Nunca imaginei que iria ficar velho. Para mim, velhos eram aquelas pessoas de mais de 50 anos, de cabeça branca, aposentados na cadeira de balanço, com uma manta sobre as pernas e chinelinhos de lã.
Todos os paparicavam e os tratavam como crianças, ninguém os levava a sério. Como se vê, desde pequeno faço graves erros de avaliação.
Felizmente, ficar velho hoje é muito melhor do que quando eu era criança. Não só pelos avanços da ciência, que prolongaram a vida e melhoraram a sua qualidade, mas pela evolução da sociedade e da tecnologia, que nos facilitaram o cotidiano, quebraram preconceitos e permitem a gente de qualquer idade ser produtiva e ter todos os direitos, e deveres, da vida social.
Nunca imaginei que minha mãe, hoje com 88 anos, continuaria tomando seu vinhozinho e estaria na internet e fazendo análise. Ela detesta ser chamada de "terceira idade": não liga de ser velha, mas não gosta de "palhaçadas".
Nunca me passou pela cabeça que um dia eu seria capaz de furar filas em aeroportos, bancos e cinemas com a tranquilidade dos justos, logo eu, que sempre respeitei a lei e sempre detestei e combati todas as formas de privilégio. Mas lamento só ter descoberto que tinha esses direitos aos 63 anos.
Mal informado, pensava que eram só para quem tinha mais de 65. Perdi três anos de moleza!
Nos aeroportos, furando feliz filas imensas, imagino como se sentem os nossos parlamentares. Assim como eles, mas por motivos diversos, não sinto a menor vergonha. Nem de minha idade nem dos meus direitos legítimos. Vou logo perguntando "qual é a fila dos velhinhos?"
Mas o politicamente correto americano continua criando eufemismos patéticos e denunciando "preconceitos" contra gente que já viveu mais. Não querem mais que nos chamem de "cidadão sênior", porque ninguém chama alguém de menos de 60 de "cidadão júnior". Nem "idoso" eles aceitam.
O correto é dizer "adulto mais velho" ou, singelamente, "homem" ou "mulher".
Depois do racismo, do sexismo e do pobrismo, o velhismo. Além de tentarem nos tirar o orgulho de havermos sobrevivido até aqui, querem nos obrigar ao ridículo.
Nelson Motta é jornalista, escritor, compositor (texto extraído de O Estado de São Paulo em 12 de junho de 2009)
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