Por Francisco Rodrigues da Costa
Acredito que toda criança, quer nascida ou não na cidade em que viveu, guarde na memória os seus becos, ruas e esquinas. Por mais importante que se torne quando adulta, suponho que não os esqueça. Fernando Pessoa, por exemplo, não lembraria os de sua Lisboa encantadora? De Salamanca, por Miguel de Unamuno idolatrada, ele os olvidaria? Alexandre Dumas, sem dúvidas, conheceria os de sua romântica Paris.
E Castro Alves, o condoreiro abolicionista, de sua memória jamais se apagariam as esquinas da Bahia, onde tanta poesia cantou. Carlos Lacerda, que em cada esquina procurava um presidente para depor, com certeza tinha desenhados na sua cachola todos os becos e esquinas da Cidade Maravilhosa.
Deixemos os que já partiram desta vida. Vamos a São Paulo. Fico imaginando a Mogi das Cruzes, do meu amigo Mario Silveira, mogiano até a medula, será que ele esqueceu a esquina da Cel. Souza Franco, ou a da Senador Dantas? Garanto que não. Como viva na sua cuca está a esquina da Livroeton.
Vamos dar uma voltinha aqui mais perto da gente: Osair Vasconcelos, estou certo, carrega no pensamento a esquina da Rua do Gango, de sua Macaíba. O Beco da Lama, em Natal, sem dúvida, é lembrado pela grande maioria dos seus boêmios.
O diabo é quem discute com Paulo de Balá. Este, além dos becos, ruas e esquinas, guarda na lembrança um punhado de currais da sua Acari.
E o que dizer de Manoel Onofre Júnior, “de camisa aberta ao peito, pés descalços e braços nus”, esqueceu suas andanças pelos becos e ruas da sua inolvidável Martins? Du-vi-d-o-dó. O poeta e escritor Marcos Medeiros, que viveu a infância em Santana do Matos, lembraria pelo menos a Rua Cel. Manoel Antonio de Macedo, esquina com o Beco da Matança.
O famoso Beco das Frutas, aqui em Mossoró, seria esquecido pelos escritores Francisco Obery Rodrigues e Elder Heronildes, ou pela grande maioria dos mossoroenses?
Chego finalmente, aos becos, ruas e esquinas de Areia Branca. E inicio pelo Beco da Galinha Morta, cuja popularidade é conhecida por alguns amigos que fiz na cidade espanhola de Salamanca. Também muito falado foi o Beco do Panema, assim mesmo: Beco do Panema como a meninada chamava. Deixou de existir quando o libertaram das cercas que o ladeavam.
O beco onde o doutor Vicente Dutra tinha seu consultório dentário também já não existe; desapareceu com a demolição daquele quarteirão que ia da esquina da Mossoró Comercial até à esquina da oficina do “Ferreiro”, avô de Naldinho.
Outro beco, que nem nome tinha, iniciava na esquina do bar de Clodomiro, na Barão do Rio Branco, terminando na Travessa dos Calafates. E, por falar em esquina, os garotos da Rua do Meio jamais esquecerão as esquinas da loja de Pedro Leite e a da casa onde morou Adauto Ribeiro, vizinha ao primeiro cinema da cidade, como, igualmente, a esquina da casa de Caboclo Lúcio e a esquina da casa de Manoel Bento, todas na Rua Cel. Fausto.
Finalmente, a loja de Pedrinho Rodrigues, na Rua Barão do Rio Branco, fazendo esquina com a Rua da Frente: quantos meninos por ali passaram visando o banho na maré, de olho nas frutas que os “beijus” sacudiam na água.
Difícil é haver, em qualquer parte deste planeta, um vivente que não recorde os seus becos, ruas e esquinas.
Francisco Rodrigues da Costa é escritor areia-branquense e a crônica em destaque faz parte de seu mais recente livro, com título homônimo
O DENTISTA ERA BRAZ BENEDITO E NÃO DR. VICENTE DUTRA. BRAZ FOI VICE-PREFEITO.