Há 30 anos, uma revista de escândalos de Hollywood mostrou o comediante Jerry Lewis, então ainda famoso, como um pai maníaco, tirânico e paranóico, que, quando seus filhos eram crianças, instalou câmeras e microfones pela casa para espioná-los. Até no banheiro os guris ficavam ao alcance de seus olhos.
O equipamento, digno do Dr. Mabuse, fora instalado em nome da disciplina.
Na época, isso foi considerado o máximo da crueldade e da insegurança. Todo mundo odiou Jerry Lewis e teve pena de seus filhos.
Mas os anos se passaram e, com a evolução da tecnologia, Jerry foi absolvido. Terá sido, no máximo, um pioneiro da espionagem paterna, e dos mais primitivos.
Hoje, conforme a reportagem de Cláudia Collucci na Folha de domingo último, a criança começa a ser monitorada no útero, pelo ultra-som 3-D. Vem à luz e, pelos anos seguintes, seus pais continuam a controlá-la com as câmeras on-line, no berçário, na escolinha infantil e em todo o apartamento, gerando imagens e sons que podem ser acessados à distância pelo computador ou pelo celular.
À medida que o garoto cresce, o olho protetor e onipresente continua a acompanhá-lo -na escola, no playground, no prédio.
Difícil que um menino desses roube um simples beijo à filha da vizinha no elevador ou na escada de serviço sem estar se sentindo filmado por alguém.
Finalmente, quando tiver idade para sair sozinho, seus passos serão guiados pelo sistema de GPS instalado no celular, no carro que ele acabou de ganhar e até na sola do tênis. Nunca estará sozinho.
Eis aí um jovem pronto para babar na gravata, cair na primeira esparrela que lhe aprontarem, meter-se nas piores encrencas, morrer de amores sem motivo justo ou matar o pai e a mãe que nunca lhe permitiram tornar-se um adulto.
Ruy Castro é jornalista e cronista
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