Por Luís Correia
René Descartes, filósofo, físico e matemático, acreditava que a mente e o corpo eram entidades separadas e que o raciocínio, o juízo moral e o sofrimento poderiam existir independentemente do corpo. Criamos um referencial: o coração representava as emoções e o cérebro, o raciocínio.
O título desta matéria, “O Erro de Descartes”, foi escrito pelo médico neurologista e neurocientista António Damásio. Em seu livro, Damásio apresenta um conjunto de argumentos fisiológicos e anatômicos sobre a formação e processamento de imagens no cérebro, os quais têm uma íntima relação na gênese e na expressão das emoções. Além disso, as tomadas de decisões tramitam por um feedback do sistema límbico (emoções) e neocórtex (“razão”), ativando alguns dos substratos neurais envolvidos na aprendizagem emocional.
A neurociência, hoje, por meio de estudos, neuroimagem, marcadores cerebrais e eletroencefalograma com mapeamento cerebral, defende que as emoções desempenham um papel crucial na tomada de decisões e no pensamento racional. Pensamentos e ações são uma fusão entre os complexos emocionais e racionais.
Fatores emocionais têm uma participação ativa na condução do veículo automotor. Ansiedade, medo, depressão, angústia, euforia e uma cascata de sentimentos criam uma atmosfera que podem levar à participação do condutor em eventos de sinistro de trânsito.
Sabemos que conduzir um veículo automotor exige atenção, controle, raciocínio e decisão, e que o sistema nervoso tem uma relação estreita sobre esses aspectos, e consequentemente, sobre a condução do veículo.
Conduzir um veículo após uma decepção amorosa, desentendimento entre os ocupantes do veículo, distúrbio gastrointestinal, cólicas ou situações que interferem no modo de agir e de conduzir pode ser perigoso.
Brigas de trânsito, manobras equivocadas, uma marcha errada, um momento que deveria frear e acelera, um pedestre atravessando a faixa somente observado muito próximo ao veículo, um avanço de preferencial, um ponto cego são situações agravadas quando o condutor está emocionalmente abalado.
E quando essas emoções vêm somadas com substâncias depressoras do sistema nervoso? Substâncias como benzodiazepínicos (diazepam, lorazepam, etc.), opiáceos ou narcóticos (morfina, heroína, codeína, meperidina, etc.) tornam a maquinaria da resposta motora, da vigilância, da atenção e do cálculo suscetível a inúmeras falhas que culminam em sinistros de trânsito.
A fala mais comum seria: “ainda bem que não consumo nenhuma dessas drogas”. No entanto, uma pesquisa encomendada pelo Instituto Brasileiro do Fígado (Ibrafig) ao Datafolha mostrou que 55% dos brasileiros com mais de 18 anos de idade consomem bebidas alcoólicas, sendo que 32%, ou seja, um em cada três indivíduos, consomem semanalmente.
Você está entre esses 55%? Então você faz uso de droga depressora do sistema nervoso central. O álcool, nos primeiros momentos logo após a ingestão, pode aparecer os efeitos estimulantes, como euforia, desinibição e maior facilidade para falar. No entanto, com o passar do tempo, começam a surgir os efeitos depressores, como falta de coordenação motora, descontrole e sono.
Quando o consumo é muito exagerado, o efeito depressor fica exacerbado, podendo até mesmo provocar o estado de coma. O tempo do efeito e as consequências têm inúmeros fatores contributivos, como alimentação, sono, quantidade, tipo de bebida, fatores associativos, fatores emocionais, entre outros.
Em função disso, a legislação do CTB expressa, em seu Art. 276, que qualquer concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar sujeita o condutor às penalidades impostas no CTB.
Não nascemos em Vulcão, não somos compatriotas de Spock; suas alegrias, tristezas, decepções, anseios, tédios, regozijos e sonhos guiam seu automóvel junto com você.
Luís Correia é agente de Trânsito, diretor de Mobilidade do Município de Mossoró, membro da Câmara Temática de Saúde para o Transito (CTST) do Contran e do Conselho Estadual de Trânsito
Sempre entendi o ato de dirigir qualquer veiculo, como um ato que requer extrema atenção e concentração, portanto, sempre requer bastante responsabilidade.
O Alto índice de acidentes de trânsito em nosso Brasil, deriva, essencialmente, do fato da maioria dos brasileiros encararem o ato de dirigir como uma brincadeira, geralmente não dando a importância devida ao cumprimento de regras preventivas básicas.
Seu brilhante artigo, efetivamente vem referendar o quanto as regras insculpidas em nosso CTB, não só devem como podem e poderiam ser objeto de intensa e permanente publicização e escolarização no âmbito das nossa escolas e universidades.