Por todo o restante de meus dias, que ainda viverei neste mundo, dificilmente, esquecerei o dia 22/02/2008. Embora, tendo acordado uma tanto quanto tarde, tive tempo ainda de engolir rapidamente o meu café, tomar banho e seguir para o auditório da reitoria da UFRN, para a aula magna inaugural do ano letivo: ano do cinqüentenário da nossa Universidade.
Ao chegar, quase todos os lugares estavam ocupados. Um aluno me acenou: "- Aqui, professor".
Consegui, enfim, sentar. Minutos depois, deu-se inicio à solenidade. E não poderia ter sido de melhor forma: o Quarteto de Cordas sobre a batuta do maestro Osvaldo D’amore.
O ambiente estava sendo cuidadosamente preparado para o seu grande desfecho: a aula do pesquisador em neurociência, o Dr. Miguel Nicolelis. E que aula! O Dr. Nicolelis retirou o paletó, dobrou as mangas e iniciou a sua fala.
Utilizando-se não só de uma linguagem de fácil compreensão – nada comum aos pesquisadores, ainda mais quando se trata de um dos cinqüenta mais influentes do mundo –, mas também de um excelente senso de humor – afinal o riso é a menor distância entre duas pessoas –, o Dr. Nicolelis explicou a magnífica pesquisa que está desenvolvendo no Instituto Internacional de Neurociência de Natal (IINN): "A criação de braços robóticos controlados por sinais cerebrais".
Essa pesquisa abrirá um mundo novo, ou melhor: uma nova vida para pacientes tetraplégicos, que são condenados a viverem deitados em uma cama, olhando para um teto sem estrelas e sem nuvens, mas que, agora, poderão num futuro bem próximo, assim espero, andarem com as suas próprias pernas, ajustadas a próteses controladas pelo seu próprio cérebro.
Parece até coisa de ficção científica, mas é verdade. Certa vez, a nossa poetisa maior Auta de Souza sentenciou: "Ai daquele que deseja viver sem uma ilusão", isso porque somos feitos, segundo Shakespeare, da matéria dos nossos sonhos. Sonhos que são o oxigênio da vida. Sonhos que podem até parecer impossíveis de serem alcançados, mas segundo o Dr. Nicolelis: "o impossível é o possível que nunca foi tentado".
A UFRN, que nasceu de um sonho de um sonhador chamado Onofre Lopes, agora vem albergar mais um sonhador. Um sonhador que não se contenta apenas com os resultados de sua pesquisa, mas que quer ainda mais: quer modificar o mundo. E nada melhor para essa mudança, disse o Dr. Nicolelis, do que através da educação e do sonho.
Assim, o IINN criou uma escola para alunos carentes da rede pública de Macaíba, em cuja sede esses alunos estão desenvolvendo, através de sua criatividade, modelos robóticos. Meu Deus! Isto é realidade ou será que estou sonhando dormindo? Não! É verdade, sim!
Não foi à toa que, quando Prometeu trouxe o sonho para o homem, ele trouxe também a esperança: o sonho do homem acordado. E a platéia estava bem acordada para ver que o Dr. Nicolelis, além de sonhar e contagiar-nos com o seu sonho, também chora. Chora, talvez, por saber que, no nosso País – tão repleto de mentes, ocupando o poder, cujos cérebros são infinitamente menores do que os dos Hamsters (ratos) – ainda há esperança.
Nem tudo está perdido.
Após ter sido aplaudido por todos de pé, o nosso novo sonhador da UFRN ainda teve a gentileza de responder a todos que ali o procuravam. Perguntei-lhe se um dia a nossa mente seria capaz de fazer com que, além de movimentar braços e pernas robóticas, pudéssemos chegar a um ponto tal de sofisticação de "esquecermos" algum órgão interno doente, tipo um estômago com câncer, em que o paciente, após ignorar este órgão, estaria assim aliviando não só a sua dor, mas também quem sabe até a sua doença…
O Dr. Nicolelis disse que isso seria muito difícil. No entanto, ele não disse que seria impossível. E mesmo se dissesse, foi ele mesmo que nos ensinou: "O impossível é o possível que nunca foi tentado!".
Afinal, o absurdo de hoje, pode ser, sim, a verdade de amanhã…
Francisco Edilson Leite Pinto Junior Professor, médico e escritor – edilsonpinto@uol.com.br
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