !!!
Kkkkkkkkkkkkkk
Lindo, aqui na terra é assim, pagamos pelo que não fizemos. Parabéns.
Essa mulher traída já deve ter rogado tanta pra esse homem, que você por ser parecido com ele,
recebeu essa energia negativa por tabela. Abraços caro poeta e escritor.
Pior que isso é real.
Tive um conterrâneo, um senhor bastante conhecido na minha cidade, que prefiro preservar o nome e que já não se encontra mais nessa dimensão, que matava árvores frutíferas. Todos tinham receio de mostrar os seus pomares… Pés de Limão, Laranjas, Mangas, Coqueiros, etc… Certo dia ele chegou na residência de uma parente e foi proibido pelo esposo da mesma de adentrar no seu quintal, por receio do que poderia acontecer com suas plantas. Questionando tamanha desfeita, o proprietário da casa justificou que não deixaria, pois ele “matava até jurema com o olhar”.
Rapaz, se você ficou desse jeito somente por ser parecido com o ex dela, imagine se você fosse, e tivesse se encontrado com ela, do jeito que se encontrou, no “shop”. Teria morrido, com certeza. Se eu me encontrar com alguém parecido com você e tiver a oportunidade de aconselhá-lo, direi: meu amigo, faça tudo, mas nunca fique cara a cara com a sua ex, aquela que você trocou por uma piranha.