"O caráter de um homem é o seu destino."
(Heráclito)
Em Mossoró, existe uma “história” interessante, que relata a primeira viagem de avião, realizada por dois irmãos para São Paulo. No meio da viagem, vira-se um irmão para o outro e, preocupado, diz: “Acorda fulano, pois o avião está pegando fogo!”. O irmão dorminhoco abriu bem devagar os olhos e respondeu: “Deixa de besteira, homem, esse avião nem é meu nem de papai. Pode pegar fogo que eu não me importo”.
Não sei o quanto de verdade tem essa história, até porque concordo com Saramago quando lembra: “De fingimentos de verdade e de verdades de fingimento se fazem, pois, as histórias”.
A mente humana é muito interessante mesmo, pois não é que, neste final de semana, lembrei-me mais uma vez deste fato. Provavelmente, esta lembrança esteja relacionada com a absoluta convicção, que cada vez mais carrego, de que vivemos num mundo “real”, em que as pessoas fazem de tudo para ganhar.
Trapaceiam, mentem, roubam, etc, etc, sem nenhum peso em sua consciência. Aliás, neste mundo “real” e utilitarista, não há espaço para crises de consciência. Pois as mentes só trabalham para responder estas questões: “Pra que serve isso? Se não cai na prova, não tenho porque estudar”; “Quanto vou ganhar com esta informação?”; “Comprarei quantos carros importados?”; “Ficarei mais rico e mais poderoso?”.
Se a resposta for ‘não’, então nada disso me serve.
Esquecem essas pessoas que, assim como os meus conterrâneos mossoroenses, nós estamos todos no mesmo barco – quer dizer: no mesmo avião. Esquecem que o importante não é viver, como dizia Sócrates, mas sim, viver com retidão. Esquecem que o que vale não é a riqueza material, mas sim, a riqueza de espírito, como propagava Antístenes.
Destruídos todos os nossos valores éticos, morais, virtudes e sentimentos do bem, amor e compaixão, resta-nos perguntar: a vida será só isso mesmo? Comer, dormir, beber, enriquecer e pronto: pra depois morrer. Com a palavra os utilitaristas?
Mas, antes de responderem, permitam-me contar outra história ou estória. E pra isso, vou recorrer ao magnífico filme, que não canso de passar para os meus alunos, “O clube do imperador”.
Nesse filme, existe um professor, o Sr. Hundert, que leciona na escola St. Benedict. Escola esta só para rapazes e que tinha bordado no Brasão, de sua farda, os seguintes dizeres: “Non Sibi” (Não para si); “Finis origene pendet” (O fim depende do começo).
O Sr. Hundert ensinava aos seus alunos que todo conhecimento ali adquirido, de nada valeria se não fosse para servir ao outro (“Não para si”). Para mudar o caráter de alguém e modificar o destino de um homem.
Destino esse, que pode ser cruel, como foi com Shutruk-Nahunte – rei de Anshand e Susa, soberano da terra de Elam e um dos homens mais importantes e poderosos-, que viveu no ano de 1158 a. C. Hoje, em 2008, Shutruk-Nahunte é totalmente esquecido.
Se não fosse o filme “O clube do imperador”, ninguém, absolutamente ninguém, saberia quem ele foi. Pois não existe relato seu, em nenhum livro da história. Isso é uma lei imutável: a história não perdoa aqueles – nem mesmo os ditos poderosos e que não tem medo de ninguém -, cuja ambição e conquista não trazem nenhum significado de melhoria para o seu próximo, a não ser para as suas próprias contas bancárias…
E o esquecimento, já lamentava Nelson Rodrigues, é pior do que a morte. E o pior mesmo é saber que a origem de tudo isso, a raiz de todo o mal, deste mundo “real” e utilitarista em que vivemos, está na família: “O fim depende do começo”. Pois, ao abandonarmos os nossos filhos, para que sejam criados pelas babás, pelas televisões, pelos amigos também órfãos de pais vivos, mas ausentes – afinal só temos tempo para correr em direção ao pote de ouro –, estamos criando uma geração doentia em que o cifrão ($) é maior do que o amor, em que a droga é mais importante do que a ética…
E o mais triste, para essas pessoas, é saber que um dia – quer queira, quer não –, serão forçados a se olharem no espelho e verão quem realmente são: se depararão com uma vida vivida sem virtudes, sem princípios, sem padrão moral.
Francisco Edilson Leite Pinto Júnior, professor, escritor e médico.
Simplesmente tudo.
Sem comentários.
Há tempos não lia artigo tão interessante e real, especialmente nos que vivenciamos.
Um abraço
Delmiro Moura
Texto que merece reflexao…
Enfim, mais um grande texto do grande mossoroense que é Edilson Pinto Junior…
Abraços
David Leite