domingo - 15/10/2023 - 06:50h

Corpo fechado

Por Bruno Ernesto

Ilustração da Champion Dog

Ilustração da Champion Dog

Recentemente, li uma excelente crônica do grande Marcos Ferreira, na qual ele passou por uma quizomba daquelas (veja AQUI)! Quase parou no hospital. Um aperreio.

Tem quem não acredite em mau-olhado, olho gordo, quebranto, inveja, mandinga, enguiço, mau agouro e outras coisas.

Na última sexta-feira 13, pipocaram publicações na internet (que Xangô me perdoe), sobre essa data simbólica.

Eu mesmo publiquei a foto de Liev, meu gato preto da sorte.

Quando li a crônica de Marcos Ferreira, que falava sobre um mal súbito, possivelmente um mau-olhado, de súbito (desculpem o trocadilho), lembrei do mestre Luís da Câmara Cascudo e seu livro Meleagro, no qual fala de magia, catimbó, superstição, religiosidade e fechamento de corpo.

E, veja, Cascudo era católico fervoroso.

Quem já não teve medo de alguém lhe varrer os pés?

Certamente, você, leitor, já desvirou a sandália para proteger sua mãe. Talvez tenha colocado uma vassoura atrás da porta, batido na madeira três vezes e levado seu filho para rezadeira.

Minha mãe, católica fervorosa, me levava para Dona Mafisa me benzer com arruda e vassourinha quando era criança. Talvez para me livrar de uma pneumonia. Nunca esqueci.

Até Lampião, para a surpresa da volante que o matou na Grota do Angico, levava no seu bolso a oração da Pedra Cristalina. Talvez tivesse também a oração das 13 palavras ditas e retornadas. Quem sabe?

No aperreio ou por hábito, todos nós, consciente ou inconscientemente, consideramos certos rituais importantes para nossa saúde espiritual.  Sexta-feira 13 passada, vi muita gente demonstrar isso, e achei excelente.

Afinal, tem quem não acredite. Mas não duvida.

Incenso, trabalhos de amor e outras mandingas também são populares. Bem, mas isso é outro assunto.

Há quem coma churrasco à noite, mas compre sal só durante o dia; não tenha medo de coruja, mas horror a rasga-mortalha e urutau; adore chá de arruda, faça figa, tenha olho grego pendurado na porta e reze um pai nosso antes de dormir.

O sincretismo religioso é tudo.

Já escolheu sua roupa anil, renovou sua folha de louro na carteira e passou desinfetante de lavanda?

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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Categoria(s): Crônica
domingo - 08/10/2023 - 12:14h

Ética jurídica e literatura – uma boa mistura

Por Marcelo Alves

Ilustração da página Direito ao cinema

Ilustração da página Direito ao cinema

Havendo proposto, na semana passada, o estudo interdisciplinar da ética jurídica com a literatura/cinema (veja AQUI), venho hoje fazer uma defesa dessa curiosa mistura. Especificamente, pretendo responder à dúvida básica que deve estar na cabeça de vocês: por que os profissionais do direito devem estudar ética jurídica através da literatura/cinema? Há alguma utilidade nisso?

Sem titubear, minha resposta é sim. E por vários motivos.

Antes de mais nada, o contato com a boa literatura é fundamental para o aprimoramento do discurso jurídico, sobretudo a capacidade de escrever dos profissionais do direito, incluindo aqui bacharelandos, advogados, promotores, juízes, legisladores e por aí vai. Para escrever bem, é preciso, ou pelo menos muito recomendável, ler bem. Isso sem falar que ler boa literatura é algo muito – muitíssimo mesmo – gostoso (certamente bem mais que os enfadonhos tratados jurídicos). Aqui já ganhamos duplamente.

Ademais, já sendo mais específico, a literatura/cinema testemunha a visão sobre o mundo jurídico existente em determinada sociedade em certa época (embora marcada, em boa medida, pela ótica particular do autor da obra estudada). Esse testemunho é bem mais acessível/compreensível aos leitores (com ou sem formação jurídica), para fins de reconstrução da imagem que a sociedade tem de seus atores/profissionais do direito, do que os áridos estudos jurídico-sociológicos de caráter estritamente científico.

Mesmo em se tratando de obras estrangeiras, podemos nos valer da análise comparativa para conhecer melhor a imagem que a literatura e a sociedade brasileiras fazem da nossa atividade jurídica e dos seus profissionais. E vale a pena estudar ética jurídica através da literatura/cinema porque a (re)construção ficcional dos operadores jurídicos pode ser um incentivo para que os estudantes e os profissionais do direito reais (juízes, promotores, advogados, policiais etc.) repensem – e, por consequência, reconstruam com aprimoramento – os seus papéis e as suas imagens na sociedade.

Doutra banda, na literatura/cinema, há inúmeras estórias que enfrentam e resolvem eticamente problemas jurídicos. Os grandes autores/diretores relatando a casuística da vida forense, dos escritórios de advocacia ou das prisões, em linguagem mais elegante e acessível do que a linguagem técnico-jurídica, são frequentemente excelentes professores de direito. Aliás, vale a pena estudar o direito/ética jurídica através da literatura/cinema porque, na medida em que haja uma correspondência entre a obra estudada e a realidade do mundo jurídico (o que nem sempre se dá, já que estamos falando de obras de ficção), o estudo do direito, partindo da casuística narrada, torna-se menos abstrato.

Outrossim, a ficção, ao mesmo tempo em que reproduz (além da concepção particular de seu autor) o direito posto e o imaginário popular acerca das diversas temáticas ético-jurídicas, também influencia, em graus variados, a construção desse direito e, sobretudo, desse imaginário. Nesse ponto, como se dá com outras interfaces da literatura (com a religião, com os costumes, com a moda etc.), a literatura e o cinema são subversivos, tanto para a filosofia do direito como para o direito positivo. Não é de causar espanto que esses “críticos” tenham antecipado muito das modernas teorias e tendências do direito (tais como a ética jurídica, o ambientalismo, o biodireito, o feminismo, a transexualidade etc.).

De fato, muitas das ideias inovadoras no direito, assim como boa parte das críticas à mentalidade jurídica consolidada, historicamente encontraram sua mais vívida expressão nesse popular e imaginativo meio de expressão, denominado por nós de romance, mas que, poeticamente, o mesmo William P. MacNeil chamou certa vez de “lex populi” (na obra “Lex Populi: The Jurisprudence of Popular Culture”, Stanford University Press, 2007).

Por fim, concluo afirmando que, com os grandes autores, com suas belas estórias, aprendemos que o direito não é um fim em si mesmo, isolado do mundo; ao contrário, ele faz parte da vida cotidiana, que é carregada de dramas bem reais. Alguns até acreditam ser essa a principal razão pela qual a literatura – e a arte em geral – interessa ao direito.

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador Regional da República e doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 08/10/2023 - 11:24h

Fé e devoção

Por Odemirton Filho

Devotos do 'santo' popular em Juazeiro do Norte (Foto: Kid Júnior/Diário do Nordeste)

Devotos do ‘santo’ popular em Juazeiro do Norte (Foto: Kid Júnior/Diário do Nordeste)

Ao pé da estátua do Padre Cícero Romão Batista, em Juazeiro do Norte, Ceará, centenas de pessoas, sob um sol escaldante, sentindo o mormaço, olham para o alto, escrevem seus nomes no monumento, e pedem a benção do Padim Ciço. São crianças, jovens, adultos, idosos; gente de todos os recantos do país, principalmente do Nordeste.

Romeiros andam pra lá e pra cá. Vários ônibus lotados de fiéis sobem ao local onde se encontra o monumento, algumas pessoas fazem o percurso a pé. Lojinhas vendem os mais variados produtos, terços, rosários, chaveiros, imagens etc. Visita-se à casa azul, na qual os romeiros fazem os seus pedidos, pagam suas promessas, veem fotos e objetos que pertenceram ao Padre Cícero.

A cidade do Juazeiro vive e respira a memória do Padre Cícero. Em quase todos os estabelecimentos comerciais se vê uma estátua ou foto; creio que em boa parte das residências   também seja assim, apesar do Padim não ter sido declarado Santo pela Igreja Católica.

No livro Padre Cícero, Santo dos Pobres, Santo da Igreja, de autoria da religiosa Annete Dumoulin, o Bispo emérito de Crato, Dom Fernando Panico, diz que em 2006 foi entregue à Congregação para a Doutrina da Fé um pedido de reabilitação histórica e canônica do Padre Cícero. O Pedido, segundo ele, foi sustentado em sólidos argumentos, fruto de profunda reflexão dos membros de uma comissão, composta por doutos em várias ciências.

Por outro lado, não vi nenhuma menção ao encontro entre o Padre Cícero e Lampião, no qual o sacerdote concedeu uma falsa patente de capitão ao cangaceiro, quando este visitou o município. Além disso, como sabemos, há outros fatos que maculam a biografia do Padre.

Entretanto, para a maioria das pessoas que visita o Juazeiro nada disso importa. O que vale é a fé e a devoção no Padim.

Consta que dois milhões de pessoas visitam anualmente a cidade. Há um forte turismo religioso, movimentando a economia da região metropolitana do Cariri, pois as acolhedoras cidades de Barbalha e de Crato são vizinhas do Juazeiro do Norte.

A região é quente, abafada; até mais que Mossoró. Lá estando, aproveitando a mítica do lugar, com a alma leve, também fiz as minhas orações. Agradeci a Deus pelo dom da vida; roguei aos céus saúde e paz para mim e os meus.

Lembrei-me da pretensão de se construir em Mossoró um monumento em homenagem à nossa padroeira Santa Luzia. Será que conseguiremos? Quem sabe. Sendo assim, socorro-me do Evangelho: “Homem de pouca fé, por que duvidastes”?

Aliás, a fé alimenta a alma de milhões de pessoas, sejam católicas ou não, por isso a tolerância religiosa deve ser cultivada em uma sociedade que pretende ser plural e inclusiva, pois de acordo com a Constituição Federal é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.

Devo confessar que achei agradável conhecer Juazeiro do Norte (calor para mim não é novidade), presenciando a fé e a devoção das pessoas. Será ignorância do povo? Ora, quem somos nós para julgá-lo?

Talvez, as palavras do Bispo Fernando Panico, um dos arautos do Padre Cícero Romão Batista, lancem luzes para explicar tamanha devoção:

“Pelo testemunho perene dos romeiros e romeiras na Terra Sagrada do Juazeiro do Norte, não era possível acreditar que Padre Cícero fosse o “heresiarca sinistro” que Euclides da Cunha descrevia no seu livro Os Sertões. Certamente Padim Ciço tem algo de muito especial para ser objeto da” devoção de milhões de pessoas que vêm a Juazeiro para “visitá-lo”. 

Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça

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Categoria(s): Crônica
domingo - 08/10/2023 - 10:20h

Ponderação

Por Bruno Ernesto

"O leitor", filma a partir de obra de Bernhard Schlink (Reprodução)

“O leitor”, filma a partir de obra de Bernhard Schlink (Reprodução)

Tenho por hábito, revisitar certos livros, autores e assuntos do meu interesse. São escolhidos de forma aleatória. Às vezes, escolho uma editora para iniciar esse ritual.

Muitas vezes passo a vista na prateleira, vejo minha lista de desejos literários, lembro de um autor, de algum tema, e daí sigo.

Dia desses, apareceu no meu celular um álbum de lembrança que reúne fotos da galeria dos arquivos e gera uma pequena apresentação no formato de lembrança sugerindo uma  postagem nas redes sociais.

Dessa vez, apareceram umas fotografias de uma palestra que o programa de pós-graduação que a faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires estava promovendo e cujo palestrante foi o renomado jusfilósofo alemão Robert Alexy.

Além das fotografias, tenho meu livro de Teoria dos Direitos Fundamentais dedicado por Robert Alexy e ainda conversei com ele um pouco. Realizei um sonho.

Para quem se aprofunda no estudo do Direito Constitucional, certamente já ouviu falar dele.

Grosso modo, em sua técnica da ponderação dos princípios, ele utiliza uma fórmula matemática para contrabalancear os princípios. Em resumo, ora um princípio se aplica, ora outro o contrapõe. Porém, nenhum princípio anula o outro.

Sempre tive a curiosidade de saber se esse jusfilósofo, conhecido e respeitado mundialmente, tinha conhecimento em matemática aplicada para elaborar essa Teoria dos Direitos Fundamentais.

Pois bem. Por volta da metade da palestra, quando falava de como elaborou essa técnica da ponderação, admitiu que contou com a ajuda de um colega matemático da Universidade de Kiel. Dúvida desfeita.

Essa história me remeteu a um outro jurista alemão, o também constitucionalista Bernhard Schlink. Ele ainda  não conheço pessoalmente. Mas, fui aluno do professor Leonardo Martins, que é amigo dele. Inclusive escreveram um livro juntos.

O ponto que trago no presente texto é o de que, mais que o conhecimento, é a habilidade individual que uma pessoa pode ter, ou mesmo desenvolver, em distintas áreas.

Bernhard Schlink, por exemplo, ao longo de sua trajetória, além de um reconhecido e respeitado jurista, traçou uma carreia paralela como escritor.

Escreveu diversos romances, dentre eles, O Leitor, um dos mais aclamados da literatura alemã e mundial, tendo sido, inclusive, adaptado para o cinema mundial.

Nesse romance, em específico, Bernhard Schlink, talvez com seu conhecimento filosófico, traz à tona um verdadeiro dilema cujo pano de fundo foram os crimes de guerra cometidos pela namorada do personagem principal durante o período do regime nazista.

Ele traz à discussão, um tema que, mesmo quem não tenha conhecimento jurídico, saberá interpretar e chegar a uma conclusão.

Afinal, deve-se perdoar em nome do amor?

Será que podemos, como na teoria de Robert Alexy, fazer essa ponderação?

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 08/10/2023 - 06:48h

Saudade dos amigos

Por Marcos Ferreira

Ilustração do Buscapé

Ilustração do Buscapé

Hoje acordei assim, com saudade dos amigos. Isto não quer dizer que me esqueceram, que estou abandonado e muito menos me sinto para baixo, melancólico. Não. Significa apenas que o relógio, o calendário e a geografia têm jogado contra nós nos últimos tempos. Alguns estão a quinze, vinte, trinta minutos de distância. Outros, a muitos quilômetros, em cidades e estados por este país afora.

O telefone também parece sem muita eficiência no estreitamento dos laços. Não toca desde a sexta-feira. Exceto pelas chamadas entre mim e Natália, o silêncio é predominante. Não duvido de que as operadoras, por má vontade e atentando contra o próprio faturamento, tenham formado um conciliábulo para favorecer a deslembrança e prejudicar a memória.

Assumo minha responsabilidade em cinquenta por cento pela falta de comunicação. E não estou agora culpando ninguém por nada. Existem dias, semanas e meses em que os compromissos aprisionam a gente.

Hoje, então, penso nos amigos. Desejo que todos, apesar da correria, dos afazeres, estejam em paz e com saúde. Porque não existe, como sabemos, nenhum patrimônio mais importante do que saúde e paz. O resto é o resto.

Há pouco escutei a simpática vizinha da casa 30, bem aqui do lado, cantando uma música do Benito Di Paula. A mulher não é uma profissional do ramo, claro, no entanto possui uma alma de passarinho feliz. Acompanha a letra vinda de uma tal de Alexa.

Interage com esse equipamento enquanto realiza as suas tarefas, e o resultado é extraordinário. Pois uma pede o que deseja ouvir e a outra obedece com notável precisão. Aí fico com essa ideia boba de que às vezes temos melhor relação com certas máquinas e menos afinidade com a nossa complicadíssima espécie.

Percebo que sobrei na curva, capotei para outro assunto. Perdoem minha digressão. Estou certo de que mais cedo ou mais tarde estaremos juntos. Um aperto de mão e um forte abraço matarão a saudade.

Vai ser bom.

Marcos Ferreira é escritor

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domingo - 01/10/2023 - 12:42h

Fundação estuda como alcançar a felicidade

Por Ney Lopes

Foto ilustrativa

Foto ilustrativa

Confesso que não conhecia a Fundação Mundial da Felicidade, instituição vinculada às Nações Unidas.

O objetivo da instituição é convencer os países que o sucesso não pode ser medido somente por índices economicos, mas sim pelo grau de felicidade do povo.

Por istoa felicidade nacional deve se tornar um objetivo dos governos.

Afinal, o que seria a felicidade?

Os dez relatórios já publicados, da Fundação Mundial da Felicidade revelam conceitos desse estado de espírito das pessoas, que se irradia pelo país onde vivem.

A felicidade seria algo que as pessoas procuram encontrar, mas o que define a felicidade pode variar de uma pessoa para outra.

Normalmente, a felicidade é um estado emocional caracterizado por sentimentos de alegria, satisfação, contentamento e realização.

Embora a felicidade tenha muitas definições diferentes, é frequentemente descrita como envolvendo emoções positivas e satisfação com a vida.

Psicólogos e outros cientistas sociais normalmente usam o termo “bem estar subjetivo”.

A felicidade está no centro das ambições humana

O sociólogo espanhol, Luis Gallardo, presidente da Fundação Mundial da Felicidade, que virá ao Brasil em novembro, em entrevista declarou, que “a felicidade é o óleo do motor. Todos nascemos com ela, é parte do nosso ser.

Mas precisamos ativá-la”.

Sobre se a felicidade depende das pessoas, a resposta é sim.

Porém “ para apenas quem pode escolher. Há pessoas que não têm essa facilidade, porque podem ter problemas mentais, depressão, podem ter sofrido traumas muito fortes e não conseguir tomar decisões. E essas pessoas precisam de ajuda”.

Ainda é Luis Gallardo que alerta para a “ditadura do medo”.

Completa: “Há pessoas que têm medo de ser felizes. A humanidade decidiu definir o sucesso através do poder, do dinheiro, da fama. E para chegar a ele se adotam as três piores ações para a felicidade: comparar-se, queixar-se e competir”.

ESTUDOS da Fundação Mundial da Felicidade revelam que as pessoas felizes sentem toda a gama de emoções humanas – raiva, frustração, tédio, solidão e até tristeza – de tempos em tempos. Mas, mesmo diante do desconforto, eles têm um sentimento de otimismo de que as coisas vão melhorar, que podem lidar com o que está acontecendo e que serão capazes de se sentir felizes novamente”.

Aristóteles distinguiu a felicidade em dois tipos. Um, que é derivada do prazer.

Outro, da busca da virtude e do significado.

De tudo que os cientistas e pesquisadores concluíram sobre a felicidade, destacam-se os elementos a seguir citados.

Cultivar estado de calma, paz, esperança, perdão, compaixão, que ajudam a gerir nossos pensamentos e emoções, integrando espírito, postura, intenção.

Comer bem, dormir, não se ater ao passado, respirar, contemplar, meditar, estar na natureza.

Dizem os especialistas, que a felicidade é uma técnica, e se deve praticá-la.

Há consenso de que líderes políticos entendem que, se o objetivo da humanidade é ser feliz, precisamos olhar para isso.

As cidades somente são felizes, se os cidadãos são felizes.

As empresas são felizes, se os funcionários são felizes.

Escolas e universidades são felizes, se professores e alunos são felizes.

Países ou comunidades com mais estabilidade, confiança, menos corrupção, mais segurança e acesso à educação podem ter mais condições de promover a felicidade de seus cidadãos.

Segundo o Relatório Mundial da Felicidade, conduzido pela consultoria de dados Gallup, a pedido da ONU, a Finlândia foi reconhecida, pelo sexto ano consecutivo, como o país mais feliz do mundo, seguido pela Dinamarca, Islândia, Israel e Holanda.

O Brasil caiu 11 posições no estudo anual e foi do 38º para a 49º lugar.

Afeganistão  foi eleito o país mais infeliz do mundo, em 2023

Já que temos uma noção científica do que seja felicidade, só resta semeá-la, no dia a dia das nossas vidas.

Assim seja!

Ney Lopes é jornalista, advogado e ex-deputado federal

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domingo - 01/10/2023 - 11:36h

O renascimento do Clube da Poesia em Mossoró

Por Aldaci de França

Ilustração do G1

Ilustração do G1

O Clube da Poesia, que tem como principal objetivo difundir a poesia popular nordestina, através do repente e de manifestações culturais afins, como o cordel, a declamação, oficinas e cursos, surgiu na década de 1990, no então restaurante “O Sujeito” (Mossoró). Seu cartão de apresentação foi uma boa cantoria, seguida de outros bons desafios poéticos, com repentistas de Mossoró e Região, e de diversos estados do Nordeste.

Com a mudança de nomenclatura de O Sujeito para “Clube Carcará,” o projeto Idealizado e coordenado pelo poeta Crispniano Neto transferiu-se para o  Clube do Sindicado dos Trabalhadores da Educação do RN (SINTE/RN), e em seguida para o Clube Aceu/Uern. Dessa feita, essa ação cultural passou a ter a minha coordenação em parceria com o professor Josué Damasceno.

Para a realização desses eventos culturais, contamos com o apoio  do próprio Sinte, Universidade do Estado do RN (UERN), além da Unimed Mossoró. Sem esse amparo cultural, provavelmente teríamos tido mais dificuldades para a viabilizarmos o projeto

Sob a nossa coordenação, foram realizados 23 cantorias de grande êxito, com renomados repentistas nordestinos e cantadores bem referenciados regionalmente.

DEPOIS DO INTERVALO de alguns anos com essa ação cultural paralisada, resolvemos tentar a sua revitalização, com o propósito de realizar cantorias de forma itinerante em nossa cidade, objetivando contemplar  admiradores(as) da poesia popular nordestina. Assim, o caminho foi percorrer diversos bairros de Mossoró,  como também acreditando  nas presenças de apologistas do repente de toda a nossa região.

O retorno do Clube da Poesia, se justifica na ausência de um calendário anual de boas cantorias, em Mossoró, onde o interesse maior seja fortalecer a cultura de raiz em nossa cidade. Precisamos destacar a sua valorização com a realização do Festival de Repentistas do Nordeste no Mossoró Cidade Junina (MCJ), por exemplo. E, neste 2023, chegou à XXI edição.

Outros eventos procuram difundir a poesia popular, no entanto, se faz necessária uma maior visibilidade em relação ao repente – que é patrimônio cultural do Brasil desde 2021, caso você não saiba. É referência da identidade da região Nordeste.

Com a pretensão de colocarmos em práticas esse objetivo, neste 06 de outubro de 2023, às 19h, estaremos na rua Juvenal Lamartine, 1676, na residência do poeta Zé Teles, Bairro Santo Antônio, à reabertura do Projeto Clube da Poesia. Vou me apresentar ao lado dos Irmãos Bessas, Antônio Domingos, o próprio Zé Teles e outros convidados.

É hora, ou passa da hora, de recomeçarmos. Então, vamos!

Aldaci de França é professor, poeta repentista, escritor e coordenador do Projeto Clube da Poesia em Mossoró.

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domingo - 01/10/2023 - 10:46h

Extramuros

Por Bruno Ernesto

Cemitério de São Sebastião (Foto: Glauber Soares)

Cemitério de São Sebastião (Foto: Glauber Soares)

Trago na memória, desde tenra idade, a imagem do cemitério público municipal São Sebastião, localizado no centro de Mossoró. Desde sempre, passo diariamente em frente a ele. Várias vezes ao dia.

Tive a tristeza de ir me despedir de vários amigos que lá estão sepultados. Até visitei os túmulos algumas vezes tempos depois.

Falar da morte pode não soar muito bem para a maioria das pessoas. Penso que é um assunto que deve ser tratado com naturalidade. Porém, reconheço que quando ocorre próximo da gente, sempre cabe uma reflexão. Como disse Manoel Bandeira: “Tudo é milagre. Tudo, menos a morte.”

Na nossa tradição cristã, especificamente católica, até meados do Século XIX, ante a inexistência de cemitérios como estamos acostumados a ver hoje, os sepultamentos se davam nos adros.

Com o crescimento populacional e a ocorrência de epidemias e, por vezes, desastres, que passaram a vitimar mais pessoas num curto espaço de tempo, os adros já não mais comportavam as inumações como antes a tradição católica exigia. A partir de meados do Século XIX foram construídos os primeiros cemitérios nos moldes que ainda podemos ver, com túmulos ornamentados, alamedas, epitáfios e, por vezes, esculturas.

Com o passar do tempo, além do seu propósito, também passaram a ser local de grande expressão artística, aliado ao aspecto religioso que, desde o início, guardam. Veja-se, por exemplo, que suas administrações eram feitas por congregações religiosas, notadamente católicas.

No caso de Mossoró, com a construção do cemitério público São Sebastião no ano de 1869, o cemitério velho, idealizado pelo Vigário Rodrigues, os sepultamentos que se davam nos adros da igreja da Mata Fresca, Capela de Santa Luzia, Casa de Oração do Bairro da Igreja Velha e, por fim, na Matriz, passaram a ser feitos no mesmo. Suas dimensões atuais se estabeleceram nos anos de 1877-1879, ampliação feita em razão de uma grande seca que vitimou grande número de pessoas em Mossoró, havendo registros de que centenas de pessoas eram sepultadas diariamente em grandes valas abertas detrás da capela do cemitério.

Cemitério de São Sebastião (Foto: Glauber Soares)

Cemitério de São Sebastião (Foto: Glauber Soares)

Retomando o raciocínio inicial, os cemitérios passaram a ser não apenas um local de despedida e repouso final dos nossos entes queridos e amigos, cujo aspecto religioso ainda guarda forte traço de espiritualidade – afinal, o grande dogma do cristianismo é a ressureição -, passando após, a ser um verdadeiro centro de expressão artística. Vem daí a construção de túmulos e mausoléus que são verdadeiras obras de arte, com seus significados e representações, e que nos levam a refletir sobre a própria morte; como podemos constatar nos famosos cemitérios da Recoleta, da Consolação e do Père-Lachaise.

Em verdade, os cemitérios revelam o que pensa determinada sociedade sobre a morte.

Hoje, independentemente do porte, das personalidades enterradas, da importância e representatividade dos construtores e artistas que, verdadeiramente, assinaram suas obras de artes nesses antigos cemitérios, e, até mesmo da religião de quem lá está sepultado, o que se revela é que a morte vem sendo ressignificada para nós. Porém, a simbologia se mantém inalterada, posto que tem por função perpetuar a memória de quem deixou a vida terrena.

Razão disso, há pessoas que visitam regularmente os cemitérios para orar pelo ente querido, para refletir sobre a própria existência, ou mesmo contemplar o cemitério, como é o caso daqueles famosos cemitérios ou daqueles mais modestos, que, no entanto, cumprem fielmente sua função, especialmente a espiritual.

A morte sempre possuiu uma simbologia. Para uns, de irresignação. Para outros, de reflexão.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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domingo - 01/10/2023 - 06:34h

Mau-olhado

Por Marcos FerreiraMau-olhado – CRÔNICA – Marcos Ferreira

Algumas vezes por vontade própria, outras por cautela financeira, esta nossa Mossoró me tem visto muito pouco. Então, sendo um indivíduo com baixa quilometragem, quase não frequento as rodas intelectuais, os cafés, os saraus literários. Sei que já falei mais ou menos sobre isso em data recente. Entre outros endereços, estou devendo visitas a familiares e amigos. Hei de revê-los em breve.

Este rodeio é para contar a pequena e distante história de um mau-olhado. Também conhecido por quebranto. Calculo que foi no início de 2018, antes da pandemia. Nesse tempo, ao contrário de hoje, eu batia pernas por aí com maior frequência. Ia ao cinema do shopping, entrava em alguma loja, dava um pulo na livraria, tomava um cafezinho ali por perto. Acontecia de comprar um sorvete ou uma barrinha de chocolate amargo. Não dava importância ao ruído, ao vaivém das pessoas. Gente habituada àquele passeio tão apreciado por famílias e namorados.

A classe média se achava. Continua se achando. Da mesma forma os pseudorricos. O espaço naquele empório parece elevar o espírito, a autoestima dos seus frequentadores. Em maior número, claro, está a população com menor poder aquisitivo. Esses dão pouco lucro aos comerciantes. Alguns deixam os seus veículos do lado de fora. Pois o preço que cobram por aquele estacionamento é uma facada.

Bom. Não quero enrolar. Vamos logo ao referido mau-olhado. Num domingo, portanto, começo da noite, de cabelo cortado e barba bem escanhoada, lá estava este pequeno cronista de bobeira. Eu acabara de sair da livraria quando topei com uma escritora desta cidade. Encontrava-se em companhia de certa mulher, cujo nome ignoro até hoje. Notei que a desconhecida empalideceu diante de mim. Achei que fosse desmaiar. Era uma jovem senhora bonita, de cabelos loiros e olhos verdes. Tive vontade de perguntar se ela estava se sentindo mal, contudo fiquei na minha.

A escritora cuidou de me apresentar e decerto informou o nome da amiga, detalhe este do qual não consigo lembrar. Daí a pouco a mulher readquiriu o sangue das faces. Suspirei. Eu temia que ela fosse ter um troço, uma síncope. Em seguida observei que ela, após balançar a cabeça lateralmente, como buscasse repelir o mal-estar, lançou-me um olhar feroz. Nesse minuto tremi de cima a baixo.

A explicação para aquele estranho comportamento não tardaria. A desconhecida resolveu abrir a boca e, ainda com ar de quem recebera uma ofensa, disse que eu era um sósia, que eu tinha a cara do seu ex-marido. Não revelou o nome do sujeito, que torci para que não fosse meu xará. Ressentida, a voz meio trêmula, acrescentou que o dito-cujo a havia trocado por outra dez anos mais nova: “Uma piranha de Grossos”, disparou. Fiquei desconfortável. Só não pedi desculpas. Mas falei que lamentava e que, salvo exceções, não se pode confiar nos homens, espécie inferior.

Foram embora. De imediato uma náusea me sobreveio. Tomei o rumo de casa já suando frio. Acordei de madrugada tremendo o queixo. Febre. Recorri à dipirona. O estômago não tolerou o comprimido. Vomitei. Repeti o medicamento. A febre me largou. Mal o dia amanheceu, porém, fui atacado por cólicas e diarreia. Escapei fedendo. Espero nunca mais me deparar com uma mulher traída.

Marcos Ferreira é escritor

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domingo - 24/09/2023 - 14:48h

Café com Henry Koster

Livro pela Cia Editora Nacional - 1942 (Foto: reprodução do BCS)

Livro pela Cia Editora Nacional – 1942 (Foto: reprodução do BCS)

Por Bruno Ernesto

Sou mossoroense de coração, criação e, recentemente, cidadão por titulação da Câmara Municipal, o que muito me orgulha.

Independentemente disso, sou apaixonado pela sua história. Aliás, quem não o é?

Há diversas obras que falam sobre Mossoró, sua gente, seus personagens, seu nascimento, desenvolvimento e seu futuro.

Entretanto, quero falar do seu passado. Um passado que já dista mais de duzentos anos, cujo personagem principal é quase que desconhecido pelos próprios mossoroenses de nascença: Henry Koster.

Tal figura, um inglês, ao que se consta, foi o primeiro a colocar Mossoró no mapa da historiografia, quando ainda era chamado de arraial de “Santa-Luzia”, ao passar por Mossoró em 07 de setembro de 1811.

Podemos citar diversos viajantes estrangeiros no período colonial brasileiro que descreveram suas aventuras, passagens e andanças nas terras do Novo Mundo, relatando sua fauna, flora e o povo – já dito brasileiro-, como diria Darcy Ribeiro. Dentre eles, podemos citar Arséne de Paris, André Thevet, George Marfraff, Cuthbert Pudsey, Hans Staden, Pierre Moreau e muitos outros.

Porém, Koster difere dos demais por ter descrito com maior fidelidade o então arraial, que contava à época com pouco mais de trezentos habitantes e era formado basicamente por choupanas; formação típica do interior do Nordeste brasileiro naquele período.

Partiu do Recife/PE em 11 de outubro de 1810 a cavalo, tendo como destino a cidade Fortaleza/CE. Atravessou os Estados do Pernambuco e Paraíba antes de chegar a Mossoró.

Ao chegar, causou um certo alvoroço, tendo, inclusive, sido abordado por uma dita autoridade policial local que, desconfiada de que era Koster um mensageiro de Napoleão Bonaparte, forçou sua partida na mesma manhã.

Apesar do pouco tempo de sua estada em Mossoró, foi o suficiente para descrever o arraial como sendo um quadrângulo de casas pequenas e baixas, indicando, inclusive, a igreja recém-construída.

E onde entra o café nessa viagem? Deve você, leitor, estar se perguntando.

Bem, os dois volumes da obra Viagens ao Nordeste do Brasil, de Henry Koster, traduzida brilhantemente pelo mestre Luís da Câmara Cascudo, e cuja primeira edição foi impressa em 1816 em Londres, já é uma raridade.

Há alguns anos, saí cedinho para ir para universidade de Buenos Aires e, como de costume, me apressei para tomar um bom café espresso antes da aula.

Dessa vez, não lembro por qual motivo, tomei outro caminho do habitual e me deparei com um sebo. Minúsculo, quase imperceptível, cuja especialidade eram primeiras edições de livros dos mais variados assuntos e autores: Kardec, Marcel Proust, Borges e Koster. Para minha surpresa!

Fiquei fascinado, claro. Pedi à atendente para folhear a primeira edição do original de Koster. Após uns instantes, achei o que procurava. Estava escrito: “A 7 de setembro, às dez horas da manhã, chegamos ao arraial de santa-luzia, situada na margem setentrional do rio sem água, num terreno arenoso.”

Só fui tomar o café após o almoço!

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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domingo - 24/09/2023 - 08:38h

Qual será o seu legado?

Por Odemirton Filho gramática, portugues, escrita, letras, jornalismo, imprensa,

Há algum tempo minha filha mais nova me presenteou com um livro. Um presente para ser devolvido, segundo ela. O livro apresenta várias perguntas, pedindo-me para escrever sobre a minha infância, sobre ser pai, sobre meus hobbies.

Achei interessante a proposta e, aos poucos, estou respondendo. Em cada resposta, resgato um pouco do meu passado; da minha infância. Infância de brincadeiras e sonhos. Infância vivida ali, nos arredores da Igreja de São Vicente e da praça do Codó, sentindo o calor do forno da antiga padaria de meu pai; comendo pão d’água e bolachas sete-capas.

Nos idos de 1980 o mundo era outro. Não havia internet nem redes sociais. O nosso mundo, real, eram as brincadeiras, o jogo de futebol na rua, o andar de bicicleta. A chegada de um parque de diversão, onde hoje se localiza o Teatro Dix-huit Rosado, era uma alegria para nós, crianças. A Festa de Santa Luzia era um acontecimento esperado durante todo o ano. Nas férias escolares, em janeiro, o mergulho no mar de Tibau.

Já ser pai é ficar “abestalhado” vendo os filhos nas apresentações da escola. É lutar diariamente para que os filhos possam seguir o caminho do bem. É se alegrar com suas vitórias, chorar com suas derrotas. É convencê-los que perder e ganhar faz parte da vida. Ensiná-los a serem honestos, principalmente, pelo exemplo; é entregá-los aos cuidados de Deus.

Os hobbies não são muitos. Fazer minhas leituras, escrever para o Nosso Blog (escritor, de verdade, é Marcos Ferreira, François Silvestre, Honório de Medeiros), viajar até onde minha grana permite; curtir uns shows; ficar ao lado da minha família. E, claro, tomar umas, ouvindo as músicas da década de oitenta, lembrando-me dos tempos da juventude.

Para finalizar, trago uma pequena história escrita por Martha Medeiros no seu livro Conversa na Sala. Conforme narrou, um dia estava em um velório e ouviu quando uma criança se aproximou do caixão onde estava o seu avô e disse: “obrigado, vô.”

Talvez, o menino estivesse agradecendo pelos momentos que curtiram juntos, pelos jogos do time do coração que assistiram no estádio de futebol, pelo sorvete de chocolate que tomaram, pelas brincadeiras, sorrisos e ensinamentos.

E continua a cronista:

“Nem o dinheiro que acumulou, nem a big casa que construiu, nem seus títulos e prêmios, nem seu sobrenome, nem suas postagens, nem sua pele sem rugas, nem as festas, nem a fama, nem seu passaporte megacarimbado, nada, nada, nada disso vai sobreviver.  

Nossa vida pode ter sido preenchida por muitos convites e conquistas, pode ter sido rica em experiências curriculares e sensoriais, mas só o que dá real sentido a ela é a nossa ampla e franca generosidade, é a visão amorosa e humanista sobre tudo o que nos cerca, é o esforço em deixar o mundo um pouco melhor do que quando aqui chegamos.  

Se não merecermos um “obrigado” verdadeiro ao final, aí sim pode-se dizer: que perda. Nossa vida terá sido em vão.

Um dia, quando minha filha folhear o livro, verá que fui um homem comum, com inúmeros defeitos e alguma virtude, mas que tentou legar algo de bom.

E você, qual será o seu legado?

Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça

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domingo - 24/09/2023 - 06:46h

Periscópio

Por Marcos Ferreira

Imagem do Freepik

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Gosto de ficar em casa. Aliás, para ser franco, tenho medo de sair. Sei que a violência me espera do lado de fora. Ela pode estar à minha espreita, que sou presa fácil, sem armas, saúde nem estrutura para certos enfrentamentos. Não me arrisco nem mesmo em bate-bocas, discussões. Não tenho nervos, sangue-frio. Exceto escrevendo. Até isso tornou-se muito raro hoje em dia.

Então, repito, gosto de ficar em casa. Aqui me sinto a salvo, a menos que seja atacado por um infarto ou derrame cerebral. Mas aí não será culpa desse bicho imprevisível chamado sociedade.

As ruas estão cheias de cães e gatos abandonados. Os governos municipal e estadual não se mobilizam, não fazem nada para mitigar o sofrimento desses animais. É triste. Como não bastasse, surge um vereador de Apodi (sem alma nem coração) propondo criminosamente que os infelizes sejam abatidos. Imaginem se fôssemos abater os políticos desocupados e inúteis que vivem soltos por aí.

O trânsito me assusta. Monstro de metal, carne, ossos e fúria. Um sujeito qualquer, desses que se autoproclamam cidadãos de bem, pode sair possesso de seu automóvel com uma arma de fogo e cometer um assassinato tão somente porque não tolera receber uma reprimenda ou reclamação de outro condutor.

Não me interesso por frequentar lugares públicos, cheios de pessoas potencialmente agressivas. Viajar também não é para mim. Sobretudo se a viagem for de avião. Instigado por amigos, fiz apenas duas viagens aéreas em toda a minha vida. Para receber premiações literárias. Uma vez no Rio e outra em Salvador. Não tive coragem, porém, de comparecer à solenidade de premiação em Manaus. Depositaram o dinheiro, e os livros vieram pelos Correios. Sou um animal terrestre. Deixo o céu para as aves, os seres alados. Embora também haja perigos, prefiro o solo.

Contudo, nesta pequena e agradável casa, projeto da querida amiga Miriam Ferreira, algo me preocupa: tremores em excesso. O problema só aumenta, apesar de meu psiquiatra ter substituído e retirado alguns medicamentos. Estou aqui me organizando para consultar um neurologista particular.

Esse tipo de profissional não está disponível na saúde pública de Mossoró. Atemoriza-me a possibilidade de não mais dominar o teclado, entre outras limitações. É trabalhoso tomar uma sopa, manejar um barbeador, uma caneta. Quase não consigo manuscrever o meu nome.

Talvez seja apenas coisa da minha cabeça. No mais estou muito bem. Não sinto a menor falta de multidão, palco nem holofotes. Negociei um armistício com os meus fantasmas e a nossa convivência tem sido respeitosa. Recebo alguns amigos que ainda me visitam e me alegro com o carinho e consideração que me transmitem.

Sei que esses não estão interessados em todo o meu dinheiro, ao contrário daquele moço remediado conhecido por Elon Musk. Esse está me devendo uma grana que tomou emprestada e que eu já dei por perdida. Que ele me perdoe a indiscrição.

Submerso em meus silêncios e recolhimento, observo este município com um periscópio que aponto especialmente para os blogues e redes sociais. Todavia não demoro. Receio me deparar com notícias abomináveis como essa do vereador apodiense que prega a matança de cães e gatos sem um lar. Assim, prejudicando meu equilíbrio, noto que perco um pouco da paciência, o sangue esquenta. Os nossos gestores precisam dar um tempo no populismo e agir em benefício dessa causa.

Era o que eu tinha para contar e dizer por hoje. O domingo está calmo. Ao menos neste recorte da periferia. Minha paz doméstica não será afetada pelo leve ruído da vizinhança. Hora de tomar um banho, esfriar a moleira, fazer um café. Quero esquecer essa malvadeza proposta contra os bichinhos de rua.

Marcos Ferreira é escritor

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domingo - 24/09/2023 - 04:22h

“Como é trabalhar no paraíso?”

Por Clarissa Paiva

Fernando de Noronha (Foto do site Max Blog)

Fernando de Noronha (Foto do site Max Blog)

Já me perguntaram isto muitas vezes. Certamente posso dizer que é um alívio. Não me refiro à localização geográfica, mas aos contextos.  Aqui não há contagem do Observatório da Violência Letal Intencional do RN (OBVIO) – a coisa que eu mais detestava anunciar por toda dor que representa. Não há sequer registro de assalto. Aqui não há chacina, perseguição… Não há medo (não desse gênero).

No paraíso trabalhamos de rasteirinha, sem botox nem pranchinha – e de shorts; mas, sim: nossa como tem trabalho! Imagine o peso de manter tudo bem, tudo lindo, como o paraíso deve ser. Pronto. Já sabe que é meio impossível com a nossa presença humana, né?

Infelizmente, ou felizmente, hoje não é preciso merecer o paraíso. Basta ter dinheiro suficiente. Aí é que “o bicho pega”. Há portas que o dinheiro não abre; e se arromba, não consegue recompor. Dinheiro não altera o ritmo da vida natural nem ressuscita passarinhos que, em todo o planeta, só existem aqui (coisas de paraísos).

Dinheiro não reconstrói recifes de corais cirurgicamente esculpidos pelos dentinhos de budiões coloridos, nem poderia pagar o cachê dos mais de 100 golfinhos rotadores vistos diariamente por aqui.

Estamos em Fernando de Noronha, um arquipélago com 21 ilhas, ilhotas e rochedos num espaço a perder de vista em pleno Oceano Atlântico, com 26 km² de extensão. A principal ilha ocupa cerca de 91% desse território ultramarino. Daqui, o ponto mais próximo no continente brasileiro é Natal, a 360 km.

Voltando ao trabalho no paraíso, dinheiro também não paga. Com um custo de vida a peso de euro, o salário comum ao continente se evapora a cada refeição. Mas, coube a mim somar na comunicação por eles e elas: praias, ilhas e ilhotas , flora e fauna do único arquipélago oceânico brasileiro a ter funcionamento de cidade (com mais de 5 mil habitantes!).

Hoje, na Comunicação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio Noronha) – órgão federal responsável pelas Unidades de Conservação que cobrem toda a Ilha, eu me sinto profundamente grata. Sem esse trabalho, eu talvez demorasse a entender a importância dessa autarquia que muitos imaginam ser não-governamental.

Sem Noronha não teria conhecido nomes incríveis da conservação e das artes. Isso jamais teria acontecido!

Por aqui, dizem que a Ilha escolhe quem fica. Sou merecedora disso, e sei desde o primeiro minuto. Posso até dizer que nós sabemos: eu e os que ficaram e ficam. Só esses sabem o preço.  Nada em minha vida profissional poderia se igualar à responsabilidade que adquiro hoje – o que é desgastante para mim que sofro de ansiedade fulminante. Às vezes é como estar em Lost, às vezes é como estar no céu sem ter morrido.

Não sei se até aqui consegui expressar algo parecido com o que eu vivo em função do trabalho na ilha mais sonhada do Brasil; nem sei se ficou entendido o desapego que é morar em alojamentos compartilhando ainda que não queira a sua vida pessoal com dezenas de outros.

Clarissa Paiva na labuta, em pleno paraíso (Foto: cedida)

Clarissa Paiva na labuta, em pleno paraíso (Foto: cedida)

Ainda falta o básico, a começar pela internet razoável e um computador compatível – o que temos que compensar de forma pessoal. Mas, ah! Como isso é mínimo… Faria tudo igual, mil vezes, sem hesitar (aquele tão falado propósito, sabe?)

Não sei quanto tempo ficarei aqui, mas sei que eu e essa Ilha cheia de gente extraordinária seremos sempre boas amigas, daquelas que nem alzheimer faz esquecer.

Reconheço, Carlos Santos: não dá mesmo para responder tecnicamente à pergunta inicial que você me fez, cobrando-me em texto para seus webleitores e webleitoras, uma resposta. Espero, ao menos, ter deixado cada um com vontade de preservar os paraísos que encontrar por aí.

Eles custam bem caro, num valor que não conseguiríamos estimar.

E melhor:  podem estar mais perto do que imaginamos.

Clarissa Paiva é jornalista desde 2004, servidora terceirizada do ICMBio em Fernando de Noronha e redatora do podcast “Fala, Noronha”

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domingo - 17/09/2023 - 06:34h

A tribuna da defesa…

Por François Silvestre

Foto ilustrativa do Istockphoto

Foto ilustrativa do Istockphoto

…no processo criminal.

Não há hierarquia entre Juiz, Promotor e Advogado. Nenhuma hierarquia. Todos iguais, essenciais e indispensáveis à administração da Justiça. Mesmo que algum juiz se imagine Alá, algum promotor se ache Maomé, ambos são igualmente equiparados ao advogado. Todos mundanamente humanos. Isso é pressuposto teórico? Não. Isso é conceituação filosófica? Não. É comando legal. Disposição expressa em Lei.

Dito isso, desço da abstração e venho ao fato concreto. O julgamento dos atentados à Democracia e tentativa de Golpe de Estado. O primeiro delito, consumado. O segundo, só se configura na tentativa. Posto que, consumado, deixa de haver “delito” e o golpista passa a ser o executor da “nova ordem”. Elementar, meu caro Watson.

Filiado que fui à Escola Clássica do Direito Penal, na minha atividade de criminalista, na Tribuna da Defesa, na qual se firmam os princípios da defesa plena, presunção de inocência, dúvida favorecendo o réu e Devido Processo Legal.

Aliás, é preciso acentuar a categoria gramatical dessa palavra “devido”, nessa expressão. Não é adjetivo, como se você dissesse o regular processo legal, o normal processo legal. Não. Devido, aí, é particípio do verbo Dever. O Estado deve ao indivíduo um processo legal para investigá-lo, processá-lo, julgá-lo, condená-lo ou absolvê-lo. Dívida do Estado estabelecida em Lei.

Ponto pacífico. Voltando ao julgamento dos atos terroristas do maior rebanho de jumentos bípedes de que se tem notícia nesses tempos de aridez intelectual. Mais precários mentais do que os próprios acusados, só os seus advogados de “defesa”. Não atacam qualquer ponto da acusação, nada.

Fazem discurso tosco, beirando a cretinice, e nenhuma tese que ajude, pelo menos, a minorar o grau das penas. Uma lástima, que deixaria abismado qualquer rábula esperto dos que havia, e bons, no sertão de antigamente. Na comparação com estes de agora, Quintino Cunha seria um Nicola Malatesta.

Quer ver uma tese de favorecimento? A produção de prova contra si. É ruim pra defesa? Não. É ótimo. É ruim pro réu, mas é ótima para a defesa. Vejamos. O que é a confissão? É o ato de assumir o delito. Qual a sua consequência? Atenuar a pena do réu, pelo argumento da colaboração com a Justiça. Reduz custo processual, facilita a decisão do juiz e esvazia o argumento do recurso. Qual a consequência da prova produzida contra si? A mesma da confissão. Facilita a decisão, reduz custo processual. Ora, se guarda consequências iguais, merece atenuantes iguais. E não agravamento. Nenhum jegue, desses da defesa, até agora, atentou pra isso. Com o mérito de que o produtor de prova contra si, não se via como praticante do delito.

Mas isso é cacoete de advogado de defesa. A certeza, no julgamento criminal, é um céu azul completo. Qualquer nesga de nuvem é dúvida. E na dúvida, o benefício é do réu. Nessa tese há uma atenuante de fácil compreensão. Se não absolutória, com certeza atenuante. Redutora de pena.

Taí. Da tragédia do Calvário, pobres diabos arrastam suas cruzes, defendidos por falsários e fariseus, na repetição da farsa, que os imolarão no alto de um Gólgota de mentira.

François Silvestre é escritor

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domingo - 10/09/2023 - 06:38h

Copidesques e revisores

Por Marcos FerreiraCopidesques e revisores – CRÔNICA – Marcos Ferreira

Espero que ninguém se ofenda, contudo acho que o trabalho mais ingrato, senão inútil para quem o realiza, é o de copidesque e revisor de textos. O ofício desses lapidadores do nosso idioma é totalmente obscuro. Pois nesse triunvirato entre escritor, copidesque e revisor, quem sempre leva os louros por uma coisa bem escrita (livre de pleonasmos, ecos, redundâncias, erros de ortografia, de concordância verbal e nominal, além da sintaxe por vezes caótica) é o suposto literato.

Precisa-se fazer a seguinte distinção: nem todo revisor é copidesque, porém todo copidesque é revisor. No geral, sem que isso seja considerado um detalhe negativo, o revisor se encarrega da importante missão de localizar e consertar falhas puramente gramaticais e tropeços de digitação. Já o outro faz tudo isso e pode transformar uma página ou livro muito ruim em algo apresentável do ponto de vista redacional. Quanto ao aspecto artístico, aí vai depender de cada autor. Do contrário, ultrapassando essa linha de atuação, descambaria para a alçada do escritor fantasma.

Tudo bem que há aqueles indivíduos fora de série, narradores excepcionais, homens e mulheres com “redação própria”, como no caso de Otto Lara Resende, mas isso não é uma regra. Porque ninguém, por melhor que seja, pode ignorar a prudência e abrir mão de olhos treinados, mais atentos e descansados.

Diante do que oferecem, e considerando a remuneração desses profissionais, pode-se dizer que o reconhecimento é pífio. Na medicina, na advocacia, na arquitetura e na engenharia, por exemplo, é certeza que as pessoas logo perguntem quem foi (ou é) o médico responsável, o advogado, o arquiteto ou engenheiro.

Já em relação a um determinado romance, um livro de contos, de crônicas ou de poemas, ninguém quer saber quem foi o sujeito (oculto) que cuidou do copidesque e da revisão. Sei que as palavras copidesque e revisor aqui empregadas pipocam como um tipo de redundância, todavia não é possível falar acerca dessa questão sem repeti-las.

Segundo Luis Fernando Verissimo, que também foi revisor de jornal: “Os revisores só não dominaram o mundo porque ainda não se deram conta do poder que têm”. A meu ver, enfim, esses operários das letras são muito pouco reconhecidos. Não sei o que seria dos literatos sem os copidesques e revisores.

Marcos Ferreira é escritor

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domingo - 03/09/2023 - 08:38h

Quem sabe, uma lembrança

Por Bruno Ernestoconversa-pai-e-filho-coluna-flavio-augusto-600x338-60b2ce20

Afinal, são as pequenas atitudes que nos marcam?

Após nosso almoço de domingo, a caminho de casa, meu filho me perguntou se em Mossoró havia alguma árvore de pau-brasil. Estávamos passando em frente ao Colégio Diocesano Santa Luzia (CDSL) e lembrei que detrás da capela havia um pau-brasil que foi plantado quando eu tinha mais ou menos a idade do meu filho Pedro.

Lembro que esse pau-brasil foi plantado juntamente com diversas outras mudas em razão de um projeto de plantio de árvores em risco de extinção. Está lá até hoje. Pois bem. Como era um domingo (27/08/2023), não seria possível entrar no colégio para ver o exemplar.

Lembrei que há duas árvores de pau-brasil em frente ao Tiro de Guerra (07-010). Partimos para lá para ele poder conhecer o famoso pau-brasil.

Como estava um pouco deserto, relutou em descer do carro. Não soube exatamente por qual motivo. Talvez estivesse com medo de assalto ou de ser preso pelo Exército. Só disse que estava com medo de descer e permaneceu dentro do carro olhando para o pau-brasil.

Apesar disso, consegui convencê-lo a descer para registrar o momento.

Retomando o caminho de casa, percebi que fiz o que meu pai, por diversas vezes, também fez comigo. Um pequeno momento, registrado numa despretensiosa fotografia, será lembrado, quem sabe, pela vida toda.

Eu lembro de vários com meu pai. Mesmo sem fotografias.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor.

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domingo - 03/09/2023 - 07:48h

A competência de cada um

Por Marcelo Alves

STF em foto de Fellipe Sampaio

STF em foto de Fellipe Sampaio

Estes dias, foi bastante comentada pela comunidade jurídica, sobretudo em grupos de WhatsApp (neles se comenta tudo), a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 1.447.939-SP, relatora ministra Cármen Lúcia, que, reformando anterior decisão do Superior Tribunal de Justiça, com base no Tema 280 de repercussão geral, considerou não evidenciada a afronta à inviolabilidade de domicílio (art. 5º, inciso XI, da CF), para busca e apreensão domiciliar, mesmo sem mandado, em caso de crime permanente.

Basicamente, afirmou o STF que: (i) parecia “incontroverso que, na espécie vertente, os policiais teriam ingressado na residência somente após fundadas razões para suspeitar de flagrante de tráfico de drogas e com autorização do recorrido X e da esposa do recorrido Y”; (ii) que o Tribunal de Justiça de SP (que fixou a compreensão dos fatos do caso) “ressaltou que os policiais entraram na residência por terem visualizado um dos recorridos fugir ao perceber os policiais, que passaram a persegui-lo, e por suspeitarem da presença de drogas em duas residências da vila, nas quais ingressaram com a autorização dos respectivos moradores”; (iii) “sendo permanente o crime de tráfico, a busca domiciliar no imóvel, na espécie, não é comprovada como contrária ao disposto no inc. XI do art. 5º da Constituição da República”; (iv) em processos semelhantes, o próprio STF tem afastado a alegação de ilicitude de provas nos casos de crime permanente quando há justa causa para o ingresso na residência”.

Lembremos que o STJ in casu, em decisão também bastante comentada à época (Agravo Regimental no Habeas Corpus 596.705-SP), tinha considerado nula a prova derivada de conduta por ele (STJ) afirmada ilícita (“pois evidente o nexo causal entre uma e outra conduta, ou seja, entre a invasão de domicílio permeada de ilicitude e a apreensão das referidas substâncias”), que dera origem à ação penal no estado de São Paulo. Foi essa, então, a decisão cassada pela novel decisão do STF.

Não vou entrar no mérito das decisões, que têm muitas nuances, embora tenda, por formação e por uma questão de política criminal, a concordar com a recente decisão do STF.

Não desejo desmerecer o papel do STJ no nosso arcabouço (palavra da moda) jurisdicional. É fundamental. Ele é o grande intérprete e harmonizador da legislação federal, entre outras coisas. Mas quanto ao exercício do respectivo papel por cada um dos nossos órgãos jurisdicionais, sempre me vem à mente uma famosa decisão da House of Lords (outrora mais alta corte do Reino Unido), em Davis v Johnson [1978] 2 WLR 553, sobre o papel da Court of Appeal (que podemos, para fins deste texto, tratar como o STJ deles) na estrutura judicial do seu país.

Na ocasião, afirmou o Lord Diplock (já reproduzindo as palavras do Lord Scarman em Tivertkon Estates Ltd v Wearwell Ltd [1975] Ch 172): “A Court of Appeal ocupa uma posição central, mas, salvo em poucas exceções, uma posição intermediária em nosso sistema jurídico. Em grande parte, a consistência e a certeza do direito dependem dela. (…). [Mas] o fórum apropriado para a correção dos erros da Court of Appeal é a House of Lords”.

Meu desejo aqui é sobretudo explicitar o papel do STF como guardião da Constituição Federal. Afinal, não resta dúvida, basta apenas ler o seu texto, afirma o art. 102, caput, da CF: “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição”. É ele, o STF, quem definitivamente interpreta a tal Constituição. Não outrem. Nem mesmo o STJ. E muito menos os pitaqueiros de zap zap (desculpem o desabafo).

No caso que ora comentamos, embora misturada com o direito penal e o processual penal, a questão especificamente debatida é majoritariamente constitucional. A própria decisão do STJ expressa isso. E, em matéria constitucional, como afirmava o ministro Moreira Alves, “a decisão do Supremo não é definitiva porque é certa, mas é certa porque é definitiva”. Seja ela “garantista” ou “punitivista” (como sempre querem, mesmo sem sentido, as hordas do WhatsApp).

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador Regional da República e doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL

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domingo - 03/09/2023 - 05:38h

Conversas de calçada

Por Marcos FerreiraConversas de calçada - CRÔNICA - Marcos Ferreira

Subúrbio. Conjunto Walfredo Gurgel. Rua Euclides Deocleciano. Chega a tarde-noite (juntamente com os enxames de muriçocas) e os moradores desta periferia começam a surgir com as suas cadeiras de plástico e de balanço. Há grupos de indivíduos de vários tipos e em quantidades diversas. O círculo de que faço parte se reúne bem perto de minha casa. Ao fim do dia, portanto, quando não estou com outro compromisso ou escrevendo, saio para interagir com meus vizinhos. São conversas de calçada, onde se fala de tudo. Inclusive da vida alheia, que ninguém é de ferro.

A senhora Raimunda é peça valiosa nessas reuniões crepusculares. Bem-informada, está por dentro de quase tudo que se passa neste logradouro. Maldiz (e com razão) os motoristas e motociclistas que passam na carreira. Apesar da vista curta, ela dá conta de quem vem e de quem vai. É a minha personagem favorita desse elenco de palestrantes bem-humorados e tão criativos quanto sinceros.

Sayonara, filha da senhora Raimunda, sai com uma cadeira e o seu bem-amado cãozinho Pim-Pim, cheio de fofura e nada amigável. Jéssica Taline, social mídia e designer, integra-se à turma. Daí a pouco, também com uma cadeira de balanço e sua cadelinha Pretinha, comparece Maria dos Navegantes. Pretinha é o meu xodó. Aqui e acolá, quando vou pedir um pouco de café a Navegantes, Pretinha faz uma festa ao me avistar no portão. Um encanto de criatura. Mais afetuosa, mais sensível até do que certas classes de elementos incapazes de um gesto de amor ao próximo.

Rucilene e Erinaldo, casal espirituoso, brincalhão, sempre disponibiliza a sua calçada e algumas cadeiras para esse bate-papo tradicional, isento do rigor e das amarras da língua portuguesa. Em tal meio, de forma cristalina, fala-se o idioma do povo, não o linguajar rebuscado, calculado, de supostos intelectuais. Em companhia dessa gente me sinto à vontade, benquisto. Eles me transmitem isso.

Os diálogos avançam pela noite. Não raro há comida degustada ali mesmo, à calçada. Navegantes, Rucilente e Erinaldo são os principais adeptos de refeições do lado de fora, ao ar livre. Não falta, claro, uma pequena mesa e uma garrafa de café. Além disso, circulando de mão em mão, ouve-se o pipocar de uma dessas raquetes elétricas para combater o ataque dos mosquitos. Após determinado horário, porém, quando circula um ventinho generoso, os pernilongos dão um sossego. Os fatos e os boatos correm soltos. Zecão, o dono da lanchonete, larga um berro de entusiasmo. Gol do Flamengo! Assim se comporta Magno, outro torcedor do rubro-negro e esposo de Navegantes. A clientela de Zecão entra e sai. A senhora Raimunda filma tudo.

Figura especialíssima é a vizinha do meu lado direito, a simpática Cilene Freitas, eventual frequentadora de nossa confraria. Não conheço mulher tão alegre, tão de bem com a vida e cheia de coragem para enfrentar os obstáculos do mundo. A sua positividade transborda e nos contagia. Além de exímia cozinheira, é responsável, em grande parte, pelo vocabulário proibido para menores de dezoito anos que se escapa da boca dos adultos. Um tirinete de palavras e frases picantes.

Não só de amenidades e risos se constitui o colóquio desses cidadãos vulneráveis, desprotegidos. Discute-se, entre outras questões, os assaltos frequentes, o abandono do bairro, o problema do carro do lixo que deixou de passar na rua, serviço agora a cargo de um único gari que realiza toda a coleta quase de madrugada e vai distribuindo as poucas sacolas encontradas em esquinas estratégicas.

Este é o mais antigo conjunto de Mossoró e jamais um prefeito ou prefeita quis asfaltá-lo. Contrariando tudo isso, sobretudo o risco de sermos premiados com a visita indesejada de assaltantes, a gente reúne coragem e bom humor para se encontrar ao pôr do sol nesta esburacada Euclides Deocleciano.

Agora vejo que me alonguei neste relato. Os meus vizinhos devem estar lá fora. Acredito que algum deles já perguntou por mim.

Marcos Ferreira é escritor

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domingo - 27/08/2023 - 08:24h

O quarto nunca esteve vazio

Por Odemirton Filho 

Foto própria do arquivo do Canal BCS (caráter ilustrativo)

Foto ilustrativa (Autor: BCS)

No portão da entrada de sua casa, o rapaz se despediu dos seus pais. Abraçou e beijou, de forma carinhosa, cada um. Viam-se lágrimas escorrerem nos rostos.

– Benção, mãe – Deus te abençoe, meu filho.

E partiu.

Partiu para começar uma nova vida longe da família. Foi trabalhar lá para as bandas da região Norte do Brasil.

Nos dias que se sucederam, a mãe do rapaz ficava a olhar o quarto do seu menino, tudo no lugar. O violão encostado em um canto; os carrinhos da coleção em uma estante; alguns livros do colégio. Cada vez que entrava no quarto sentia uma dor doída.

Não é fácil para os pais verem os filhos “ganhando o mundo”, mesmo sabendo que faz parte da vida. “Criamos os filhos para o mundo”, diz o ditado popular. Mas o pai e a mãe sofrem quando os filhos saem de casa. E deve ser imensurável a dor de quem enterra um filho. Rasga a alma.

Com aquela mãe não era diferente. Às vezes, ao preparar uma refeição, lembrava do filho. Vez em quando as lágrimas ajudavam a temperar o feijão. Nas festas de fim de ano e aniversários, sentia ainda mais a sua ausência. Lembrava do sorriso, das brincadeiras. Por vezes, a mãe ficava à janela, como se esperasse seu filho.

O tempo passou. O “menino” formou família, com mulher e filhos. Como o dinheiro era pouco, somente de raro em raro o filho vinha visitá-los; quando vinha, era uma festa. Nos dias que antecediam a chegada os preparativos eram muitos.

A mãe fazia uma boa faxina no quarto, elaborava um cardápio bem caprichado das comidas que o filho, a nora e os netos gostavam.

Eram dias de alegria, sorrisos. Os netos correndo pra lá e pra cá; brincando sobre a cama. A casa ficava viva. Sem falar nos passeios pela cidade, as visitas aos familiares, o banho de mar.

No dia da partida, porém, era uma tristeza. O menino vai ganhar o mundo de novo, pensava a mãe. O pai fazia-se forte, contudo, sentia um nó na garganta.

A mãe olhou para o quarto do filho; sem a bagunça e a alegria de outrora. Ouvia-se o silêncio.  Mas, na verdade, o quarto nunca esteve vazio. Sempre esteve repleto de saudades.

Deus te proteja, meu filho.

 Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça

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Categoria(s): Crônica
domingo - 20/08/2023 - 04:00h

À vara e a remo

Por Marcos Ferreira

Ilustração sem identificação de autoria

Ilustração sem identificação de autoria

Mais uma vez estou aqui, diante da tela fluorescente do notebook, catando ideias e pensamentos com que eu possa urdir um texto minimamente digno de ser apresentado ao leitor. Não devo botar a cara fora com sensaborias, mera enrolação palavrosa. No entanto a semana voou e ainda não dei conta deste compromisso de produzir uma crônica dominical. Preciso arrumar isto em cima da hora, tirar uma carta da manga, eu que não sei jogar cartas, xadrez nem nada dessa natureza.

Embora paciente, compreensível com os meus apuros e contratempos domésticos e criativos, sei que o meu editor não está a fim de requentar outra página deste cronista, como fez noutros domingos neste espaço diversificado. Então prossigo garimpando um mote, uma fagulha, um tema a ser desenvolvido.

Muito bem. Vejam o seguinte. Geralmente é este um momento de prazer, de reencontro comigo mesmo e com algo que, permitam-me dizer, consigo manejar com razoável desenvoltura: o exercício da escrita. É isso. Não usarei de charminho ou falsa modéstia. Sou escritor e não tenho por que negar. Suponho que escrever seja a única atividade que realizo sem embaraço, atrapalhação. Hoje, no entanto, estou à vara e a remo. Pois a minha cabeça (de circunferência planetária) dói de maneira absurda. A isso, claro, dá-se alguns nomes como enxaqueca e cefaleia.

Portanto, a sinagoga pulsa, lateja. A pressão é grande. Exibe sinais de que vai explodir. Receio um derrame. Cedinho tive aquela ânsia de vômito e um suor frio. Porém não vomitei. O diclofenaco potássico, a dipirona monoidratada e um pouco de café seguraram as pontas. Imagino que sim. Estes são achaques típicos e velhos conhecidos deste apanhador de palavras. Então abandonei a rede.

Não está fácil. A redação sai picotada, cheia de arestas. As ideias vêm confusas, prolixas, desconexas. Sou obrigado a emendar e desemendar alguns pontos. Os ombros formigam. Estômago embrulhado, mãos trêmulas. Sinto um gosto de insucesso ou derrota perante a folha em curso. Os olhos marejam; até parece que têm areia. A luz desta manhã com céu amplamente azul representa um desconforto. Tenho a desagradável impressão de que escrevi muita coisa e não disse quase nada.

Peço perdão pela náusea, por esta cefaleia teimosa, recalcitrante. Perdoem, enfim, este relato bem pouco literário e decerto enjoativo.

Hei de engendrar algo melhor para o próximo domingo. Se minha cuca estiver em ordem.

Marcos Ferreira é escritor

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domingo - 13/08/2023 - 08:30h

literalmente gótico

Por Marcelo Alves

Da página terror under the bed

Da página Terror: under the bed

“O Castelo de Otranto” (“The Castle of Otranto”), de 1764, é convencionalmente considerado como o título fundador da denominada ficção gótica. O seu autor é Horace Walpole (1717-1797), escritor, político e aristocrata inglês, filho de Robert Walpole (1676-1745), 1º Conde de Oxford, considerado, também convencionalmente, como o primeiro Primeiro-Ministro da Grã-Bretanha. Curiosa família de “primeiros”.

É certo que “O Castelo de Otranto” possui as características que costumam ser apontadas como marcantes no gênero (literário) gótico. Segundo consta da minha edição do dito cujo (Oxford World’s Classics, Oxford University Press, 2008): “Primeiramente publicado pseudonimamente em 1764, The Castle of Otranto alegava ser uma tradução de uma estória italiana do tempo das cruzadas. Nele, Wolpole buscou, como ele declarou no prefácio da segunda edição, ‘misturar dois tipos de romance: o antigo e o moderno’.

Ele nos dá uma série de catástrofes, intervenções sobrenaturais, revelações de identidades e intrigas excitantes. Repleto de invenção, entretenimento, terror e sofrimento, o romance foi um imediato sucesso e tornou-se o favorito do próprio autor entre os seus numerosos trabalhos. Seu amigo, o poeta Thomas Gray, escreveu que ele e sua família, tendo lido Otranto, restaram doravante com medo, todas as noites, de ir para a cama”.

Hoje difícil de se ler, “O Castelo de Otranto” ganhou status de cult, sendo objeto de referências em outras paragens, como no caso do mui querido “O nome da rosa” (“Il nome della rosa”, 1980), de Umberto Eco (1932-2016), um romance que, embora perpassando outros gêneros da ficção (romance histórico, medieval, policial, sobre livros e por aí vai), é uma obra marcadamente “gótica”: a personagem Adelmo de Otranto, o primeiro frade morto na trama de Eco, é uma referência ao livro seminal de Walpole. E é fato: inseminado por “O Castelo de Otranto”, o romance gótico, com sua “sedutora mistura de bizarro e macabro”, com seus “castelos, caixões e claustrofobia”, com seus “segredos e vinganças”, ganhou o mundo, sendo adorado por muitíssimos leitores. Eu adoro! Registro.

Surfando na onda, dia desses até dei de cara com um artigo/lista da BBC Culture, intitulado “The eight best gothic books of all time”, por Freya Berry, que achei deveras interessante. E antes que vocês me indaguem o porquê desse número de “oito” melhores (confesso que achei bizarro), da lista vou destacar dois títulos: “Frankenstein” (1818), de Mary Shelley (1797-1851) e “A Sombra do Vento” (“La sombra del viento”, 2001), do espanhol Carlos Ruiz Zafón (1964-2020).

“Frankenstein” é provavelmente o clássico dos clássicos dos livros góticos. Nele, Victor Frankenstein cria um ser vivo em seu laboratório. Mas as coisas não saem como ele imaginava. E ele tem de lidar com as consequências. “Frankenstein” é tido também como pioneiro na ficção científica. Mas ele é muito mais do que isso. É sobretudo uma profunda discussão filosófica sobre ambição, criatividade, ciência, educação, paternidade, natureza, humanidade, vida e morte.

Já acerca de “A Sombra do Vento”, repito um trecho do artigo da BBC Culture: “Stephen King [e aqui temos um craque do jogo] disse sobre esta obra espanhola que, ‘se você pensou que o verdadeiro romance gótico morreu com o século 19, ela vai mudar sua opinião’. O best-seller mundial de Zafón de 2001 é de fato quase matematicamente gótico – segredos, castelos, belezas etéreas, bibliotecas perdidas e amor proibido – embora isso ainda não faça justiça a esta fantasia encantadora. Se você quer uma obra-prima na criação de uma atmosfera sombria, leia este livro, de preferência à luz de velas enquanto a noite tudo domina”. No mais, “A Sombra do Vento”, com o seu “Cemitério dos Livros Esquecidos”, é marcadamente um romance sobre livros. E isso é mais que uma maravilha!

De minha parte, acho difícil qualquer romance superar “O Nome da Rosa”, que é também uma estória sobre livros e o poder infinito, muitas vezes macabro, das palavras. O livro de Eco é ainda o meu romance preferido, o número 1 mesmo. Mas vou em busca da “Sombra do Vento”, cair para dentro dele, enterrar-me ali, no seu “Cemitério dos Livros Esquecidos”, já nos próximos dias. Quem sabe algo de ainda mais bizarro e maravilhoso não me acontece?

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador Regional da República e doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL

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domingo - 13/08/2023 - 04:24h

Pequenas grandes coisas

Por Marcos Ferreira

A noite estrelada (Vincent Van Gogh)

A noite estrelada (Vincent Van Gogh)

Preciso dizer que não é rotina, algo corriqueiro. Mas, a exemplo de muita gente, tenho pensamentos negativos. Às vezes minha cabeça é um poço escuro, solitário, nebuloso. Os motivos, embora alguns considerem tolos, são complexos. Há sensações que os meus ombros nem sempre conseguem suportar. Então, como quem busca um alívio, eu reflito. E, mesmo sem muito entusiasmo, recordo que o Sol brilha e aquece nossos corações e sonhos. Por mais pessimistas que sejamos.

É necessário que a gente lute, reaja. Ainda que tudo pareça desfavorável ou perdido. Que o vento desta manhã radiante carregue as sombras, o pessimismo, o desânimo. Ora desejo a cantoria dos pássaros, o macio e distante passeio dessas poucas nuvens branquinhas que pontilham o infinito azul do céu. Hoje estou de bem comigo, com a vida, com o mundo. Não quero conflitos. Somente paz.

Logo mais à noite teremos a Lua e toda uma infinitude de estrelas cujo brilho nos é dado gratuitamente desde que o mundo é mundo, sem nos cobrar um centavo por isso. Ao contrário das companhias de luz elétrica, as estrelas, o Sol e a Lua não exigem taxa de iluminação pública. Você já parou para olhar o espaço em uma noite estrelada? Quanta vastidão! Quanto poder sobre as nossas insignificantes cabeças! Nossa geração cabisbaixa está habituada demais ao asfalto e paralelepípedo.

Você tem se permitido ler ou ouvir um bom poema? Não sei dizer. Porque a poesia, assim como o pipilar e o voo dos passarinhos, não é prioridade, não se vincula ao seu campo de interesses, ao seu percurso nem à sua vida apressada. O trabalho, os eventos sociais e os bares talvez sejam sua única busca e destino. Quando foi a última vez que você tomou um banho de chuva, hein? Não sabe.

Ninguém é obrigado a nada. De jeito algum. Não vim aqui dizer o que você deve fazer ou deixar de fazer. Cada um procura por aquilo que lhe é mais importante.

Quanto a mim, no entanto, preciso dessas pequenas grandes coisas que a vida e a Natureza têm a nos oferecer. Lembrar desses aspectos de nossa existência me fortalece até quando a minha alma se encontra de joelhos. É preciso que todos busquemos as nossas razões para seguirmos em frente. Tenho buscado as minhas.

Marcos Ferreira é escritor

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