Por Bruno Ernesto
Para que tanta pressa, se irão retardar o seu cortejo para poder lhe dar o último adeus ?
Como é interessante perceber que a busca da felicidade não depende exclusivamente de nós, como os autointitulados gurus da felicidade tanto pregam.
Não soa coerente com o que tantas pessoas consideram válido?
Perceba que se a receita infalível deles de fato funcionasse, haveria necessidade de tantos livros de autoajuda ou novas edições de tais receitas miraculosas?
Afinal, a felicidade plena muda com o tempo?
Evidente que ao longo da vida mudamos de opinião, temos novos desejos, novas metas de vida, nem mesmo as nossas amizades são perenes ou perpétuas. Vivemos de forma cíclica, de maneira que é mais que normal que mudemos de opinião e de metas.
Aliás, as metas não são feitas necessariamente para serem cumpridas.
Diria que, na maioria das vezes, são descumpridas de forma planejada. Não há nada de anormal, errado ou frustrante nisso.
Quem vive exclusivamente de metas são as equipes econômicas. E, veja só como anda a economia.
Veja que o fundamento invocado por tais gurus da felicidade transfere toda a infelicidade – ou não alcance da felicidade plena – para o indivíduo, como se fosse culpa exclusiva dos seus seguidores.
Ele terceiriza a infelicidade e a culpa do insucesso para o outro, como se a sua receita de felicidade fosse infalível.
Para eles, se você não é feliz e plenamente realizado, você é o único culpado por esse fracasso, pois não se esforçou o suficiente para alcançá-la e isso é terrível para os desavisados. Tem muita gente que acredita mais nisso que na própria razão.
É importante que tenhamos em mente que há vários tipos de felicidades e, duas delas, são altamente consideradas diariamente por nó, muitas vezes sem nem mesmo percebermos.
A felicidade eudaimônica, está relacionada ao bem estar com com base no esforço, ocupação ou trabalho, mesmo em situações nas quais podemos descansar e não fazer nada, porém optamos por mantermos ocupados, uma vez que esse tipo de felicidade vem da percepção de que temos algum potencial para a vida, ou mesmo um propósito que nos dá uma sensação de orgulho por concluir uma determinada tarefa, por mais simples que seja.
Essa é a razão pela qual tantas pessoas relutam em não deixar de trabalhar mesmo após se aposentar ou mantêm-se ocupadas durante as férias ou num período de descanso.
Já na felicidade hedônica, mantemo-nos com pensamento relativamente positivos e alegres, e o ócio é muito bem vindo para se alcançar a felicidade. Ainda que em certos momentos retomemos alguma atividade ou ocupação.
Entretanto, a diferença nodal entre elas é que a felicidade eudaimônica é a felicidade duradoura; enquanto a felicidade hedônica é a felicidade imediata.
O que se tem constatado, entretanto, é que a felicidade plena tem mais ligação com a felicidade coletiva.
Uma pergunta simples pode demonstrar o quão você se esforça e se importa com pequenos gestos e atitudes: por acaso, você é colaborativo no seu dia a dia?
Ao estacionar o seu veículo, eventualmente, você leva em consideração o outro motorista?
Estaciona trancando outro veículo ou uma garagem? A propósito, ocupa uma vaga exclusiva para idosos ou duas vagas de estacionamento?
Sempre que possível, gosto de relembrar o que Guimarães Rosa dizia sobre a felicidade: “Felicidade, só em raros momentos de distração.”
Se considerarmos o conceito de felicidade plena como sendo aquela que considera apenas as grandes vitórias, os grandes momentos de um indivíduo, tente enumerar quantas vezes você, de fato, se sentiu feliz com essas grandes conquistas.
Aliás, você tem alguma meta inalcançável?
Talvez você nem se lembre quando foi a última vez que lhe agradeceram por algo que você despretensiosamente fez de bom, gentil e, genuinamente, para colaborar com a coletividade ou para um desconhecido.
O que se tem visto com seriedade, é que a felicidade repousa mais na colaboração de todos, num movimento convergente, nas pequenas coisas do dia a dia, com atitudes voltadas para o interesse coletivo. Ou seja, para a felicidade coletiva.
Se você observar bem, os países com alto índice de desenvolvimento humano não são fortes apenas no campo econômico, mas também nos aspectos de desenvolvimento social e político.
Na Suíça, por exemplo, praticamente todos os meses há referendos e consultas à população para que decidam sobre todos os tipos de questões e, embora não seja uma exclusividade dos suíços, é necessário destacar que, se apenas a economia suíça fosse suficiente para proporcionar a felicidade plena, os demais aspectos pouco importariam, de fora que são as pequenas coisas que refletem e direcionam todo o nosso bem estar e conduz à plena felicidade. Pelo menos possibilita que seja tangível.
Um dos muitos exemplos disso foi o que Vincent van Gogh escreveu ao seu irmão Theodoro van Gogh, quando, em uma de suas muitas cartas, tentou convencê-lo a ir para a província holandesa de Drenthe e também tornar-se um pintor, e não apenas encorajá-lo, como fez a vida inteira, embora fosse o irmão mais novo de Vincent.
Se você tiver a oportunidade de visitar o museu Van Gogh em Amsterdã, verá inúmeras cartas trocadas entre os irmãos van Gogh, compartilhando não apenas as agruras, mas também o incentivo e, sobretudo, o raros e pequenos momentos de felicidade, os quais foram determinantes para que Vincent van Gogh seguisse como pintor.
Embora em vida Vincent van Gogh tenha sido considerado um louco e fracassado e, a despeito de toda polêmica que cerca a sua morte, podemos ver a sua felicidade em cada uma de suas telas com suas cores vibrantes: pequenas e constantes alegrias.
“Vamos lá, velho amigo, vem pintar comigo na baía, no campo de batatas. Vem caminhar comigo atrás do arado do pastor. Vem olhar a fogueira comigo, deixar soprar através de ti a tempestade que sopra através da baía. Fuja.” (Carta de Vincent a Theo van Gogh).
Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor