Por Marcos Ferreira
Madrugada. Quase duas horas. Despertei com fortes dores na barriga e nas costas. Levantei-me a custo. Repeti a dose dos remédios, aguardei e suportei alguns minutos na expectativa de que minha agrura cessasse, contudo não arrefeceu; continuei com o mal-estar intenso. O estômago estava embrulhado. Abri a porta da cozinha e vomitei no quintal com abundância. A minha testa e os cabelos logo ficaram ensopados. Aliás, o meu corpo inteiro suava excessivamente. Os achaques seguiram.
Decidi que precisava rumar para o pronto-socorro do Hospital TarcÃsio Maia. Não tinha condições de ir pedalando. Descartei a opção da bicicleta. Peguei o celular e recorri ao serviço de um carro de aplicativo. Foram longos e agônicos quinze minutos até que o motorista chegasse. O trajeto levou menos de dez minutos. Deitei-me encurvado no banco de trás. Apesar do horário, paguei apenas trinta reais pela corrida. Desci com a ajuda do condutor. O rapaz me acompanhou até o guichê da recepção. Encontrei duas pessoas na minha frente. Estas, porém, vendo a minha agonia, deixaram que eu fosse atendido primeiro.
Precisei, no intuito de agilizarem o atendimento, revelar que tenho câncer e que me encontrava em uma forte crise. Citei todos os quase impronunciáveis nomes dos remédios que tomo pela manhã e antes de dormir. O uso contÃnuo desses fármacos me permitiu decorar, além da posologia, as suas denominações com precisão. Quanto ao socorro no TarcÃsio Maia, para ser justo e grato, não tenho do que me queixar. Quando cheguei ao corredor, amparado por uma enfermeira que me pôs em uma cadeira de rodas, topamos com o médico de plantão, que vinha com um copinho de plástico com café. Não me recordo do nome desse profissional, mesmo ele tendo se identificado, entretanto me recebeu com sensibilidade quanto educação. Não é em toda parte que encontramos gente assim no serviço público.
Sem demora, portanto, aquele indivÃduo de jaleco branco, de estatura mediana, pele morena, olhos e cabelos negros, logo me encaminhou para um leito da enfermaria onde havia outras duas camas com pacientes. Ali, após as minhas explicações, ele tomou conhecimento do meu caso. Explicou-me que naquela unidade de saúde dispunham de um aparelho de ressonância e providenciou o uso da máquina. Como eu esperava, disse que minhas condições são crÃticas. Acrescentou, enfim, que o que estava ao alcance dele era aplicar uma injeção de morfina.
Isso foi o que me livrou daquelas dores terrÃveis. Cerca de uma hora depois recebi alta e novamente solicitei um carro de aplicativo, que demorou menos que o primeiro. Dessa vez não precisei de ajuda para entrar, e fui no banco dianteiro. Em casa, depois de um banho, visto que havia suado bastante, usufruà de um resto de noite tranquilo e reparador. Só deixei a cama por volta das nove horas. A seguir preparei um café, comi um pão com manteiga e uma fatia de queijo. Tomei os medicamentos prescritos para esse perÃodo do dia. Até este instante, enquanto relato a via crucis da madrugada, não sinto nenhum desconforto. São precisamente dezessete horas e dois minutos deste sábado. Todas as janelas e portas estão abertas, enquanto um vento agradável percorre a casa. Essa possibilidade de chuva sempre me deixa feliz.
Hoje não tenho a menor condição de tocar a faxina adiante, porém espero que amanhã, embora que aos poucos, bem devagarinho, eu consiga limpar mais algumas partes desta residência. Especialmente a cozinha, visto que a sala já consegui pôr em ordem. A expectativa de receber Leopoldo Nunes na próxima terça-feira é um estÃmulo que parece renovar os meus ânimos. Neste momento, para não forçar muito a coluna sentado nesta cadeira, devo findar a narrativa por aqui.
Marcos Ferreira é escritor
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Boa tarde caro mestre; aplacar uma dor é algo divino e como dizia o professor Júlio Sanderson de Queirós : ” a cura é anônima; a morte é a noticia”
Um abraçaço
Fernando começa a sentir de forma mais intensa os sintomas da doença que está no seu corpo. A dor tira a concentração; provoca desespero; mostra que precisa de ajuda. A referência à morfina, me fez lembrar que nos momentos finais dos meus pais, foi esse fármaco que aliviou o sofrimento. Estou curiosa, quase ansiosa, em saber o que vem nas próximas publicações. Parabéns nobre escritor!