domingo - 21/12/2025 - 09:24h

Um conto de Natal

Por Odemirton FilhoImagem natalina, natal, festa de natal, luzes, brilho - 5

O clássico livro do escritor inglês, Charles Dickens, que tem o título desta crônica, inspirou-me a escrever o presente texto. O romance tem como personagem principal o senhor Scrooge, um velho rabugento que odeia o Natal e tudo que o envolve. Ele trabalha em um escritório em Londres com o seu empregado, Bob Cratchit.

No entanto, o fantasma de um falecido sócio de Scrooge aparece para ele, dizendo-lhe que três fantasmas irão acompanhá-lo em uma viagem ao passado, presente e futuro, a fim de que o velho repense a sua vida e seus valores.

Eis, em breves palavras, o resumo do mencionado livro.

De fato, a época do Natal é momento de inúmeras confraternizações, trazendo lembranças e saudades. Muitas famílias e amigos se reúnem nesse período para trocarem presentes e degustarem uma deliciosa ceia, além de sorrisos, abraços e discursos com palavras bonitas e reflexivas.

Por outro lado, entretanto, celebrar o Natal não é a realidade de milhões de pessoas. Para quem não tem o que comer, um teto para se abrigar e um lençol para se cobrir, a Noite do Natal é somente mais uma. Há, também, quem ache essas confraternizações uma verdadeira hipocrisia, pois no ambiente de trabalho, e até mesmo no seio das famílias, existem aqueles que adoram “puxar o nosso tapete”.

De toda forma, a época do Natal, para quem acredita no “clima natalino”, é a oportunidade de repensar atitudes e valores. O que fizemos? Em que posso melhorar enquanto pessoa? Talvez, fazer mea-culpa seja fundamental para se tentar uma mudança na forma de pensar e, sobretudo, de agir.

Certa vez, o escritor José Lins do Rego disse que “não há mais ninguém, neste mundo de Deus, que acredite em sentimentos humanos, em grandeza de alma, em boas intenções”. Eu, todavia, creio que não devemos deixar de acreditar na criatura, porque se assim for, deixaremos de acreditar no Criador.

Enfim, caro leitor, eu não sei se você credita no espírito do Natal. Porém, desejo-lhe muita saúde, sossego e uma ruma de coisas boas.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 14/12/2025 - 12:02h

Almoço aos domingos

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Segundo o cientista político e escritor Felipe Nunes, no livro Brasil no Espelho, “o hábito do almoço aos domingos – seja na casa da mãe, da sogra ou de outro familiar – é uma instituição nacional, um rito quase sagrado, que há décadas influencia desde piadas até a programação da televisão, os horários do futebol e o comportamento de consumo”.

Certamente, alguns leitores devem lembrar dos almoços em família, nos quais se reuniam uma ruma de gente. Eram os avós, pais, filhos e netos que conversavam sem parar. Às vezes, parecia que estavam brigando, de tão alto que falavam. Já as crianças faziam uma zoada danada, brincavam e corriam pra lá e pra cá. Talvez, em alguns momentos, palavras, sorrisos e lágrimas se misturassem. Era desse jeitinho, nera não, caro leitor?

Puxando os fios de minha memória, lembro-me que em tempos idos não havia uma grande quantidade de restaurantes na cidade. Era costume almoçar em casa, também aos domingos. Com os meus pais e minhas irmãs, ficávamos em casa, jogando conversa fora, enquanto a nossa querida Socorro preparava o almoço.

Normalmente, o menu variava entre galinha, carne de sol, arroz de leite, feijão, picadinho e lombo. Como, na maioria das vezes, eu não gostava de almoçar, preferia comer ovo com arroz e um copo com leite. A sobremesa quase sempre era um delicioso doce de goiaba ou de leite.

Estando à mesa, meu pai, que sempre foi de poucas palavras, de quando em vez comentava algum assunto e, ao final da refeição, fazia o sinal da cruz, em agradecimento. Conversávamos coisas do cotidiano, de como estávamos na escola, do meu boletim com notas vermelhas ou das brigas com minha irmã mais nova. Por outro lado, minha mãe sempre gostou de falar sobre a sua juventude; contava muitas histórias, sobretudo, sobre o meu avô.

Claro que como quase todo menino/adolescente eu achava aqueles momentos um “saco”. Ficava doido para que a refeição terminasse logo, para me trancar no meu quarto ou ir à casa de algum amigo. No entanto, não me dava conta que aqueles momentos passariam, e ficariam guardados em minha memória.

O tempo passou. Casei. Vieram os filhos e o neto.

Os almoços aos domingos viraram uma ocasião especial, nos quais eu sinto uma profunda alegria. Entre sorrisos e histórias, ao lado da minha mulher, dos meus filhos, nora e neto, encontro o verdadeiro sentido da vida. Aqui e acolá, como aperitivo tomo duas ou três doses de cachaça, enquanto meu filho toca violão.

Na verdade, não há nada melhor do que estar ao lado de quem amamos e nos sentimos amados. Ver o sorriso do meu neto, ao se lambuzar com a sua comida, arrastando-se pela casa, aprendendo a andar e balbuciando, aquece o meu coração.

Pois é, de uns tempos pra cá percebi que a felicidade também está nesses singelos momentos; entre os quais, os almoços aos domingos.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 07/12/2025 - 09:36h

Vida boa é a dos outros

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Um dia desses, eu tomava um café lá em Duart´s, de propriedade dos amigos Toinha e Rafael Arcanjo, no centro da cidade de Mossoró. Como de costume, papo vai, papo vem. Depois de um certo tempo, chegou ao estabelecimento, uma senhora, de uns setenta e poucos anos. Sentou à mesa, pediu um café e perguntou quanto custava uma fatia de bolo.

Ao saber o valor (que não é caro), recusou. Então, pedi aos proprietários que lhe servissem. Ela me olhou, agradecida, e conversamos um pouco. Falou-me que tinha vindo ao centro da cidade para receber o seu “aposento”.

Após tomar o café e comer o pedaço do bolo, a senhora abriu a sua bolsa, retirando uma cédula de vinte reais. Porém, como eu tinha lhe oferecido o desjejum, não deixei que efetuasse o pagamento.

Ela, para o meu espanto, começou a chorar, lágrimas escorreram pelo seu rosto. Eu pedi para que se acalmasse, pois o que fiz foi apenas um ato de gentileza.

Ela agradeceu, guardou o dinheiro em sua bolsa e se despediu. Foi cuidar da vida, como me disse. Quando fiquei sozinho, fiquei a imaginar quais os problemas àquela senhora estivesse atravessando. Talvez, fosse arrimo de família, e precisasse economizar os vinte reais para findar o mês.

Com se sabe, cada um de nós enfrenta inúmeras batalhas. São problemas emocionais, de saúde, financeiros ou com algum membro da família. Ninguém, absolutamente ninguém, consegue mensurar as lutas que o outro está enfrentando.

“Vida boa é a dos outros”, costuma-se dizer. No entanto, é no fundo da alma, na solidão dos nossos pensamentos, que digladiamos dia e noite com os nossos problemas. A vida não é fácil. Nunca foi. Nunca será.

Por isso, um ato de gentileza pode ser um lenitivo para alguém. No mais das vezes, não precisa ser dinheiro. Quem sabe, apenas uma palavra de conforto, um sorriso, um abraço, ou um simples café, sejam suficientes.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
quarta-feira - 03/12/2025 - 08:38h
Ufersa Mossoró

Festival Literário tem bate-papos, música, livros e diversidade

Banner de divulgação

Banner de divulgação

Aberta no fim da tarde dessa terça-feira (02), a segunda edição do Festival Literário Macambira tem sequência nesta quarta-feira (03). Promovido no Campus de Mossoró da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), o evento é promovido pela Editora da Universidade (EdUfersa) e o Banco do Nordeste do Brasil (BNB).

Neste segundo dia, a programação seguirá bastante diversificada. Veja abaixo:

17h – Batuques do DM

17h20 – Airton Cilon (Atração musical)

18h – Lançamentos de livro EdUFERSA

Periodicamente (Livia Cabral Maia)

A técnica como potência do humano (Fátima de Lima)

Saúde versus adoecimento psíquico no trabalho (Agostinha Mafalda)

O Educação para cuidar e saúde mental para aprender (Aridenise Fontenelle)

Educação infantil currículos e linguagens
(Elaine Sobral)

18h30 – Violões – NAC

18h50 – Bate-papo

(“O lugar do excluido na literatura”)

Mediação: Cícera Cajazeiras
Convidado: Octávio Santiago

Octávio Santiago é uma das atrações desta quarta-feira Foto: Rierson Marcos/Arquivo)

Octávio Santiago é uma das atrações desta quarta-feira (Foto: Rierson Marcos/Arquivo)

19h40 – Alex (Atração musical)

20h20 – Bate-papo

(“Suportes Alternativos da Literatura”)

Mediação: José Roberto Alves Barbosa
Convidados: Ayala Gurgel, Carlos Santos e Odemirton Filho

21h20 – Cabocla de Jurema (Atração Musical)

Acesse nosso Instagram AQUI.

Acesse nosso Threads AQUI.

Acesse nosso X (antigo Twitter) AQUI.

Compartilhe:
Categoria(s): Cultura
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 30/11/2025 - 11:36h

Amanhã é dezembro

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com uso de recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com uso de recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Mais um mês de dezembro pra conta. De muitos.

Em minha memória, inúmeras lembranças. Eu ficava ansioso pelo início das férias, na praia de Tibau. No entanto, como quase sempre ficava em recuperação na escola, era preciso esperar alguns dias. Enquanto isso, começavam-se pequenos reparos na casa de veraneio, faziam-se reboco e pintura por causa da maresia, consertavam-se alguns móveis; eu ficava mais animado do que “pinto em beira de cerca” com esses preparativos.

Para mim, o mês de dezembro sempre foi envolto em boa aura. Havia algo de mágico. Lá de casa, no centro da cidade, ouvia o badalar dos sinos da Catedral de Santa Luzia, anunciando os festejos da padroeira; era hora de ir comprar uma roupa e sapatos novos, acompanhado por minha mamãe.

Sobre a Festa de Santa Luzia, vale transcrever um fragmento de um texto escrito pelo historiador Geraldo Maia:

“Essa tradição de celebrar a Virgem de Siracusa só deixou de acontecer três vezes ao longo dos anos. Em 1860 e 1865, a igreja passou por uma grande reforma, e o padre da época achou melhor não realizar a festa. E a última vez que a festa não aconteceu foi 1935, quando Padre Mota achou melhor não fazer a festa por causa dos conflitos gerados pelo movimento conhecido como Intentona Comunista”.

No meu tempo de menino/rapaz, à noite, vez ou outra, ia assistir as novenas celebradas por Monsenhor Américo. Depois, gostava de andar pra lá e pra cá na rua da Catedral, onde havia uma ruma de gente, lotada de barracas. Logo após as novenas, o burburinho profano varava noite adentro. Cadê A Mais Bela Voz?

Eu, então, parava na barraca de minha tia, Socorro de “Puca”, pra degustar uma generosa fatia de bolo de leite. Com o passar dos anos, já na qualidade de pai, levava os meus filhos pra passear; comprava aquelas bolas grandes que, no primeiro chute, furavam. Eles jogavam argolas para ganhar uma prenda ou brincavam de pescaria, e sorriam, alegres, pois para as crianças o singelo é sinônimo de felicidade.

No dia 13, o ponto culminante. Uma enorme procissão, com milhares de fiéis, num misto de fé e devoção. Ali, tradição e fé se entrelaçam, com pessoas das mais variadas classes sociais; alguns caminham com pedras na cabeça, outros, vestem-se com as cores da roupa da Santa, e há aqueles que acompanham a procissão com os pés descalços. Sem falar nos milhares de pessoas que ficam nas esquinas, à espera da passagem do andor. Tudo isso, é claro, acompanhado por orações, cânticos e muita, muita emoção.

Sim, amanhã é dezembro, aproveito para garimpar lembranças. Recordo-me da ceia de Natal, na casa dos meus avós, na rua Seis de Janeiro. Um bocado de primos e primas, amigo secreto, mesa farta. Era tão bom. À tarde, ia à casa dos meus primos, jogar bola, na rua ainda de areia. Outras vezes, ia brincar e saborear seriguelas na casa de tia Adna e tio Chico Espínola.

Pois bem. Há quem não goste do mês de Dezembro por ser carregado de lembranças e saudades, com ares de melancolia. Eu, porém, sempre gostei. E ainda gosto.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 23/11/2025 - 08:50h

O Grande Hotel

Por Odemirton Filho

Grande Hotel em foto de 1971 e mais abaixo nos anos 50, no Centro de Mossoró (Fotomontagem do BCS a partir de fotos do //blogdetelescope.blogspot.com/)

Grande Hotel em foto de 1971 e mais abaixo nos anos 50, no Centro de Mossoró (Fotomontagem do BCS a partir de fotos do //blogdetelescope.blogspot.com/)

Na Mossoró das antigas um majestoso prédio embelezava a cidade. Foi palco, segundo os historiadores e pessoas de ontem, de inúmeros encontros sociais, festas e tardes/noites badaladas. Era o famoso Grande Hotel, inaugurado em 1908.

Localizava-se na esquina da rua Bezerra Mendes com a avenida Augusto Severo, próximo ao Mercado Central. O prédio era dividido em três partes: uma casa de hospedagem, um cineteatro e um bar-restaurante.

“O cineteatro, o principal centro de lazer familiar da cidade, estava instalado numa área semiaberta do prédio do Grande Hotel, local que recepcionava a nata da sociedade nos grandes eventos. Este espaço, também foi palco de histórias, fatos pitorescos e confusões do cotidiano  local. Durante as projeções, ocorria um intervalo de 15 minutos para permitir a plateia fazer um pequeno lanche, tomar um café, um refresco ou apenas tomar um ar fresco na área livre”(…) (Disponível em //blogdetelescope.blogspot.com/2014/11/o-grande-hotel-e-o-cine-teatro-almeida.html).

Segundo se comenta, nessas sessões cinematográficas houve inúmeros fatos inusitados, como a proibição de uso de chapéus com plumas por parte de algumas mulheres, haja vista dificultar a visão de quem estava assistindo aos filmes. Além disso, várias figuras públicas, entre os quais cantores de vulto nacional, e políticos hospedaram-se no Grande Hotel.

Eram outros tempos. Tempos de uma Mossoró que ficou para trás. Fico a imaginar o cotidiano das pessoas daquela época; as roupas com as quais se vestiam, quais os assuntos do dia, os costumes, o que era relevante nas rodas de conversas entre familiares e amigos.

É claro que eu não conheci o Grande Hotel em seus áureos tempos. Talvez, meus avós e bisavós tenham vivenciado àquelas tardes/noites. Eu ainda cheguei a ver o prédio, bastante deteriorado, lá pela década de mil novecentos e oitenta.

Hoje, restou-nos, tão somente, um pouco de sua rica história.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • San Valle Rodape GIF
domingo - 16/11/2025 - 09:32h

Da janela lateral

Por Odemirton Filho

Foto de produção própria do BCS

Foto de produção própria do BCS

“Vejo uma igreja, um sinal de glória, vejo um muro branco e um voo pássaro, vejo uma grade, um velho sinal” (…)

Na bela e antiga canção de Lô Borges (falecido recentemente) e Milton Nascimento abre-se passagem para a licença poética, uma vez que podemos viajar, interpretar e inundar a nossa alma de uma leve brisa. Dizem que os “elementos como igreja, muro branco e voo pássaro, reforçam o clima contemplativo e nostálgico, lembrando a infância e a vida no interior, mas também apontam para o desejo de liberdade e esperança em tempos difíceis”. (Disponível em //www.letras.mus.br/lo-borges/47027/significado.html).

Sim. Da janela do meu quarto eu posso ver o mundo de muitas formas e cores. Posse enxergar uma igreja e tê-la como um local no qual encontro conforto para o meu coração, aumentando a minha fé. Dependerá da crença de cada um. Nessa sentido, em cada vitória ou derrota que encontro no decorrer da vida, pode ser um sinal de glória para o meu crescimento pessoal.

De longe, também, eu posso enxergar um muro branco, e nele, começar a desenhar e escrever a minha história de vida, fazendo-a colorida e pulsante.

Lembro, quando era criança, ali pelos arredores da Igrená de São Vicente, ao cair da tarde, eu gostava de ver o voo das andorinhas, que bailavam lindamente no ar. Hoje, no bairro onde moro, inúmeras vezes escuto o cantar de várias espécies de pássaros, chamando-nos para viver. No entanto, há quem fique chateado com a sinfonia dos pardais.

Da janela de minha vida, posso enxergar grades que aprisionam, que me impedem de correr em busca dos meus objetivos. Posso, em consequência, fica preso ao meu medo, a minha angústia, ao meu desalento perante o mundo. Muitas vezes, é de bom tom procurar ajuda profissional para abrir as grades da prisão do nosso eu.

Doutro lado, ao olhar pela janela da alma, posso vislumbrar múltiplas possibilidades para a minha vida. É claro que não se pode julgar ninguém, pois cada pessoa sabe o peso que carrega sobre os ombros.

Assim, da janela do meu quarto eu posso ver um velho sinal. Ele pode estar verde, nos mandando seguir avante nos nossos sonhos; pode estar amarelo, para que tenhamos cautela ao tomar alguma decisão na vida. O sinal, enfim, pode estar vermelho, alertando-nos que é o momento de colocar o pé no freio, esperar e refletir; somente depois devemos seguir o nosso caminho.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 09/11/2025 - 07:02h

Um pouco de ontem

Por Odemirton Filho

Foto ilustrativa

Foto ilustrativa

“A criança que fui chora na estrada. Deixei-a ali quando vim ser quem sou; mas hoje, vendo que o que sou é nada, quero ir buscar quem fui onde ficou”. (Fernando Pessoa).

Vez ou outra, lembro-me da criança que fui; de poucas palavras, poucos amigos. Vivi os dias da minha infância na rua Tiradentes, no centro de Mossoró. Ali, o adulto de hoje foi forjado.

Os dias corriam devagar, quase parando, divididos entre a casa onde morava, a padaria dos meus pais e o colégio. À noitinha, gostava de jogar bola com os meninos da rua e ouvir histórias de “trancoso”. As férias, como já escrevi em inúmeras oportunidades, era na praia de Tibau, meu xodó.

Lembro que os dias na padaria começavam ainda de madrugada. Meu pai, por inúmeras vezes saiu de madrugada para ir buscar outro funcionário, porque o padeiro do turno, depois de tomar umas, faltava ao serviço. Então, era um aperreio para conseguir um substituto e conseguir começar o dia com uma nova fornada de pães.

Durante o período da manhã, depois de fazer o dever de casa, eu corria pra padaria a fim de ver os funcionários, literalmente, com a mão na massa, trabalhando incansavelmente com o cilindro. Recordo-me muito bem do padeiro João Camilo, um mestre em sua arte.

A massa depois de pronta era colocada em um enorme forno a lenha. Ao sair do forno, em alguns pães, passava-se um pincel com uma espécie de melaço, transformando-o no famoso “pão doce”. Maria Arimar Braga, funcionária antiga da padaria, fazia os bolos e doces.

O que mais apreciava, entretanto, era a bolacha sete capas, enquanto ajudava a encher os pacotes, saboreava algumas.

Cheguei, algumas vezes, a atender no balcão. O final da tarde era o horário de maior movimento, quase não dava conta atender a freguesia. Outra vezes, porém, quando tinha mais idade, ficava no caixa, recebendo dinheiro e passando troco. Nada de cartão de débito, crédito ou PIX. Era dinheiro “vivo”.

Duas ou três Kombis faziam a entrega dos pães em alguns pontos de revenda nos bairros mais afastados da cidade. Às vezes, vendia-se muito; a sobra, chamávamos de “boia”. Final de semana, normalmente no sábado à tarde, fazia-se o pagamento dos funcionários. Inúmeras vezes, restava-nos uma quantia mirrada de dinheiro.

Havia um senhor, não lembro o nome, que toda tarde passava para comprar pão. Ele chegava no seu carro potente, descia, comprava e ia embora. Criança, eu ficava sentado na calçada, vendo-o, e dizia a mim mesmo que, um dia, teria o meu carro pra ir comprar pão em uma padaria e levar para minha mulher e meus filhos. Um inocente sonho de criança. Mas, quem não teve um sonho quando era criança? Eu tive. Muitos. Não deixei de sonhar, é claro, no entanto, sonho com os pés no chão.

Por isso, aqui e acolá, ao buscar a criança que um dia fui, lembro um pouco do ontem. Dos meus medos e sonhos; das minhas alegrias e tristezas. E hoje, agradeço a Deus pelo pão nosso de cada dia.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos 

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 26/10/2025 - 09:48h

Meditando o tempo

Por Odemirton Filho

Pavilhão Vitória ficava na Praça Rodolfo Fernandes, sendo ponto de encontro durante muitos anos (Fotomontagem BCS)

Pavilhão Vitória ficava na Praça Rodolfo Fernandes, sendo ponto de encontro durante muitos anos (Fotomontagem BCS)

Benfazejas são algumas lembranças; fazem-nos recordar momentos e pessoas especiais. Sim, aprecio e fico feliz quando os leitores navegam comigo nesse mar de tempos idos.

Por quê? Porque o cotidiano é tão repleto de dificuldades, sobretudo de silenciosas batalhas subjetivas, que reviver momentos singulares acalma o coração. Quem não gosta de relembrar pessoas queridas? Pessoas que se foram, deixando uma lacuna imensa em nossas vidas? Pois bem, sempre procuro trazer a este blog textos livres, leves e soltos.

Sei que aqui e acolá faço alguma crítica. Contudo, faço de forma geral, sem ofender a honra de quem quer que seja. Já bastam a intolerância e o ódio disseminados diariamente nas redes sociais.

No entanto, cada pessoa tem o seu estilo de escrever, o que respeito, diga-se de passagem. Mas prefiro cultivar na alma, paz, apresentando aos leitores uma crônica suave, que aqueça o coração.

Assim, inspiro-me em crônicas que falam sobre o simples da vida. Exemplo? Um trecho de uma das belas crônicas do inigualável Jornalista Dorian Jorge Freire, a seguir transcrito:

Procurar a Mossoró de ontem, procurei (…), tirei do baú o meu terno de linho irlandês diagonal, branco, passado com muita goma, mandei engraxar por Chico Doidinho os meus sapatos Fox de bicos finos, passei Glostora nos ralos e raros cabelos e subi a 30 de Setembro a procura da Vigário Antônio Joaquim. (…) Digam onde estão os charutos de padre Mota, a gargalhada de Motinha, o riso bom de Manuel Leonardo, o cafeísmo de Negus, os comícios do velho João Leite? Benício Gago, seu reco-reco e seu jumento”?

E continua o mestre Dorian:

A praça Pé Duro, depois Praça do Pax, virou Rodolfo Fernandes e perdeu sua dignidade. Porque perdeu, na avalanche, o Pavilhão Vitória, a voz de Jorge Pinto anunciando deslumbrantes tecnicolors, o bozó do Bar Suez, onde se vendia a cerveja mais gelada do mundo”.

Percebe-se que ele escreve sobre um tempo distante, do dia a dia de uma Mossoró ainda com ares de cidade interiorana. Talvez, poucos leitores tenham vivido esses momentos e conhecidos referidas pessoas.

Ademais, costuma-se dizer que antigamente o tempo passava devagar, quase parando, porquanto as pessoas tocavam a vida sem a correria dos dias atuais. Sentavam-se nas calçadas, na boquinha da noite, para jogar conversa fora e falar da vida alheia; aos domingos, reuniam-se em família para saborear um lauto almoço.

Por isso, veio-me à memória um texto do poeta Mario Quintana: “havia um tempo de cadeiras na calçada. Era um tempo em que havia mais estrelas. Tempo em que as crianças brincavam sob a claraboia da lua. E o cachorro da casa era um grande personagem. E também o relógio da parede. Ele não media o tempo simplesmente: ele meditava o tempo”.

O tempo deve ser um aliado; jamais, inimigo.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 19/10/2025 - 06:26h

Compromisso semanal

Por Odemirton Filho

Rubem Braga para o BCS, em arte impressionista com uso de Inteligência Artificial, a partir de foto de O Globo

Rubem Braga para o BCS, em arte impressionista com uso de Inteligência Artificial, a partir de foto de O Globo

Certa vez, Rubem Braga, um dos nossos melhores cronistas, escreveu: “fazer crônica não dá trabalho! Eu poderia estar ouvindo música, lendo um bom livro, batendo um papo com algum amigo e estou aqui há três, quatro horas, lendo jornal, pensando umas coisas vagas, procurando um assunto qualquer pra escrever”.

Pois bem. Pegando carona nas palavras do velho Braga, acrescentarei: eu poderia estar sentado à mesa com Marcos Ferreira, Carlos Santos, Bruno Ernesto, Rocha Neto e Marcos Araújo, saboreando um café coado, caprichosamente preparado pelo dileto anfitrião da “casa branca”. Aproveitaria para aprender com cada um deles, ouvindo as suas histórias e dando gargalhadas.

Ou, quem sabe, poderia ir à praia com minha mulher, meus filhos e meu neto. E lá estando, tomaríamos uma água de coco; eu e o meu primogênito iríamos saborear uma “loira gelada”, apreciaríamos o azul do mar, o vai e vem da maré. Eu brincaria com o meu lindo neto, faríamos um castelo de areia, e esperaríamos as ondas para desmanchá-lo.

Talvez, eu ficasse em casa, balançando-me na rede. Abriria um livro para ler, folheando cada página com vagar e atenção. Aqui e acolá, acessaria as redes sociais para me inteirar do besteirol do dia. Também acessaria os blogs e portais pra saber a quantas andam o Brasil e o mundo. Eu até sei, vivemos tempos de intolerância política, guerras pelo mundo afora e corrupção, praga que há anos corrói as entranhas do nosso país.

Aproveitaria, de igual modo, para estudar algo sobre a Ciência do Direito, sobretudo Processo Civil e Eleitoral, minhas paixões desde os bancos da faculdade. Na docência, foram quinze anos lecionando referidas matérias e, com certeza, eu aprendi mais do que ensinei. Amadureci; fiz bons amigos.

Eu também poderia ir à casa dos meus pais para conversar. Ouviria as histórias do meu genitor sobre as brincadeiras no antigo horto florestal, quando ele e seus amigos tomavam banho nas águas (ainda salubres) do rio Mossoró, principalmente na época das enchentes. Escutaria as histórias emocionantes de minha mãe sobre o meu avô, Vivaldo Dantas de Farias, e da fé inabalável da minha vó Placinda.

Enfim, poderia fazer muitas coisas. Entretanto, cá estou, “enchendo linguiça”, com receio de não cumprir o compromisso semanal que há sete anos tenho com os leitores deste Blog. Isso dito, peço desculpas pelo texto mal-ajambrado. Até o próximo domingo.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 12/10/2025 - 08:42h

Pela estrada afora

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

O tempo, como se diz, voa. Anda a galope. Passa tão rápido que não percebemos. Eu, por exemplo, há vinte anos trabalho na região da Costa Branca, entre as cidades de Tibau, Grossos, Areia Branca e Porto do Mangue.

Aproveito o ensejo para apreciar as lindas praias do nosso litoral. Por outro lado, visito o “sovaco da cobra”, em Grossos; o Mocó, em Areia Branca; o assentamento Brilho do Sol, em Porto do Mangue.

No meu mister de oficial de diligências, já me deparei com inúmeras situações agradáveis e desagradáveis. Ninguém, ou quase ninguém, gosta de receber em sua casa um Oficial de Justiça com um mandado judicial. Às vezes, são diligências simples, como a intimação de uma sentença ou para comparecer a uma audiência.

Outras vezes, no entanto, as diligências são executórias, como uma penhora de bens, busca e apreensão de veículos, uma reintegração de posse ou a guarda de um menor de idade. São atos processuais mais complexos, os quais exigem cautela no seu cumprimento.

Infelizmente, a maioria das pessoas não entende o trabalho do oficial de Justiça, age com desrespeito e, em alguns momentos, com agressividade. Não entende que apenas cumprimos as ordens judiciais, não nos cabendo emitir juízo de valor sobre a justiça ou a injustiça das decisões.

Entretanto, até aqui, nos ajudou o Senhor. Raramente eu encontrei uma situação mais delicada, que exigiu um posicionamento firme. Nesses casos, sempre contei com o inestimável apoio da nossa gloriosa Polícia Militar.

É claro que existem situações hilárias e delicadas, como correr por medo de um cachorro; meter o pé na lama, subir e descer dunas sob um sol escaldante, percorrer ruas e becos sem saída. Além disso, é comum encontrar pessoas que aproveitam para desabafar sobre os seus problemas, sobre um filho ou neto que estão envolvidos com as drogas.

Um dia desses, lá pra bandas da cidade de Porto do Mangue, conversei com uma mãe que perdeu dois filhos, ambos envolvidos com o mundo da criminalidade. Ela chorou. Eu, que ainda sou feito de carne, osso e, principalmente, de coração, fiquei emocionado.

Ainda tenho sonhos? Sim, tenho, pois “os sonhos não envelhecem”. Contudo, “viver é melhor que sonhar”. A maturidade me trouxe a certeza que ser feliz é fazer o que se gosta e estar ao lado de quem amamos. Simples assim.

Pois é, o tempo passou, e eu tive que me adaptar às mudanças. Fomos do processo físico ao Processo Judicial Eletrônico (PJE), das intimações pessoais as intimações por meio do aplicativo WhatsApp, das audiências presenciais as audiências por videoconferência.

E, talvez, ainda tenha um longo tempo pela estrada afora. Por isso, rogo ao bom Deus para que continue a ser a minha proteção e companhia nessas andanças.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 05/10/2025 - 09:48h

Sobre Luiz Gama e a abolição da escravatura em Mossoró

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa

Arte ilustrativa

Estou lendo o livro Luiz Gama contra o Império, do advogado e historiador do Direito, Bruno Rodrigues de Lima. Na obra, o autor destaca a luta de Gama pelo Direito no Brasil da escravidão. É uma leitura densa, fazendo-nos enveredar pelos tortuosos caminhos da escravidão brasileira. Luiz Gama nasceu em Salvador, na Bahia, em 21 de junho de 1830, e foi uma voz incansável na defesa dos direitos dos escravos.

Por coincidência, em um dia 30 de setembro, só que de 1871, ele escreveu:

“A minha missão única, missão de que orgulho-me, não é provar forças com assassinos, que desprezo; é prestar auxílio e proteção a pessoas livres, que sofrem cativeiro ilegal; é arrancar as vítimas das mãos dos possuidores de má-fé, é vencer a força estúpida e a sórdida cavilação, perante os tribunais, pelo direito, e com a razão. Minhas armas são as da inteligência, em luta pela vitória da justiça, e só pararei quando os juízes tiverem cumprido o seu dever”.

A leitura do livro despertou a minha curiosidade para saber um pouco mais sobre a história da abolição da escravidão em Mossoró, ocorrida em 30 de setembro de 1883. Infelizmente, não damos o devido crédito ao passado de nossas cidades, pois cada comunidade, e seu povo, tem uma história que merece atenção, muitas vezes com vários aspectos desconhecidos da sociedade. Creio que poucos mossoroenses ouviram falar em Rafael Mossoroense da Glória, que foi um dos alforriados.

Segundo dados que pesquisei, em 1861 existiam em Mossoró “somente” 153 cativos para uma população de 2.493 habitantes. Vale ressaltar, que no dia 06 de Janeiro de ano de 1883 foi criada a Sociedade Libertadora Mossoroense, a qual tinha por objetivo lutar pelo fim da escravidão no município; naquele ano, Mossoró contava com 86 escravos.

Destaque-se que ao lado da Sociedade Libertadora Mossoroense estava o Clube dos Spartacus (referência a Espártaco, líder das revoltas de escravizados na Roma Antiga), composto principalmente por ex-escravizados que, diferentemente dos membros da Libertadora, utilizavam-se de sua força braçal na luta pela emancipação dos escravizados. (Fonte: Cartilha didática, curso de História, UERN/Campus Mossoró).

Conta-se que no dia 30 de setembro “a cidade amanheceu em festa. Ao meio-dia, a Sociedade Libertadora Mossoroense se reúne na Câmara Municipal (onde atualmente funciona o Museu Lauro da Escóssia). O Presidente da Sociedade, Joaquim Bezerra da Costa Mendes, abre a sessão, e se inicia a leitura de cartas de alforria dos últimos escravos da cidade. Com a liberação oficial, ele declarou: “livre o município de Mossoró da mancha negra da escravidão”.

Eis, portanto, um breve relato sobre Luiz Gama e a abolição da escravatura em Mossoró. Existiram, é claro, vários interesses sociais, políticos e econômicos que permearam esse fragmento da nossa história. No entanto, o objetivo deste texto foi tão somente apresentar uma visão geral sobre o tema.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • San Valle Rodape GIF
domingo - 28/09/2025 - 08:26h

O calhambeque

Por Odemirton Filho

Roberto Carlos e o seu "Calhambeque" (Foto: reprodução da Web)

Roberto Carlos e o seu “Calhambeque” (Foto: reprodução da Web)

Das lembranças que eu trago na vida, parafraseando Roberto Carlos, uma delas marca profundamente a minha alma: o meu pai cantando a música O calhambeque, do “rei” Roberto. Inúmeras vezes ele cantou essa música, enquanto tomava uns goles de cerveja. Ao violão, quase sempre estava o meu saudoso tio Albeci, da banda Bárbaros; seja em Mossoró, na rua Tiradentes, seja no alpendre da casa de Tibau, eram momentos de pura nostalgia e descontração.

Esses momentos são “de vera” o que importam no decorrer de nossas vidas. Nada como estar ao lado de familiares (alguns, é claro) e amigos queridos. Por isso, tentemos viver de forma leve, apesar dos pesares e das dificuldades cotidianas.

Pois bem, ao cantar O calhambeque, acho que o meu pai viajava ao passado, resgatando tempos idos. Talvez, lembre da sua lambreta, quando passeava pelos arredores do Cine Pax, flertando com as moças da época. Certa vez, um amigo dele me disse que ambos pilotavam as suas lambretas e, às vezes, empinavam o pneu para impressionar os “brotos”.

E logo uma garota fez sinal para eu parar, e no meu calhambeque fez questão de passear, não sei o que pensei, mas eu não acreditei, que o calhambeque, bi-bi, o broto quis andar no calhambeque”.

Ou, quem sabe, ao cantarolar essa e outras músicas, ele lembre das festas no clube Ypiranga, da ACDP, dos festejos de Santa Luzia, da União Caixeiral (onde conheceu a minha mãe e, logo depois, iniciaram o namoro; poucos dias após, casaram-se).

Hoje, somente vez ou outra papai entoa algumas canções. Todavia, quando o escuto cantar, a minha memória afetiva é ativada, o meu tempo de menino/rapaz vem à tona, fazendo-me reviver, sobretudo, as agradáveis e inesquecíveis tardes/noites no alpendre da casa de Tibau.

Quem não traz no coração uma música que faz lembrar bons tempos? Pois então, o Calhambeque fez parte dos dias da minha infância e juventude; dias de um tempo danado de bom.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 21/09/2025 - 09:30h

Do analógico ao digital

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Dia desses assisti a um vídeo interessante. Disse o autor do vídeo, não lembro quem era, que quem tem atualmente cinquenta anos, ou mais, teve que se adaptar as mudanças do mundo, principalmente, ao rápido avanço da tecnologia.

Com efeito, quem viveu em outra época sabe como as coisas eram diferentes. Há algum tempo, não imaginávamos o uso do aparelho celular. Ter um telefone fixo em casa era um luxo. Para muitas famílias possuir uma televisão na sala era um sonho inalcançável. Muitas pessoas assistiam a televisão na casa do vizinho “rico” ou nos aparelhos que ficavam em algumas praças da cidade ou na zona rural.

Computador? Ora, era coisa de filme americano. Quem viveu na Mossoró das antigas, certamente foi aluno da Escola de datilografia São Lázaro. Eu fui. E foi uma luta danada para aprender a usar a máquina de datilografia. Aliás, eu somente conheci duas pessoas que eram datilógrafos de mão cheia: meu pai, que aprendeu o ofício quando trabalhou em cartório, e Olivar, servidor do Detran.

As mensagens eram enviadas por meio de cartas, telegramas ou cartão-postal. WhatsApp e outros aplicativos de mensagens não faziam parte do nosso dia a dia; troca de mensagem por e-mail nem pensar. Quando o Fax apareceu foi um assombro tecnológico (salvo engano, o editor deste Blog enviava uma publicação via Fax. Herzog Press, ainda nos anos 90 do século passado, há mais de 25 anos).

Os funcionários dos jornais que circulavam na cidade, por exemplo, entravam pela madrugada para fechar a edição do dia.

Para assistir a filmes, íamos ao Cine Pax, Caiçara ou Cine Cid. Netflix e outras plataformas não existiam, mesmo porque o aparelho celular e outros dispositivos eletrônicos são coisas recentes. Para se comprar um celular, o famoso “tijolão”, era preciso esperar numa enorme fila. E a fila nos bancos? Já fiquei várias vezes por horas para pagar um simples boleto, nada de aplicativos para fazer transações bancárias nem Pix para transferências, como ocorre hoje em dia.

Ademais, à guisa de ilustração, os automóveis de tempos pretéritos possuíam carburadores, e não essa tecnologia de hoje em dia. Perdi as vezes que fui limpar o carburador de um velho buggy, lá na oficina de Souza, no bairro Paraíba. Agora, iniciamos a onda dos carros elétricos.

Como esquecer a fila que se formava para comprar um botijão de gás no depósito de Porcino, sob um sol causticante? Atualmente, é bom demais, temos delivery, e qualquer mercadoria chega rapidinho as nossas casas.

Pois é, vivemos à luz da modernidade. A tecnologia mudou e facilitou sobremaneira as nossas vidas. Passamos da era analógica para a digital. No entanto, consumimos boa dose do nosso tempo nas redes sociais e na internet, em vez de aproveitar a vida real.

De fato, o mundo está bem diferente de outrora. Pelo menos, em alguns aspectos, a humanidade evoluiu.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • San Valle Rodape GIF
domingo - 14/09/2025 - 12:44h

Livro físico ou eletrônico?

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Quando eu iniciei o curso de Direito, adquiri o livro Filosofia do Direito, do respeitável jurista Miguel Reale. É um livro denso, com uma linguagem de difícil compreensão, principalmente, para alunos do primeiro período do curso.

Ao longo dos semestres, comprei alguns livros, condizentes com o meu pouco orçamento doméstico e com a imperiosa necessidade de acompanhar as aulas e o estudo das disciplinas. Assim, o Código Civil, de Processo Civil, Penal e Processo Penal eram obrigatórios para auxiliar nos estudos. Como eram atualizados anualmente em razão das mudanças legislativas, praticamente todos os anos, adquiria.

Além disso, livros de doutrinadores consagrados na seara do Direito precisavam ser comprados. Muitas vezes, no entanto, tirava xerox dos livros ou de capítulos específicos para conseguir estudar e me submeter as avaliações. Aliás, a vida de um estudante não é fácil, pois normalmente o dinheiro é escasso. Para mim, já casado e com um filho pequeno, era uma luta medonha.

Com o passar dos anos, formei um pequeno acervo com livros dos vários ramos do Direito e de literatura. Como sabemos, o livro físico requer um maior cuidado, pois precisamos acondicioná-los em um ambiente para conservá-los, ocupando espaço em uma casa, apartamento ou escritório.

Na contemporaneidade, entretanto, estamos na era do e-book (livro eletrônico). E, convenhamos, é inegável a facilidade de manuseio e a capacidade de armazenamento dos dispositivos eletrônicos. Podemos ter acesso a uma quantidade imensurável de livros em qualquer lugar; quando estou aguardando atendimento num consultório médico, costumo acessar o livro digital para ajudar a passar o tempo.

Não sei se você gosta de ler no formato físico ou eletrônico, mas, para mim, embora a minha leitura seja realizada praticamente em dispositivos, nada se compara ao prazer de ler um livro físico, de abrir a embalagem, marcar as suas páginas, apreciar a sua diagramação, isto é, o texto, as imagens e os gráficos; no livro físico, até o cheiro é agradável.

Mas, enfim, cá pra nós e o povo da rua, o importante é embarcar no prazer da leitura, não importa o meio.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 07/09/2025 - 13:50h

Bravíssimo, Veríssimo!

Por Odemirton Filho

Luís Fernando Veríssimo morreu em Porto Alegre (Foto: Mateus Bruxel/Agência RBS)

Luís Fernando Veríssimo nasceu em Porto Alegre-RS (Foto: Mateus Bruxel/Agência RBS)

“A crônica é literatura que se apega às coisas miúdas da vida. Nasce do rés do chão, com uma simplicidade reveladora e penetrante”.

No último dia 30, o Brasil perdeu a verve do cronista Luís Fernando Veríssimo. Ele deixou um legado imensurável de crônicas, contos e romances. Nascido em Porto Alegre/RS, em 1936, Veríssimo era detentor de uma fina ironia. Em seus textos, sabia navegar no cotidiano e perscrutar a alma humana.

Assim é o cronista. Do simples, extrai o que há de melhor na vida. No entanto, não fica amarrado ao estilo culto da língua. Ao contrário, prefere a linguagem coloquial que se identifica com o dia a dia das pessoas. O cronista observa a paisagem, um jardim florido, uma praça, o azul do mar, o luar, um casal enamorado, conseguindo transformar o que parece banal em especial.

Certa vez, ao ser entrevistado, Veríssimo disse que com trinta e poucas linhas se conseguia escrever uma crônica. Entretanto, em relação ao romance, essa quantidade de linhas daria, talvez, para um capítulo de um livro. Sem dúvida, ao escrever crônicas podemos enveredar por caminhos diversos, às vezes, de forma sucinta, deixando fluir palavras carregadas de sentimentos, lembranças e saudades.

Entre os seus inúmeros textos, destaca-se a série de crônicas sobre a Velhinha de Taubaté. Tratava-se de uma senhora que acreditava no governo durante a gestão do general João Baptista de Figueiredo (1979-1985). Ela continuou a acreditar nos mais variados políticos até que, com o tempo, de tanto se decepcionar, morreu. (Tenho para mim que continua vivendo em pessoas que acreditam e idolatram políticos).

Luís Fernando gostava de frases marcantes, instigantes, reflexivas. Eis algumas: “No Brasil o fundo do poço é uma etapa”. “Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data”. “Os tristes acham que o vento geme, os alegres acham que ele canta”. “O futuro era muito melhor antigamente”.

Bravíssimo, Veríssimo. Valeu!

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • San Valle Rodape GIF
domingo - 31/08/2025 - 08:24h

Tocando em frente

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Nesses tempos de intolerância, nos quais não se escuta o que o outro tem a dizer, e todos são donos da razão, procuro me blindar da toxicidade das redes sociais. Não sei você, mas eu tento manter a calma para enfrentar as batalhas da vida. Que são muitas.

Na verdade, não sei como alguém consegue viver permanentemente em guerra; não sei como o coração suporta, a alma aguenta. Sendo assim, ante as dificuldades impostas pela, procuro respirar fundo, pedindo sabedoria a Deus para superar as adversidades.

Certamente não é uma tarefa fácil. No entanto, é preciso tecer em nossas vidas um caminho que possa ser percorrido com discernimento e paz. A escolha certa depende, sobremaneira, de um matutar sereno ou, quem sabe, de uma oração singela que ilumine as nossas decisões.

Cada um tem os seus desafios, uns mais, outros, menos. Contudo, para vencê-los, é preciso diminuir o ritmo do dia a dia, procurando arejar a cabeça. Decisões atabalhoadas, irrefletidas, levam-nos a atitudes inconsequentes, às vezes, sem volta.

Por exemplo: qual a vantagem de continuar um debate quando o interlocutor entende que suas convicções são imutáveis? Ora, se ele tem sempre razão, torna-se infrutífero qualquer diálogo. Assim, não há argumento, por mais verossímil que seja, que faça o intransigente mudar de opinião.

Por isso, em certas ocasiões, é preciso ensarilhar as armas, saber a hora de recuar. Para vencer uma guerra é fundamental ter estratégia, ou seja, é preciso refletir para, somente depois, avançar.

Enfim, “penso que cumprir a vida seja simplesmente compreender a marcha e ir tocando em frente”. Buscando paz.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 24/08/2025 - 05:00h

Eternos momentos

Por Odemirton Filho

Criança e avô caminham na praia - Imagem ilustrativa com recursos de Inteligência artificial para o BCS

Criança e avô caminham na praia – Imagem ilustrativa com recursos de Inteligência artificial para o BCS

Na semana passada fui à praia com o meu primeiro neto. Foi a segunda vez que ele viu o mar, e parece que gostou. É ainda um bebê, começando os dias de sua vida. Sentado na areia com os seus pais, ele sorria, olhava o mar, as ondas quebrando, pegava na areia; a brisa batendo em seu pequenino rosto.

Eu o olhava, de longe, apreciando esse momento tão singelo, de descobertas. E pensei no junho de minha vida. Vi-me na areia, fazendo castelos, brincando com os carrinhos. Eu estava a jogar bola com o meus primos e amigos, tomando banho de mar, desbravando o morro do labirinto.

Não sei se o meu neto continuará gostando de ir à praia, no entanto, espero que possa acompanhá-lo nessa jornada, e possamos jogar bola. Formaremos uma pequena trave, com chinelos. Ele, então, fará gols. Sorrirá. Depois, mergulharemos no mar; pegaremos “jacaré”; banharemos nossos corpos, sobretudo a alma, afastando mau-olhado.

Esperaremos as jangadas que aportarão à beira-mar e compraremos peixes. Vamos nos lambuzar saboreando picolés de chocolate. Caminharemos até a pedra do Ceará, recolhendo as conchas que embelezam a praia (as grandes, levaremos ao ouvido para escutar o barulho do mar, o fenômeno da reverberação), e afundaremos os nossos pés na areia, em ensolaradas tardes de fluxo e refluxo da maré.

Tudo isso, é claro, sob o olhar carinhoso e atento dos seus pais.

Na casa dos seus bisavós, ele vislumbrará uma linda paisagem; um mar azul, um lindo coqueiral. Na linha do horizonte, verá o Porto-ilha, que leva o nome do seu trisavô. O alpendre da casa será palco de redes armadas, onde se joga conversa fora, e se toma café coado, com bolo, grude e tapioca.

Na adolescência, talvez, ele não queira ir à praia comigo. Decerto, preferirá a companhia dos amigos e amigas, iniciando as paqueras, “as ficantes”, os namoros, na “vibe” dos doces anos da juventude. Pena que não curtirá as festas do Creda e a escadaria de Zé Félix.

Por isso, tento aproveitar esses eternos momentos, fazendo-os inesquecíveis, singulares.

Lembrei-me do poeta paraibano Ronaldo Cunha Lima, no seu livro de sonetos, Sal no rosto:

“Quando os meus filhos disserem aos meus netos o quanto eu os amava; e quando os meus netos disserem aos meus filhos que guardam lembranças minhas, e de mim sentem saudade, não terei morrido nunca:

Serei eternidade”.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Repet
domingo - 17/08/2025 - 10:38h

O misto de Zé Tomás

Por Odemirton Filho

Caminhão misto da década de 40 (Foto: Notícias do Sertão)

Caminhão misto da década de 40 (Foto: Notícias do Sertão)

Um dia desses conversando com o meu sogro, ele me contou a história de quando ia à cidade de Macau, no misto de Zé Tomás. Disse-me que a viagem era demorada, pois a estrada era de terra, e o misto ia parando de comunidade em comunidade, numa luta medonha até chegar ao destino. Saíam de Mossoró às 13h e chegavam a Macau por volta das 21h.

O misto, para quem não sabe, é um caminhão que na sua carroceria havia alguns bancos para o transporte de passageiros. Transportavam-se crianças, adultos, galinhas, cachorros, além das bagagens. Era o transporte comum de outrora, pois inexistiam ônibus ou carros de pequeno porte fazendo linha para o interior. Transporte por aplicativo? Ora, ora, isso é coisa de pouquíssimo tempo pra cá.

Nessa árdua jornada, até chegar ao destino, o misto parava em várias localidades. Segundo o meu sogro, o lastro do automóvel era carregado de macambira, sendo necessário apear os passageiros e as bagagens para descarregar a macambira que seria entregue nas fazendas e nos sítios, o que tornava a viagem bastante demorada e cansativa.

Lembro que, ao lado da igreja de São Vicente, no centro de Mossoró, havia também um misto que diariamente fazia o transporte de passageiros, porém, não me vem à memória o nome do condutor e qual o era o seu destino; isso lá pela década de oitenta.

Outro meio de transporte que também fez parte da cena urbana de Mossoró foram os ônibus de Belmont. Como a frota era antiga, aqui e acolá os ônibus davam o “prego” no meio do percurso, fazendo com que os passageiros tivessem que chegar ao destino “pegando” carona.

Na subida para o alto de São Manoel, próximo a ponte, em outros tempos as pessoas ficavam esperando carona para voltarem para as suas casas; as bicicletas e as carroças faziam parte do nosso cotidiano e, com o tempo, as motocicletas tomaram conta da cidade. Hoje, está tudo mudado; o trânsito cada vez mais caótico.

Eis, portanto, mais um pedacinho da história de Mossoró. E você, já viajou no misto de Zé Tomás? Ou andou nos ônibus de Belmont?

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 10/08/2025 - 08:40h

O verdadeiro pai

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Pergunte aos filhos que perderam os seus pais o que eles gostariam de receber no dia de hoje? Certamente, diriam que gostaria de ter a presença do seu pai. Não só hoje, mas ontem, anteontem, sempre. Por quê? Porque o verdadeiro pai faz falta. Muita.

Para o verdadeiro pai não há necessidade de ganhar presentes, somente a presença dos filhos para alegrar os seus dias já é suficiente. O verdadeiro pai vibra com a vitória dos filhos, torce por eles, chora por eles. Não precisa de determinação judicial para pagar a pensão aos seus filhos, pois sabe das suas obrigações. E o faz com amor.

O verdadeiro pai está sempre presente na vida de seus filhos, mesmo que já não conviva com a mãe deles. O verdadeiro pai, apesar de imperfeito, procura preencher a lacuna da sua ausência com atenção e carinho. Triste é observar o distanciamento entre pais e filhos.

O verdadeiro pai está sempre ali, firme e forte para dar a mão aos seus filhos para o que der e vier.

Um dia desses, eu vi o meu primogênito tocando violão para o meu neto, brincando num tapetinho no chão, cheirando o rosto e a cabeça de seu filho. Aí, apercebi-me, mais ainda, que aquele momento era especial. Singular. Era isso que importava, que importa, que vale.

Não é preciso grande coisas para se fazer presente na vida dos filhos. Um redobrado carinho, uma preocupação, uma ligação, um abraço são suficientes para ocupar o coração dos filhos. Não há nada melhor do que ter à mesa nossos filhos e netos, comendo, bebendo, sorrindo. Não tem preço.

É pena que na maioria das vezes somente percebemos o valor das pequenas coisas quando já estamos no entardecer da vida. Quando somos jovens, a vida nos impõe uma correria medonha, a imperiosa necessidade de ganhar dinheiro para pagar as contas. E deixamos de lado a atenção que devemos dar aos nossos filhos.

O “pai herói” da letra da música cantada por de Fábio Júnior não é perfeito, nem invencível. Ele chora, ganha e perde, como qualquer pai. Inclusive, eu.

Quando eu vi o meu filho cantando para o meu neto, eu lembrei da canção de Fábio Júnior:

– “Eu cresci e não houve outro jeito. Quero só recostar no teu peito, pra pedir pra você ir lá em casa, e brincar de vovô com meu filho, no tapete da sala de estar”.

Sim, é isso que importa.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • San Valle Rodape GIF
domingo - 03/08/2025 - 06:32h

O velho e o mar

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Arte ilustrativa com recursos de Inteligência Artificial para o BCS

Reli o livro O Velho e o Mar, do escritor norte-americano Ernest Hemingway. Dessa vez, porém, reli o livro devagar, apreciando o desenvolver do texto, as palavras, a cadência da história.

Enquanto escritor, Hemingway adotou um estilo direto, talvez, valendo-se de sua formação em Jornalismo. No decorrer da vida escreveu vários clássicos, a exemplo de Adeus às Armas e Por quem os sinos dobram.

Em apertada síntese, O Velho e Mar trata da vida do velho pescador Santiago e do seu único amigo, o garoto Manolin.

O livro conta a história de um velho pescador que passa dias e dias sem fisgar nenhum peixe, trazendo para os seus sofridos dias um enorme desalento. Aliás, não sei por qual razão essas histórias de pescador me fascinam.

Talvez, seja porque eu sempre encontro pescadores lá pelas praias das areias brancas e, vez em quando, troco um dedo de prosa com eles. Quantas vezes eu tive que esperar pescadores voltarem do alto-mar para que pudesse efetivar a intimação? Muitas e muitas, não conto as vezes.

No livro, o velho Santiago parte mais uma vez para o alto-mar em busca de uma farta pescaria. Depois de alguns dias, consegue fisgar um grande peixe. Inicia-se, então, uma luta renhida para conseguir mata-lo e colocá-lo junto ao barco.

São dias de uma batalha que parece interminável. O grande peixe puxa o barco do velho pescador mar adentro. Porém, o velho, apesar de cansado, e sofrendo com a linha que feria as suas mãos, com pouca água e comida, permanece firme, fazendo-se forte.

“O homem não feito para a derrota, pensava, um homem pode ser destruído, mas nunca derrotado”. Assim é a nossa vida, repleta de batalhas. Umas conseguimos vencer, outras, não. Entretanto, precisamos continuar firmes, mesmo que machucados, pois a vida não é fácil para ninguém.

Como diria o velho pescador, “é uma estupidez não ter esperança, acho que é um pecado perder a esperança”.

E lá vamos nós singrando nossos mares. Às vezes, navegamos por mar calmo, outras vezes, revoltos. Além disso, enfrentamos tubarões, como fez o velho pescador. Tubarões de todas as espécies e tamanhos. Vencê-los é a nossa luta diuturna. Sem esquecer, decerto, que inúmeras vezes a nossa luta é solitária, sem ninguém para nos ajudar a remar o barco.

Ao fim e ao cabo de vários dias, depois de uma longa e exaustiva batalha, o velho pescador voltou pra sua humilde cabana. Ao seu lado, somente o garoto, seu único e fiel amigo.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 27/07/2025 - 04:02h

Sob o pé de seriguela

Por Odemirton Filho 

Foto ilustrativa - por Mário Franco

Foto ilustrativa – por Mário Franco

A casa onde eu morava quando era criança ficava na rua Tiradentes, no centro de Mossoró. Na rua por trás, José de Alencar, era a padaria do meu pai. Havia ligação entre a casa e a padaria. Eu passava o dia pra lá e pra cá.

A casa tinha um primeiro andar. No pavimento superior, ficavam os quartos, no inferior, sala e cozinha. No quintal existia uma simples e pequena piscina, onde eu, minhas irmãs, primos e amigos tomávamos banho. Ali, aprendi a nadar.

Havia, também, um frondoso pé de seriguela. Sob a árvore, ficávamos conversando e brincando. Nos finais de semana, juntava-se uma ruma de meninos para tomar banho de piscina e comer as seriguelas. Eu gostava das verdes, minhas irmãs, das maduras.

Às vezes, meu pai reunia alguns familiares e amigos para tomarem umas sob o pé de seriguela. Entre outras músicas, ouvíamos meu pai cantar Nelson Gonçalves, “boêmia, aqui me tens de regresso”, e o Calhambeque, de Roberto Carlos, sua preferida. Eu via emoção em seus olhos, talvez, por relembrar da Mossoró do seu tempo de rapaz.

Meu tio Albecir, da Banda Bárbaros, acompanhava com o violão. Tio Alcides cantava O Menino da Porteira. Tio Ezanildo, lá pra tantas, levantava-se e fazia um discurso. Preocupações da vida? Deveriam existir, é claro. No entanto, curtia-se a vida, como deve ser.

Quando era adolescente convidava um bocado de amigos lá pra casa. Como sabemos, para a juventude tudo é diversão; reunir-se com amigos, paquerar, os namoricos, os passeios sem a responsabilidade da vida adulta.

Certa vez, num comício da vitória de um candidato, tomei uns goles a mais de vodka com Fanta Laranja. Os meus amigos foram me levar em casa e, para não perder o costume, mergulharam na piscina, de madrugada.

Hoje, aqui ou acolá, lembro-me, com saudade, da casa da rua Tiradentes, na qual vivi os dias da minha infância e adolescência. Dos momentos ali vividos forjou-se o homem com inúmeros defeitos e, quem sabe, alguma virtude.

De vez em quando, vem à memória o quintal da minha infância. E eu ainda sinto o sabor das seriguelas.

Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
Home | Quem Somos | Regras | Opinião | Especial | Favoritos | Histórico | Fale Conosco
© Copyright 2011 - 2025. Todos os Direitos Reservados.