domingo - 19/07/2015 - 14:26h

No fundo do poço, a voz do vento

Por François Silvestre

O Brasil entrou numa crise econômico-financeira, com resultados preocupantes na vida social, que nos põe no seguinte dilema: Vale a pena esticar a corda e deixar que o governo sangre até a anemia irreversível ou a necessidade de sobrevivência implora uma trégua sem oportunismo de interesses políticos?

Essa trégua não significa conivência. Significa estratégia de sobrevivência da atividade produtiva e comercial. Se o país falir, por desgoverno e intransigência, não será apenas o governo falido que ruirá. Ruiremos todos.

Só os fanáticos não se convenceram ainda de que a luta contra a Ditadura não dá salvo-conduto para apunhalar a Democracia, mesmo tendo lutado por ela. Sem negar a luta do passado desses partidos, que envergonham o presente.

A mesma Pátria que eles defenderam contra a violência do arbítrio, agora atacada pela violência da corrupção. O episódio Petrobrás é a mais escrachada promiscuidade público-privada da nossa história.

Houvesse tido o PT a coragem histórica da autocrítica, na hora angustiante, certamente teria colhido a compreensão dos seus seguidores não fanatizados.

Agora, a autocrítica parecerá esperteza. E a malícia dos espertos tem prazo encolhido de validade.

O heroísmo de ontem transformado num conluio de trampolinagens, onde se juntaram todos os lados raspando o mesmo tacho.

O PT que vi nascer, e num comício da Praça Craveiro Lopes, no Paço Municipal da Capital paulistana, saído da casca do ovo do ABC paulista, era tão exigentemente puro que espantava até os pecadores veniais.

E como toda pureza é impura, deu no que deu. É o fenômeno de o herói virar vilão. O melhor e mais triste exemplo é o do Marechal Pétain.

Pétain foi endeusado pela França como herói da primeira guerra mundial. Depois, ao colaborar com os nazistas, foi condenado por traição, ao fim da segunda guerra; pela mesma Pátria que o elegera herói.

Muitos dos resistentes contra a Ditadura foram cooptados pelos encantos do poder. E dão munição aos cretinos que eles combateram no passado e com eles se juntaram sem qualquer fronteira ética.

Tudo isso é verdade. Mas é verdade também que não vale a pena deixar a sangria matar o país. Urge evitar o fundo do poço, mesmo sem petróleo, para que não nos afundemos todos.

O Brasil sempre viveu sob o signo da exploração. Roubado na colonização e depois pela ganância do capitalismo financeiro. Espoliado pelas multinacionais. Traído pela demagogia interna. Sangrado por ditaduras. Não serão esses corruptos que o destruirão.

É menos grave manter a precariedade legitimamente eleita do que anular a Lei sob o argumento de uma nova ordem inventada no golpe. Esse filme é repeteco.

Se me permite Eulício, no Rio da Noite Verde, repito a pergunta: “Talassa! Quem estrangulou a voz do vento”?

Té mais.

François Silvestre é escritor

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. Junior 100 diz:

    O pior de tudo é esforço demasiado de algumas mídias em tentar polarizar a discussão, sendo que quase todos os partidos estão envolvidos. Perdemos também o Bonde da História, novamente, e o que restou foi um pais em franca recessão com uma geração ainda deslumbrada com o consumismo. Não sabemos como o Brasil vai ficar no ápice da crise, contudo sabemos que aqueles menos dado a prodigalidade terão mais chances de suportar as turbulências que virão.

  2. naide maria rosado de souza diz:

    Confusa. ” É menos grave manter a precariedade legitimamente eleita do que anular a Lei sob o argumento de uma nova ordem inventada no golpe. Esse filme é repeteco. ” Penso que se a nossa história mais próxima mostrou uma pureza pecadora, que se contaminou com o brilho do poder que destituíra, não vale dizer necessariamente, que uma nova ordem seja ainda mais pecadora. É quase descrer que ainda existam cidadãos decentes e darmos a nós mesmos, em totalidade, um atestado de péssima conduta e aguardarmos a ruína de todos. O meu humilde entendimento, precário diante do de François Silvestre deixa-me constrangida, digamos, envergonhada e até mesmo insegura em questionar algo escrito por quem tanto admiro. Não posso, todavia, permitir que minha esperança desbote. É uma questão de esperança…

  3. FRANSUELDO VIEIRA DE ARAÚJO diz:

    Caro François Silvestre, faço das suas…minhas palavras, e com a devida vênia, acrescento mais. Os brasileiros que realmente possuem estofo democrático e têmpera na relação com a res pública e com o verdadeiro destino do país vinculado diretamente a estabilidade das instituições que a muito esforço foram, décadas a fio construídas pela inestimável dedicação, sangue e suor de uns poucos em favor da maioria ignara e excluída do processo real e decisório em nosso país.

    Neste momento ao mesmo tempo grave e fecundo que atravessa a nação brasileira, os brasileiros aos quais me referi, necessariamente tem que se dar as mãos, fazer valer o poder institucional das nossas ainda cambaleantes instituições que efetivamente representam o estado democrático direito e livrar o nosso país dos fascistas, golpistas e oportunistas de plantão, sendo estes, infelizmente nos últimos meses tão ” bem representados” pelo canalhocrata corrupto e oportunista Eduardo Cunha, tendo, infelizmente, no PMDB do chamado baixo clero o esteio e estuário das suas desaforadas, autoritárias e desarvoradas ambições.

    No caso, oportuno assinalar que, não é possível ficar quieto quando o congresso é dominado pelo que há de mais sórdido e pior na sociedade brasileira, bandidos e falsos pastores, achacadores em nome de Cristo, picaretas envolvidos em todo tipo de falcatrua, legislando em causa própria, manobrando votações, rasgando repetidas vezes o próprio regimento interno o qual deveria ser um norte irretorquível, chantageando empresários para garantir seu butim, promovendo cultos religiosos no plenário, fomentando a homofobia e a ignorância. O atual congresso brasileiro, comandado, sobretudo pelo triplo dublê de empresário, pastor e deputado Eduardo Cunha, sendo este, investigado por uma dúzia de crimes e toda sorte de imoralidades em sua notória trajetória de oportunismo deslavado, fascismos e achaques para com aqueles que tentam enfrentá-lo, o que verdadeiramente é uma vergonha para o país.

    Noutra quadra temos que, igualmente não é possível aceitar calado que o ministro Gilmar Mendes, uma única pessoa sem um único voto, por uma manobra rasteira, mantenha engavetado, por mais de um ano, um projeto de mudança da legislação eleitoral já aprovado pela maioria dos juízes, projeto este que, se não impede, dificulta em muito a roubalheira nas eleições e na política. A quase totalidade dos escândalos que entravam a vida nacional e sangram os cofres públicos está relacionada com a doação de empresas aos políticos, que retribuem o favor legislando contra o interesse da maioria da população e superfaturando obras, ambulâncias, remédios. Sem o fim da doação de empresas para políticos a roubalheira nas eleições será eternizada.

    Infelizmente, quem deveria fiscalizar o governo, o legislativo e o judiciário é a imprensa, que se tornou irrelevante quando abriu mão de fazer jornalismo para fazer oposição partidária. A imprensa brasileira, que sempre foi ferozmente governista, descobriu sua vocação oposicionista quando a Casa Grande perdeu um pouco o seu poder. É constrangedor ver jornalistas ou similares pensando exatamente como determinam seus patrões. Talvez pela profunda crise que o setor atravessa, com jornais e audiências minguando, velhos jornalistas e jovens sedentos de poder e fama se agarrem aos seus empregos com unhas e dentes, repetindo bobagens até a náusea. A verdade não agrada o patrão? Esqueça! O bandido disse que também deu dinheiro aos tucanos? Ignore! O patrão esconde dinheiro na Suíça e sonega fiscais para não pagar impostos? Não é comigo! O mensalão foi criado para eleger o presidente do PSDB? Concentre-se no plágio petista! A acusação contra um petista não faz sentido? O que importa? A antiga imprensa, que já estava seriamente ameaçada por conta da revolução digital, acelerou seu caminho para o fim abrindo mão do princípio básico do jornalismo: a defesa da verdade factual. Quando a história da antiga imprensa brasileira for contada descobriremos que ela não morreu, suicidou-se.

    Felizmente – talvez pela cretinice evidente dos seus apoiadores na mídia – a direita brasileira tem perdido eleições com agradável regularidade, foram quatro, em dois turnos, nos últimos 13 anos. Oito vezes o povo brasileiro foi às urnas dizer não à intolerância, ao egoísmo e a hipocrisia. Espero que eles percam outra vez em 2018, mas se até lá o PT não administrar melhor o quadro de alianças com essa direita, inevitavelmente permeada de truculentos, homofóbicos, picaretas e ignorantes, pode até ganhar as eleições, mas continuaremos a ter que assistir, mais uma vez esse deprimente espetáculo, o qual a mídia golpista faz questão de botar pilha e manipular à seu bel prazer e a favor dos seus conhecidos interesses obscuros e patrimonialistas em desfavor da maioria historicamente excluída e, por via de conseqüência infelizmente, em grande ignara e alienada população do nosso país.

    Afinal, até quando iremos aceitar calados as agressões dos derrotados nas urnas, uma elite iletrada, egoísta, ignorante, preconceituosa e, sobretudo golpista, que ficou 500 (quinhentos) anos no poder e transformou o Brasil no país mais desigual do planeta?

    Um baraço
    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
    OAB/RN. 7318.

    • ROSANA diz:

      Você sabia que todos os dias morrem mulheres decentes ? Hoje você não pediu justiça por nenhuma delas, diferente do caso das FÊMEAS DE TODOS OS MACHOS, que lhe deixou indignado, como deixaria todo machista hipócrita. Se gosta de justiça mesmo, lute pela PROSTITUIÇÃO MASCULINA, O MACHO DE TODAS AS FÊMEAS, ou o fim de todo tipo de prostituição. Se não conseguir ser bom , seja pelo menos justo.

  4. ROSANA diz:

    Isso mostra que ninguém deve ser “endeusado”, pois as vezes alguém pratica o bem por interesse, e quando não existe mais vantagem com o bem, escolhe as vantagens do mal. O bem é nossa obrigação e não favor , mas isso não é ensinado nas escolas e nem dentro de casa , não temos a cultura do bem, do respeitar o próximo, e essa infinidade de egoístas é o resultado. Poucos querem o bem de verdade, pois o bem exige sacrifícios, a maioria acham que são bons só por não matarem e não roubarem, mas o bem é muito mais que isso, e a sociedade segue hipócrita, até rindo dos religiosos que falam do verdadeiro bem, seja pela moralidade ou pela religião, o importante é escolher o bem, que é diferente de escolher o prazer, esse até o diabo escolhe.

  5. Antonio Augusto de Sousa diz:

    Parabéns a Francois, pelo texto! Todo domingo tenho uma aula de cultura e aprendizado “geral” nos seus escritos!

    Não entendi à “saída” do tema de alguns leitores!

    Regulado pelos meus 5.7 de idade, onde penso e faço o que quero, de acordo apenas com minha consciência, e às limitações físicas, adoraria ser prostituto de mulher bonita!.

    Quando criança, fui “bolinado” por algumas mulheres bonitas e de meia idade. Só lamento não entender à época, o que elas queriam. Mesmo assim, me lembro com saudade dos casos. E se sinto saudade…, foi porque valeu à pena!

    O resto é hipocrisia, e papo furado!.

  6. naide maria rosado de souza diz:

    Jornalista Carlos Santos. Estivéssemos todos os comentaristas próximos, bem como François Silvestre, sonharia com uma mesa redonda…um debate sobre a matéria. É sonhar demais?

    • Carlos Santos diz:

      NOTA DO BLOG – Naide, boa tarde.

      O Blog vai passar ainda este ano por reformulação estética e ganhará mais espaço à partilha de conhecimento, bate-papo e valorização dos webleitores, para continuar sendo “Nosso”.

      Não vou dizer quando estará de cara nova, porque tudo depende de tempo e tempo. Tenho que conciliar essa atividade com viagens a trabalho no estado e fora dele.

      Não gostasse tanto disso, já tinha parado.

      Mas se paro, morro um pouco.

      Prefiro continuar vivo.

      Abração

  7. naide maria rosado de souza diz:

    Continue vivo, meu prezado Jornalista, para preservar e ilustrar a minha vida também. Noite dessas conjeturei que se nossa conversa tivesse começado mais cedo, ainda com Serra Grande no espaço , talvez o meu rumo em termos de política fosse outro. Afinal, filhos encaminhados, haveria tempo. Agora, encaminho netos e a hora passou. Aqui no “Nosso” blog aprendi muito e quero continuar a aprender. Grande abraço.

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