Por Odemirton Filho
“Não sei por quantos votos, mas vamos ganhar a eleição”. (Aluízio Alves)
Diz o jornalista Zuenir Ventura, em seu livro “1968: O ano que não terminou”, que naquele ano o mundo pegou fogo. Foi um ano que incendiou corações e mentes, explodiu em canções, filmes, passeatas, revoluções e guerras.
No “país” de Mossoró não foi diferente. Em 1968 a disputa eleitoral a prefeitura entre Jerônimo Vingt-un Rosado Maia e Antônio Rodrigues de Carvalho “pegou fogo”.
De um lado, Vingt- un Rosado (vinte e um em francês), homem das letras e de família tradicional na política. No jogo do bicho, o número vinte e um é o do “touro”, daí o surgimento do apelido na campanha eleitoral.
Já Antônio Rodrigues de Carvalho era do sítio Capim Grosso, município de Upanema, por isso o chamaram, naquele pleito, “Toinho do Capim”.
Vamos aos fatos, de acordo com as reminiscências de Aluízio Alves.
Segundo Aluízio, Mota Neto, político de Mossoró, o procurou, pois queria impor uma derrota aos Rosados na campanha eleitoral, achando que Antônio Rodrigues de Carvalho era o candidato certo.
Aluízio não se opusera, porém quis consultar as “senadoras”, um grupo de mulheres de Mossoró que dava sustentação ao seu projeto político. Elas insistiam que o nome deveria ser do próprio sistema, com preferência por Cid Duarte, rebento do senador Duarte Filho.
O candidato foi Toinho, que já tinha sido eleito em 1957 à prefeitura, com apoio dos Rosados.
Duarte ficou longe da campanha. Numa carta a Aluízio assumiu essa posição e avisou que votaria em Vingt-un.
No início da campanha tudo caminhava para a vitória do “Touro”. As pesquisas encomendadas pelo grupo de Aluízio apontavam que o “Capim” perderia por número esmagador.
Entretanto, o grupo do “capim” foi à luta. As “senadoras” organizaram uma passeata de 72 horas no “Caminhão da Esperança”, com parada de meia em meia hora, na quais o “cigano feiticeiro” pudesse discursar.
Sob o sol escaldante de Mossoró, Aluízio começou a maratona eleitoral. No decorrer das 72 horas muitos fatos ocorreram. Assim, era comum que, ao término das aulas, os estudantes e professores seguissem a passeata.
As empregadas domésticas foram convidadas a participar, largando as cozinhas e as casas, trazendo nas mãos uma colher como símbolo de identificação, às vezes, gritando o nome de suas patroas.
A passeata, também, passou pelo comércio de Mossoró, fazendo com que parte dos comerciantes fechasse as lojas, pois clientes e empregados começaram a segui-la.
Ou seja, uma multidão começou a acompanhar a passeata no decorrer das 72 horas. Algumas pessoas carregavam um ramo verde nas mãos. Uma “floresta ambulante”, lembra Aluízio.
Alves, de igual, modo percorreu parte da zona rural do município de Mossoró, até a divisa com o Ceará, levando o nome de seu candidato.
Começara a virada.
Após uma desgastante campanha eleitoral, fechadas as urnas, era o momento de aguardar a contagem dos votos.
Quando começou a apuração o “touro” saiu à frente. As urnas sendo apuradas e Vingt-un ganhando. Alguns de seus correligionários, no calor, apostavam dinheiro na vitória e soltavam fogos de artifícios.
Contudo, Aluízio acalmava os eleitores do “capim” que estavam desolados com a perspectiva da derrota. As nossas urnas vão chegar, dizia.
E chegaram.
No final da apuração, Antônio Rodrigues de Carvalho, “Toinho do capim”, ganhou a eleição para prefeito de Mossoró por 98 votos de maioria sobre Vingt-un Rosado, o “ Touro”.
Foi uma festa. Das grandes. “É o capim, meu filho”!
Há, ainda, um “causo” hilário, contou-me meu pai.
Vingt-un, com sua comitiva, em andanças na campanha eleitoral pelos lados da cidade de Baraúna, foi visitar a bodega que pertencia a uma pessoa da região, conhecida por “Priminho”. O vereador Expedido Bolão, seu correligionário, era o guia nessas visitas.
Lá estando, sentou-se à mesa e começou a comer o que o dono do estabelecimento lhe oferecia.
“Priminho” estava feliz da vida, pensava que venderia muito, pois era uma ruma de gente que acompanhava o candidato. “Mais um “queijim”, Dr. Vingt-un”? “Aceito, é bom”. E o “Touro” continuava a comer.
Lá pra tantas Vingt-un se levantou e, pensando que o lanche era uma cortesia de “priminho”, apertou a sua mão, agradeceu e foi embora sem pagar.
Eleições de 1968 (Fonte: Vingt-un Rosado, Coleção Mossoroense):
– Antônio Rodrigues (Aena 2/verde) – 11.132 votos;
– Vingt-un Rosado (Arena 1/vermelho) – 11.034 votos;
– Maioria – 98 votos a favor de Antônio Rodrigues.
“Priminho”, cabisbaixo por causa do prejuízo, chamou uma das pessoas que acompanhava Vingt-un e implorou, quase chorando: “por favor, nunca mais traga esse “touro” aqui”.
Se é verdade, não sei, mas é mais uma das muitas histórias que ilustraram aquela memorável campanha.
Pois é. Realmente 1968 foi um ano atípico em todo o mundo. E dizem, cá por estas bandas, que a disputa entre o “touro” e o “capim” foi a mais bela campanha eleitoral que Mossoró já viu.
Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça