Por Marcos Pinto

Massilon, coronel Isaías Arruda do Ceará e Lampião fazem parte de um enredo ainda incompleto (Fotomontagem BCS)
Nunca é demais repetir: é densa e vastíssima a bibliografia historiográfica da temática cangaço, no que consiste ao ataque lampionesco a Mossoró. Mas, nunca houve aprofundamento sobre os autores intelectuais do malogrado ataque.
Os dois principais jornais de Mossoró abordaram o episódio com manchetes instigantes, porém sem referenciar que o assalto à cidade fora objeto de complô formado por Tilon Gurgel, seu genro Décio Holanda, desembargador Felipe Guerra casado com uma irmã de Tilon Gurgel, que se acumpliciou com Jerônimo Rosado, seu amigo íntimo e compadre (vide Livro “Jerônimo Rosado” de autoria do consagrado historiador Câmara Cascudo – páginas 24/25 – coleção mossoroense – série C -vol XVIII. Editora Pongetti – RJ – ano 1967).
À página 35, o renomado mestre Cascudo tira carta de seguro: “Todas as frases ‘históricas’ têm uma documentação negativa, desmentidos formais de pesquisadores. Mas o real é que não foram ditas, mas foram programas subsequentes de veracidade indiscutível”.
Após o ataque, os jornais “O nordeste” – edição de 26.06.1927 estampa manchete ridícula e inverídica: “Jararaca falecera em viagem para Natal”, quando toda a cidade já sabia, à boca miúda, que cangaceiro fora assassinado à meia noite, no cemitério, por componentes da Polícia Militar, como queima de arquivo.
Na manhã do mesmo dia em que foi eliminado, ele recebera a visita de uma senhora, à qual pediu para dizer ao prefeito Rodolfo Fernandes que tinha assunto confidencial para tratar com o mesmo. A imprensa nunca citou o nome desta senhora e qual a razão da mesma não ter dado o recado ao prefeito.
O mesmo jornal “O nordeste” estampa em edição de 09.07.1927, a Manchete “Massilon no Brejo,” referência ao Brejo de Pedra das Abelhas (atual cidade e município de Felipe Guerra-RN), onde residia Tilon Gurgel, também amigo íntimo do farmacêutico Jerônimo Rosado.
Este prestigioso jornal estampou somente dois anos e dez meses depois do ataque (edição de 12.04.1930) a elucidativa Manchete: “Isaías Arruda perto de Mossoró no dia 13 de junho de 1927,” referência a influente coronel cearense, de estreita relação com o cangaço. Indaga-se: por que o dono do “Nordeste” omitiu o fato de que Isaías era hóspede de Jerônimo Rosado em seu sítio “Canto”?.
Ouvi esta assertiva reiteradas vezes feita pelo tabelião Romeu Rebouças, que não pedia ressalvas.
Não resta dúvidas de que os historiadores Câmara Cascudo, Raimundo Nonato da Silva e Raimundo Soares de Brito (Raibrito), eram visceralmente vinculados à elite política dominante no Estado.
Câmara Cascudo privou da amizade de todos os governadores do ano de 1920 à 1955. Raimundo Nonato cerrou fileiras com Dinarte Mariz, desde o golpe getulista de 03 de outubro de 1930, tendo sido nomeado juiz de direito da comarca do Apodi no ano de 1957 pelo amigo/governador Dinarte Mariz. Observe-se que o prestígio e amizade de R. Nonato com o Dinarte era imensurável, que o R. Nonato assumiu a comarca do Apodi e no mesmo dia uma plêiade de amigos de Mossoró foram para a solenidade de posse. Foi organizada grande festa, sendo certo que o R. Nonato já havia sido professor em Apodi na década de 40 (1940).
Uma semana após a sua posse, o celebrado historiador R. Nonato solicitou aposentadoria como juiz de Direito, valendo-se dos seus 36 anos de exercício como professor da rede estadual de ensino. Ao saber, da aposentadoria, o governador Dinarte esboçou um sorriso, dando a entender que o astuto e novel juiz de Direito lhe passara a perna.
Alguns historiadores/pesquisadores apropriam-se da história para torná-la oficial, elidindo ou ocultando o papel dos demais protagonistas que, no caso, são condenados ao esquecimento mediante a fragmentação de “fatos” e “verdades.” É um modelo que serve aos objetivos dos “protagonistas” oficiais.
Certas forças autênticas e criativas dos processos históricos são dissimulados por uma narrativa que acentua a ação da vontade de alguns sujeitos privilegiados.
Costumo enfatizar que o historiador escreve fundamentado em documentos oficiais irrefutáveis. Já o memorialista escreve o que quer, na maioria das vezes para agradar as elites dominantes, ocultando, deturpando, e dissimulando, atendendo assim às hostes políticas e partidárias as quais está visceralmente vinculado.
Inté.
Marcos Pinto é advogado e escritor