Em 1985, o escritor Patrick Suskind lançou a sua obra mais famosa, o livro “O perfume”, que tempos depois foi adaptado para o cinema, em uma superprodução, e conta a estória de um homem, Jean-Baptiste Grenouille, rejeitado pela mãe, pelas amas-de-leite, pela igreja e pelo mundo.
Crescendo, portanto, neste ambiente hostil e carente de amor, Grenouille descobre ser dotado de extrema sensibilidade olfativa, a ponto de as pessoas dizerem: “Ele enxerga mais com o nariz do que com os olhos”.
Quase nada escapava ao seu nariz: do fresco aroma do primeiro alvorecer – cheiro este considerado como liberdade e esperança –, até o mais pútrido de todos os odores produzidos no mundo. Mas, existia um aroma que ele não conseguia cheirar. Mesmo se ele se afogasse em si mesmo, Grenouille não conseguia cheirar a si próprio.
Por isso, ele procurava desesperadamente, no aroma dos outros, um cheiro que pudesse ser o dele também. E só assim: descobrindo o seu cheiro, ele poderia tornar-se um homem completo e amado. Afinal, era só através do aroma – que é “irmão da respiração” – que Grenouille pensava poder penetrar nas pessoas, atingindo ao coração delas, para que, nesse órgão, fosse feita a distinção entre atração e menosprezo, nojo e prazer, amor e ódio.
É interessante como as pessoas ainda pensam que é a arte que imita a vida. Para mim, cada vez mais, estou convencido do contrário. Pois veja só, caro leitor, quando li, o livro “O perfume”, logo pensei: “será que um dia, vou conhecer alguém com esse problema de Grenouille (não sentir o seu próprio cheiro)? E não é que, recentemente, descobri que existe, não só um, mas vários Grenouilles trabalhando (será que eles trabalham mesmo?) num mesmo local e com o semelhante problema (Anosmia – perda da capacidade de sentir o cheiro – de si mesmo)…
É sim, caro leitor. É lá mesmo no congresso nacional que encontramos os diversos Grenouilles da vida… Eles não conseguem mais sentir o cheiro pútrido de suas ações diárias e, portanto, não se incomodam em nem mesmo esconder as suas pestilentas atitudes: roubos, mentiras, cinismos, etc, etc…
A podridão exalada por esses anósmicos é tão grande que não consegue mais ficar restrita apenas aos corredores do congresso nacional. Nós, os escravos desses Grenouilles, que ainda conseguimos ter um mínimo de “odor próprio”, de sentir o nosso próprio cheiro, estamos, aqui fora, com dificuldades respiratórias, pelo mau cheiro causado nas negociações realizadas nas entranhas podres daquela casa…
Lá tudo cheira mal… Como se não bastasse o já tão propalado “toma-lei-me-dá-verba”, agora absorvem culpados, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Quando todas as provas mostram que houve corrupção, sonegação, nepotismo, quebra de decorro parlamentar… nada disso tem valor, pois o que vale mesmo é continuar produzindo gases fedorentos, tão fedorentos, que o mais pútrido de todos os abdomens agudos inflamatórios, repletos de pus, no mundo, não seriam capazes de exalar tal odor…
O Congresso nacional literalmente está apodrecendo por dentro… E o pior, meu caro leitor, é que não vejo nenhum indício de uma possível cura, ou da limpeza dessas entranhas. Nem a longo prazo. Pois, quem um dia se dizia estar disposto a fazer essa limpeza, hoje é quem mais produz a podridão…
São estupidamente podres! E como Aristófanes dizia que “a juventude envelhece, a imaturidade é superada, a ignorância pode ser educada e a embriaguez passa, mas a estupidez dura para sempre”, é melhor começarmos a andar com os nossos narizes tapados (pegadores de roupas, máscaras…), pois este fedor irá continuar “Ad infinitum.”
Francisco Edilson Leite Pinto Júnior, professor, médico e escritor
Faça um Comentário