Devido ao fato de ser médica, sou procurada por dezenas de mulheres diariamente, que motivadas pelo contato com mulheres médicas, tornam-se abertas, falando livremente sobre os seus problemas, principalmente os sexuais. O que tenho observado, ao longo dos anos, trabalhando em postos de saúde do estado e da prefeitura, é uma permanente crise da sexualidade na mulher de baixa renda.
As queixas são várias, não obstante a base ser a mesma. Essas mulheres não sentem prazer sexual. Sexo fazem bastante.
Tem em média duas relações sexuais por semana, isto porque são procuradas pelo marido, que – pelo que tenho observado, os homens não estão em crise – chegam cansados do trabalho, mas não querem outra coisa, a não ser fazer sexo.
As mulheres estão exauridas por todo um trabalho doméstico (lavando, passando, cozinhando, quando têm comida), problemas com filhos pequenos, além de sofrerem a falta de comida em casa, bebida do marido, espancamento, doenças venéreas (DST), isto porque os homens de classe média baixa têm várias mulheres e são muito promíscuos. Enfim, há uma gama de fatores causando a transformação destas mulheres em trapos humanos.
Aliás, estas mulheres aparentam o dobro ou triplo da idade real. São seres sem vida, corpos sofridos, bocas sem dente ou com múltiplas cáries, pele seca, desidratada, rugas profundas marcando rostos.
Para ilustrar melhor esse aspecto, nunca vou esquecer a imagem de uma paciente que me procurou, aparentando 60 anos. Sua idade real era 28, o protótipo da mulher fantasma descrita acima. Motivo da consulta: não agüentava mais fazer sexo com seu marido. Este não a deixava em paz um dia sequer, e essa senhora não suportando as dores físicas que sentia no ato sexual, pedia-me para falar com seu marido, alegando doença grave. Foi o que tentei fazer e não obtive êxito.
A conclusão a que cheguei nesses anos todos, atendendo a um sem-número de mulheres, é que a sexualidade está em crise e não o sexo. “Doutora, não sinto nada, dê-me um remédio para esta coisa, porque já não sinto mais nada, e não dá para fingir. O meu marido me bate se me recusar a manter relações sexuais com ele”.
Esta é a queixa mais freqüente que ouço sempre.
Quantidade não é qualidade e sentir prazer não significa manter um relacionamento sexual.
O que faço para ajudar a minimizar os problemas dessas mulheres? Procuro conscientizá-las ao máximo, orientando-as em questões sexuais, conversando com os maridos, alertando-as para os problemas orgânicos que suas mulheres são portadoras.
Acho que faço alguma coisa, mas há muito trabalho a ser feito. O problema é de ordem econômico-social e neste setor nada posso fazer.
Maria do Carmo Rego, médica ginecologista-obstetra.
Doutora Maria do Carmo a senhora me faz rir quando diz: “isto porque os homens de classe média baixa têm várias mulheres e são muito promíscuos.” Doutora, pelo amor de Deus, em que mundo a senhora vive? Esses são os que tem menos mulheres! Saia na calada da noite, veja os carrões que adentram os motéis, veja as camionetes importadas que param à beira da estrada para dar carona a prostitutas e travestis, veja os bares-esconderijos e perceba como são lotados de senhores distintos da alta sociedade local: médicos, advogados, empresários, políticos… a lista é grande. Os pobres, minha senhora, não podem ter nada disso. Andam de bicicleta e não vão muito longe. Têm amantes, sim, mas normalmente são as vizinhas, as amigas da própria esposa ou então alguma colega de trabalho. São normalmente mulheres com donos que não se satisfazem com o que tem dentro de casa e buscam outras formas de prazer. Mas são os ricaços, esses sim, que contratam serviços vários, de vip a “don’t griffe”, de mulheres. Esses sim, minha cara doutora, são os patifes muito promíscuos que existem na nossa cidade.
O comentário de Juscelino Pereira complementa o da Dra. Maria do Carmo.