No dia 05 de março de 2009, médicos e enfermeiras (vejam que eles podem conviver juntos) ganharam as ruas de Paris, para protestarem contra o corte drástico de funcionários, promovido pelo projeto de reforma do sistema hospitalar francês. O protesto teve resultado e a ministra da saúde da França voltou atrás.
Enquanto isso, bem aqui, na nossa cidade espacial do Brasil, mais precisamente na maternidade do Hospital José Pedro Bezerra (Hosp. Santa Catarina) – o segundo maior do estado – mães estão dando à luz os seus filhos em ambiente cheio de insetos, sujeiras e infiltrações; o Hospital Walfredo Gurgel – o primeiro maior do estado – vive com os seus corredores abarrotados de pacientes em macas enferrujadas; o serviço de verificação de óbito (SVO) encontra-se entregue às traças e, nele, falta o mínimo de condições para o funcionamento: falta formol e as geladeiras estão quebradas, levando ao risco de os corpos entrarem em decomposição antes de serem enterrados.
E nada, absolutamente nada, foi feito.
Nenhuma passeata, nenhum protesto, nenhum grito da população e nem do Ministério Público. Somente o silêncio perturbador da acomodação é o que foi ouvido…É uma pena que os brasileiros não imitem os franceses que, por muito menos, invadiram a Bastilha e iniciaram a revolução francesa, que culminou na liberdade, igualdade e fraternidade para aquele povo.
É uma pena que a vida não imite a arte, pois, no seu livro “Incidente em Antares”, Érico Veríssimo mostrou que os mortos – quando foram desrespeitados e impedidos de serem enterrados com dignidade, devido a uma greve dos coveiros –, ganharam ‘vida’ e passaram a vasculhar a podridão da sociedade. Sim!
Alguém duvida de que estamos podres? Se alguém tiver dúvida, sugiro que ouça Caetano Veloso: “Enquanto os homens exercem seus podres poderes, Morrer e matar de fome, de raiva, de sede, São tantas vezes gestos naturais… Será que nunca faremos senão confirmar, A incompetência da América católica, Que sempre precisará de ridículos tiranos?”. Gestos naturais. É isto que achamos.
É natural o sujeito ocupar um cargo público e da noite para o dia se descobrir que ele tem um patrimônio – de mansões e aviões –, que só se justificaria, se ele tivesse vivido pelo menos umas dez reencarnações…
É natural irmos dormir com o nosso dinheiro na poupança e acordar com o ele confiscado por elles: tudo em nome da governabilidade e do combate à inflação… É natural vermos que as licitações são feitas sem o mínimo de escrúpulos…
Hoje, é natural nem mais acharmos os tiranos ridículos…
Até quando suportaremos isto? Não sei.
Só sei que o poeta russo Maiakowiski já fez a sua parte ao nos alertar: “Primeiro, eles vêm à noite, com passos fugitivos, arrancam uma flor e nada dizemos/No dia seguinte, já não tomam precauções: entram no nosso jardim, pisam nossas flores, matam nosso cão e não dizemos nada. Até que um dia, o mais débil dentre eles, entra sozinho em nossa casa, rouba nossa luz, arranca a voz de nossa garganta e já não podemos dizer nada”.
É, meu caro, a coisa tá russa mesmo. Mas, ainda bem que moramos na terra do samba e pandeiro, e o que é ainda melhor: abençoada por Deus… E imagine se não fosse…
Francisco Edilson Leite Pinto Júnior é professor, médico (conselheiro do CRM) e escritor
Espetacular é o blog que tem a oportunidade de ter colaborades do quilate de Armando Negreiros e Edilson Pinto. Os dois, juntamente com Damião Nobre, são os melhores cronistas (não confundir com colunistas, por favor!) sociais deste Estado, sem desmerecer aos que se julgam melhores.
Fazem a parte deles, se indignam, irritam-se, sublevam-se, denunciam… E nós, o que fazemos? Nada. Somente o imobilismo patético de uma turba comprometida de algum modo com os detentores dos poderes públicos.
Achei muito interessante tudo o que você disse. Principalmente o fato de que médicos e enfermeiros podem conviver juntos; pois o que vemos aqui em Natal e o que o médicos falam é que eles fazem suas “lutas” indepedentes das outras categorias profissionais (independentes dos dos enfermeiros, por exemplo). Nos movimentos de reinvidecações preferem o fazerem sozinhos. Talvez seja por isso que deixam de conseguir muita coisa. É interessante essa constatação vinda de um médico.
Graça Sabino – enfermeira