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domingo - 10/07/2022 - 08:26h

Momento difícil – perdi o filho e a mãe

Por Ney Lopes

Faleceu na última segunda, 4, a minha mãe Neuza Lopes de Souza, 99.

A causa mortis Covid 19, enfarto agudo do miocárdio, pneumonia e lesão renal aguda.

Enfrento mais um grande choque emocional, após a morte de Ney Junior, em novembro passado.

Dores profundas atingem toda família.depressão, tristeza, solidão, perdas, fim, melancolia

Em época de volta à política, como pré-candidato ao senado, perdi a força e o estímulo de um filho, que era vocacionado e preparado para a vida pública.

Não tenho mais a sua presença, nem as suas palavras de solidariedade, um sentimento que a cada dia parece desaparecer.

Como se não bastasse, falta-me agora também a convivência física da minha mãe, que partiu e se encontrou com Ney Jr.

O funeral dela foi no Cemitério do Alecrim, em Natal sepultada no túmulo onde estão o meu Pai Josias de Oliveira Souza, o irmão Gileno Lopes de Souza e a minha avó, Mafalda de Araújo Souza da Fonseca.

O Alecrim traz recordações, por ser o símbolo da nossa vida familiar.

Lembra fatos vividos há anos, ao lado dela, de papai e irmãos.

Naqueles tempos, muitos sonhos vicejavam na minha mente cheia de fé e confiança em um futuro, que parecia custar a chegar.

O meu pai, Josias, veio do Açu e instalou a alfaiataria Globo, na avenida um.

Morávamos na rua Presidente Quaresma, onde residiam as famílias de Sinval Poti, Dr. Vicente Dutra, Dr. Hildebrando Matoso, Paulo Bulhões, Coronel Jovino Lopes, capitão Gurgel, José Fernandes, o casal Wellington e Etelvina, Marcilio e irmãos, Bráulio da movelaria (pai do escritor e jornalista Alex Nascimento), Miguel do Armazém Estrela, Esaú Vilela, Pedro Costa e outros.

Aos sábados ia na companhia dos meus pais à feira do Alecrim.

Teve razão o cordelista Elinaldo Medeiros, quando recitou à época: “Amigo vou lhe dizer, ouvinte vou te contar. Se arrume, pois, sábado vamos juntos passear, e na feira do Alecrim maravilhas vou te mostrar”.

Aos domingos despertava às quatro da manhã e com a família, assistia à missa na Igreja de São Pedro.

Lá estava aquilo que o notável cronista Sanderson Negreiros chamou de “multidão de personagens”, a maioria composta de congregados marianos, filhos de Maria, fiéis.

No altar, a figura do padre Martinho, falando com sotaque polaco, gestos largos e voz aguda.

Ele chegava à Igreja antes do início da missa e sempre estava na porta, cumprimentando a todos.

Após a missa, convidava alguns fiéis para o café da manhã na casa paroquial, ao lado.

Frustrava-me nunca ser convidado.

O Cemitério do Alecrim me traz outras recordações.

Em 1959, perdi o primeiro familiar próximo.

Lá deixei a minha avó materna Idalina, suave, santa, abnegada.

Depois, o meu avô materno Manoel Lopes da Silva Neto.

Em 1980, a figura humana e humilde do meu pai, Josias. 

Sanderson definiu bem o Cemitério do Alecrim, como um lugar onde “os epitáfios esplendem ao sol de verões penitentes e invernos dourados pela lembrança”.

Trago comigo a imagem da avenida um onde morei anos e seus personagens.

O posto do SAPS, situado no centro do bairro, era o Serviço de Alimentação da Previdência Social, criado por Getúlio Vargas para vender alimentos baratos à população.

Diariamente, recebia o encargo de mamãe para entrar em filas intermináveis e comprar o pão.

Na memória, figuras respeitadas como “seu” Álvaro Navarro, Celso Dutra e Wober Pinheiro, donos de farmácia, que amenizavam a dor dos seus clientes, com receitas prontas e eficazes; do “seu” Chiquinho, “seu” Artur e “seu” Juvenal Faria, todos fazendo as vezes dos supermercados de hoje, com varejo e atacado “sortidos”; dos cinemas São Luiz e São Pedro semeando a fantasia fugaz de romances (Casa Blanca; E o Vento Levou), duelos (seriados de caubóis: Rod Cameron e outros) e épicos inesquecíveis (Quo Vadis).

Amanhã, 11, será a missa de sétimo dia.

Um dia de intensa saudade de um passado já tão distante, que continua vivo no coração.

Momentos emocionalmente difíceis estou vivendo.

Somente a crença no reencontro conforta-nos, além da resignação cristã pela manifestação da vontade de Deus.

Ney Lopes é jornalista, advogado e ex-deputado federal

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. Raniele Alves diz:

    Boas palavras, boas lembranças, é o que sempre falo “Enquanto houver lembranças haverá vida” .
    Meus pêsames senhor Ney Lopes.

  2. Marcos Pinto. diz:

    Como são pesados os nossos “Baús de Ossos” !. O silêncio dos longes rasga o negro véu do tempo e nos obriga a calçar as sandálias de chumbo de tão pungente dor. Imagens, sons, cenas trazem à tona um corolário de intensas recordações de um penitente passado. Eis que, na retina da saudade surge um desfilar merencório e pungente, emoldurado nos contornos das nossas pegadas, que já dobram as esquinas do tempo. A dor bate com.tanta força que chega a ameaçar quebrar e arrebentar a fibra da vida. Tempo…tempo…tempo. À luz perpétua o resplendor. Meu sentimento de pesar, extensivo nobre e tradicional família.

  3. François Silvestre diz:

    Texto terrível, de beleza e dor, o belo na arte de conseguir iluminar trevas. E a dor que denuncia dois antagonismos. Um da ordem natural das coisas, que é sepultar a mãe. Doloroso, mas natural. Outro, a negação dessa naturalidade, que é sepultar um filho. Inversão da ordem natural das coisas. Meu abraço, amigo, e o desejo de que a memória de ambos lhe sustente forte.

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