domingo - 30/10/2016 - 10:22h

Realidade versus retórica

Por François Silvestre

O atual governo é continuação. Monótona repetição de uma década, sem criatividade e vazio retórico. Do segundo governo Wilma e do governo Rosalba, que Robinson jurou não continuar“.

Quando estive na Secretaria de Planejamento, recebi uma vasta explicação sobre o programa de implantação de uma prática estratégica de governabilidade. O Secretário e sua equipe inovadora fizeram uma apresentação retoricamente impecável. Tudo com vistas à colheita de reconhecimento futuro.

Na época, não contestei. Deixei que o futuro respondesse, torcendo pelo o sucesso da retórica.

Num certo momento, o Secretário sentenciou, com muita ênfase: “Foi o discurso de um governo técnico que ganhou a eleição”.

Ouvi calado para cumprir uma regra da hospitalidade sertaneja. Quando o dono da casa pede a opinião do visitante, acata a resposta mesmo que dela discorde. Porém, quando a opinião é expressa pelo dono da casa o visitante há de retribuir com a mesma gentileza.

Silenciei, cumprindo a regra não escrita da terra e da gente de onde venho. Deste sertão profundo, cujos galhos da jitirana, a se enfronharem, refazem de infância meus olhos de criança.

Incomodou-me o gentil silêncio. Por quê? Porque o interesse histórico, que é também interesse público, obrigou-me a questionar o que se revelou retórica do entusiasmo. Ainda mais a tratar-se da história política daqui. Dessa terra que carrego no matulão para qualquer lugar aonde me leve o destino de retirante.

Não, meu caro, não foi discurso técnico que elegeu Robinson. Foi um conjunto de fatores tão marcadamente convergentes, que o discurso fica na rabeira da fila. Essa promessa técnica não ganhou a eleição nem se revelou competente no governo.

A vitória de Robinson nada deve à retórica. Foi rejeição popular ao fantástico acerto de cúpula que ignorou completamente a memória coletiva. Desmentindo outra falácia técnica, de que o povo não tem memória.

Um candidato sem máculas, simples, de comunicação fácil, contra um agrupamento de “aliados” que durante três décadas trocaram acusações e insultos. O povo reprovou o ajuntamento “heterogêneo”.

Disse o Secretário que “o tempo era outro”. Retórica do vazio. Aí estão os fatos. Este texto não inova, republico as mesmas razões, pela atualidade e comprovação de que a retórica não faz a realidade. É o inverso. A realidade desmente a retórica.

Mudança é a mais prostituída palavra de cada governo.  Na hora da disputa do voto, os técnicos são dispensáveis. E a mudança decantada é a de “que tudo mude pra que fique tudo do mesmo jeito”. Da lição de Lampedusa.

O que mudou? Absolutamente nada.

O atual governo é continuação. Monótona repetição de uma década, sem criatividade e vazio retórico. Do segundo governo Wilma e do governo Rosalba, que Robinson jurou não continuar.

A beleza virtual do quadro prometido, numa tela enorme, queda-se vencida pela realidade mal enfrentada.

E todos nós pagamos por mais uma retórica abatida em pleno voo.

Té mais.

François Silvestre é escritor

* Texto originalmente publicado no Novo Jornal.

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. Honório de Medeiros diz:

    Palmas e mais palmas!

  2. naide maria rosado de souza diz:

    Grande, François Silvestre. Como sempre, Artigo maravilhoso de palavras que me forçam a relê-las para se fixarem, sem possibilidade de esquecimento, no meu cérebro não privilegiado como o seu.
    Acabo de votar. Li, na Internet, o que comprovei. Aqui no Rio de Janeiro, cabia ao eleitor escolher em qual lado das nádegas receberia uma injeção de Benzetacil. Escolhi, na falta de opção que me alegrasse, como cidadã, e doeu.

  3. João Claudio diz:

    O governo técnico não passa do mesmo feijão com arroz de sempre, sem direto a tempero. Apenas água e sal.

  4. Marcos Pinto. diz:

    Povo idiota e imbecilizado esse que votou e elegeu essa incompetente e desastrosa Rosa de Hiroshima mossoroense. Triste sina dos que gostam da vida de gado, sem direito a não ser se contentar com as migalhas que caem das mesas fartas da oligarquia político-familiar numerada de Mossoró. Não tem, sequer, o direito da disparada, em estouro da boiada.

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