Luís Gomes, antiga Serra do Senhor Bom Jesus, povoada a princípio por escravos, destacando-se entre eles o negro Jacó, de propriedade do sertanejo Luís Gomes de Medeiros, o fundador oficial, o dono que foi das terras desta serra, tem 251 anos de existência.
Por isso cada beco, cada esquina desta distante cidade potiguar diz muita coisa para quem sabe enxergar ou tem sensibilidade para perceber o que os olhos não vêem, o coração não sente e a memória não absorveu ou apagou ao longo dos anos. Nos subúrbios da cidade de Luís Gomes, para o lado do poente, próximo e um pouco à esquerda da lagoa chamada de “Santana” ou de “Antonio Augusto”, estão às ruínas de uma edificação muito interessante, as da Casa de Pedra, também conhecida como da Pólvora.
Dessa construção feita há muitos anos, muito provável em uma das décadas do século XVIII, ainda restam algumas paredes, servindo de testemunha dos acontecimentos de um tempo distante e denunciando, por seu estado, a falta de preocupação dos administradores com o nosso patrimônio histórico. Trata-se de uma edificação feita para comercializar gêneros susceptíveis de explosão e fábrica de fogos de artifício.
O Regimento das Câmaras Municipais do Império do Brasil, de 01 de outubro de 1826, assinala que esse tipo de comércio “pelo seu perigo só poderáõ vender e fazer nos lugares marcados pelas camaras, e fóra do povoado…”.
Isso explica à existência da obra que ao longo dos anos intrigou a quem conheceu e que atualmente encontra-se esquecida.
Numa das manhãs, final do mês de outubro próximo passado, na companhia de alunos da Escola Estadual Coronel Fernandes, numa aula de educação física, fui à antiga Lagoa de Santana, roubada ao longo dos anos da igreja católica. Seguindo nossa caminhada, espécie de passeio escolar, como se fazia noutros tempos, levei-os para conhecer as ruínas da Casa de Pedra, hoje dentro da chácara da professora Maria Claudino de Sá [Graça de Gilfones].
Qual não foi minha surpresa e indignação quando cheguei ao local: encontrei-a circundada por uma pocilga de bom tamanho, feita de varas, cheia de porcos. As ruínas, ainda mais em ruínas da antiga casa, não resistirá por muito tempo caso não haja uma intervenção por parte do executivo municipal ou por pressão do Ministério Público.
Há algum tempo temos implementado, através do Grupo Mutirão, com todas as limitações que uma ONG distante dos holofotes da mídia e da preocupação dos mecenas da cultura neste estado está sujeita, uma política de educação visando principalmente preservar o patrimônio material e imaterial deste município. Isso culminou no ano passado, em 16 de novembro, com a abertura do Centro de Cultura Popular “Escravo Jacó” que abriga o único e primeiro museu de Luís Gomes e um dos mais importantes de toda região próxima.
Não é novidade também, para muitos, que temos apontado culpados para a falta de preocupação com a nossa tão prostituída cultura. Nesse sentido nosso foco natural e principal tem sido o atual prefeito Pio X Fernandes, que administra este município pela terceira vez, por ser negligente ao extremo naquilo que é de sua competência.
A Lei Orgânica Municipal, promulgada em 03 de abril de 1990, no seu artigo 11 e nos itens que seguem, diz que é de competência também do município “proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos”. Assim a administração municipal tem sido criminosa quando tem permitido que vários dos nossos bens culturais sejam reduzidos à poeira.
Não podemos esquecer, jamais, a casa do fundador Luís Gomes, destruída no final do ano de 1992; as diversas fachadas das casas centenárias que vêm sendo impiedosamente deformadas; a casa de morada do Pe. Belarmino de Almeida [antigo deputado provincial e vigário de Pau dos Ferros, falecido em 1873], nas proximidades da Vila São Bernardo, que quase não mais existe; o casarão que pertenceu ao Major Baltazar Meireles, que em 1926 abrigou o Comando Maior da famosa e lendária Coluna Prestes quando por aqui passou, recentemente desfigurada por seu proprietário, o advogado Francisco Fontes Neto.
São esses e muitos outros bens materiais que as futuras gerações, certamente mais conscientes, não terão oportunidade de conhecer “in loco”.
O que mais impressiona é que todas e muito mais poderiam ter sido preservadas apenas por força de um decreto municipal. Lamento e denuncio a falta de preocupação dos seguimentos da sociedade luisgomense com os desmandos patrocinados pelos diversos administradores com a memória do nosso povo. Assusta-me a omissão estapafúrdia do Ministério Público de Luís Gomes com esses graves crimes.
Perturba-me, ainda, a grande distância das instituições de ensino desta comunidade, que muito e principalmente através dos seus educadores podem ser importantes na tarefa de conscientizar os alunos para assim cobrar uma mudança de atitude, um comportamento mais ético, daqueles que de fato têm o poder de fazer mais e diferente.
Enfim, ainda lamento profundamente, e principalmente agora, num momento em que a Fundação José Augusto, está sendo presidida pelo petista, um companheiro de partido, Crispiniano Neto, que foi criada para apoiar e proteger a cultura do nosso estado, seja completamente descompromissada com a cultura dos rincões, especialmente a do Alto Oeste Potiguar.
Luciano Pinheiro de Almeida, professor e historiador (lucianomandacaru@hotmail.com)
Solidarizo-me, daqui, com o pvo de Luis Gomes, presentemente defendido por Luciano Pinheiro, que conheci ainda menino, entre outros meninos que receberam as lições do Padre Pedro Lapo, italiano que se mostrou, frequentemente, em defesa do Rio Grande do Norte, especialmente do Oeste norte-rio-grandense, melhor do que muitos de nós que aqui nascemos e não damos nenhuma importancia aos nossos valores culturais, como bem o faz, nesse momento, Luciano, em defesa de Luis Gomes. Seu exemplo nos anima a continuar lutando.